Capuz Vermelho (Especial): "Deuses e Monstros"


AVISO:
*Se ainda não leu nenhum capítulo desta série ou uma temporada inteira, sugiro que não prossiga a leitura, pois pode acabar se deparando com SPOILERS.

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Notas iniciais: 

*Este capítulo especial aborda, de forma mais detalhada e aprofundada, a linha temporal alternativa na qual Rosie mantém sua decisão irrevogável quanto a proposta oferecida por Yuga. Tal irrevogabilidade desencadeia eventos que favorecem a vitória de Abamanu que triunfa sobre a Terra juntamente aos seus subordinados (soldados quiméricos e miméticos nível Beta), causando o decaimento gradual da humanidade. Em "Sinais do Fim (3x07)", Áker, inesperadamente, surge para Rosie quando a jovem se preparava para ir a uma reunião importante no QG do Exército Britânico, e, discretamente com os dedos, desenha um sigilo dimensional na parede do quarto enquanto conversa com Rosie, ativando-o com um estalar de dedos em seguida, mandando-a para um futuro apocalíptico onde Abamanu e suas tropas obtiveram a vitória, a Legião dos Caçadores conta apenas com três membros (Adam, Lester e Êmina) que possuem uma aliança com outro grupo de caçadores sobreviventes, Sekhmet tivera seus poderes totalmente absorvidos e encontra-se sob custódia da Legião, Áker está desaparecido e Rosie, especulativamente, fora morta na explosão da fábrica de Liverpool. No final do capítulo supracitado, o arauto de Yuga revela ter tido visões a respeito desse futuro assombroso e quis compartilhar esse alerta com Rosie o quanto antes para convencê-la a dizer sim. Os eventos a seguir iniciam-se a partir da ida de Rosie ao QG do Exército Britânico, sem a presença de Áker, pois, nesta linha temporal, o arauto não vislumbrou psiquicamente o futuro consequente da resposta negativa de Rosie. Só esclarecendo que Áker não possui um dom premonitório, tal como Alexia - que previu eventos distintos. O alerta proveio de uma fonte misteriosa, sobre a qual Áker não quis comentar nem mencionar em sua conversa com Rosie, e muito menos ele sabe quem lhe forneceu, preferindo questionar esse evento estranho consigo mesmo.

OBS¹: Informações a respeito da tal fonte misteriosa surgem nos capítulos que compreendem a reta final da 3ª Temporada (capítulos 37 à 40/13 à 16).

OBS²: Pode-se considerar os eventos deste capítulo como Linha Temporal 01 (Alternativa) na qual Rosie não sabia da fórmula da cura, as operações de resgate não ocorreram simultaneamente mas em dias diferentes e Áker estava mais focado em frear os movimentos violentos de Sekhmet sem saber do futuro catastrófico reservado, desencadeando acontecimentos que levam à morte da jovem na explosão da fábrica de Liverpool e ao triunfo de Abamanu sobre a humanidade poucos anos depois. Já os eventos decorrentes a partir do momento em que Áker se encontra com Rosie no Casarão em "Sinais do Fim (3x07)" - com a descoberta da cura para a substância tóxica por parte de Rosie em sua viagem ao futuro, algo que motiva ambos a mudarem o curso da história - deve ser chamada de Linha Temporal 02 (Oficial). Com a ida de Rosie (da já alterada Linha Temporal 02) ao futuro da Linha Temporal 01 graças a Áker, as probabilidades são rapidamente alteradas, o que consequentemente ocasiona a criação de uma outra linha temporal a partir do exato momento da chegada de Rosie, aqui sendo chamada de Linha Temporal 03, na qual ocorrem os eventos mostrados em "Sinais do Fim (3x07)", pertencentes ao futuro apocalíptico, como a antecipação da missão de invadir a fortaleza dos miméticos, por exemplo, evento este que também antecipa a morte dos membros da Legião graças à influência da Rosie do passado da Linha Temporal 02. Que tipo de futuro ocorreu na terceira linha do tempo, após a detonação e os efeitos da bomba Ômega, é desconhecido.

OBS³: A Linha Temporal 01 (Alternativa) pode ser entendida como o caminho mais curto que os eventos dela trilharam para um final da série como um todo, pois, como visto no clímax de "Sinais do fim (3x07)", o trio da Legião e todos os humanos limpos acabam morrendo devido ao imenso poder da bomba Ômega que transforma a Terra em um lugar inabitável para seres humanos não-infectados. Charlie também está morto após ter sido útil à Abamanu. Sekhmet foi a única sobrevivente, por ser uma deusa, claro, ainda que desprovida de seus poderes é imune aos efeitos do gás tóxico e passa a vagar pela Terra - após escapar do bunker da Legião -, solitária e envergonhada de si mesma por ser rebaixada a uma reles mortal.

OBS(4): Alguns trechos de "Sinais do Fim (2x07)" ou "Alfa,Beta e Ômega - Parte 3 (3x10)" foram transcritos para indicar que certos diálogos da Linha Temporal 02 (Abamanu e Hector, por exemplo) também foram ditos na Linha Temporal 01, embora as situações ocorridas em ambas tenham se desdobrado de formas relativamente distintas em diversos aspectos.

OBS(5): O pesadelo de Rosie apresentado logo no início de "Sinais do Fim (3x07)" nada tem a ver com as visões de Áker, é apenas uma manifestação dos medos da personagem em relação ao resgate dos seus amigos e da possibilidade de falhar neles. No entanto, não é desconsiderado na Linha Temporal 01, mas a cena não foi transcrita pois o foco deste especial são as consequências da recusa de Rosie diante da proposta, então alguns personagens que não apareceram no capítulo citado tem seus devidos destaques (como Mihos, Eleonor e General Holt).

OBS (6): Charlie não necessariamente deve aparecer. A descrição breve de sua morte está nas notas finais. Seria uma cena demasiadamente longa e tornaria este capítulo ainda mais extenso. O personagem terá seu devido destaque em algumas cenas importantes da reta final da 3ª Temporada.


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16 de Março de 1941

Inglaterra - Área florestal de Raizenbool  


Rosie guardara seu diário alternativo - pois o verdadeiro, para ela, havia sumido -, junto à caneta, ao puxar a primeira gaveta de sua cômoda, após ter escrito mais pensamentos a respeito de como enxergava as possibilidades em meio àquela crise que, no mais tardar, poderia alcançar proporções globais.

Abrira a primeira porta do guarda-roupa, seus belos olhos azuis fitando as vestimentas que normalmente utilizava para aventuras perigosamente imprevisíveis, as quais jamais imaginou que usaria. "E pensar que minha avó criou todos esses acessórios... Talvez para usar como um disfacre barato e escapar dos inquisidores ", pensou ela, a face séria, pegando as botas vermelho escuro, os cintos de couro, a blusa vermelha, o corset e os braceletes e braçadeiras, jogando cada um dos itens na cama. Por último, pegara o capuz vermelho escarlate, o qual estivera bem escondido atrás dos outros. Em vez de joga-lo como fizera com os demais itens, a jovem observava o vermelho vivo daquele manto, idealizando a figura de seu pai... usando-o em alguma seita dos Red Wolfs.

"Fugi tantas vezes... que nem percebi estar perdida nesse meu mundo virado do avesso.", pensou ela, direcionando seus olhos para um canto do quarto, seriamente reflexiva quanto á obrigação que Richard Campbell impôs à filha, sem nem mesmo ter pensado no quão direto isso influenciaria no futuro planejado de Rosie após a universidade.

Ajeitara seu cinto de couro marrom bem afivelado. Antes de sair, erguera o capuz escarlate sobre a cabeça, em seguida dando uma rápida olhadela no espelho, passando uns dedos pelas órbitas dos olhos. "Está tudo bem. Já estou mais do que requisitada... ele vai entender meus motivos.", pensou ela, dirigindo-se à porta do quarto. Puxara a maçaneta, com um olhar decisivo e determinado, logo abrindo a porta, fechando-a e seguindo pelo corredor semi-escuro em passos tranquilos.

"Hora de contar a verdade. Sem rodeios... e sem temer a reação do chefe.", disse ela para si, confiante de que não sairia de lá com o sangue fervendo devido à uma possível discussão.

                                                                                            ***

QG Alternativo do Exército Britânico 

Infelizmente, nada correspondeu às expectativas.

- Só pode estar brincando!- soltou o General Holt, levantando-se abruptamente de sua cadeira e pondo as mãos na mesa enquanto encarava Rosie com raiva através de seu único olho sadio.

- Eu estaria caso eu estivesse dando risadas agora. - retrucou Rosie, estando de pé, para o aumento da fúria do chefe militar. - Se temos algo em comum, então é o estresse.

- Ora, como ousa... - disse Holt, fechando o punho direito e fuzilando-a com o olhar raivoso. Deteve-se para acalmar-se e respirar melhor. - Isso não ficará do jeito que está, senhorita Campbell. Eu deveria indicia-la por omissão. - falou, apontando um dedo para a jovem.

- E o senhor deveria retirar meu diário confiscado na caixa de "Achados e Perdidos". - disse ela, mantendo o ar sério, revoltando-se com a atitude passada dos soldados, quando invadiram o Casarão sem autorização dela ou de Hector. - Acredite, vim com a melhor das intenções, esclarecer de vez as coisas, eu... - pausara, parecendo preocupada. - ... eu só quero que isso acabe. - seu semblante alterara-se, tal como sua voz mudara para um tom mais choroso e baixo. A jovem virou-se de costas para o General, pondo as mãos no rosto e andando pela sala devagar. Holt a olhou com estranheza, levantando uma sobrancelha.

- Não querendo ser indelicado, mas...  - disse ele, atento aos baixíssimos soluços de Rosie. -... Isto não é uma tentativa para me convencer com uma chantagem emocional, certo?

Rosie ignorara o comentário e enxugara as lágrimas e voltara-se novamente ao General, recompondo-se.

- Respire fundo... Rosie. - disse Holt, intencionando acalma-la, sentindo-se pouco à vontade.

- É a primeira vez... que me chama pelo primeiro nome. - apontou a jovem, estranhando.

- Foi a primeira coisa que pensei para me tornar mais próximo de você, de alguma forma. - disse ele, caminhando até ela. - Para amenizar sua preocupação, precisa de apoio, e eu sei o quão está atordoada. - se pôs mais perto dela. - No entanto, isto não minimiza seu delito. Devo exercer a lei... e fazê-la responder por esse ato.

- Ótimo. - disse, com rispidez, erguendo um pouco os braços e juntando os pulsos. - Vá em frente, me prenda.

- A exposição prolongada ao senhor Crannon, pelo visto, tornou você em alguém bastante petulante. - reclamou o General, aparentando ter desistido da ideia, andando para um lado, pensativo.

- O senhor também não parece estar nos seus melhores dias. - notara Rosie, olhando-o com seriedade.

- Meu estado de espírito não vem ao caso. - retrucou ele, voltando-se para ela, sem alterar a altivez. - Sabe por que não a prenderei? - semi-cerrara o olho. - Somente por conta de sua utilidade.

- E o que vem depois? - perguntou ela, desconfiada.

- A tão esperada reunião dos membros da Legião dos Caçadores para defrontar contra o cabeça por trás da calamidade. - disse Holt, pondo as mãos para trás e andando pela sala vagarosamente. - Caso seja encontrando, o senhor Crannon também está permitido a participar. Afinal, será uma operação sem a interferência do Exército, mas estarão livres para solicitarem nossa ajuda quando acharem necessário.

- E por acaso encontraram o paradeiro? - perguntou Rosie, sem deixar de olhar para o General, mostrando-se interessada a saber os rumos da suposta investigação para achar Hector.

- Ainda estamos trabalhando nisso. - disse o General, rápido na fala.

- Espera aí... - disse Rosie, não convencida. - Não estou entendendo nada. Por que me trata desse jeito se disse que sou priorizada pela minha utilidade?

- O que pensou quando eu disse isso? - questionou Holt, olhando-a com severidade. - Que minha intenção era fazê-la se sentir especial no meio militar? - virara o rosto e fizera um barulho rápido com a boca indicando deboche, como se tratasse aquilo como uma simples piadinha estúpida.

- Disso eu sei, mas, pelo seu tom, está fazendo me sentir ofendida. - reclamou Rosie, não gostado nem um pouco do rumo da conversa. - E chamar pelo meu primeiro nome não o torna mais próximo de mim, para o seu governo.

- E, tendo em vista seu tom, posso prende-la por desacato á autoridade. - ameaçou Holt, dando um infame sorriso de canto de boca. - A escolha sua... Campbell.

- Agora chega. Cansei de brincar de soldadinho. - disse Rosie, andando a largos passos, bufando em fúria. Porém, o General a pegara pelo braço direito, fazendo-a parar. A jovem virou o rosto enraivecido para o homem. - Me larga!

- Você não vai a lugar nenhum, mocinha. - determinou ele, categórico no tom. - Possuo contato com uma fonte que me assegurou sobre você ser perigosa o suficiente para pôr em risco todos os pelotões. Antes do interrogatório de Crannon, eu confisquei um item especial portado por ele.

- Quem é a tal fonte secreta? - perguntou Rosie, intrigada.

- Não está em posição de fazer perguntas. - decretou Holt, rígido.

- Não estamos em um interrogatório. - redarguiu ela.

- Mas logo passará por uma revista. - disse ele, logo sacando do coldre o seu rádio-transmissor a fim de chamar um de seus homens. Puxara a antena do aparelho e apertara o botão responsável por liga-lo, em seguida aproximando-o à boca e mantendo os olhos sérios fixos em uma irritadiça Rosie. - Gerard, preciso que se encaminhe até aqui, neste exato momento. Quero que leve a senhorita Campbell para uma revista. Caso encontre um objeto estranho, leve-a imediatamente para a sala de interrogatório. Fui claro?

- Entendido, senhor. - respondera o soldado do outro lado da linha.

Rosie limitou-se a pôr as mãos na cintura e respirar fundo para manter-se calma.

- Está cometendo um erro. - apontou ela, olhando-o com reprovação e balançando levemente a cabeça em negação.

- Não julgue minhas decisões. - disse o General, guardando seu rádio. Tornou a olha-la. - Não deixo passar um único detalhe. Não estiveram naquele antiquário para uma visitinha eventual.

- Como tem tanta certeza? - perguntou Rosie, a face dura.

- Os detectores são infalíveis, registraram um alto nível de atividade paranormal. - informou ele, andando alguns passos em direção à Rosie. - Acham que podem me tapear? Só estou preservando algumas informações comprometedoras sobre Crannon para não abalar sua relação com ele. E não estou insinuando nada, se é o que pensa.

- Nossa relação sofreu alguns tropeços. - disse Rosie, olhando para um canto da sala, pensativa. - Eu... já me desiludi com ele uma vez... por causa de um segredo... e não sei dizer se exatamente eu o perdoei ou... apenas me deixei levar pela urgência do momento.

O General a fitou com suspicácia rigorosa. Quanto mais secretas pareciam as informações omitidas por Rosie mais forte tornava-se sua motivação em desvenda-las e arranca-las de uma vez por todas.

- Urgência do momento!? - indagou ele. - O que isso significa? - fez uma pausa, sorrindo de modo infame. - Quanta hipocrisia.

- Não tiro sua razão. - disse Rosie, dando de ombros, rendendo-se à verdade. - Afinal, todos tem algo a esconder. Eu o fiz revelar tudo o que eu queria saber... é, acho que chegou minha vez de passar por isso. - uma lágrima escorrera pelo seu rosto. - O senhor tem toda a razão, General. Eu mantive coisas em segredo. Coisas importantes. Mas nesse caso, nós dois fomos cúmplices. Não precisa me dizer fatos horríveis sobre Hector. O conheço tão bem quanto o senhor mereceria conhecer. - declarou ela, comovida, parecendo denotar uma estranha saudade do caçador e ansiando profundamente por encontrar a resposta de seu paradeiro.

Antes que Holt dissesse algo, o soldado Gerard entrara na sala com algemas.

A jovem juntara os pulsos, entregando-se.

- Pensando bem, a mande direto para a sala. - decretou Holt, paciente.

- O senhor mesmo conduziu a revista antes de eu vir? - perguntou o soldado, fechando as algemas.

- Peça para o soldado Heller se encarregar de interroga-la. - decidira ele, dirigindo-se à sua mesa.

Um arrepio perpassara a pele de Rosie. "Espera aí... Vou ser interrogada por um deus carnívoro, psicopata e disfarçado de um homem morto?!", pensou ela, exibindo perplexidade na expressão.

Gerard franziu o cenho para o General, não entendendo a razão pelo chefe ter rejeitado sua pergunta.

- Mas o senhor não respondeu...

- O que eu disse sobre questionamentos? Não insista! Vá, já! - ordenou ele, colérico, apontando para a porta com o indicador e sentando-se em sua cadeira de couro.

- Desculpe pela teimosia, senhor. - disse o soldado, levando Rosie algemada para fora da sala. - Vamos. - falou, logo fechando a porta.

O telefone tocara no exato instante em que a jovem passara da soleira da porta. Holt, ainda sob o pesado efeito do estresse, atendera.

- Alô?

- Olá, General. - disse a voz feminina e provocante do outro lado.

O semblante de Holt alterara-se para nervosismo incontrolável, sendo possível ver gotículas de suor formando-se em sua branca testa.

- Justo agora? O que quer? - perguntou ele, rude.

- Apenas uma pequena renegociação nos termos. - disse Sekhmet, em seu apartamento. - Serei direta: Me deixe tentar matar Rosie Campbell nas duas operações e, em troca pela sua inestimável generosidade, lhe direi quem comanda as fábricas espalhadas no seu país. A identidade do inimigo de meu amado. Caso eu falhe na primeira tentativa, terei de revelar apenas quando eu mata-la com minhas próprias mãos na segunda.

- E se fracassar nas duas? - perguntou Holt, permanecendo sério, embora inseguro ao estar falando com a violenta deusa que lhe arrancara o olho esquerdo.

- Impossível. - disse ela, lacônica. - Embora haja um obstáculo.

- Então elimine-o. - pediu ele, lembrando-se logo do erro que cometeu ao dirigir-se à deusa daquela forma petulante. - Ahn... Quero dizer...

Sekhmet gargalhara em deboche.

- É tristemente patético. - disse ela. - Sócios devem interagir na mesma medida. Estou profundamente calma. E quanto ao senhor... está falando comigo como um cão com o rabo entre as pernas e as patas enfraquecidas e trêmulas.

- Não é necessário. - disparou Holt, sem medo desta vez. - Ela está sob minha custódia, vou arrancar dela cada palavra, cada informação a respeito do que presenciou nos últimos dois anos, desde quando conheceu Hector Crannon. Portanto, irei descobrir o nome do cabeça por minha conta e risco. E você pode voltar para o inferno de onde veio. Mate-a se quiser, já não me importo mais, eu fui tolo, mais do que nunca em minha vida ao confiar em uma jovem de 21 anos sem nenhum preparo militar e com intenções questionáveis. Encerremos por aqui, sua vadia infernal. O acordo está, definitivamente, destruído! - levantara-se da cadeira, enfezando-se. - Tem minha permissão concedida para mata-la. E se sentir-se ofendida por causa do meu tom, eu...

