Frank - O Caçador #44: "Sobre Meninos e Lobos"



Frank não iria mentir para si mesmo naquele momento: estava sendo sendo a missão que mais lhe exigiu força nas canelas para correr ao mesmo tempo que protegia uma vida resgatada do perigo obstinado. Segurando firmemente a mão direita do garoto de 10 anos de idade, chamado Brian, o detetive seguia frenético cruzando a floresta tanto mergulhada nas trevas da noite quanto banhada pela lua cheia. Brian apertava o passo junto à ele, tentando igualar o ritmo acelerado, seu fôlego já pedindo recuperação. Parecia que iam ter de percorrer a floresta inteira para chegarem ao sedã prata. 

O garoto havia sido raptado por uma alcateia de lobisomens para um propósito que Frank desconhecia. Não era um simples jantar servido. Maxwell, líder da alcateia que os perseguia vorazmente, reservava um destino específico para o menino. O exército de lobos negros e grandes corria pulando raízes no caminho e farejando os dois fugitivos. Frank percebeu que tinham se aproximado demais e pegou Brian se escondendo atrás de uma enorme árvore. O detetive se cobriu com umas folhas nuns arbustos, mantendo Brian ao seu lado como um tesouro inestimável que jamais deveria cair nas mãos erradas. 

- Conseguimos despis....

Frank tapou a boca de Brian. 

- Shhh. Lá vem eles. - disse Frank, o mais baixinho possível. Os 12 lobos passaram próximos da árvore e seguiram na mesma velocidade adiante.

- Eles são muitos. - disse Brian, temeroso - A gente se perdeu, não foi?

- Não, estamos no caminho certo. - disse Frank, verificando os arredores cuidadosamente - Anda, vem. Parece que se distanciaram. - pegara Brian pela mão novamente e ambos retomaram a corrida por uma outra direção. Frank mal podia descrever o alívio que sentiu ao ver seu carro à poucos metros. Brian se colocou à frente, ele mesmo abrindo a porta do carona sem nem Frank pedir. O detetive ficara surpreso como uma expressão de "nada mal". 

Frank entrara rápido, dando logo a partida ao girar a chave. Porém, o barulho do motor aparentemente atraiu uns lobisomens nas proximidade, os quais vieram em disparada para atacar o carro. Os lobos estavam nos dois lados do veículos, suas mandíbulas quebrando os vidros. Da esquerda, Frank socava o lobo que tentava abocanha-lo insanamente, seus olhos vermelhos parecendo brilharem no escuro. Na direita, Brian se afastava dos dentes do lobo que o atormentava. Frank pegou seu rifle e deu uma coronhada forte no que o atacava, conseguindo afasta-lo, e depois atirou contra o lobo que estava quase mordiscando um acuado Brian. O tiro acertou-o bem na cabeça. 

- Fica aí, não sai! - ordenou Frank ao garoto. O detetive saíra do carro, agindo rápido em dar um tiro bem na cabeça do lobo que levou a coronhada antes que o mesmo pulasse para um ataque fatal. Voltara ao carro, desta vez pisando fundo e acelerando. Sem nenhum dó, Frank atropelava lobisomens que surgiam no percurso partindo para cima do carro. A fuga desesperada custou o espelho retrovisor direito, arrancado na batida com uma árvore. Após ficarem longe da floresta, o carro deu uma parada, encostando na beira da estrada. A pausa serviu para a dupla readquirir a calma e o fôlego. 

- Por que aqueles caras estavam atrás de você? Monstros como ele pegam e matam no mesmo dia. Você tava, pelo que eu vi, recebendo serviço de hotel três ou quatro estrelas. Com certeza você não foi uma vítima qualquer. 

- Eles me querem porque sou especial. - disse Brian, sério - Mas eu não sou como eles, eu juro. 

- Claro que não, você é uma vítima, está com medo, quer voltar pra casa e pros seus pais...

- Eu tenho apenas meu pai. Minha mãe se foi quando eu era bebê. - revelou Brian.

- Ah... Então, Brian, não entendi bem o que quis dizer com não ser como eles. 

O menino virou o rosto para Frank mostrando olhos vermelhos e presas afiadas, fazendo-o quase saltar do banco para fora do carro. O espanto de Frank se estampava na face, 

- Só pode ser brincadeira... 

- Por favor, detetive. Tem que proteger meu pai, vai sobrar pra ele também. Eu te imploro. - pediu Brian. 

Frank suava ainda mais em profusão após ouvir a súplica vendo aquela face mista de animal e humano. Uma parte sua relutava em ter que ser "babá" de um menino-lobo para mante-lo são e salvo. 

Longe dali, Maxwell, sob sua forma lupina, corria até a beira de um precipício, projetando seu peito para frente como a figura de um líder exigia. Com a lua cheia acima iluminando-o, soltou um poderoso e agudo uivo de alta extensão. Alguns lobisomens pertencentes a outras alcateias, mantidos em suas formas humanas, em lugares distintos, escutaram o uivo à vários quilômetros. Os olhos de cada um deles adquiria um tom de escarlate assim que ouviam o uivo, virando seus rostos na direção da lua e sendo atraídos pelo som parando tudo o que estavam fazendo. 
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CAPÍTULO 44: SOBRE MENINOS E LOBOS

Departamento Policial de Danverous City

Ernest estava sentado à sua mesa com os cotovelos apoiados e as mãos juntas diante da boca numa análise fria da "batata quente" que Frank tentava passar para ele. Brian sentia-se pouco à vontade no ambiente cinzento da sala do diretor, ainda mais apreensivo com seu futuro breve para escapar dos seus raptores que a todo custo fariam sucessivas tentativas. 

- Eu lamento profundamente te dizer isso, Frank... Mas terá mesmo de pedir um aval do superintendente. A custódia de uma vítima menor de idade transferida a um agente requer esse processo. Não vamos ser loucos de violar os regulamentos. 

- E eu não vou ser louco de deixar o Brian nas mãos de um psicopata com fetiche de ver monstros como ratinhos de laboratório. - retrucou Frank - Sem ofensa, Brian. - disse ele ao garoto à sua direita. 

- Relaxa, é isso que eu sou. - disse o menino que vestia um casaco marrom claro com capuz por cima de uma camisa vermelha e calças jeans. Virou seu rosto branco de bochechas meio cheias para o detetive, os olhos castanhos fitando-o - Você não tem que esconder o que pensa só pra não me magoar. 

- Escuta, Brian, o que acontece é o seguinte: Você me garantiu nunca ter cravado os dentes em um braço ou uma perna antes, significa então que você não despertou seu instinto animal. Mas tô surpreso porque é a primeira criança com maldição de lobisomem que já vi em toda minha carreira de caçador. 

- Se Frank não sabia que lobisomens procriavam, quanto menos eu. - disse Ernest. 

- Na verdade, minha mãe também era... uma coisa parecida. Meu pai chamava de kitsune. 

- Kitsune? As lendárias raposas de nove caudas do folclore japonês? Elas existem? - questionou Ernest, pasmo - Bem, anjos bons, anjos maus, demônios e híbridos dessas criaturas existem, mas nunca imaginei que certas figuras como essa pudessem ser reais. 

- Esqueceu do que eu falei pro senhor, né? Depois que comi o pão que o diabo amassou não descreia de mais nada. - disse Frank - E as kitsunes não são novidade pra mim, embora nunca cheguei a caça-las. 

- Aqueles caras querem meu sangue, literalmente. - disse Brian, desconfortado - Passei a entender porque meu pai era tão super-protetor comigo toda vez que estávamos juntos. Agora vão atrás dele. 

- Não se eu puder evitar. - afirmou Frank, a determinação evidente na voz - Enquanto protejo a vida dele, você fica aqui com alguém responsável. Foi por isso que não arrisquei te levar pra minha casa e te deixar sozinho. 

- Esse alguém não sou eu, certo? - perguntou Ernest, levantando uma sobrancelha. Frank o olhou nervosamente e a percepção do chefe captou a resposta - Basta, Frank. Você vai agora mesmo pedir uma autorização ao superintendente e ponto final. É uma ordem de alta prioridade. 

- Calma, o senhor não vai ser a babá do Brian. Vou pedir pra algum segurança ficar de olho nele.

- Por que vou ser vigiado? - perguntou Brian, desconfiado - Tá achando que vou me transformar?

- Não, não é bem isso, Brian, é que... - procurou as palavras certas na mente - ... você precisa de toda a segurança possível quando eu não estiver por perto. A turma desse tal de Maxwell tá ligada que sou do DPDC e a qualquer momento podem entrar disfarçados pra te farejar e capturarem de novo. 

- Segurança este que deverá ser designado pelo superintendente. - avisou Ernest, aborrecendo Frank. 

- Diretor, é perigoso demais confiar o Brian à ele. Vai querer saber a verdade, não importa qual desculpa eu invente. 

- Saiba mentir se não quiser possíveis complicações pelo fato do menino ser um monstro... digo... 