Sekhmet desligara de forma abrupta, denunciando impaciência, mesmo satisfeita com a resposta.

Holt olhara para o fone com o cenho franzido.

- Entenderei isso como um "Sim, senhor". - afirmou ele, pondo o fone no gancho.

                                                                                             ***

Haveria uma reunião a respeito das próximas duas operações de resgate marcada para aquele dia, às 10 horas em ponto. Rosie, vendo-se sozinha na silenciosa, abafada e pouco iluminada sala de interrogatório, perderia a participação de tal evento tal como, provavelmente, perderia sua alcunha de líder de esquadrão. Fitando o nada, concentrada unicamente em si mesma e nos vários devaneios que vinham-lhe à mente, a jovem sentia os pulsos doerem devido ao tamanho das algemas. Uma lâmpada meio amarelada e meio branca era fonte de iluminação da sala, localizada no teto, focando mais o centro da média mesa de madeira. Rosie encontrava sentada do lado que postava-se diante da única porta do recinto, aguardando pacientemente a chegada de seu interrogador.

"Não é justo!", pensou ela, colérica por dentro, sem o mínimo de aceitação por aquele tratamento. "É praticamente óbvio que tem o dedo podre de Sekhmet no meio disso. Se Mihos vai me interrogar... Então, é bom que esteja preparado, pois vai ser de grande ajuda, mesmo estando em cima do muro.", pensou ela, mal acreditando por estar considerando a ideia de unir forças com o filho daquela que deseja mata-la brutalmente, "Sei que é loucura! Mas que outra opção eu tenho?". Olhou para a sua direita, encarando a janela de vidro semi-espelhado, incerta sobre alguém estar vigiando-a do outro lado. "Vai parecer estranho se eu gritar perguntando se tem alguém aí. Tem sempre alguém acompanhando o processo. Merda! Não posso sair daqui, não há como saber, nem Mihos pode me revelar quem se resolver não facilitar as coisas só por diversão. Se eu acabar presa, já era. Se eu for liberada, porém, talvez ainda haverá uma chance de conversarmos a sós outra vez, a menos que me mandem ir para casa o que seria péssimo. Se acontecesse, ainda assim não daria certo caso eu pedisse algo emprestado do soldado Heller, com certeza estranhariam minha intimidade muito rápida com ele, depois vão me acusar, especular que estou envolvida com um soldado e que posso ter a má intenção de colocar em risco sua carreira, depois essas teorias infundadas chegam aos ouvidos de Holt... Enfim, o jeito é simplesmente acreditar que vou contar com a sorte do meu lado, por mais possível que eu ache que isso não vá acabar bem, principalmente à mim".

O ranger da porta se abrindo fizera Rosie se empertigar na cadeira, fixando seus olhos na figura que ali adentrava.

O "soldado Heller", fardado e de boné, entrara na sala, exibindo certa arrogância.

- Ora, ora, ora. Veja só quem eu encontro. E eu duvidando. - disse ele, sacanamente sorrindo para Rosie ao se aproximar da mesa. Puxara a cadeira e, em seguida, sentou-se, pondo o boné em cima da mesa. Olhou-a com cinismo. - Pelo visto, seu juramento não recebeu aquele voto de confiança honesto. Se bem que... - inclinou-se um pouco para ela, o olhar pulsante. - ... honestidade, para os mortais, tem o seu preço, por isso o General manteve os dois pés atrás.

"Para estar falando assim...", pensou Rosie, no ápice do nervosismo, olhando de soslaio para o lado direito, visando a janela. Depois voltou novamente a atenção para Mihos, esperando uma resposta rápido e precisa.

O herdeiro de Yuga não tardou a notar, sendo bem esperto quanto ao significado da expressão insegura demonstrada pela jovem.

- Pode ficar tranquila. - disse ele, bem à vontade, encostando as costas na cadeira. - Sem bisbilhoteiros enxeridos. - relanceou a janela. Por fim, revelara a aparência de seu receptáculo, metamorfoseando em milissegundos. Um caçador meio loiro de cabelos pouco espetados, esbelto, olhos azuis e face meio arrendondada. - Aliviada? Mais satisfeita, eu diria? Admita, você me esperava, mas não exatamente para me fornecer respostas que só o ignóbil comandante deste bando de carnes suculentas ambulantes quer saber.

Rosie suspirou longamente.

- Eu iria perguntar sobre não haver ninguém nos assistindo, mas estou com pressa. - disse ela, fitando-o seriamente.

- Use-a a seu favor. - disse Mihos. - Esta conversa não durará muito mais. Na verdade vai durar mais do que minha abstinência forçada pelos meus pais. Deve imaginar como é.

- Sim, eu sei, imagino você numa jaula chorando e pedindo comida para a mamãe trazer. - disse ela, irônica.

- Você realmente quer me ver cooperando ou mudando de ideia? - perguntou ele, dando sua condição. - Porque, para falar mesmo a verdade, eles nem sabem que estou aqui.

- O quê?! - indagou Rosie, franzindo o cenho e estremecendo. Sua voz soou mais alta do que ela esperava. - Entrou sem ser visto?

- Senti a energia do amuleto emanando. - declarou ele, mostrando-se um pouco mais sério. - Uma emanação tão forte que pensei ser basicamente um pedido de socorro de um mortal desconhecido, só depois percebi que se tratava de você, a princípio duvidei, mas, quando enfim entrei, tive certeza.

- Como sabia que eu precisava de ajuda? - perguntou Rosie, desconfiada. - Foi Áker quem me deu aquele amuleto.

- E por essa razão a energia dele está fortemente ligada à você. - informou Mihos, enfático. - Uma divindade oferecendo um item de certo valor a um mortal faz com que a energia dele se conecte ao portador. Ou seja, você, nesse caso. Como eu disse antes: Use a pressa a seu favor se quiser que isto termine logo.

- Por acaso, você sabe ou está a par de algum plano de Sekhmet para me matar? - perguntou Rosie, tentando ser o mais direta possível, sem esconder a apreensão.

Mihos deu uma risadinha zombeteira, cruzando os braços.

- Mamãe não aprendeu mesmo a lição.

- Dá para responder logo? - apressou-se Rosie, demonstrando sua impaciência seguida de um tom ríspido.

- É claro que não. Nem que ela me ofertasse o maior banquete de toda a minha vida. - disse ele, transparecendo sinceridade na expressão. - Mesmo tendo uma vantagem palpável, eu jamais me aliaria à alguém obsessivo, insano e traiçoeiro.

- Então é um "sim"? - indagou ela, levemente esperançosa.

- Você nem expôs os termos. - disse Mihos, exigente, sorrindo de canto de boca. - Não assino na linha pontilhada sem ler tudo.

- Então lá vai o primeiro: Você para de se alimentar, pelo menos aqui no QG. - apontou ela, sucinta.

Mihos ficara alguns minutos em silêncio, pensativo quanto a condição, movendo a boca de um lado para o outro.

- E então...? - perguntou Rosie, encarando-o com bastante seriedade e suspicácia.

- É válido. - decretou ele, decidido. - Estou ouvindo passos distantes... É melhor agilizarmos a negociação.

Com aquela revelação, Rosie sentira seu pulso acelerar subitamente de um minuto para outro. Engolindo a saliva, a jovem se esforçou para pensar numa maneira rápida de conseguir um apoio.

- Me dê um novo amuleto. - pediu ela, receosa.

Mihos levantara uma sobrancelha, sorrindo de modo cínico.

- Tem ideia do que está desejando? - perguntou ele, sem pôr muita fé no pedido da jovem. - O que acha que nós somos a partir de agora? Aliados?!

- Não seja idiota. - disparou Rosie, impaciente. - Por que acha que estou propondo esse acordo?

- Um acordo de fornecimento mútuo. E temporariamente limitado. - elucidou ele, não gostando nem um pouco do rumo que a conversa passara a adquirir. - E não uma aliança forjada para beneficiar somente um lado. - levantou-se da cadeira, pondo as mãos na mesa, exibindo uma postura rude. - Não pense em quem está lidando, saiba com quem está lidando. Palavras do General, não minhas.

Rosie se via quase no limite, virando o rosto para um lado ao bufar em aborrecimento.

- Se realmente pensou que eu poderia ajuda-la a escapar das garras da minha mãe - disse Mihos -, lamento profundamente, então vou refrescar sua memória: Não escolhi um lado nesta maldita guerra por eu estar pouco me importando, por eu achar isto completamente inútil e sem sentido algum.

- Será que vou precisar implorar? - perguntou Rosie, já pensando em desistir daquele plano arriscado.

- Você é frágil, mas também não é pra tanto. - retrucou Mihos, sentando-se novamente. - Mas não vou ser forçado a trabalhar em conjunto, muito menos com uma mortal. Menos ainda se tiver a intenção de envolver aquele serviçal e seu clube rebelde.

- Eu estive pensando agora... - disse Rosie, estreitando os olhos. - ... Recusou por talvez estar com receio de enfrentar sua mãe?

- Nem nos meus piores delírios eu me intimidaria com a presença dela. - confessara Mihos, dando de ombros.

- Não foi exatamente isso que eu quis dizer. - disse Rosie, séria.

- E o que foi, então? - perguntou Mihos, denotando irritabilidade.

- Que deve estar apavorado só de pensar em voltar para a prisão onde colocaram você por ser tão intransigente. - disse ela, inclinando-se para ele.

- Não seja estúpida. - devolveu Mihos, levantando-se novamente, mas, desta vez, para se retirar. Olhou de soslaio para a janela a sua esquerda. - Nosso tempo acabou. - falou, arqueando as sobrancelhas. - E o acordo... desfeito. - dera as costas para a jovem.

Antes que o herdeiro de Yuga tocasse na maçaneta, Rosie o chamara como que por instinto alimentando pelo desespero.

- Espera! - disse ela, sua voz soando bastante alta para aquela sala.

Mihos voltara-se para ela, demonstrando todo o seu descontentamento.

- Ah, é verdade, esqueci o boné. - disse ele, andando até a mesa e pegando-o. - Até... nunca mais.

- É sério, por favor. - suplicou Rosie, rangendo os dentes em aborrecimento. - Tenho quase certeza de que sabe boa parte dos planos de Sekhmet e o que ela tem feito ultimamente.

- Continue se convencendo disso. - retrucara ele, abrindo a porta e, por fim, saindo.

- Como contactar o General, por exem... - interrompera a frase na metade ao ver a porta fechando-se. Fechou os olhos, suspirando pesadamente em desalento pelas chances se esvaírem por completo.

"Ele com certeza vai voltar", pensou ela, irrequieta na cadeira e destetando cada vez o aperto e o desconforto que as algemas lhe proporcionavam. "Mas obviamente como soldado Heller.", Foi então que lembrara-se de algo de grande importância, o qual utilizaria-se como trunfo para sobressair-se. "Merda! Eu... eu poderia te-lo chantageado, ameaçando contar ao General que o soldado Heller na verdade está morto! Sim, eu sei, se eu o fizesse, ele me ameaçaria de morte, não cometendo a loucura de me matar aqui mesmo por ser um deus explosivo, mas o faria enquanto eu estivesse fora da vigilância do Exército. Os outros soldados o revistariam... achariam o amuleto... Mas, se ele matou o soldado Heller aqui no QG, qualquer um dos detectores de atividade paranormal seria acionado. Considerando que ele está possuindo um caçador qualquer... do qual ninguém costuma prestar muita atenção, então ele foi bem seletivo, planejou isso bem antes. Se eu não for imediatamente desvinculada quando isso acabar, posso ir até um dos acampamentos e perguntar sobre o caçador. Hector seria de extrema ajuda com um retrato falado... mas não, eu não sou muito boa em fazer descrições, então vou ter de me esforçar. Se alguém se lembrar e reconhece-lo, vão da-lo como desaparecido e vai gerar suspeitas. Mihos não vai demorar a saber, irá atrás de mim exigindo explicações, mas não vai me matar, pois seria punido por Áker, que foi ordenado para ser o responsável dele na ausência dos pais. Sekhmet está preocupada em elaborar o plano perfeito para me pegar desprevenida e me matar com rapidez e Yuga está ocupado demais com sua meditação, de acordo com Áker, crédulo demais sobre eu aceitar a maldita proposta. Só preciso... relaxar... tentar agir naturalmente". Rosie permanecera silenciosa, oral e mentalmente, olhando para a mesa e aquietando sua aflição.

A porta fora aberta novamente. Era um dos subordinados de Holt, verificando o estado da jovem, sem exatamente entrar na sala.

- Como está se sentindo? - perguntou ele, de modo apático.

- Além de uma criminosa? - indagou Rosie, a expressão séria. - Hum... Se não se importam, então não precisam saber.

O soldado franzira o cenho, fitando-a com chateação.

- Só me foi ordenado para ver como está. - disse ele, dando de ombros.

- Se estivessem tão preocupados, talvez não me manteriam algemada como se eu fosse um psicótica enrustida. - disparou ela, vomitando toda a sua insatisfação, destacando suas mãos algemadas. - Sou líder de operação. Se me punirem injustamente, me sentirei no direito de recorrer à Corte Marcial.

- O General já está a caminho. - disse ele, prestes a ir embora, ignorando as queixas da jovem.

- Ei, espera aí. - chamou Rosie, fixando sua atenção no soldado. - Interrogar ou me vigiar?

- Interrogar, obviamente. - disse ele, lacônico. - Não foi avisada? - perguntou, estranhando.

- Não, é que... - disse Rosie, desviando os olhos para um canto da sala, pensativa. - Tudo bem, que seja ele. Não me importo. - disse, balançando de leve a cabeça com os olhos fechados por uns segundos.

- O.K. Aguarde mais alguns minutos. - disse o soldado, fechando a porta.

Rosie se limitou a deitar sua cabeça na mesa, esticando os braços com pulsos algemados, não suportando ter de esperar o início do interrogatório por mais tempo, deixando-se vencer pelo tédio.

                                                                                       ***

08 de Abril de 1941 

Inglaterra - Liverpool: 3ª e última operação de resgate. 


A operação já havia se iniciado por volta das oito da manhã, com as tropas sendo mobilizadas para cercarem toda a estrutura, tal qual fizeram na missão anterior em Birmingham - ocorrida há 5 dias. Naquele dia ensolarado, maquinários militares - tanques, carros e blindados - rugiam com seus motores ao atravessarem a zona florestal da área ocupada pela proliferação do gás tóxico, cujo avanço era limitado, e garantirem uma proximidade segura com as principais entradas da enorme fábrica, mirando suas armas nos pontos considerados mais vulneráveis para efetivar uma melhor capacidade de derrubada.

Dentro do laboratório, especificamente uma cela privada, o Dr. Lenox, após ouvir longínquos ruídos de um tenso alarido do lado de fora, preparara-se para pôr em prática um plano audacioso. Numa maleta metálica, posta sobre uma mesa de granito, desesperadamente colocava seus materiais de pesquisa. A luz semi-azulada do recinto ilumina-o de cima à baixo, seu jaleco branco em destaque. Lenox estava visivelmente apavorado, tremulamente guardando suas coisas para fugir dali o mais depressa possível. "Dois anos... Dois anos desperdiçados em um maldito laboratório, coagido a compactuar com a perversidade de um monstro soberbo que se sente no direito de se proclamar um deus! Em nome de toda a minha formação intelectual, científica e social, jamais consideraria aquela abominação como um verdadeiro deus! Deveria ser categorizado como um demônio assassino e sanguinário!", pensou ele, despejando de sua mente toda sua opinião sobre Abamanu, logo fechando a mala com pressa e pegando-a com as duas mãos. Pusera-a debaixo do braço esquerdo, carregando-a como se tivesse a preservar um tesouro milenar.

"É isso... Tudo nos conformes por aqui.", pensou ele, andando para trás, os olhos castanhos rapidamente esquadrinhando o laboratório numa tentativa de detectar algo fora do lugar. Especialmente, olhara, com alguns segundos a mais, para um ponto do amontoado de caixas de papelão localizado em um canto à sua direita. Ali estava o seu trunfo para garantir uma possível reversão da calamidade. "Espero, do fundo do meu coração, que possa se encontrar em boas mãos", pensou, referindo-se à uma fita com um áudio que gravara mais cedo discorrendo a respeito de uma fórmula reversa para a substância, desenvolvida poucos dias antes secretamente.

As chaves do laboratório pertenciam-lhe, embora soubesse que seriam inúteis no futuro. Pelo menos era o que ele pensava. Portando sua valiosa maleta, Lenox fechara as pesadas portas de metal do local, girando a válvula com toda a força. O "lado de fora" era semi-escuro e a porta não estava tão visível, além de estar trancada. Sorte que ao seu lado esquerdo havia um atalho. Uma porta estreita. Chutou-a com força com o pé direito, quebrando-a quase que totalmente, logo iniciando uma frenética corrida por um longo corredor cinzento e pouco iluminado, sem a menor noção do risco de se deparar com inconvenientes que colocariam absolutamente todo o seu plano a perder.

                                                                                          ***

Zona florestal

A luz do sol fazia os belos e alisados cabelos pretos do receptáculo de Sekhmet - Betsy Rossman - reluzirem estonteantemente enquanto a deusa caminhava a passos cuidadosos pela floresta, visando seu mais ousado oponente. Encontrou três corpos de soldados quiméricos largados no solo, olhando-os com certo desdém. Ao ganhar proximidade com Áker - que postava-se parado ao lado de uma árvore, parecendo cansado -, a deusa sacara de seu sobretudo, com discrição, sua adaga dourada, a afiada lâmina brilhando em contato com a luz solar, erguendo-a lentamente e segurando seu cabo com uma firmeza inabalável.

Entretanto, seu plano passava longo de pega-lo desprevenido.

- Serviçal! - gritou ela, chamando rapidamente a atenção de seu subordinado. Áker virou-se para ela, espantado. A deusa lhe devolveu um olhar debochado, girando a lâmina ao se preparar. - Conheço essa expressão. Pelo visto - olhou para os corpos -, esteve dedicando tanta concentração àquela indigna que se esqueceu de si mesmo.

- O que faz aqui, Sekhmet? O que quer dizer? - perguntou Áker, recompondo a postura, mostrando-se desafiador com sua seriedade.

- Presumo que estas feras débeis lhe deram bastante trabalho. - disse ela, pronta para ataca-lo a qualquer instante. - Não fosse por isso, não o veria assim.

- Continue enganando a si mesma. Não cheguei ao meu limite. - afirmou o arauto, sacando sua adaga, aproximando-se da deusa. - Vamos acabar com isso hoje. Sempre tão imprudente quanto o seu filho.

- Do qual você deveria estar cuidando agora mesmo. - atestou ela, ríspida.

- Depende do que você entende por "cuidar". - disse Áker, levantando uma sobrancelha, deixando algo subentendido.

Sekhmet o fitou estreitamente, esboçando um sorriso de infame e cínico.

- É impressão minha ou... está ameaçando matar meu filho. - desconfiou ela, compreendendo as intenções do arauto.

- Pode duvidar o quanto quiser. - disse Áker, mantendo-se sério e a faca na mão. - Eu me isento da responsabilidade. E se isso não bastar, eu desisto de convencer Rosie da proposta apenas para protegê-la!

- Então nós dois seremos punidos. É reconfortante. - disse Sekhmet, não ficando surpresa com a decisão do arauto.

- Só se for para você. - disse ele, ficando mais próximo para atacar.

- Exato. - disse ela, chegando perto de modo ameaçador. - Sempre... eu!

Áker investira com rapidez contra Sekhmet, tentando golpeia-la com a lâmina e a mesma desviando de um lado para o outro, procurando uma brecha, uma oportunidade para desferir seu ataque.

Conseguira pegar o braço de Áker, o que segurava a faca, para arremessa-lo em alta velocidade contra uma árvore de tronco fino. O forte impacto fizera-a partir e Áker voara longe, batendo com suas costas no solo de modo arrastado. Sekhmet viera em super-velocidade, pondo-se por cima do arauto, aproveitando que o mesmo permanecia deitado no solo, ameaçando esfaqueá-lo no peito. O arauto, prontamente, segurara o braço com o qual ela manejava a faca. A deusa bloqueara o movimento do braço direito do arauto.

- Façamos um teste: Posso não conseguir mata-lo mas vou machuca-lo bastante. E então recorro ao meu amado, confirmo sua deserção, e veremos em qual das partes ele irá confiar. - disse Sekhmet, forçando cada vez mais para golpeia-lo.

- Isso já passou... de todos os limites. - disse Áker, enfurecendo-se ao tentar resistir. Batera com sua cabeça na testa da deusa e a chutara com bastante força, fazendo-a chocar-se contra uma árvore mais robusta, não causando grandes danos.

O arauto lançara sua lâmina tal qual lança-se um shuriken. A deusa, por reflexo, conseguira pega-la pelo cabo antes que a ponta encostasse em seu rosto, em seguida largando-a no chão e logo apelando para o uso de sua rajada óptica solar para atingir Áker.

O arauto, por sua vez, tentara parar aqueles finos e retilíneos raios com uma só mão, sendo empurrado com força, seus pés deixando rastros profundos no solo. Ao passo em que Sekhmet se andava e aumentava a força de suas rajadas, Áker via-se sem nenhum suporte, tampouco uma saída, sentindo a carne de sua casca ser queimada aos poucos. Trincava os dentes, resistindo o máximo que podia.

- Vou fazer com que a punição devido ao seu apego sentimental por Rosie Campbell seja menos do que merece! Por ter desafiado minha autoridade! - decretou a deusa, colericamente investindo seu incontrolável poder contra o mensageiro de Yuga.

                                                                                            ***

Instalação Nº3 - Sala sem numeração. 

Atraído por uma poderosa e familiar energia divina, Abamanu - usando Mollock como receptáculo e uma robusta armadura metálica que lhe proporcionava toda uma sensação de imponência genuína - percorria a passos calmos o interior da uma parte da fábrica, especificamente uma sala - parecendo servir como um improvisado depósito de lixo - com paredes altas de concreto, duas janelas acima e uma única porta de entrada cuja abertura dava-se por meio de uma inclinação para frente.

A sentira há poucos minutos. Ora estável, ora irregular.

Farejou com o focinho de Mollock, o ar gelado do ambiente entrando pelas narinas, concentrando sua atenção totalmente àquela conhecida energia, ignorando com considerável facilidade todo a balbúrdia estrondosa do lado de fora. Seus sentidos jamais o trairiam. Parou em um ponto, perto de entulhos de lixo metálico.

Quando menos esperou, ao virar-se para um lado, deparou-se com a figura de um altivo Hector diante de si, exalando um estranho ar de suntuosidade.

Ao ver o caçador parado à sua frente, Abamanu não escondera seu pasmo. Rapidamente notara a diferença na postura do caçador, um tanto atípica à que esperaria.

- Então, é você!? - disse Abamanu, petrificado de surpresa, seus selvagens olhos amarelos fixados em Hector. - Vindo... logo de você!? Impossível! Inconcebível! - vociferou ele, inconformado demais para lidar com a possibilidade do caçador enfrenta-lo de igual para igual ali mesmo.

- Deve estar perguntando desesperadamente o porque. - disse Hector, com uma frieza aterradora. - A verdade... é que não sou obrigado a lhe dar satisfações. Como surgi aqui... Como soube que a última operação ocorreria aqui... - olhou para as mãos por alguns segundos. - Como obtive este poder... - balançou a cabeça em negação para Abamanu. - Nenhuma resposta importa.

- E designou-se exatamente para quê? - perguntou Abamanu, olhando-o com deboche falso. - O que pretende fazer à mim usufruindo destes... resquícios insignificantes?

- Eu posso testar agora mesmo. Não tenho muito tempo. - afirmou Hector, aproximando-se de seu algoz de modo corajosamente desafiador.

- Ah, você tem sim. Eu o oferecerei à você, com todo o prazer. - disse Abamanu. - Sem arrependimentos.

- Suas últimas palavras? - perguntou o caçador, a expressão sisuda inalterável.

O deus lunar fitara-o com um interesse que beirava à uma obsessão recém-alimentada.

- Percebe meu estado deplorável, caçador. - disse ele, referindo às feridas grotescas em seu pescoço e parte do rosto em decorrência da insustentabilidade do corpo de Mollock, tornando-o nada mais e nada menos que uma casca improvisada e temporária. - O que acha de abortar sua missão para tratarmos de negócios?

- Não vim negociar nada. - disse Hector, categórico. - Primeiro vou pulverizar você... e depois transportar a carcaça de Mollock e decidir o que fazer a seguir.

- Só há uma decisão! - disse Abamanu, empolgando-se com a vantagem que visualizara. Fizera de tudo para tentar manter Hector atento ao seu discurso. - Sobre Mollock... e, acima de tudo, sobre nós dois. Na verdade... Nunca foi a meu respeito. Mas sim ele! Você o quer mais do que tudo... mas precisa de mim.

O caçador parara de andar em direção ao deus lunar e o encarou com uma hesitação intensa. Seus olhos, devido à tamanha fúria, brilharam uma luz azulada em questão de milésimos.

- Isso vai depender. - disse ele, olhando-o com seriedade e receio. - O que você propõe?

Ao escutar a pergunta, Abamanu deixou um macabro sorriso formar-se em sua face lupina.

                                                                                    ***

As mãos de Êmina agarraram firmemente o braço direito de Rosie, em um impedimento tão súbito quanto nervoso, sua voz soando abafada devido aos barulhentos desabamentos de partes do teto causados pela saraivada de tiros de canhão provindos dos tanques militares.

- Rosie, melhor você vir conosco! - pedia Êmina, desesperando-se. - Como tem tanta certeza de que é ele?

- Eu sei o que vi, Êmina! Por favor, me larga, eu realmente... sinto que preciso alcança-lo! - disse a jovem, a expressão aflita ao olhar para sua amiga, seu branco rosto sujo pela poeira do concreto.

A alquimista balançara a cabeça negativamente, não entendendo como Rosie poderia ter se deixado levar por um mero vislumbre que passaria despercebido por qualquer um.

O soldado responsável por conduzir a resgatada diretamente ao acampamento olhava para todos os lados, armado com sua metralhadora, o nervosismo acometendo-o mediante à intensidade que o desabamento adquiriria em poucos minutos à medida que os tiros e explosivos fossem ficassem mais violentos e perigosos. Voltou-se para as duas, exasperando-se.

- Não temos mais tempo! - gritou ele fortemente.Tocou no braço direito de Êmina, intencionando puxa-la para leva-la dali o mais depressa possível, embora também estivesse preocupado com a segurança de Rosie. - Toda essa área vai vir abaixo em menos de 10 minutos! Deveríamos já estar do lado de fora! - olhou para Rosie, a face desesperada. - Senhorita Campbell, ouça-a! Não faz nenhum sentido seguir adiante por conta de uma simples visão de relance!

- Eu o vi, eu tenho certeza! - disse Rosie, desvencilhando-se do agarro de Êmina.

- Rosie, não... - disse a caçadora, os olhos marejando-se.

Uma enorme parte do concreto vinda do teto caíra com um imenso baque no chão, quase atingindo Rosie que protegera-se com sua capa vermelha, destroçando-se brutalmente, fazendo erguer-se uma poeira cinzenta e densa. Êmina dera um rápido grito devido ao susto, depois voltando-se para Rosie, cada vez mais motivada em convence-la a desistir daquela loucura.

- Olha, por tudo o que é mais sagrado, Rosie... pela amizade que construímos... por favor, por mim!

Rosie fechara os olhos apertadamente, deixando jorrar algumas lágrimas, trincando os dentes, sentindo aquela força de atração se fortalecer dentro de seu âmago.

- Me perdoe. - disse ela, desalentada. - Mas... não posso. - olhou para Êmina. - Isso não é um adeus. Lembre-se disso. - por fim, dera as costas à caçadora e ao soldado, correndo freneticamente e desviando dos pedaços de concreto que caíam rapidamente, sendo ocultada segundos depois pela poeira.

- Não!!! - exclamou Êmina, ajoelhando-se e chorando. - Rosie...

- Nós temos que ir... - disse o soldado, ajudando-a a se levantar. - Vamos! Eu também sinto muito pela decisão dela, mas acontece que nosso tempo está praticamente esgotado! - olhou para o semblante choroso da caçadora, tocando seu rosto com as duas mãos. - Eu realmente sinto muito! Infelizmente, precisamos nos conformar, as possibilidades de ela escapar viva nos próximos minutos é nula! - afirmou, a fala veloz.

Êmina apertou os olhos, derramando mais lágrimas. A perda já era sentida por ambos.

- Vamos... - disse o soldado, levantando-a e correndo junto à ela, escapando do desabamento de vários pedaços que caíram no exato ponto onde estiveram, ambos desaparecendo em meio à poeira altamente concentrada no local.

                                                                                            ***

Rosie mal conseguiria contar quantos blocos de concreto caíram tão próximos à ela enquanto correra desenfreadamente pelo labirinto, avançando contra uma poeira que seria prejudicial aos seus pulmões. Mal pensava em sua própria voz, devido aos estrondosos barulhos de desabamentos e explosões. Em compensação, o capuz ajudava a se proteger do pó cinza que caía constantemente, embora a tosse provocada pelo mesmo sendo inevitável.

Parou em uma área, aparente e temporariamente livre de ser afetada, para tatear seu cinto de utilidades onde estavam suas adagas, o amuleto... e um detector de atividade extraordinária, o qual podia jurar que encontrava-se seguro e difícil de ser roubado.

- Não pode ser... - disse ela, olhando para o cinto, passando as mãos e, infelizmente, não achando o que procurava. - Mas que... - olhou ao redor, recuando alguns passos e pondo as duas mãos na cabeça, basicamente sinalizando uma rendição em sua busca falível por Hector.

- Senhorita Campbell!? - disparou um soldado que viera de outro corredor, espantando-se com a presença de Rosie ainda naquela fábrica em pleno processo de destruição. - O que ainda faz aqui? Está perdida? - perguntou, abanando sua mão esquerda para dissipar a poeira.

- Eu... - gaguejou Rosie, sem saber como explicar. - Ahn... Sim! - mentiu, como única saída. - Onde estávamos o desabamento começou a ficar intenso e acabei me perdendo! Não sei o que...

Antes que pudesse completar a frase, Rosie mudara o semblante forçado de sinceridade para um real de horror ao testemunhar o soldado tendo seu coração saído para fora de repente. Recuou alguns passos, logo dando-se conta do responsável.

O corpo trêmulo e agonizante do soldado caíra devagar no chão, o sangue golfando em profusão do buraco aberto no peito. Rosie acompanhou-o com um olhar tenso.

A ensanguentada mão que segurava o órgão vital amaciava-o com certo orgulho.

- Não está sentindo o mesmo que eu? - perguntou Mihos, em seguida desviando os olhos para Rosie. - Essa... energia? É estranho, não acha? É como se estivesse incompleta. - fez uma pausa, andando calmamente pela área, enquanto a parede rachava-se. - Meus instintos dizem estar vindo de um mortal, pois posso detectar uma alta carga emocional de sua alma se fundindo á energia. E não está muito longe...

- O que está fazendo aqui? - perguntou Rosie, rigorosa no tom, ouvindo ruídos da parede atrás de si rachando-se.

- A pergunta correta não seria"Sabe onde ele está?"? - retrucou Mihos, voltando-se para ela. Claramente fizera referência ao fato de Hector estar como um intruso na fábrica e emanando uma poderosa quantidade de energia divina.

- Não precisava ter feito isso. - disse ela, lamentando a morte do soldado, olhando para o corpo.

- Não oficializamos acordo nenhum, só para refrescar sua memória. - disse ele, olhando para o coração que segurava. - Minhas sede e fome continuam válidas. - sorrira de modo sacana. - Mudando de assunto... - olhou para o lugar prestes a desabar. - Acho que devia ter escapado enquanto teve a chance.

Extremamente revoltada, Rosie logo sacou uma lâmina dourada, a única que trouxera e oferecida por Áker um dia antes da operação. Já não sabia se sua respiração pesada devia-se ao imenso acúmulo de poeira no ar que maltratava suas narinas ou era parte dos efeitos da tamanha raiva que sentia de Mihos naquele instante.

O deus fitara a pequena espada, desdenhoso.

- Oh... Não é necessário irmos tão rápido. - dissera ele, infamemente piadista.

- Se está apenas se divertindo matando pessoas, se está em cima do muro ou, às escondidas, sendo um maldito cúmplice de sua mãe, não me importo! - bradou Rosie, a expressão furiosa, mantendo a lâmina em riste e dando passos altamente vagarosos à frente. - Como estou sem saída, só existe uma coisa que se tornou minha única missão: Acabar com você! Ou morrer tentando!

                                                                                                    ***

Em paralelo, na área florestal, o confronto entre servil e superior alcançava níveis violentamente extremos. As chances não conspiravam a favor de Áker. Sekhmet andava em sua direção, ainda disparando suas rajadas ópticas, àquela altura já o subjugando e fazendo bom proveito de uma vantagem palatável e natural.

O arauto via-se praticamente ajoelhado, apoiando-se com sua mão esquerda tocando no solo e defendendo-se do ataque com a direita. "Isto é por Rosie... e por mais ninguém!", pensou ele, não demorando a compreender que tal embate prejudicaria os planos de ambos, logo tentando se esforçar para convence-la a parar ou morreria ali mesmo em vão.

- Não quero desperdiçar toda a minha energia com você, serviçal! - disse Sekhmet, equilibrando o nível de sua rajada, já sabendo que manteria-se por cima, algo que ela apreciava mais do que tudo. - Provou-se ineficaz ao bater de frente contra mim, deve estar arrependido. Ou pior: humilhado! Desrespeito a um superior é um crime grave e isento de perdão! Agora diga-me... O que pretende fazer nesta condição? - perguntou, logo fazendo uma rápida pausa, torturando-o ainda mais. - Ah, sim! É óbvio! É incapaz de falar! Só mesmo assim para fazê-lo se curvar diante de meu poder e coloca-lo no seu devido lugar!

A deusa concentrava toda a sua atenção no sofrimento de Áker. O que consequentemente a fez ser vítima de um golpe bem pensado. Um golpe vindo dos céus. Nuvens cinzentas e tempestuosas formavam-se.

Antes que ordenasse o arauto a se render e confessar sua total e absoluta submissão, a deusa fora impactantemente atingida por uma descarga elétrica atmosférica. O plano era simples: Induzir uma situação que parasse a rajada óptica, fazendo-a piscar os olhos, devendo ser algo provindo de cima, ainda que não a detivesse por completo.

Áker, com o impacto do raio sobre o solo, rolara feito uma bola até parar próximo à uma árvore. A mão direita de seu receptáculo estava enegrecida como carvão e fumaçando bastante.

O controle climático do arauto foi vulnerável à deusa... pelo menos em parte. Sekhmet movia-se com dificuldade, apenas alguns dedos e o pescoço. O corpo de Betsy Rossman exalava uma fumaça cinzenta e exibia queimaduras de primeiro grau. Logo a consorte de Yuga desviou seu olhar enfurecido à Áker - que se levantava ao passo em que sua mão direita reconstituía-se.

- Desgraçado!!! - vociferou ela, o rosto horrendamente queimado, em tons de vermelho, amarelo e cinza.

Áker sacara sua adaga dourada, tirada debaixo da manga esquerda do terno preto, andando em direção à deusa com fervorosidade na expressão.

- Eu poderia mata-la agora mesmo... - disse ele, observando-a dos pés à cabeça.

- Ora, não brinque comigo! - disse ela, ríspida, logo dando uma risada zombeteira. - Um golpe sujo e desonesto.

- Em legítima defesa. - retrucou ele, o tom frio.

- Que se dane! - disparou ela, raivosa. - Esta sua afeição por aquela mortal insignificante... irá custar sua própria vida. Além do mais... - relanceou a lâmina dourada portada pelo mensageiro, dando um leve e cínico sorriso. - ... uma arma tão convencional dessas é incapaz de me ferir. Vamos lá... tente.

Áker olhou de esguelha para sua esquerda, a direção onde a fábrica se situava.

- Oh, veja... - disse a deusa, movendo tremulamente o seu braço direito e os dedos da mãos, intencionando agarra-lo mais uma vez. - Meus movimentos estão retornando... A escolha é sua: Ou foge... - conseguiu inclinar-se de leve para falar mais proximamente. - ... ou morre!

Suspirando pesadamente, Áker decidira. Em um ato impulsivo, ele lançara sua lâmina contra uma árvore. A ponta da arma cravou-se com profundidamente no tronco. O arauto seguira na direção, caminhando com tranquilidade ao contar com a possibilidade de Sekhmet reaver os movimentos e reconstituir a pele do receptáculo em questão de meia hora, tempo suficiente para entrar na fábrica, procurar por Rosie e salva-la da iminente explosão.

Contudo, algo desalentador pôs suas esperanças a perder. A deusa, enquanto seu subordinado resolveu caminhar, conseguira juntar os dedos polegar, indicador e maior de sua mão direita e estala-los... o que significava algo aterrorizante que Áker não previra devido à luta.

De repente, um círculo com um trapézio invertido e um triângulo iluminou-se sob os pés de Áker, que paralisou no mesmo instante. Olhando para o sigilo inibidor, Áker sentiu um misto de impotência e, sobretudo, culpa. Seguido disso, escutara uma gargalhada infame por parte de Sekhmet, que comemorava sua virada inesperada contra o arauto.