- Já disse que não tem nada demais me chamar assim. - interrompeu Brian - E aí, vamos ou não falar com esse cara tão perigoso? De qualquer forma, eu já corro perigo apenas por ser quem eu sou. 

- Tá OK. - disse Frank, levantando-se - É um obstáculo difícil, mas a gente não tem que amarelar. É tudo ou nada. 

                                                                                ***

No relógio da cabana de Maxwell marcavam onze e meia. O líder da alcateia deliciava-se com uma dose de uísque velho, balançando o copo lentamente sentado à sua mesa de madeira com os pés sobre ela. Max tinha um cabelo castanho meio longo, os fios quase tocando os ombros, uma aparência basicamente rústica, até cabível para um lobisomem veterano. Cofiou seu cavanhaque olhando para o relógio enquanto seus onze homens jogavam baralho numa mesa redonda próximo à ele. 

- Bati de novo nessa merda! - comemorou um deles, um homem grandalhão e careca usando colete marrom, jogando as cartas na mesa - Os otários vão querer revanche? - perguntou, esfregando as mãos.

A partida de poker foi interrompida com a chegada repentina de cinco homens. Maxwell sabia muito bem quem eram, por isso levantou-se rapidamente para tratar de avisar seu grupo sobre as visitas. 

- Calminha aí, pessoal, todo mundo relaxado, eu que chamei esses caras. Reforços de última hora. 

- Você usou o uivo de longo alcance, né? Espero que tenha atraído bons rapazes. - disse um lobisomem afrodescendente com um palito de dente na boca. 

- Nunca se confia em facções rivais. - palpitou outro - A gente sabe por experiência própria. 

- Isso diz muito. - falou o visitante que estava à frente dos outros quatro, um homem repleto de tatuagens pelos braços usando uma camisa regata preta e uma corrente de prata com uma caveira de pingente - Como querem trabalhar em equipe desse jeito? Não é querendo provocar, mas... Se estiverem com medo da decepção, desistam enquanto há tempo. Enfim, o nosso papo reto é com o mestre. - olhou para Maxwell com interesse - Ouvimos o seu uivo. Bem no tom de um líder. 

- Foi como música pros nossos ouvidos. - disse o que estava à esquerda. 

- É um chamado para a missão mais importante das suas vidas. - disse Maxwell - Nos últimos dias, pegamos um garoto que tínhamos certeza de que é um híbrido com o sangue imortalizador. 

Os cinco riram como se tivessem escutado uma boa piada que nunca enjoava. 

- E aí, Max? Vai deixar os pela-sacos tirarem uma da tua cara? - indagou um dos lacaios. 

- Não esquenta, já sabia que iam duvidar. Escutem aqui vocês. Tô falando sério. O moleque é sim um híbrido legítimo, puro, novinho em folha pra ser rasgado por uma lâmina e nos saborear com uma cascata de sangue à luz da lua cheia na hora do eclipse. Vão dispensar essa fácil assim? Talvez ele seja o único. 

- Se vocês fossem tão bons no que fazem, sabe, uma alcateia digna pra dar uma moral, teriam pego o garoto e mantido ele num cativeiro mais adequado. - disse o tatuado, visualizando melhor o interior da casa.  

- Pois é, esse muquifo é farol pra caçadores. - concordou um outro lobisomem que atendeu ao chamado - Não me admira terem perdido o híbrido pra um caçador de meia tigela em pouco tempo. 

- Meia tigela? O cara era um armário. - disse outro dos lacaios de Maxwell - Desceu o maior sarrafo em alguns de nós e fugiu com o moleque. 

- Ah então é o contrário. Caçador bem treinado contra lobisomens de meia-tigela. - retrucou ele, instigando no outro o desejo de partir para a violência, mas apenas rosnou para demonstrar. 

- Vocês não parecem ter noção de pra onde o caçador levou o garoto. - disse o tatuado. 

- Vamos traze-lo de volta. - disse Maxwell, confiante, em seguida  tomando o último gole do uísque - Mas dizem que a pressa é inimiga da perfeição, né? Como não temos um lugar decente pra trancafia-lo, vamos esperar até amanhã. 

- Mas amanhã é a noite do eclipse. - ressaltou o lacaio careca e brutamontes de Max. 

- Por isso mesmo. Tem que ser um dia especial. De preferência pra pegar e matar dois coelhos com duas pauladas. - disse Maxwell, não facilitando o entendimento dos seus discípulos e convidados. 

- Quem mais além do garoto teremos que levar pro mato? - perguntou o tatuado. 