                                                                                            ***

Um dilema excruciante deixara os nervos de Hector em total ebulição.

Abamanu aproximava-se de maneira forçadamente amistosa em direção ao caçador que estava em poder da pedra Ônix dentro de si.

- Eu deveria agradece-lo por ter matado Michael naquela noite nas Ruínas Cinzas? - perguntou Hector, ainda resistente.

- Eliminei um estorvo para meu favorito. Talvez, no mínimo, eu mereça sua gratidão. - disse Abamanu, não tirando os olhos de Hector nem por um segundo. - Lhe fiz um favor. Nosso vínculo é mais profundo do que sua pobre compreensão pode definir.

- Não sinto remorso por Michael. - declarou Hector, pensativo. Voltou os olhos frios para o deus lunar. - Em outras palavras, acho que ele... até teve o que mereceu. Mas não confunda com gratidão. Depois de suas investidas, mata-lo foi a primeira coisa que pensei caso você o poupasse, e, claro, poupasse a mim e meus amigos também. - fez uma pausa, olhando ao redor após sentir um pequeno tremor. - Dividir para conquistar...

- E então? O que me diz? - perguntou Abamanu, olhando-o com expectativa. - Quando nos unirmos, Mollock estará totalmente entregue á você, além de vulnerável. Darei-lhe a liberdade de mata-lo com suas próprias mãos...

- Apenas isso não basta. - disparou o caçador, fitando-o com desconfiança. Deu uma olhadela discreta no relógio de pulso. - Deve me garantir, honestamente, que vai manter Rosie longe de sua mira, longe dos seus planos maquiavélicos. Nenhum dos meus amigos deve sofrer mais do que já foram obrigados a suportar quando os manteve prisioneiros. Para uma vingança eficiente e dolorosa... é necessário uma sacrifício. - andou dois passos em direção ao deus, meio cabisbaixo e parecendo sinalizar alguma concordância diante do nefasto acordo. Ergueu de leve a cabeça, encarando Abamanu com uma expressão indicativa de determinação pura e genuína. - Mantenha-me no controle. Quando chegar a hora.

- E em seguida? - perguntou Abamanu, sorrindo macabramente.

- Irei descansar. - disse Hector, deixando uma gélida lágrima descer pelo seu rosto. - Eternamente.

                                                                                             ***

Enquanto Áker tornara-se vítima de uma reviravolta, ficando incapacitado em seguir com a mesma direção de seu plano, e Hector se entregava de corpo e alma à proposta ofertada por Abamanu... Rosie e Mihos pareciam se encontrar no limiar de um confronto que, em decorrência das circunstâncias, demonstrava ser pouco provável.

- Acha que tenho medo desse alfinete? - perguntou Mihos, olhando com deboche para a lâmina dourada portada por Rosie.

- Não estou para brincadeiras! - ditou Rosie, posicionando-se para atacar ou se defender caso o herdeiro de Yuga investisse imprevisivelmente. - Teve sorte da primeira vez. Era só uma adaga comum. Duvido que consiga infligir o mesmo golpe com essa.

- Vamos lá, Rosie... Está ficando ridículo. - disse Mihos, exibindo tédio na face ao andar dois passos à frente. - Não precisa ser assim. Nós dois sabemos disso. Você, melhor do que eu, deveria muito mais. - fez uma pausa, aparentando subestimar o teor de ameaça da jovem. - Não tem a menor graça continuarmos com isso se as chances de acontecer são... escassas.

- Do que está falando? - perguntou Rosie, parecendo não estar muito atenta às palavras do deus.

-  Não é óbvio? - perguntou ele, olhando para a área ao redor rachar-se gradualmente. - Posso imaginar como se sente ao ver que perdeu a oportunidade de escapar com vida. A questão é: Está disposta a pagar o preço por essa escolha? De minha parte, julgaria como um erro.

Rosie manteve-se irredutível, passando a ignorar os estalidos provocados pelo concreto rachando-se.

- Não me importo. - disse ela, sem medo, o tom frio. - Você ter vindo até aqui... me fez lembrar que eu tinha um objetivo que não havia considerado antes. É tão sádico e cruel quanto a sua mãe...

- Sim, isso é a mais pura verdade, - disse Mihos, sério ao cortar a frase da jovem. - Mas o que está querendo provar? O que a convence de que pode me matar com tanta facilidade? Não quero pressiona-la, mas... Posso garantir à você que meu pai não é alguém disposto o bastante a manter a palavra. Se as coisas mudam... os planos também vão mudar.

- Pouco me interessa... - disse Rosie, enfurecida, sem intenção de largar a lâmina dourada - ... os ideias do seu pai... ou a sua tentativa de me atrasar...

- Atrasa-la?! - soltou Mihos, franzindo o cenho, tornando a andar vagarosamente em direção à ela. - O lugar inteiro logo mais vai virar um amontoado de escombros. Nos encontramos por acaso. Além do mais, sua raiva por mim é desnecessária. - ganhou proximidade suficiente para acalma-la. - Então, agora, não deve temer minhas ações. Eu só não posso contrariar minha natureza. Nem ceder ao pedido de um mortal. Não porque eu não queira... Mas porque fui designado, desde o início, a agir conforme as regras ditam. De acordo com o que natureza me instiga a fazer. E se eu tiver que inibir meu desejo... não será pelo pedido de um mortal pacifista... será por redenção. - declarou ele, tocando com delicadeza na mão direita de Rosie, fazendo-a calmamente baixar a lâmina.

Rosie, por outro lado, balançara a cabeça em negação ao mesmo tempo em que derramava uma lágrima.

- Foi por confiar demais que eu me coloquei em situações perigosas. Não sei... não sei se devo me permitir a agir assim com um ser acima de mim... - disse ela, indecisa.

- Agora pode. - disse Mihos, olhando-a com menos fervorosidade. - Já tomei minha decisão. Só acho uma pena... as coisas terminarem dessa forma. - afirmou, logo em seguida, de modo inesperado, pondo dois dedos de sua mão direita na testa de Rosie, fazendo-a, em poucos segundos, perder a consciência e cair no piso de concreto desgastado. A lâmina dourada tilintou ao também cair no mesmo instante.

Ao virar as costas para a jovem desacordada, Mihos olhou para cima, respirando fundo.

- Obrigado, Rosie Campbell. Eis o seu castigo por arruinar minha temporada de férias neste mundo. - disse ele, estranhamente aparentando mais estar grato ao invés de frustrado. - Foi até divertido. - falou, dando de ombros e, em seguida, emanando uma luz amarelada que parecia sair de sua boca aberta e de seus olhos.

A refulgente luminosidade preenchera o local, ofuscando Rosie caída sobre o chão, seguida de um som extremamente agudo.

Mihos fizera a escolha que julgou mais segura para sua situação àquela altura, prevendo consequências que o afetariam diretamente. Restou-lhe antecipa-las, como única alternativa menos arriscada. Lidar com Yuga ao ser detido por Áker certamente lhe causaria mais reveses que prolongariam sua abstinência auto-imposta - algo que estava fora do seguimento teórico do plano. Não por negação à sua essência puramente assassina e carnal, mas sim por expiação.

Decerto haviam penitências não-cumpridas.

O corpo do caçador que servira de receptáculo ao herdeiro do império caíra duro feito uma rocha, ao lado do corpo de Rosie, ao passo em que a intensa luz desfizera-se rapidamente em segundos.

A partir daquele momento, escombros maiores do teto começavam a ceder mais rápido, alguns chegando a quase atingir ambos.

Faltavam, precisamente, 5 minutos para a detonação dos explosivos implantados por toda a fábrica.

                                                                                            ***

As derradeiras energias de Áker esvaíam-se a cada soco desferido contra o rosto de seu receptáculo, pelo qual brotavam feridas sangrentas e inchaços graves.

Sekhmet infligia dor contra seu subordinado dando vários e consecutivos cruzados de esquerda e direita, usufruindo com um altivo proveito da vantagem proporcionada pela armadilha previamente colocada, tomando certo cuidado para que tamanha empolgação em torturar o arauto não a fizesse tocar seus pés acidentalmente no círculo luminoso.

- Não faz ideia do quanto estou saboreando esse momento, do quanto eu esperei para que se concretizasse. - disse a deusa, cessando a sequência de murros e agarrando a gola do terno preto que a casca do arauto vestia. Áker mal exprimia um balbucio tamanha era a gravidade das feridas inchadas e sangrando. - Eu prometi à você... que sentiria a pior dor em toda a sua existência patética, o suficiente para se lembrar dela toda vez que ouvir meu nome ou estar diante de mim. - fez uma pausa, dançando seus dedos da mão esquerda pelas feridas no rosto do subjugado. - O que o auto-proclamado protetor de Rosie Campbell fará agora? Além de se render?

Áker gemia, mantendo apenas um olho aberto e parecendo trincar os dentes em fúria pela humilhação sofrida.

- Vamos... fale. - disse ela, sorrindo com cinismo. - Diga-me suas últimas palavras, serviçal.

- É... - dizia o arauto, com séria dificuldade. - É ousada... o bastante... para me deixar morrer... aqui... sem nem mesmo ser... - tossira fortemente gotículas de sangue. - ... ser denunciada... por meus seguidores? Escapar impune... Nunca!

A deusa empertigara-se e socara-o novamente com a mão direita. Sem muitas forças para resistir mais do que exigia de si mesmo, Áker deixou o impulso do golpe virar seu rosto para o lado como se não lhe restasse mais nenhuma forma de responder com menos fraqueza.

- Desrespeito ao superior é passível de punição. - argumentou a deusa, aborrecida.

- Eu apenas... - Áker esforçava-se para falar - ... sou designado... a acatar as ordens somente de meu soberano. Aquele que me confiou... sua lealdade eterna. Temos um vínculo recíproco. O qual você... jamais... - trincara os dentes novamente - ... jamais irá desfrutar com vivacidade.

Sekhmet permaneceu bufando em cólera por vários segundos, pensando em fulminar aquele receptáculo com sua rajada óptica. Teve de admitir que o ataque-surpresa do arauto suprimiu boa parte de sua resistência física, embora todas as camadas teciduais fossem reconstituídas.

- Chega. - decretou ela, com frieza no tom. - No fim das contas, mata-lo realmente me causaria problemas. De fato, havia me esquecido da sua corja de insurgentes. De qualquer forma, não serão obstáculos problemáticos caso resolvam seguir com medidas suicidas. Uma delas é seguir meus passos. - dera uma última olhada desdenhosa para Áker e, em seguida, andara adiante, passando por ele. - Repasse este aviso à eles. - erguera a mão direita, estalando os dedos enquanto andava tranquilamente. O sigilo desaparecera no mesmo instante, fazendo o arauto cair exausto no chão. - Você não vale nem o esforço. - dissera, passando a andar com mais rapidez pela floresta.

Enquanto isso, Áker, tomando as devidas medidas preventivas, tirara de um bolso do smoking, mesmo estando combalido e machucado, um amuleto para se comunicar com algum dos seus aliados. O pusera na palma da mão esquerda, esforçando-se ao máximo para proferir a urgente mensagem.

Como sinal, o objeto, felizmente, brilhara, embora a visão turva de Áker não percebesse.

- Não sei... se estão me ouvindo... mas preciso que pelo menos três de vocês venham... Eu fracassei, não chegarei a tempo. Então... desejo sorte à todos vocês. Sekhmet não pode ser impedida, por ora. - a inconsciência repentina o acometera, fazendo-o largar o amuleto, sem saber se o aviso foi ou não transmitido.

                                                                                     ***

Um vulto caminhava sorrateiramente dentre as folhagens e galhos, em uma calculada observância à um alvo determinado... que parara inesperadamente de andar, permanecendo de costas e em silêncio por vários segundos.

Por fim, a "sombra" manifestou-se, sem conseguir esperar mais tempo, saindo de sua moita ao se revelar para o inimigo visualizado.

- Hector Crannon. - disse um homem com uma voz macabra, vestindo um macacão de couro preto e usando uma espécie de capacete de mesma cor com dois olhos vermelhos. - Fique exatamente onde está, se ainda quiser permanecer vivo nos próximos 5 minutos. - salientou, ameaçadoramente. - Estou aqui para arrancar de você o que roubou daquelas pessoas que, para você, não passavam de mais uma refeição qualquer do dia.

Alguns segundos depois, o caçador, mantendo-se de costas, tivera uma leve crise de risos com teor infame. Vislumbrando os ombros de seu inimigo tremerem e perceber ares de riso, o tal assassino fez surgir duas lâminas médias, pontiagudas e resistente de seus braceletes cinzas.

- Vire-se. - ordenou com severidade. - E verei se ainda vai manter o sorriso que está escondendo.

- Vocês, mortais, são incríveis. - disse ele, rindo mais uma vez em seguida. - Sei quem você é. As memórias de Hector não deixam mentir. Obviamente, me seguiu até aqui para buscar a sua... - franziu o cenho, mantendo o cínico sorriso. -... tão sonhada vingança.

- Eu disse... para se virar! - insistiu o assassino, dando um passo à frente, as lâminas brilhando rapidamente graças ao forte sol da manhã.

- Eu compreendo, Edgar, sua raiva, seu rancor, a sua dor... - disse Abamanu, notando que o algoz do caçador ia se aproximando. - Pelo menos é o que Hector está me permitindo dizer. Eu, particularmente, pouco me importo.

- Você ficou insano? - indagou Edgar, entortando a cabeça de leve. - O que está tentando provar falando na terceira pessoa, seu idiota?

- Não tolero petulâncias, ainda mais vindas de um reles disfarce de carne. - apontou Abamanu, sentindo-se desconfortável com a rispidez. Olhou-o por cima do ombro. - Mas Hector está me pedindo para ser misericordioso com você mesmo tendo em vista a ameaça que você representa.

Edgar balançava a cabeça em negação, parecendo confuso.

- Mas... O que está havendo aqui? Não entendo...

- É claro que não. - disse o deus lunar, olhando-o com frieza. Dera um sorriso sacana. - Hector se foi.

- O.. o quê!? - indagou Edgar, recuando lentamente. - Não vejo, não sinto medo algum na sua face... O que fez... O que fez com Hector? Certamente... você não é ele! O que você é? Um fantasma possessor? Um demônio?

- Não acha que deveria ter estranhado eu ter dito seu nome assim que você declarou sua ordem? - perguntou Abamanu.

- Não importa! - bradou Edgar.

- Sei o que se tornou, Edgar. Hector sofre igualmente desse mal. - disse o deus, permanecendo a olha-lo daquela forma. - E, além disso, tenho plena certeza que seus atos são justificáveis. Honestamente, é uma pena.

- O que é uma pena? - perguntou ele, o tom mais ameno.

- Seria um desperdício. - disse Abamanu, voltando-se a olhar para as árvores com uma visão entediada. - Por um momento, imaginei você dentro do meu vasto panteão de subordinados.

- Do que se trata? - perguntou Edgar, fazendo as espadas recolherem-se nos braceletes. - Mas você ainda nem me disse seu nome. Se se apoderou do corpo de Hector, significa que é um inimigo.

- Muito pelo contrário. - disparou o deus, querendo rir novamente. - Somos almas gêmeas.

Edgar retraíra-se por um momento, refletindo sobre aquela declaração.

- Não pode ser... Então, nada feito. - decidiu Edgar. - É inútil querer me forçar a trabalhar com alguém que se diz a favor do meu inimigo! Mas olhando mais a fundo, você me tirou uma oportunidade única! Você pode ir se ferrar!

- Você primeiro. - disse Abamanu, logo erguendo a mão direita e estalando os dedos, efetuando a morte de Edgar cujo corpo explodira em vários pedaços instantaneamente. Sorrira, fechando os olhos e se deliciando por finalmente estar em um receptáculo apropriado. Retomara a caminhada, deixando o amontoado de sangue esparramado e carne partida para trás.

                                                                                      ***

Sekhmet tivera sua andança pela floresta interrompida ao ouvir um estrondo abafado. Parara para detectar a origem do som, mantendo os belos olhos azuis de Betsy Rossman bem abertos.

Por fim, ao conseguir rastrear os barulhos, correra em alta super-velocidade, desviando de árvores e galhos, aumentando o ritmo à medida que os estrondosos sons ficava mais próximo.

Quando a deusa, enfim, freara bruscamente em um ponto relativamente alto da floresta, sua face transformou-se de ansiedade para estupefação máxima. E deste estado... alterou-se para alegria pura.

Um sorriso foi sendo esboçado quando seus olhos penetravam concentradamente naquelas opulentas nuvens flamejantes que se elevavam de alguns pontos da grande estrutura.

Um sorriso que denotava o mais genuíno sentimento de vitória.

                                                                                         ***

Durante a recuperação de Alexia - que anteriormente queixava-se dos incômodos dentro do corpo por conta das falhas que a troca de corpos gerou no plano -, Eleonor estava solitária na salinha que servia como uma espécie de "porão", andando de um lado para o outro vagarosamente.

Fazia vários minutos que sua aprendiz estava dentro do banheiro e não voltara.

"O que ela tanto está fazendo lá? Já devia ter saído. À essa altura, as dores já teriam amenizado, pois a troca foi desfeita há exatos trinta minutos.", pensou ela, andando até a porta, girando a maçaneta e abrindo-a.

Pensara em Hector enquanto subia a escada.

"Trinta minutos... O mínimo que se podia esperar era o retorno de Hector, seja trazendo Mollock sedado ou simplesmente voltando de mãos vazias. Só quis reaproxima-lo de Rosie... para que ficasse certificado de que o controle absoluto da licantropia fosse alcançado.".

- Alexia? - chamou a bruxa, andando com pressa até a sala de estar, após ter verificado na cozinha e no banheiro. - Onde você está? - olhou atentamente para cada ponto, seus olhos esquadrinhando o recinto. - Se estiver chorando no quarto, vou precisar que interrompa suas lamentações e venha até aqui, por favor. - esperou alguma resposta provinda do quarto da jovem vidente. A bruxa cruzou os braços. - Só não invado o seu quarto porque você me proibiu. - esperara um pouco mais, olhando para o corredor semi-escuro à sua esquerda. - Alexia? Está aí?

De repente, uma voz monstruosa reverberara pela sala.

- A profetisa encontra-se em nosso total poder. - disse um soldado quimérico de Abamanu postado ao lado da luminária de piso.

Eleonor, assustada, virara-se, estupefata com o que aquela presença. Estendeu sua mão direita rapidamente, os dedos em mano cornuto.

- Spectro le bestia... 

O soldado apontara sua lança, a ponta do cristal vermelho ameaçando disparar um raio desintegrador.

- Mais uma palavra e seu breve encontro com o Lorde será anulado. - disse o soldado, firme.

- Onde ela está? Para onde a levaram? - perguntou Eleonor, abismando-se com o rapto da vidente.

                                                                                    ***

Prefeitura de Londres

Um funcionário - um homem aparentando ter uns 30 e poucos anos, meio calvo, rosto fino e usando óculos de alto grau - caminhava desajeitadamente por um corredor com paredes de madeira polida em direção ao gabinete do prefeito emanando uma urgência pelo seu semblante embargado de aturdição.

Trazia uma pequena pasta com alguns papéis a serem arquivados, mas tal conteúdo passava longe de ser o assunto abordado na sala. Olhou rápida e tremulamente para trás, ajeitando o óculos e, claro desconforto e ansiedade, parecendo desejar correr e se trancar lá até que o alarido desesperador - tanto no interior do prédio quanto do lado de fora - cessasse por definitivo - algo que não aconteceria tão cedo se dependesse da polícia despreparada a lidar com tal ameaça.

Olhou apressadamente para o relógio de pulso, depois voltando-se para a porta do gabinete que estava próxima. Em sua grande testa viam-se pingos de suor brotando em abundância.

- Eu não quero morrer... não quero morrer... não quero morrer... - repetia para si mesmo em tom baixo. Ao se aproximar do gabinete, seus passos ficaram mais retraídos e sua desenvoltura um tanto travada e hesitante.

A quietude do recinto só o apavorava cada vez mais, motivando-o a suspeitar da ausência de seu chefe e fazendo-o pensar no pior.

Empurrou de leve a porta... que estava destrancada. O que era raro em se tratando daquele prefeito.

- Se... senhor? - indagou ele, gaguejando, enquanto abria a porta. Entrara na sala, cauteloso. - Que coisa estranha... - sussurrou para si mesmo ao olhar para a sala silenciosa. - O mundo está acabando lá fora e o senhor resolve sumir assim de uma hora para outra. Se estiver aí... escondido... - olhou para o armário à direita. - ... saiba que venho lhe informar a respeito da ineficácia da vacina. - apertara os olhos, chorando. - Me sinto traído pelos meus próprios colegas. Por favor, senhor, saia daí, posso sentir sua presença. Eu... também estou com medo, não quero morrer sozinho.

De repente, o funcionário escutara algo caindo sobre o piso, atrás de si, com um som que lembrava algo pegajoso. Ao se virar rapidamente, deparou-se com uma figura humanoide e bizarra, completamente coberta de preto... como uma sombra surgida do nada. Tremendo de pavor, ele largara a pasta, recuando alguns passos.

- Aaahh... Não pode ser! Você não, você não! - dizia ele, querendo gritar por socorro, mas retraindo-se.

A criatura sombria mal dera dois passos e já se encontrava à poucos centímetros de seu corpo, logo tocando seu rosto com as mãos. O homem queria debater-se, mas nem forças para isso tinha, apenas limitou-se a gemer de modo agoniante, ao passo em que sua pele empalidecia e as veias de sua face enegreciam, tal como seus olhos, devido ao toque mortal do mimético.

Do lado de fora, o que podia ser observado pela única janela do gabinete, ocorria um terrível surto epidêmico de pessoas com olhos pretos atacando outras violentamente - seja mordendo, quebrando pescoços, atirando com armas de fogo ou desferindo golpes -, algumas até sendo baleadas por tiros disparados pela polícia - a maioria deles mantendo distância ao ficarem perto de suas viaturas -, dando origem ao pânico generalizado, à correria e à gritaria incontroláveis.

                                                                                      ***

Eleonor sentia o chão cedendo sob seus pés ao ouvir aquelas tristes notícias. Lívida, ajoelhou-se, olhando para o nada com uma expressão de abalo emocional intenso. Arrependeu-se de ter feito aquele pedido em vez de ser teleportada pelo soldado quimérico até o local onde Alexia passaria a estar confinada até uma decisão ser julgada.

- Não... - disse a bruxa, balançando a cabeça, enquanto uma lágrima escorria pelo seu rosto. - Isso é mentira. Rosie não pode estar morta...

- Eu vou repetir caso não tenha captado a mensagem. - disse o soldado, o tom frio na voz. - Rosie Campbell não conseguiu escapar da fábrica e foi morta na explosão dela. Seu corpo, obviamente, foi reduzido à cinzas.

- Não! - disse Eleonor, com fervor e angústia no tom.

- Você quis estar informada, apenas cumpri meu dever. - retrucou o quimérico.

- É claro que sim, é claro que cumpriu. - disse a bruxa, enraivecida. - A pessoa mais importante pra mim está morta! A minha neta!  - esbravejou, derramando mais lágrimas

- E quanto ao caçador e a profetisa? Não são dignos de serem lembrados?

- Fala como se também estivessem mortos...

- A profetisa é útil para o decorrer dos próximos planos. - afirmou o soldado, olhando para a bruxa com seriedade. - O caçador, por outro lado...

Um baque atingira o coração de Eleonor como uma bola de demolição colidindo a um prédio.

- Não me diga que... - sua fala tornou-se mais chorosa ao perceber o significado. Balançou a cabeça em negação com mais rapidez, o desespero crescendo em sua face. - Não, não, não pode ser! - batera sua mão esquerda no chão duas vezes, baixando a cabeça ao colocar-se em prantos por finalmente saber o péssimo destino que o caçador abraçara. - Não pode ser verdade. - disse ela, aos soluços.

- Você tem uma escolha a fazer, mortal. - disse o quimérico em tom arrogante, sentindo-se superior ao ver o estado deprimido da bruxa. - Me seguir para dar seu último adeus à profetisa... ou abandonar esta casa e jamais pensar em cruzar nossos caminhos novamente.

Lentamente, Eleonor erguia a cabeça para fita-lo com todo o seu ódio. Seus olhos estavam vermelhos devido ao choro.

- Vá embora. - disse, sucinta. - E diga para aquele deus de araque que a batalha está apenas começando.

- É uma ameaça? - perguntou o quimérico, soando rude.

- Uma promessa. - disse Eleonor, convicta, arqueando as sobrancelhas. - Rosie... tinha amigos determinados a fazerem qualquer coisa em prol da humanidade. Sei que Abamanu não chegará ao ponto de mata-los, pois vai adorar vê-los tentar quantas vezes forem necessárias. Posso ter perdido, no mesmo dia, as três pessoas que mais me importavam... Mas não perdi a esperança. É só o que me resta. Vou lutar se for preciso. E sobreviver a este inferno na Terra como a guerreira que a vida me ensinou a ser.

As palavras da bruxa pouco o impressionaram. Eleonor voltara para seu choro copioso, esperando não ver mais aquele lobo bípede branco com armadura e lança na sua frente quando ficasse de pé.

O soldado quimérico desaparecera em milissegundos.

                                                                                          ***

Ao anoitecer, um homem careca, aparentando estar em seus plenos 40, vestindo um macacão cinza de metalúrgico - meio encharcado de gosma preta -, perambulava tropegadamente por uma calçada de uma rua curta e meio íngreme em uma pacata área residencial próxima do centro de Londres.

Seus lábios - tão pálidos quanto o rosto - banhavam-se pela substância negra sendo expelida e gotejando pegajosamente. Pelos seus olhos sombrios, lágrimas pretas escorriam.

Avistou, não muito longe, um cidadão usando um terno, um chapéu e calças marrons, além de uma gravata vermelha, assoviando em tom baixo e trazendo uma maleta. Supostamente vinha retornando de seu trabalho, ainda que tenha sido interrompido pela confusão ocorrida em frente ao prédio da prefeitura.

O inocente homem optou por andar sob as luzes de alguns postes. Não demorou para notar uma presença no mínimo estranha por ali perto, parando com o assovio.

- Senhor? Precisa de ajuda? - perguntou ele, de forma gentil ao caminhar com certa rapidez em direção ao mimético cambaleante e grotesco. - Está perdido? - o olhou estreitamente.

Ao vê-lo, o mimético reproduzira grunhidos incômodos, expelindo mais gosma de sua boca e andando com mais pressa.

- Espera um minuto... - disse o homem, instintivamente recuando uns dois passos ao esbugalhar os olhos após vislumbrar o rosto decrépito e pálido do mimético quando o mesmo passou pela luz de um poste. - Não... Vo... Você... - gaguejava, andando para trás e erguendo de leve as mãos como se quisesse proteger-se. - Você... é um deles!? Não é? - perguntou, o pavor nítido na voz. - Pra trás! Eu disse... Pra trás! Por que não me obedece seu monstro repugnante?

A resposta viera na forma de um pulo selvagem seguido de um rugido e o som de uma mordida brutal ecoando pelo espaço. Por último, veio o grito doloroso e reverberante da primeira vítima Beta.

                                                                                     ***
                                                                                         
22 de Agosto de 1942

Notícias de última hora:

"Ainda que soluções eficientes possam estar distantes e, em uma visão pessimista, inalcançáveis, as principais organizações de saúde do continente em parceria com a comunidade científica européia permanecem empenhadas em reunir esforços dobrados para conter esta devastadora calamidade. Nosso país tornou-se o marco zero de uma infecção que atualmente parece evidenciar uma iminente expansão para fronteiras e além. As questões mais gritantes são: Quem, afinal, é o responsável pela criação desta substância tóxica e corrompível? Está vivo e foragido? Está morto e talvez seja alguém cujo nome é de certo conhecimento? Sabe-se que o Dr. Maximillian Lenox esteve desaparecido por dois anos. Seu sumiço foi considerado misterioso e intrigante para a maioria de seus colegas, amigos e familiares. Resta saber se o mesmo provavelmente estaria envolvido na produção da substância. O Exército parece hesitante em nos fornecer algum detalhe a respeito, tendo em vista suas atividades mais recentes, no ano passado, quando uma divisão alternativa chefiada pelo General Holt se encarregou de desmanchar instalações industriais genéricas e supostamente ilegais. O militar-chefe fez questão de não conceder nenhum coletiva de imprensa em meio a esse período extremamente turbulento para a história. 

Enquanto as principais pessoas a estarem a par de todos os detalhes cruzam os braços e se mantém silenciosas, o caos é instaurado todos os dias em vários pontos da Grande Londres e arredores. Enquanto o silêncio impera, o país mergulha em uma era sombria regada a terror, medo e loucura."

                                                                                 
                                                                                            ***

09 de Outubro de 1942 

Escola Municipal de nome desconhecido 

Uma das primeiras missões enfim fora oficializada pelo comitê de aprovação organizado pelos membros iniciais da Resistência e composto por sete caçadores escolhidos por votação uma semana após a primeira reunião entre os integrantes oficiais e os novos incluídos - o trio da Legião - e o selamento do acordo por escrito assinado pelos mesmos. Bertrand Nincoln, chefe de escalação e ex-caçador de aluguel, decidira, naquele dia, enviar o trio da Legião à uma missão cuja meta era liquidar miméticos em estágio de inquietação, tendo boa parte deles estando localizados em uma escola de ensino integral com estrutura inacabada e detectados, previamente, três dias antes por dois caçadores disfarçados de miméticos em completude (nível Beta). A procura do material para a farsa foi árdua, durando cerca de doze dias, mais dois inteiros para a confecção das "fantasias".

Sob um céu cinzento e nebuloso, o prédio do colégio e arredores exibiam um caráter decrépito e rústico, muitos dos pontos mais visíveis com resquícios da substância negra em respingos em meio à um cenário deprimente. Até mesmo parquinho que serviria para crianças do primário se encontrava em estado deplorável, a maioria dos brinquedos visivelmente enferrujados e sujos de gosma preta. Uma brisa leve e gelada fez um balanço se mover, produzindo um rangido fraco. Ao mesmo tempo, o trio da Legião pisara nas areias imundas do parque afim de chegar à alguma entrada dos fundos na escola. Adam portava uma metralhadora que dispararia dez mini-capsulas de nitrogênio líquido por segundo. Já Lester e Êmina carregavam lança-granadas com cápsulas do tamanho de uma lata de refrigerante.

- Fiquem de olho... - disse Adam, soando sussurrante para não chamar a atenção de inimigos ocultos. - Podem estar escondidos em qualquer lugar, até nos bueiros.

- Esse lugar virou um chiqueiro. - disse Lester, andando e observando o gramado da entrada da escola.

- Foi umas das muitas zonas evacuadas em menos de seis meses. - salientou Êmina, a expressão séria e firme, caminhando ao lado de Adam. - Não vejo muita diferença nos padrões que a maioria deles costuma seguir. Veja bem: Boa parte prefere lugares abandonados, silenciosos e que não sejam tão facilmente acessíveis para grupos numerosos.

- Bem, isso é verdade. - concordou Adam, visualizando a escola com olhos estreitados. - Esse lugar, por exemplo, foi vítima de um grande descaso da prefeitura. Sem infraestrutura adequada, trabalhadores mal-pagos, pausas constantes... Não me admira esse ter sido o local predileto desses monstros aqui nesse bairro. - olhou para a caçadora. - Já vez a varredura nas casas?

- Nos três primeiros quarteirões? Sim. - respondeu ela, olhando atentamente para os lados. - Tudo limpo. Com isso eu quero dizer que todos que decidiram permanecer em seus lares estão seguros. Portas trancadas, cercas não-enferrujadas, nenhuma brecha, estão confinados e totalmente privados do mundo externo. - informou ela, estranhando Lester seguir adiante tão à frente deles. - Espera... O que é aquilo ali?

- Aquilo o quê? - perguntou Adam, tentando acompanhar o olhar da parceira.

- Não viu? Lester pareceu ter corrido para detrás daquele muro! - apontou ela com o indicador, logo apressando o passo para chegar a tempo de ver uma descoberta.

Ao escutarem vozes exaltadas, ambos tornaram a correr diretamente para o outro lado do muro com tijolos vermelhos para o qual Lester foi verificar.

- Quem é você? Mãos onde eu possa ver, agora! - gritava o caçador estrategista, apontando o lança-granadas para um homem de smoking preto agachado e de costas.

- Lester! O que foi? - perguntou Adam, em alto som, chegando ao ponto com Êmina vindo atrás. Ao perceber, seu instinto o fez acalmar o amigo imediatamente, olhando fixamente para o homem negro com as mãos para cima e de costas.

- Ele guardou alguma coisa no bolso! - disse Lester, olhando-o suspeito.

- Calma aí, Lester, abaixa a arma. - pediu Adam, sem tirar os olhos do homem, aproximando-se com cautela.

- É impressão minha ou você... conhece esse cara? - perguntou Êmina, olhando-o com estranheza.

- Não só conheço - disse o robusto caçador, tendo certeza -, como também sei o que representa. Pode se virar... Áker. - falou, surpreendendo aos dois companheiros.

O arauto de Yuga abaixara as mãos, voltando-se para o trio, emanando uma face de tensão misturada com desconfiança.

Adam abrira um sorriso para o auto-proclamado protetor de Rosie.

- E aí? - disse ele, amigavelmente.

- Como é que é? - indagou Lester, a expressão confusa, olhando para os dois. - Você não vai nem checar se ele está limpo?

- Não é necessário. - retrucou Adam, sem olha-lo.

- Se eu não estivesse com meus poderes, eu é quem estaria em posição de verifica-los antes de vocês. - disse Áker, com firmeza no tom. - Olá, Adam. - cumprimentou-o, assentindo e chegando mais perto.

- Poderes? - perguntou Lester, franzindo o cenho. - Que tipo de ser você é, afinal?

- É o arauto de Yuga. - disparou Adam antes que Áker pudesse falar. - Conheci ele quando Rosie me levou para o Casarão. Não precisam teme-lo.

- Ligado à Rosie?! - soltou Êmina, chegando perto ao ficar interessada no mensageiro. - Isso... me faz lembrar uma coisa... Acho que foi na noite nas Ruínas Cinzas... - disse ela, pensativa, - Vamos lá, me ajudem. - disse, dirigindo-se à Adam e Lester.

- Não lembro nem do que comi no café da manhã de ontem. - disse Lester, dando de ombros. - Ah é, falando nisso, falta alguém coletar mais suprimentos ainda hoje.

- Acho que se refere ao que Abamanu disse à Rosie naquele dia... - disse Adam, tentando se recordar, pondo a mão no queixo e ficando pensativo, ao passo em que Áker revirava os olhos em impaciência. - Sobre sua conexão com Yuga... Inimigo de Abamanu devido à uma guerra...

- Pessoal, por favor, devemos nos apressar. - disse Áker, com urgência, gesticulando com as mãos. - É complicado demais ter de explicar com detalhes agora... Mas vou precisar da ajuda de vocês.

- Isso depende. - disse Lester. - Nós estávamos no meio de algo. Você, pelo visto, tem seus próprios problemas.

- E iremos ajuda-lo a resolver. - disse Adam, olhando para Lester de relance com reprovação. O caçador estrategista suspirara, rendendo-se. - De acordo, Êmina? - perguntou à caçadora.

- Olha... Pela primeira vez, em muitos anos, vou ter de concordar com o Lester. - disse a jovem, relanceando o amigo e um pouco insegura.

- Acho que precisamos de um termômetro... - disse Lester, brincando com o fato da alquimista finalmente ter demonstrado apoio ao seu ponto de vista, como raramente fazia, parecendo que ela "delirou" de febre.

- Ahn... Me desculpe, Áker, mas, como pode ver, meus amigos ainda precisam estar convencidos de que você é totalmente confiável. - disse Adam, meio sem jeito para explicar.

- Não, eu não me sinto constrangido, de forma alguma, eu compreendo perfeitamente. - disse Áker, sensato. - Me conheceram assim tão de repente, de modo suspeito, ainda mais sabendo que tenho ligação com o maior algoz de Abamanu, é natural que estejam hesitantes a meu respeito.

- Só pra começar: O que escondeu no bolso? - perguntou Lester, soando indelicado.

- Lester, eu já disse: Não há porque temê-lo. - repetiu Adam, aborrecendo-se com a atitude do caçador. - Obviamente, ele está pedindo por ajuda e vamos apoia-lo. Não trata-lo como um criminoso.

- Era isto. - disse Áker, retirando o que havia guardado no bolso esquerdo do smoking. Mostrara uma bala dourada com um sigilo inibidor "entalhado" na ponta. - Pretendo encurralar um certo inimigo com quem tenho uma rixa pessoal.

- Ah, tá... - disse Lester, levantando uma sobrancelha, em sinal de incredulidade. - Com uma só bala? Belo plano.

- Não sou eu quem vou atirar. - disse Áker, franzindo o cenho para Lester, logo olhando para os outros dois resistentes. - Mas um de vocês.

- Cara, estamos em uma missão extremamente importante! - reclamou Lester, impaciente. Apontou para a entrada da escola. - Tem centenas de desgraçados que sangram gosma preta lá dentro. Não vamos perder tempo com sua vingança pessoal. - dissera, balançando a cabeça negativamente.

- Precisamos que seja breve. A gente não tem muito tempo. - disse Êmina, disposta a auxiliar.

- Garanto a vocês que parte do meu plano servirá como retribuição. - assegurou Áker, andando em direção ao gramado a fim de alcançar a porta principal da escola. O trio o seguira. - Nesta bala há um sigilo inibidor. - jogara-a para trás, fazendo com que Adam a pegasse certeiramente. - A forjei a partir de uma lâmina dourada comum. Deve funcionar.

- Deve? - indagou Lester, fazendo uma expressão de desconfiança.

- Mas, afinal, de quem se trata? - perguntou Adam, pondo-se lado à lado com o arauto na caminhada.

- Sekhmet. Consorte de Yuga. E suposta assassina de Rosie. - disse ele, mantendo-se sério e focado.

- Acredita mesmo que essa... deusa... conseguiu matar a Rosie? - perguntou Êmina, intrigada.

- É meu único palpite. - respondeu o arauto, dobrando em direção à entrada do colégio.

- Então é mesmo uma vingança... por Rosie? - perguntou Lester, aparentando estar finalmente compreensivo quanto aos motivos do mensageiro de Yuga.

- Basicamente. - disse ele, sem querer se prolongar. - Eu vou estar lá para ativar o sigilo após a deterem. Na verdade, existem determinadas lâminas mais efetivamente letais contra divindades, as quais não estão e nunca estiveram ao alcance de seres como eu. Tive como única alternativa arriscar dessa maneira. Ela pode ter se fortalecido graças ao recarregamento de seu amuleto.

- Mas você é mensageiro de um deus bem influente. - disse Adam, olhando-o curioso. - Por acaso, é proibido ter acesso a essas lâminas tão raras?

- Infelizmente, alguém como eu não deve portar adagas tão perigosas. - afirmou Áker, apressando o ritmo de seus passos em direção à entrada. - É uma regra estabelecida pelo meu Lorde. Diziam as más línguas que isto era um artifício para evitar que arautos ou soldados comuns se rebelassem contra o imperador e usufruíssem de tal vantagem proporcionada pela adaga.

Lester dera uma risadinha rápida, embora não achasse engraçado.

- Seu imperador é um exemplo de confiança. - disse ele, irônico.

- Ele tinha suas próprias paranoias. - afirmou Áker, convicto. - Honestamente, eu até creio que ele não deposite tanta confiança em mim. E ao tocar no assunto das adagas especiais, percebo que Sekhmet, de certa forma, tinha razão sobre mim. Não perguntem porque, afinal temos pouco tempo.

Questões emergentes ainda pairavam na mente de Adam, motivando-o a não cessar com a busca por respostas.

- Quando disse que vai ativar o sigilo ao chegar lá... Não se referiu à escola, certo? - perguntou o caçador de braços fortes.

- Os capangas dessa deusa estão caçando você, não é? - questionou Lester, o tom de voz suspeitoso.

- E não deveríamos entrar pela porta da frente. - apontou Êmina, relembrando o curso inicial da missão, desconsiderado graças ao arauto. - Por que não pode nos dizer todo o seu plano aqui?

- Eu já estive aqui antes destes infectados surgirem para se apropriar do local. - revelou Áker, subindo a escadinha de concreto com uns 10 degraus que levava diretamente à porta dupla vitrificada. - Foi uma oportunidade valiosa para premeditar todo o seguimento. Cobri todas as paredes de sigilos invisíveis, internas e externas. Vocês saberão mais tarde com muitos detalhes. - falou, favorecendo um certo mistério. - Por favor, confiem em mim. Deverão fazer tudo o que eu mandar, assim que entrarmos. Está seguro, pelo menos no primeiro andar, eu garanto.

As portas duplas foram abertas pelo mensageiro com determinada cautela. Áker seguira caminhando pelo primeiro corredor com paredes brancas meio cinzentas devido à sujeira acumulada graças a estadia dos miméticos.

- Essa escola me faz lembrar os corredores da fábrica onde eu estava encarcerada. - disse Êmina, tendo péssimas recordações ao visualizar as sujidades nas paredes. Seguia os passos do novo aliado, mantendo o lança-granadas firme em suas mãos. - Nada nostálgico.

- Eu pus os sigilos - disse Áker, andando mais apressadamente. - para mantê-los distantes e avisados de que se entrassem sofreriam consequências. Um dos meus emitiu essa mensagem. Ligaram isto aos sigilos e não aos infectados, claro.

Lester se empertigara, o fitando com o cenho franzido.

- Ei, eles podiam ter nos feito um favor. Sabia? - disparou Lester. Adam virou o rosto para o amigo com uma expressão que denotava pura estranheza.

- Que bobagem é essa que a sua cabecinha duvidosa criou hein? - perguntou o líder da Legião.

- Ué, é lógico. - disse ele, parecendo estar certo daquilo. - Se Áker não tivesse feito esses sigilos invisíveis, obviamente permitiria eles entrarem e agirem livremente... para dar cabo dos desgraçados.

A ideia do caçador fez Áker estremecer de impaciência.

- É esse seu genial plano? - perguntou Êmina, reprovando o amigo. - Deixar que os inimigos de Áker fizessem o trabalho pela gente? Só pode ser brincadeira, não é?

- É estratégico. - defendeu-se Lester, sem olhar para a companheira.

- É comodista. Isso sim. - retrucou ela, aborrecida com tal ideia estúpida.

- Não fique envergonhado, Áker, eles são assim na maioria das vezes. - disse Adam, pensando que a breve discussão tenha o constrangido ou o deixado nervoso. - Quase nunca se entendem. - virou o rosto para os amigos, olhando-os com desaprovação. - Não é?

Lester dera de ombros, desviando a visão para um lado, enquanto Êmina revirara os olhos.

- Sugiro que mantenham suas vozes baixas. - disse Áker, dobrando à uma escadaria de ferro, localizada em uma área discreta e pouco iluminada, que descia vários degraus a um depósito trancado. Descera com cuidado. - Ou não falem.

- Áker - disse Adam, estando próximo do arauto ao descer a escada no mesmo ritmo. -, me tire uma dúvida: Se os sigilos o manterão distantes... O que realmente pretende fazer depois de nos mandar para o outro local onde Sekhmet está?

- Vou apaga-los. - afirmou ele, direto. - E permitir que eles passem.

Os três abalaram-se com aquela decisão súbita e inesperada.

- O quê?! - soltou Adam, atordoado, soando um pouco mais alto do que deveria. - Não pode fazer isso. Nos mandar cumprir a parte menos pior do plano e deixar você se arriscar com um exército deles.

- Eu posso e o farei. - redarguiu Áker, o tom severo. - Como eu disse: Vão saber mais tarde. Prometo não esconder nada depois que terminarem.

- Não faz o menor sentido você querer se sacrificar por nós. - opinou Êmina, afligindo-se com todo aquele mistério alimentando.

- Não é um sacrifício. - retrucou Áker, sem rodeios, descendo os últimos degraus.

Alguns estalidos agudos ressoaram de forma a deixa-los alertados à um perigo de proximidade. Miméticos em estágio de submissão e de nível Beta recém-infectados poderiam estar escondidos em áreas que acreditavam serem discretas ou quase ignoráveis para seus alvos. Mas julgando pelo tempo em que os inimigos entravam na escola, sem produzir nenhum alarde, seria o momento ideal para saírem de suas "tocas" e procurarem os caçadores sorrateiramente.

Os três seguiram descendo a escada, mantendo a concentração em Áker e sua estratégia àquela altura ainda tão ocultada.

O arauto procurou fazer o mínimo de barulho de possível ao abrir a porta com as mãos, sem precisar usar sua termocinese para destrancar as desgastadas maçaneta e fechadura. As dobradiças rangeram estridentemente, para o desprazer de Áker, mas o risco era aguardado.

Lester, hesitantemente, olhou para o topo da escadaria, sendo dominado pela tensão e o medo em se deparar com miméticos atraídos pelo estardalhaçante barulho.

Áker fez sinal com uma mão para entrarem, mas também fazendo um contanto visual que parecia dizer "Venham rápido". Ligou o interruptor, acendendo uma fraca lâmpada fluorescente de luminosidade amarela no teto.

Após todos adentrarem no recinto, a porta, enfim, fora fechada rapidamente, produzindo um barulho menos intenso que a abertura.

- Está devidamente seguro. - disse Áker, dirigindo-se à outra porta do depósito vazio e empoeirado. - O sigilo que desenhei vai impedi-los de realizar uma invasão. - passou seus dedos na porta, gravando mais o sigilo que seria responsável por envia-los ao local exato.

- Isso está ficando bem estranho... - disse Lester, intrigado, fitando-o com suspicácia.

- E quanto a seus aliados? - perguntou Adam. - Não são eles que deveriam fazer esse trabalho?

- À esta altura, meus únicos aliados... - disse ele, terminando de desenhar o sigilo invisível, logo virando-se para o trio. - ... são vocês.

- Mas havia dito que um deles enviou a mensagem para os inimigos. - lembrou Êmina, ainda sem entender o total objetivo daquela missão. - E essa escola foi ocupada há dois meses. É meio estranho terem largado você para trabalhar sozinho, sem mais nem menos, em um curto período de tempo. Deveriam estar aqui, do seu lado.

A caçadora tocara em um ponto extremamente relevante, mas bastante doloroso para o arauto.

- Eu os perdi. - revelou ele, ficando ao lado da porta, pensativo. - Mas não estão mortos, muito pelo contrário. Foram coagidos a não seguirem meus passos. Graças à morte de Rosie. Estou sozinho.

- Não, não está. - disse Adam, intencionando consola-lo. - Nós também perdemos Rosie. E se essa deusa, ou seja o que ela for, pra mim não importa... for a responsável, nós a vingaremos.

- Claro, com a montanha de provas que temos. - retrucou Lester, irônico e aborrecido.

Adam voltou-se para o amigo, suspirando pesadamente ao emanar um ar rigoroso.

- Lester, se não quiser ser parte disso, eu entendo. - disse ele, a expressão séria. - Mas isto se trata de Rosie, a melhor amiga que já tivemos a sorte de conhecer.

- Graças a Hector, que deveria estar aqui conosco. - disse Êmina, relembrando a figura do caçador que se entregara à Abamanu sem alcançar a redenção.

Adam virou o rosto, trincando os dentes, irritado ao ouvir o nome daquele que um dia considerou mais do que um amigo.

- É... Êmina, tem razão. - disse ele, forçadamente.

- Muito bem. - disse Áker, estalando os dedos da mão direito ao ativar o sigilo. O símbolo brilhara com uma luz amarela na porta. - Já está na hora. Eles chegaram.

- Vai conseguir contê-los? - pergunto Adam, o semblante de preocupação, andando até a porta.

- Irei tentar. Embora estejam um pouco mais fortes do que mereciam. - disse o arauto, exibindo uma segurança inigualável. Tocara no ombro do caçador. - Boa sorte. - vislumbrou Lester e Êmina. - Aos três.

Adam entrara primeiro, abrindo a porta lentamente.

Um aposento ligeiramente diferente do qual estavam surgiu à vista do grupo. Lester entrara por último, fechando a porta sem perceber enquanto esquadrinhava aquele galpão abandonado.

- Esse truque me faz lembrar... de uma certa pessoa que conhecíamos. - disse Êmina, olhando para ambos com um semblante triste.

- Charlie. - disseram Adam e Lester em uníssono, ambos assentindo devagar e com expressões sérias.

O galpão parecia uma cadeia de andaimes, além do imenso conjunto de tubulações. As janelas localizavam-se na parte mais alta das paredes cinzentas e gastas, deixando a fraca luz solar alcançar o chão coberto em poeira. Uma outra construção inacabada para servir de refúgio aos infectados.

- Precisamos ir. - disse Adam, dando início ao plano ao andar com cuidado em direção a um corredor elucidado através de uma porta escancarada. Sacou um revólver calibre 32, puxando a trava do mesmo com a bala dourada carregada. - O silêncio desse lugar nos oferece uma boa vantagem.

- Só se for apenas para você, já que nasceu com a audição de um morcego. - disse Lester, com uma pequena inveja do líder caçador.

- Ouvi passos... - disse adam, em tom bastante baixo, entrando no corredor com a arma em riste.

- Você realmente ouviu ou foi apenas impressão? - questionou Êmina, atrás dele, não muito convencida. - Afinal de contas... é uma deusa poderosa, pelo jeito como Áker falou dela.

- Se bobear, ela já deve saber que estamos no encalço. - especulou Lester, visualizando o semi-escuro corredor.

- Não consigo duvidar disso. - aquiesceu Êmina, tensa.

- Segunda vez a meu favor? Esse dia ficará para a história. - disse Lester para a alquimista, soando meio alegre.

- Não confunda as coisas. Ainda acho você um idiota, apesar de útil. - disparou ela, sem dó.

- Vocês dois, quietos. - ordenou Adam, caminhando cuidadosamente pelo corredor. - Ela pode estar bem mais próxima do que pensamos. Portanto, silêncio é fundamental. - avisou ele, sua testa suando e seu coração descompassado. "A primeira e última vez que lidamos com uma divindade... foi naquela maldita noite nas Ruínas Cinzas. Áker está confiando em nós, nos viu como suas últimas opções. Eu me odiaria se decepcionássemos-o.".

                                                                                        ***

Diante de um servo de Sekhmet, em um dos muitos corredores da escola, no primeiro andar, Áker emanava uma austeridade em sua expressão, além de uma autoconfiança, em teoria, inabalável.

O assecla da deusa usava como vassalo um caçador de porte bastante atlético, rosto quadrado e olhos e cabelo castanhos bem penteado para um lado. Vestia um figurino comum para indivíduos do tipo: Colete marrom de tecido, camisa branca com mangas, calças sociais e botas.

O corredor possuía armários colegiais de cor cinza inconcluídos e portas-duplas de entrada e saída, além de extintores de incêndio posicionados em alguns pontos.

- Eu ainda estou tentando entender como chegamos a esse ponto. - disse Áker, desapontado. - Quando deixamos a cumplicidade se perder com o tempo tão facilmente?

- Não cabe a mim responder. - redarguiu o outro, mantendo a sisudez. - Nosso inimigo venceu por sua causa, Áker. Esteve na retaguarda enquanto seus seguidores débeis se perguntavam vários porquês e realizavam o serviço pesado. Você... - apontou o indicador esquerdo para o arauto. -.. abalou com a honra do império. Estamos aqui para conserta-la.

- Me removendo da equação? - perguntou o arauto.

- Que outra escolha temos? - retrucou o soldado, dando alguns passos adiante. - Só para sua informação, não viemos a mandado de nossa rainha, mas sim de Lorde Yuga! Eles nos enviou até aqui para puni-lo severamente pelos danos que causou!

- Eu protesto! - bradou Áker, claramente insatisfeito. - Sei que posso ter ferido a confiança de meu soberano, mas tenho o total direito de me manifestar em defesa.

- Esse direito foi revogado. - salientou o soldado, arqueando as sobrancelhas. - Fomos justamente recompensados para tirar você deste posto do qual você não é digno. Nunca foi... e nunca será. - fez uma pausa, movendo os dedos das mãos para denotar um ato inesperado. - Viemos para leva-lo ao expiatório. Eu sugiro que não nos subestime.

- Ora, por favor. - disse Áker, demonstrando impaciência. - Não me envergonhe. Sei que está desenhando um sigilo. Vai precisar muito mais do que isso se quiser me deixar realmente intimidado com suas ameaças.

- Não seja tolo, nunca iria desperdiçar toda minha energia em uma escória feito você. - provocou o soldado, manifestando seu ódio. - Combinamos de reservar algo bem especial para você. E, honestamente, nenhum de nós queria estar na sua pele. A sua pele de verdade, não esse saco de carne e ossos. A escolha é sua, Áker: Do jeito fácil... - enfiou sua mão direita por detrás do colete para retirar algo. - ... ou, se preferir... do jeito difícil. - mostrara uma afiada lâmina dourada, parecendo estar pronto para ataca-lo.

- É o bastante para me fazer temer pela minha própria vida? - questionou Áker, fitando a faca com certo desdém.

- Vamos descobrir. - disse o soldado, logo em seguida avançando contra o arauto.

Áker tentou imobilizar o braço direito do oponente antes que a lâmina chegasse ao seu rosto, logo o jogando contra parede ao lado, embora não o fazendo largar a arma. O soldado investira novamente ao se erguer, empurrando, supervelozmente, o arauto contra a outra parede, gerando um impacto que a fez rachar. Tentou perfurar Áker, mas o mesmo desviara a cabeça e a ponta da espada cravou no concreto da parede. O arauto o empurrara contra um dos armários com forte violência.

O soldado, por sua vez, em vez de reerguer, pusera um amuleto sobre a palma da mão esquerda, proferindo uma mensagem rápida.

- Eu o encontrei! - alertou ele aos demais.

Áker o pegara pelo colete, dera um giro e o jogara no chão brutalmente. O piso danificou-se, deixando um rastro médio de destruição.

Por meio de teleporte, outros dois surgiram por trás do arauto e tentaram agarra-lo.

Áker incutiu uma pressão em sua mão direita, fazendo um deles voar para fora do corredor, danificando a porta dupla. Tendo baixado a guarda por causa disso, Áker fora atingido pelas costas por uma lâmina dourada arremessada pelo primeiro a aparecer. O terceiro desferira um cruzado de direita e outro de esquerda, aproveitando que o arauto perdera a concentração, em seguida o chutando-o no queixo, fazendo-o cair.

Uma cuspida de sangue manchara o piso de cerâmica.

O mesmo soldado tentara esfaqueá-lo com a lâmina dourada, mas Áker, ainda que caído, defendera-se ao agarra-lo com as duas mãos. Quebrara os ossos do pulso do soldado, fazendo-o largar a lâmina, logo depois erguendo-se um pouco e quebrando seu pescoço. Ao se levantar, o arauto se dirigiu superveloz até o primeiro, tirando a faca antes cravada em suas costas, para golpeá-lo de modo certeiro. O mesmo se defendera, pegando o cabo da faca antes que a ponta perfurasse um dos olhos.

O terceiro viera por trás de Áker, também superveloz, mas o arauto o socara sem olha-lo, derrubando-o contra a parede.

- Vieram somente vocês três? Uma pena. - disse o mensageiro de Yuga, limpando o smoking, achando pouco.

- Lorde Yuga só permitiu que somente três soldados determinados a fazerem o possível e o impossível para salvar o império fossem designados a capturarem o desertor. - informou ele, depois tentando atacar Áker novamente.

O arauto o pegara pelo pescoço no mesmo instante, levantando-o.

- Agora entendi. - disse Áker, sem parecer piedoso. - Ele lhes concedeu quase o mesmo nível de força que o meu, pude sentir logo no primeiro golpe. Não é a mesma coisa, mas um dia vocês chegam lá.

- Se acha muito forte, não é? - perguntou o soldado, a voz enfraquecida pelo intenso aperto que Áker infligia em seu pescoço. - Saiba que não desistiremos tão fácil...

- Sei que não vão. - disse o arauto, olhando por cima do ombro por uns segundos e, logo em seguida, jogando-o contra a parede da direita como se fosse um mero objeto descartável.

Rapidamente sacando sua adaga dourada, Áker virou-se e investira contra o soldado que empurrara para fora do corredor e que havia retornado para contra-atacar.

Certeiramente cravou sua lâmina em um ponto vital do soldado... que logo mais se revelou como uma simples ilusão, desaparecendo feito um fantasma.

- Essa técnica é minha. - disse Áker, franzindo o cenho em indignação.

- Queria ver algo novo? - perguntou o primeiro soldado a surgir, fazendo o arauto se virar bruscamente.

Os três estavam juntos, exibindo sorrisos infames que indicavam um certo ar vitorioso. A dupla que aparecera depois do primeiro soldado a encontrar Áker posicionava-se à esquerda e à direita. Os dois caçadores puseram suas mãos esquerda e direita, respectivamente, nos ombros de seu "líder". Uma luminosidade amarelada passava pelos seus braços, como se estivessem realizando um veloz processo de transferência de energia para seu considerado chefe da missão. O soldado de cabelos castanhos e porte robusto recebia certa quantidade, ao passo em que seu tórax emitia uma luz de igual cor, mantendo seus punhos fechados e bem apertados.

"Mas o que estão tentando fazer, afinal? Que tipo de artimanha é essa?", pensou Áker, sem entender.

O soldado do meio abrira a boca iluminada, seus olhos refulgindo intensamente. Do seu peitoral uma grande concentração energética, assemelhando-se à uma esfera, surgira, em seguida alcançando o nível máximo de liberação ao disparar uma espécie raio retilíneo ou rajada solar, a qual acertara Áker de imediato, o arremessando de forma brutal contra uma parede próxima aos armários.

Os efeitos não pareceram tão graves quanto o esperado pelo trio, mas, em vista do esforço, valera a pena já que tal técnica possuía eficácia no enfraquecimento da vítima, até mais do que usuário.

Apenas desconheciam o limite de tal fraqueza.

Áker caíra no chão, trêmulo, mas ainda consciente, esforçando para se reerguer. Seu smoking estava em frangalhos, rasgado em várias partes e exalando fumaça. Na parede, via-se um grande rombo.

Os três soldados ofegavam bastante.

- O que achou da surpresa? - perguntou o do meio, feliz ao ver o arauto combalido. - Isto aqui tem o dobro dos efeitos que uma simples rajada pode causar. Mais duas e você estaria acabado, definitivamente.

O mensageiro de Yuga se pusera de um só joelho, recuperando o fôlego a cada segundo. Deu uma risadinha baixa, para o espanto dos opressores.

- O quê?! - perguntou o da esquerda, estranhando. - Ele ficou insano?

- Na verdade, só está se exibindo... - disse o do meio, gradualmente reavendo a disposição. - Querendo nos provar que pode suportar as dores da punição. Apenas está enganando a si mesmo.

- Pena não podermos fazer de novo. - disse o da direita.

- Não seja estúpido. - retruco o do meio, olhando-o por cima do ombro. - Lorde Yuga nos ordenou para trazê-lo vivo. Mas não disse nada sobre leva-lo repleto de danos físicos.

- Reclamam por eu me achar mais forte... - disse Áker, levantando-se lentamente, mas exibindo um tom de voz que provava sua inquebrável determinação. - Mas, em verdade, vocês se acham muito espertos...

- Héth, precisamos dar á ele uma segunda dose. - sugeriu o da esquerda, a face enfezada. - Não foi o bastante.

- Você não podem. - rebateu o arauto, mantendo a cabeça baixa e o ar de mistério. - E não querem. - dera outra risada baixa. - Só devo avisa-los... de que as coisas nem sempre acabam como se espera. - ergueu a cabeça, apresentando uma face sisuda e, em simultâneo, raivosa. As pupilas brilhavam uma luz amarela um tanto intensa e a área em torno de seus olhos parecia clarear.

Não demorou para que um tremor de terra começasse a vibrar sobre o espaço e aumentando à medida que o arauto erguia seu corpo.

- O que está havendo aqui? - perguntou Héth, recuando. - Não pode ser...

As paredes rachavam-se com uma rapidez aterradora ,bem como chão. Os armários, nos dois lados, vibravam intensamente.

- Precisamos ir... - disse um deles, preocupando-se. - Talvez tenhamos o subestimado... Ele atingiu o limite!

- Isto não está certo! Nós o acertamos com toda a força! - questionou Héth, olhando para os dois companheiros, agarrando as golas de suas camisas. - Impossível, inadmissível! - tornou a observar Áker triunfar em dar a volta por cima.

O arauto, após ficar totalmente de pé, urrara estridentemente no mesmo instante em que seus olhos refulgiram uma intensa luz amarela e suas asas se projetaram na parede como sombras. A força gerada por Áker fora tremenda de modo a destruir completamente as paredes, o chão e os armários em uma descarga avassaladora e extrema, como um terremoto de magnitude na escala mais alta possível.

Tal poder esmagador consumira toda a área que circundava a escola, a força sísmica alastrando-se ao passo em que um ínfimo ponto luminoso adquiria volume até se transformar em uma liberação assoladora, estrondosa e flamejante, não poupando absolutamente nada que estivesse próximo o bastante.

A cinzenta nuvem de fumaça em formato de cogumelo alcançou uma altura estratosférica, podendo ser facilmente visível à vários quilômetros dali.

                                                                                     ***

Em uma área aberta e mais ampla do galpão, Sekhmet andava visualizando cada ponto onde o seu alvo poderia estar se mantendo escondido visando atingi-la imprevisivelmente.

- Estou cansada de rodeios. - declarou ela, irritando-se, pondo as mãos na cintura. - Apareça! Serviçal patético! Deveria ter pensado mil vezes antes de tentar me atrair para sua falsa armadilha. Saia de onde estiver... - andou mais alguns passos, dando um sorriso de canto de boca. - ... e talvez eu repense sobre uma interação mais pacífica, por menos que eu goste.

Um estampido ecoou por todo o recinto em altíssimo som.

A deusa parara de caminhar... dando-se conta de um pequeno corpo ter atravessado a carne de seu receptáculo direto no abdômen. Ao verificar vira um líquido vermelho escorrer pela ferida, manchando o sobretudo cinza. Aparentemente sem sentir nenhuma dor, ela vasculhou ao redor com seus olhos fervorosos.

- Quem está aí? - perguntou ela, elevando o tom.

Um vulto surgiu por detrás de uma porta entreaberta em uma área meio opaca. A figura de alguém forte e de alta estatura avizinhava-se dela com toda a calma e segurança necessárias. A deusa focara sua atenção naquela sombra que ganhava mais luz a cada passo, percebendo um objeto que se igualava a um revólver de médio calibre.

- Não está sentindo algo... diferente? - perguntou Adam, revelando sua face à deusa ao se aproximar. O caçador baixou os olhos para a ferida. - Vejo que não consegue retirar a bala. Um bom sinal.

- Quem é você, seu mortal insolente? - perguntou a deusa, rude.

- E ela realmente fala como uma verdadeira deusa! - dissera Lester, surgindo de uma parte incompleta de uma parede. - E tem a aparência de uma. - afirmou, olhando-a de cima à baixo, assoviando.

- Melhor não arriscar, Lester. - disse Êmina, aparecendo por uma das portas e andando em uma direção oposta da qual o caçador vinha. - Essa daí não parece fazer seu tipo.

- O que significa isso? - questionou Sekhmet, sem levar a sério aquela inesperada reunião. - Aquele serviçal está mesmo desesperado a ponto de contratar insetos rastejantes para fazerem o serviço sujo. E esta é a estratégia que ele recomendou? - perguntou, apontando para a ferida. - É esta a prova de confiança que ele lhes deu?

- Não fomos contratados. - disparou Êmina, fitando-a séria.

- E nem exigimos recompensa. - disse Adam. - A bala que disparei... foi por Rosie.

- Então é o cretino motivou-os a se vingarem. - disse a deusa, levantando uma sobrancelha. - Era de se esperar. Mas com isto? Ingenuidade não é bem das piores características dos mortais, mas vocês se superaram. Será que podem me algemar? - perguntou, logo dando uma gargalhada mefistofélica. - Ou devo exigir que me solicitem um médico ou curandeiro? - olhava-os com forte zombaria.

- O que te aguarda é bem pior, acredite. - disse Lester, sorrindo de leve.

- Talvez até para os deuses exista um destino bem pior do que a morte. - afirmou Êmina, cruzando os braços.

- Nem tudo o que é imortal se dá bem no final. - disse Adam, encarando com total seriedade.

- É engraçado... - disse Sekhmet, ainda dando algumas risadinhas. - Vê-los me subestimarem tão deliberadamente. E, ainda assim, tão vulneráveis. Como feras adestradas. Não pensem em ir agora. Só estou permitindo um tempo para que vivam seus últimos segundos. Por que não importa que tipo de objeto me feriu, se é especial ou não... Pois vou me regenerar... e quando assim ocorrer, vou desmonta-los como peças de bonecos. A coisa mais fácil do mundo. E extrair cada gota de sangue de seus corpos, cada fluido, cada órgão sendo saboreado. - declarou, o tom cruel gerando um feito de revolta nos três caçadores.

- Eu não teria tanta certeza. - disse um voz grave vinda de um ponto não detectável. Depois viera o som quase reverberante de um estalar de dedos.

Um pequena luz amarela acendeu-se na ferida sangrenta de Sekhmet, fazendo-a, instantaneamente, ir ao chão, ficando em posição quadrúpede. A deusa grunhiu e gemeu sentindo uma familiar sensação de algo arrancando suas forças sem misericórdia.

- Oh, não... - disse ela, a voz fraquejada.

- Quem muito ladra, acaba sem coragem para morder. - disse Êmina, adorando ver a deusa render-se.

Áker se aproximava a passos largos, prestes a explicar para o trio todas as fases do plano.

- Chegou a tempo. - disse Adam, feliz ao revê-lo em bom estado. - E então, como conseguiu lidar com aqueles caras?

- Antes de mais nada, devo dizer que não cheguei agora. - disse Áker, confundindo os bravos caçadores. - Na verdade, estive aqui o tempo todo. - revelou, olhando para cada um deles.

- O quê?! - dispararam os três, quase em uníssono, estupefatos.

- Então foi isso... - disse Sekhmet, tocando na ferida, mantendo-se na mesma posição. Tentou virar o rosto para olhar o mensageiro, os cabelos pretos e lisos cobrindo um pouco a face. - Você usou aquilo... Trapaceiro. Maldito!

- Exato. - confirmou Áker, encarando-a com desdém.

- Será que pode nos explicar o que você andou aprontando que não quis nos contar? - perguntou Lester, fortemente intrigado.

- Nos conte a verdade, Áker. - pediu Adam, fitando-o com certa preocupação.

- Estavam interagindo como uma cópia criada por mim mesmo. Possuo a habilidade de produzir cópias de mim e de outros seres. Mas respeitando o limite de uma réplica por vez. - explicou Áker. - Antes disso, forjei rastros que diziam estar levando ao local onde eu estava esperando por Sekhmet, eu intencionei atraí-la, enquanto seus subordinados se concentravam em acatar a ordem de captura dada pelo meu Lorde.

- Impossível. - reclamou a deusa. - Afinal, como diabos você soube da denúncia? Não havia como. Já estava declarado como desertor fugitivo!

- Um dos meus antigos aliados me informou, antes de se unir aos demais a testemunhar contra mim. - disse Áker, andando em redor de sua prisioneira. - Determinei que assim que conseguissem pega-la, eu poderia me desfazer da cópia. No entanto, as circunstâncias conspiraram a meu favor, e meu confronto com seus aliados durou o suficiente até o fim da cópia. Quando uma cópia excede o seu limite de tempo, ela naturalmente se auto-destrói. No fim, o lugar inteiro se reduziu em pó, e, com ele, os três soldados recém-promovidos e os infectados que lá residiam. Além disso, a bala que Adam disparou foi fornecida por mim e nela está um sigilo entalhado na ponta. Temi que não funcionasse, por ela ter sido derivada de uma lâmina dourada comum. Mas uma coisa ficou provada: O sigilo não é influenciado pela ineficácia da lâmina contra seu alvo e por isso se sobrepõe.

Sekhmet ficara pensativa enquanto enxergava uma iminente ruína de sua condição autoritária. Sua expressão arrasada comprovava sua frustração sem tamanho.

- Não... Eu não posso... Não posso aceitar...

- Você deve. - ditou o arauto, severo. - Perder com honra ou sofrer amargamente em lamentação. Já não sou eu mais quem se encontra num dilema existencial.

- Olha... - disse Lester, impressionado. - ... Tenho que admitir: Isso foi genial. - confessou, sorrindo. - Superou minhas expectativas, de verdade.

- Obrigado, Sr. Cooper. - agradeceu Áker, assentindo positivamente ao caçador.

- Espera, como sabe meu sobrenome? - perguntou ele, o cenho franzido.

- Rosie me falou bastante sobre você. - revelou ele, recordando-se dos momentos que passara ao lado da jovem. - Sonhava com todos nós reunidos... e felizes, eu acho.

A risada zombeteira de Sekhmet quebrara o breve clima de silêncio enquanto os caçadores lembravam-se, com pesar em seus rostos, das aventuras passadas com a última da linhagem Campbell.

- Agora... ela está morta. - disse a deusa, com infâmia.

- Graças à você. - disse Êmina, fitando-a com desprezo.

- Eu?! - indagou a deusa, mantendo a cabeça baixa, tentando passar a impressão de que estava suportando todo o ardor proporcionado pelo sigilo. - Eu nem sequer entrei naquela fortaleza medíocre. - revelou, tentando inocentar-se.

- Espera que acreditemos nisso? - perguntou Adam, rigoroso.

- Não espero por mais nada, minha existência perdeu qualquer sentido. - disse ela, rendida. - Deveria... tê-los matado com minhas próprias mãos enquanto tive a chance. Acho que foi tempo demais. Mas eu nunca menti. Não... matei Rosie Campbell. Mas eu teria... o imenso prazer de fazê-lo.

Como resposta, Êmina desferira um forte chute contra o rosto da deusa.

- Cala a boca, vadia. - disse ela, o tom frio.

- Vamos aguardar algumas horas. - disse Áker, decisivo. - Até que o processo se complete. - decretou, andando em uma direção aleatória para esperar em uma outra parte da grande estrutura. - Não precisam me seguir.

- Eu faço questão. - disse Lester, tocando-o no ombro de forma amigável e caminhando ao seu lado. - Estava errado ao seu respeito e recusar isso seria bem deselegante. Enquanto a dama fatal vira uma boa menina... O que acha de, sei lá, trocarmos umas ideias? Falar mais sobre você. - sugeriu, olhando-o.

- Como vocês mortais dizem: Vamos nessa. - disse o arauto, concordando fazer companhia ao caçador.

Êmina puxara Adam de leve pelo braço, convencendo-o a esperar em outro lugar.

- Anda, vamos. - disse ela. - Tortura-la é puro desperdício de energia. Não vale a pena.

- Tem razão. - aquiesceu o caçador, olhando a deusa com intenso desprazer. - Vamos deixar seu lado divino morrer aos poucos. Se é que existe um lado humano. - dissera, virando-se para se direcionar à uma das portas, ao lado da caçadora.

Até que Sekhmet perdesse cem por cento de toda sua energia divina, teria-se que esperar por cerca de 3 ou 4 horas, no máximo.

A deusa não esboçava sinais de sofrimento, muito menos tentando retirar o projétil do ferimento, em clara demonstração de que sua aceitação pelo destino era genuína e corajosa. As forças que a tornava imbatível definhavam-se , mas seu ódio por humanos e seu orgulho resistente permaneciam intactos.

                                                                                     ***

- Então quer dizer que suas duplicatas não passam de bombas-relógio? - perguntou Lester, seguindo Áker pelo caminho de volta ao ponto onde Sekhmet estava imobilizada.

- Basicamente. - responde o arauto, sem muita paciência ou disposição para prolongar a conversa.

- Sinistro... - disse o caçador estrategista, arqueando as sobrancelhas.

- Como ela está? - quis saber Áker, dirigindo-se Adam e Êmina, ambos bem próximos da deusa ainda caída.

- Meio deprimida... - disse Êmina, fitando-a com curiosidade. - ... Mas está exatamente do jeito que esperávamos.

- Especulamos que ela fosse tirar algum truque da cartola. - disse Adam, com os braços cruzados, também olhando-a.

Áker fizera uma expressão de pura estranheza.

- Truque da cartola? - perguntou ele, confuso. - O que isso significa?

- É um lance de mágico... - tentou explicar Lester. - ... Ele tira algo de sua cartola, normalmente é um coelho e... - olhou para os outros dois companheiros, meio envergonhado. Áker franzira o cenho, sem entender absolutamente nada de como aquilo poderia se relacionar com o caso.

- Ahn... - disse Adam, tentando encontrar palavras para encerrar aquele assunto. - É maneira de dizer. - falou, sorrindo forçadamente. - Significa que pensávamos que ela fosse tentar alguma coisa para escapar.

- O sigilo se esgotou. - analisou Áker, visualizando a ferida, entortando de leve a cabeça. Com telecinesia, erguera a mão direita e retirara a bala do corpo da deusa, como se estivesse espantando uma mosca. O projétil meio ensanguentado caiu com um ínfimo ruído tilintante. - Agora é por conta de vocês.

- O quê? Sugere que adotemos ela? - perguntou Lester, preocupando-se.

- Lester, ela já não é mais uma deusa, é completamente uma reles mortal como nós. - disse Êmina, contrapondo-se ao amigo. - Talvez possamos força-la a se unir à nós na Resistência.

- Nunca! - vociferou Sekhmet, tentando se levantar. - Jamais me sujeitarei à compactuar com a causa de vermes como vocês! Tentando salvar um mundo que não pode ser salvo.

- Na verdade... - disse Adam, estreitando os olhos. - Eu andei pensando sobre como ela nos pode ser útil. - olhou para os dois amigos. - Se lembram da fórmula da cura?

- Não me diga que... - disse Êmina, intrigando-se.

- Sim, talvez ela consiga. - decidiu o caçador robusto. Pegara a deusa pelo braço direito, erguendo-a do chão. - Afinal, deuses são mestres em conhecimento. Não é?

- Isso foi meio drástico. - afirmou Lester, um tanto receoso ante a ideia.

Êmina se pôs a ajudar Adam a levanta-la.

- Será que tem alguma coisa de química nessa mente psicopata? - perguntou ela, pondo o braço esquerdo da deusa sobre sua nuca.

- O básico... - respondeu Sekhmet, a voz fraca.

- Já é um começo. - disse Êmina, carregando-a para fora do galpão ao lado de Adam.

- A humanidade dela já foi ativada? - questionou Lester, desconfiado. - De repente, ela quis colaborar.

- Ela está desesperada. - disse Áker, pegando o bala. - Por estar vulnerável. E sem outra escolha, ela será bastante diligente em apoia-los.

- De que ainda vai servir essa bala? - perguntou ele.

- A energia de Sekhmet está armazenada. - respondeu o arauto, guardando o projétil. - Me servirá com possível trunfo.

- Ah, sim... - disse o caçador, assentindo levemente e fitando o nada. Desviou os olhos novamente para o arauto. - É aqui que nos despedimos, não é?

- Infelizmente... - disse Áker, suspirando pesarosamente. - Foi agradável o tempo que passei com vocês. Espero que obtenham êxito no desenvolvimento da cura para esta... praga que está assolando a humanidade.

- Ei, o que é isso? - indagou Lester, expressando incômodo. - Até parece que... isso é um adeus. Um adeus de verdade, pra nunca mais mesmo.

- Sr. Cooper, acho melhor você voltar para Adam e Êmina. - aconselhou Áker, rapidamente olhando para trás de modo suspeito. - Devem estar precisando de sua ajuda. Diga à eles que serei eternamente grato pelo apoio e lealdade. Digamos que essa aliança e amizade me tornou mais humano, de alguma forma.

- Tudo bem... - disse o caçador, andando alguns passos para trás e estranhando a insegurança que o arauto adquirira repentinamente. Virou as costas e deu alguns passos adiante. No entanto, voltou-se para Áker, erguendo de leve o indicador direito. - Ahn... Só mais uma pergunta: Será que você sabe o que aconteceu com... o Hector?

- Lamento, mas não sei. - respondeu ele, dando mais duas olhadelas para trás. - Vá, Lester.

- Já percebi. - constatou Lester, com um semblante de seriedade ao notar uma movimentação estranha em uma das portas de saída do galpão. - Adeus. - despediu-se ele, andando com certa pressa até a porta por onde Adam e Êmina saíram com Sekhmet.

Cerca de três minutos passados, dois soldados a favor da consorte de Yuga irromperam de duas portas diferentes, ambos encaminhando-se lado a lado em direção à Áker com austeridade odiosa nas faces.

- Aí está você. Desertor. - acusou um deles, com tom rude. - Com quem estava falando?

- Isso importa? - retrucou o arauto, franzindo a testa, aceitando sua condição.

- Não muito. - respondeu o outro. - Não viemos gastar nossas energias para esmagar baratas. Acabou, Áker.

- Chega de truques. Chega de brincar de esconde-esconde. - dissera o primeiro, demonstrando um ar de superioridade que não parecia casar bem com sua conduta e/ou posição. - Acusado de ir além de suas obrigações, assassinatos, negligência ao falecimento de um mortal, a quem confiou sua proteção e lealdade, e, não menos importante, deserção.

- Você vem conosco, agora. - disparou o outro, andando mais rápido. - Tem a obrigação de permanecer em silêncio. Prestará os devidos esclarecimentos a Lorde Yuga, sem direito a testemunhas. A ordem vem do primeiro escalão, o qual presumo que saiba de quem se trata especificamente.

Em um evidente sinal de rendição honesta, Áker levantara as mãos, pouco abalando-se com a voz de prisão, muito menos se afligindo com a possível condenação severa.

- Não vou impedi-los. - disse o arauto, totalmente ciente.
                                         

                                                                                        ***

25 de Novembro de 1944

Completamente alheio aos efeitos devastadores da bomba Ômega - a qual tirara as preciosas vidas dos tão perseverantes e empenhados membros da Resistência - , um homem, aparentemente de meia idade, vestindo um manto cinzento que ocultava a parte de seu rosto e esvoaçava com o vento extremamente gélido, estava parado acima de um prédio de 15 andares totalmente coberto pela couraça negra formada após a explosão... assim como toda a extensão que terminava em parte do pólo norte.

Observava calmamente a desolação do mundo dos mortais, resumida à lugares preenchidos por uma camada sólida preta, um céu cinzento beirando a um azul escuro tempestuoso e uma temperatura de -260ºC. Seus punhos cerrados tremiam. Não de frio. Mas de culpa. E, sobretudo, de raiva.

Ergueu um pouco a cabeça, logo abrindo os braços e os levantando ao alto com as mãos abertas.

Em milésimos, já não se encontrava mais ali.  

                                                                                       ***      

08 de Março de 1941

Inglaterra - Centro de Londres

Caminhando de forma um tanto trôpega pela calçada - além de ser ignorado por boa parte das pessoas pelas quais passava -, o homem encapuzado logo percebera a presença de uma bela jovem, de corpo voluptuoso, trajando roupas apertadas e uma capa com capuz vermelhos observando uma parede. Parou por alguns segundos para fita-la, a luz do pôr-do-sol banhando seu manto verde-escuro.

Testemunhou Rosie tirando o papel grudado na parede que antes estava encarando com um nítido pasmo, pelo que dava para ver através da distância que o homem estava. Após ver a jovem dobrar o papel e guarda-lo dentro da bota direita, a mesma discretamente relanceando o armazém para onde Hector fora comprar mantimentos, o homem tornou a andar, desta vez aparentando intencionar algo por meio do jeito como caminhava - meio corcunda -, direcionando-se à Rosie, embora se esforçava para fingir não nota-la.

Rosie, então, vira seu parceiro caçador saindo da loja segurando quatro sacos de papelão com os dois braços. Andou até ele, assumindo uma postura que lhe dizia estar agindo com total e absoluta naturalidade.

O homem andou mais rápido... e, meio que sem perceber, já havia esbarrado de leve com Rosie. Deu-se conta de que ansiedade por uma oportunidade de estar próximo à Rosie Campbell sobrevaleu sua concentração para uma maior eficácia do "plano". Contudo, no fundo estava satisfeito, mesmo não ocorrendo da forma que esperava. Seu braço direito bateu levemente no de Rosie.

- Oh, me desculpe. - disse ela, a fala rápida, tocando-o em apenas um segundo, logo voltando sua atenção à Hector.

- Estou bem, não foi nada. - disse ele, em tom gentil, voltando a caminhar.

Entretanto, ele cessara novamente seu percurso, virando-se somente para vê-la seguir seu caminho em direção à Hector.

Uma sensação de missão cumprida o preencheu de modo a não hesitar em realizar seus próximos passos. Se havia chegado ali com êxito, era obrigatório que agisse de acordo com o que havia jurado a si mesmo para reverter um problema e as condições que levariam à sua causa.

"Não serei perdoado. Jamais", pensou ele, não parando de observar Rosie nem por um segundo.

       _________________________________________________________________________

                                                                                       

Notas finais:

*O personagem surgido nas duas cenas finais deste especial se chama Údon, o Escriba de Abamanu, e a aparência de seu receptáculo é apresentada em "O Voo da Fênix", o décimo terceiro capítulo da temporada e o trigésimo sétimo da série, marcando sua aparição definitiva.

*Explicando as linhas temporais:

Introdução - O modelo é basicamente igual ao da famosa série de anime Dragon Ball Z (da qual sou fã confesso), onde uma viagem no tempo programada para o passado desencadeia na criação de uma linha do tempo alternativa, cujos acontecimentos não sofreram interferência do viajante, sendo assim duas linhas do tempo paralelas. Porém, em Capuz Vermelho só há um detalhe que se diferencia do modelo utilizado ao da obra de Akira Toriyama: Viagens ao futuro também causam mudanças e criações de novas linhas temporais.

Linha Temporal 01:

Descrita como a linha do tempo alternativa para onde Rosie foi enviada - como dito bem mais acima - e a linha que este especial trabalha e que não sofreu nenhuma interferência de Údon.

- 16 de Março de 1941: Rosie foi ao QG do Exército Britânico para participar de um reunião comandada pelo General Holt, mas foi acusada de omissão e submetida à interrogatório, tendo seu amuleto confiscado e seu nível de influência reduzido.

- 16 de Março de 1941: Rosie se encontrou mais uma vez com Mihos, na sala de interrogatório, algo que não ocorre na linha temporal oficial, onde ambos se conhecem em "Senhor Escarlate" e posteriormente não mais contracenam.

- 16 de Março de 1941: O General Holt desfez seu acordo com Sekhmet, não se importando se Rosie vivesse ou morresse, além de ter dado intervalos entre as duas operações de resgate.

- 27 de Março e 08 de Abril de 1941: Sekhmet tentou duas vezes assassinar Rosie - nos dois dias de operações do Exército, em Birmingham e Liverpool - e falhou em ambas, graças à Áker.

- 08 de Abril de 1941: Mihos abandonou sua casca, prometendo a si mesmo não retornar mais aquele mundo e não se alimentar de carne humana por um bom tempo.

- 08 de Abril de 1941: Hector aceita a proposta de Abamanu e torna-se seu receptáculo, já que é o verdadeiro, matando Mollock em seguida.

- 08 de Abril de 1941: Eleonor abandona sua casa após o ataque dos quiméricos e recorre a abrigos de pessoas desfavorecidas para manter-se fora do radar de suas inimigas, resolvendo permanecer fugitiva por toda a Inglaterra.

- 08 de Abril de 1941: Alexia é sequestrada por soldados quiméricos e, meses depois, infectada por uma versão especifica da substância criada por miméticos de nível Alfa a partir de rascunhos das fórmulas do Dr. Lenox. Com isso, alia-se à Abamanu e promovida à líder de esquadrão - miméticos Beta.

- 14 de Outubro de 1941: Charlie é morto por Abamanu após o mesmo tê-lo ensinado a romper seus limites para viagens dimensionais, através de uma combinação de sigilos criada pelo próprio mago do tempo - que tivera seu pescoço quebrado e, assim, morte instantânea.

- 21 de Março de 1942: A Legião dos Caçadores se reúne novamente após terem sido solicitados pelo Exército Britânico a agirem em conjunto com outros caçadores, originando a criação de uma resistência contra a calamidade.

- 22 de Agosto de 1942: Infecção nível Beta se alastra com mais força pela Europa.

- 18 de Setembro de 1942: A Resistência obtém a fita com a gravação de Lenox sobre a fórmula reversa.

- 09 de Outubro de 1942: Sekhmet é pega em uma armadilha planejada por Áker - que contou com o auxílio de Adam, Êmina e Lester -, tendo seus poderes totalmente sugados por um sigilo inibidor e condenada a ser prisioneira dos caçadores.

- 09 de Outubro de 1942: Áker, por ter assassinado outros soldados e não conseguir proteger Rosie como jurou, é condenado por Osíris a uma prisão especial, perdendo sua posição de arauto, bem como boa parte da energia concedida por Yuga que o tornava acima dos outros soldados.

- 17 de Dezembro de 1942: Sekhmet, agora como um mortal, é obrigada a aplicar a fórmula na prática.

- 05 de Janeiro de 1943: A Grande Guerra é cessada indefinidamente mediante aos números inacreditáveis atingidos pelo alcance da calamidade. Um consenso de trégua entre super-potências - sobretudo Alemanha e URSS - foi estabelecido.

- 12 de Janeiro de 1943: Abrigos subterrâneos são abertos à uma determinada quantidade de sobreviventes. Contundo, a maior parte da concentração de não-infectados pertence à nobreza, incluindo pessoas de grande influência e utilidade pública como chanceleres, prefeitos, senadores, militares e médicos. Outras classes sociais compõem cerca de 10% dos refugiados.

- 14 de Março de 1943: Alexia/Evilexia, exercendo o papel de chefe de esquadrão Beta, inicia uma série diária de saques, assassinatos e contaminações contra refugiados em locais de fácil acesso, juntamente com um exército de miméticos nível Beta em estágio de completude.

- 26 de Junho de 1943: A Fortaleza Beta - principal lar do esquadrão liderado por Alexia/Evilexia - tem sua construção iniciada.

- 12 de Julho de 1943: Com o Exército se desligando da Resistência aos poucos por escassez de recursos e busca por mais instalações seguras, A Legião (Adam, Lester e Êmina) firma aliança com um grupo misto de caçadores que outrora se diziam a Oficial Resistência Europeia (que aceitava membros de outras etnias), realizando uma fusão e um renascimento do exército de sobrevivência, passando a investir em armamentos pesados e grande quantidade de suprimentos. Como o acordo de união foi proposto pela primeira Resistência formada, a Legião teria de aceitar receber autorizações quando uma missão estivesse em planejamento.

- 25 de Novembro de 1944: Ocorre a missão de invasão à Fortaleza Beta oficializada pela Resistência Definitiva. Consequentemente, a bomba Ômega - contendo o nível supremo da substância tóxica - é disparada por um canhão sob as ordens de Alexia/Evilexia, matando todos os membros da Resistência, incluindo o trio da Legião, ao se alastrar em alta velocidade, causando a extinção de 95% da vida humana na Terra e, possivelmente, o fim da série.


Linha Temporal 02:

É a linha tida como a principal. Em outras palavras, é a linha que se tornou oficialmente única no enredo trabalhado pela série a partir de "Sinais do Fim (3x07)". Portanto, ela é a linha do tempo a ser desenvolvida adiante e a única a ter sofrido influências diretas de Údon. Foi criada graças à volta de Údon ao passado.

- Os eventos da 1ª e 2ª Temporadas e dos seis primeiros capítulos da 3ª.

- Entre 11 e 16 de Março de 1941: Áker começa a ter visões estranhas e misteriosas sobre algo de caráter grave relacionado ao plano de Abamanu e o dilema de Rosie, mas prefere manter isto em segredo até ter certeza sobre quem (ou o quê) está lhe enviando tais mensagens alarmantes.

- 16 de Março de 1941: Rosie se depara com Áker no Casarão quando estava prestes a sair para a reunião com o Exército Britânico a respeito das próximas operações da força-tarefa de resgate e desmanche das fábricas. No mesmo dia, o arauto a envia para o futuro (L3). Na volta, Rosie traz a fórmula da cura transcrita num papel e uma foto tirada com seus amigos antes da missão antecipada.

 - 19 de Março de 1941: Eventos da trilogia "Alfa, Beta e Ômega (3x08/3x09/3x10)".

- 23 de Março de 1941: Cena final de "Conhece-te a ti mesmo (3x11)".

E narrativa segue...


Linha Temporal 03:

Esta é a linha que Rosie criou graças à sua ida ao futuro da Linha Temporal 01. Parece bem confuso mesmo. Afinal, como a L1 pode, de repente, tornar-se a L3? Como dito acima: Viagens ao futuro também implicam na criação de linhas do tempo alternativas. Áker, em "Sinais do Fim (3x07)', enviara Rosie para o futuro apocalíptico, fazendo-a parar em um determinado momento crítico vivido pelos sobreviventes e a Resistência. A partir dali, Rosie foi o elemento influenciador que resultou na alteração de todas as probabilidades. E justo quando a missão de invasão a´Fortaleza Beta estava em plena fase de planejamento. A presença de Rosie antecipou esse evento, o qual, na L1, só viria a ocorrer meses depois. Mas somente o que acontece a partir da chegada de Rosie até a saída dela do futuro deve ser considerado como Linha Temporal 03?

Não. Ambos os futuros (L1 e L3) existem paralelamente. Não importa se Rosie tinha intenção de salvar seus amigos ao se juntar à eles na missão. Eles já estavam mortos no futuro da L1 em um evento similar, mas ocorrido em um período diferente. Obviamente, Abamanu saíra vitorioso nas duas linhas do tempo. O que acontece é o seguinte: Os eventos conhecidos da L1 fazem parte sim da L3, não apenas do momento da chegada de Rosie até a fuga dela. Não é porque Rosie veio de uma linha do tempo previamente alterada que ela deve servir como elemento significante para que uma outra possa existir, como se tal linha do tempo dependesse exclusivamente de sua presença e influência. Em outras palavras, a saída de Rosie daquele futuro - após a explosão da bomba Ômega - não "deletou" a L3. É a influência inicial de um elemento pertencente à uma outra dimensão que gera as mudanças significativas em meio à nova cadeia de eventos que se desenha a partir dela. A ausência deste elemento em nada modifica a realidade já permanentemente construída. Portanto, os eventos que precedem a criação da L3 - originalmente pertencentes a L1 - e os da própria, compõem, em totalidade, esta linha temporal. A quebra de uma linha do tempo por um viajante do passado não anula a existência dos eventos que ocorreriam caso não houvesse influência dele, gerando, por conseguinte, uma nova linha do tempo, que passa a existir em paralelo com aquela que seria única (no caso, a L1).

Por exemplo: Se Rosie, partindo do futuro da L1 que se tornou a L3 por sua causa, voltasse ao passado - em um momento de grande destaque - , uma quarta linha do tempo seria criada. Dependendo de qual evento ela testemunharia. Uma viagem dessas é suscetível ao risco de um paradoxo temporal, o que é extremamente perigoso, por justamente ser feita por alguém que desconhece o total controle de viagens temporais. Apenas divindades e relacionados podem fazê-lo sem sujeitarem-se à possíveis riscos. Logo, Rosie não deve, em hipótese alguma, utilizar o sigilo temporal que Áker desenhou.

Adendo: Não importando qual seja o meio - sigilos, brechas inter-dimensionais ou habilidade natural -, a viagem no tempo tem as mesmas consequências. Só por ser uma viagem pelo fluxo temporal, os resultados não se diferenciam pelos meios utilizados.

- Os eventos ocorridos na Linha Temporal 01: Até as 14 horas, 32 minutos e 21 segundos do dia 28 de Março de 1944 (data esta em que acontecem os eventos apresentados em "Sinais do Fim").

- 28 de Março de 1944: Rosie explora a Londres do futuro apocalíptico. Depois é atacada por uma horda de miméticos e reencontra seus amigos da Legião. Obtém conhecimento da cura, de Evilexia, dos miméticos Beta, de Sekhmet presa - e como uma mortal - e participa da missão antecipada à Fortaleza Beta, além de se encontrar com Abamanector.

*"Abamanector" (não é shipp, só um apelido carinhoso à essa "fusão" rs) utiliza o mesmo manto negro com um "broche" prateado no formato de meia-lua apresentado em "Sinais do Fim (3x07)" na Linha Temporal 01. A vestimento (em L1) foi confeccionada pela própria Evilexia, após a mesma ter jurado sua fidelidade ao reinado, chegando até mesmo a assumir o controle do continente, já que o deus lunar expandiu, a nível universal, todo o seu império reerguido graças à quebra de limitação.

*Existem (tanto na L1 quanto na L3) comandantes de exércitos - escolhidos a dedo por Abamanector -que, basicamente, ocupam posições similares à presidentes. Para cada continente há um comandante. Como dito no item anterior, Evilexia e sua horda de miméticos domina toda a Europa. As identidades de tais líderes são desconhecidas.

*Criaturas imunes à substância tóxica: Deuses (e associados), bruxas, magos, licantropos, vampiros (e vários outros seres sobrenaturais poderosos)... e Rosie Campbell.






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