- O pai dele. E já sei de um jeito de descobrir onde o híbrido está agora. Mas quero deixar que ele pense ter se livrado de nós e que está 100% protegido pelo caçador. - disse Maxwell - O que acham? 

O quinteto transparecia concordância diante da estratégia. Maxwell destacou seu copo vazio.

- Estão afim de uma bebida? - perguntou ele, mostrando-se um bom anfitrião. 

                                                                                 ***

Frank estava frente à frente novamente com Hoeckler com Brian ao seu lado. O detetive pôs a mão direita no ombro do menino e tentou controlar a insegurança de lidar com o superior mal-caráter.

- Eu peço que o senhor permita uma custódia temporária pra esse garoto, ele foi vítima de sequestro e não posso reaproxima-lo do pai dele pois ele também tá na lista negra dos bandidos. 

- Uma escolta pra um menino que não pode se reencontrar com o pai? - questionou Hoeckler. 

- Não exatamente escolta-lo, mas oferecer pra algum segurança o trabalho de vigia-lo por um tempo enquanto cuido de blindar o pai dele que é advogado. Os caras o juraram de morte e descontaram no filho. 

- Entendo perfeitamente. - disse Hoeckler, parecendo convencido da explicação... mas apenas parecendo. Voltou-se para Brian com um sorriso falsamente amigável - Muito bem, rapaz. Já conheceu o nosso playground? Tem pinball, fliperama, sinuca etc. Fica à três corredores daqui, siga à direita. É restrito pra funcionários na hora do intervalo, mas pra você abro uma exceção. Por que não vai lá enquanto Frank e eu discutimos o seu caso a sós? - tocou-o no ombro e Brian não esboçou nenhuma expressão recíproca. Ele olhou para Frank que sentiu-se obrigado a permiti-lo sair. 

Brian andou até a porta, saindo da sala. Hoeckler parecia mais à vontade. 

- Agora me diga o que realmente significa proteger este garoto. - disse Hoeckler, autoritário. 

- Você não vai sossegar, né? Com essa ambição maquiavélica de trancar monstros em celas pra estuda-los. 

- É parte do lema da fundação: Estudar, Segurar e Proteger. 

- Proteger a quem? A humanidade ou vocês com seus terninhos de luxo? Sabe como eu imagino vocês trocando umas ideias? Fazendo reunião numa sala inspirada na Estrela da Morte. - disse Frank, exasperado - Só sei que você não é o Darth Vader dessa parada. 

- Eu lhe fiz uma pergunta, agente Montgrow, responda. 

- Tá legal, comandante. - disse Frank, soltando um suspiro pesado - O garoto é um lobisomem. Uma alcateia quer ele como um troféu pra drenar o sangue dele por ser um híbrido de lobisomem e kitsune. Tá satisfeito? 

- É claro que não, afinal você acaba de expor todos ao perigo. Leve-o pra sua casa, é lá que deveria estar. 

- Não quis deixa-lo sozinho porque ainda vou tratar da situação do pai dele. É só mandar um segurança ficar observando. A qualquer sinal de hostilidade... 

Hoeckler ficou curioso com as palavras que sairiam da boca de Frank. 

- Permissão pra atirar. - completou ele - Não é isso que ia dizer? - deu um sorrisinho infame de canto. 

Frank tivera um leve surto de raiva ao pensar em Brian sendo morto por um agente da ESP e agarrou a gola do paletó de Hoeckler com as duas mãos. 

- Olha aqui, eu não quero ninguém do seu pessoal triscando um dedo no Brian sem necessidade. OK?

- Enlouqueceu? Me largue! - disse Hoeckler, tirando as mãos à força. Andou pela sala, estressado - Como você ousa se dirigir à mim dessa maneira? Eu sou a droga do seu superior! 

- O Brian é só uma criança, merda! Vai dar ordem de atirar num garoto de 10 anos sem saber se ele vai se descontrolar a ponto de sair querendo fazer um lanchinho pelos corredores? 

- Medidas drásticas servem justamente para cenários como esse. - retrucou Hoeckler - E eu não vou hesitar caso um funcionário meu, seja do DPDC ou da ESP, morra pra esse menino lobo. É meu ultimato, Frank. Alguém se fere... e o seu filhinho adotivo temporário morre. Ou talvez eu obrigue você a puxar o gatilho. Pensar nisso me faz torcer pra que aconteça. - Frank o encarava raivosamente. 

- O Brian vai sair dessa... vivo. Ou meu sobrenome não é Montgrow. - direcionou-se à porta. 

- Não saia daqui achando que teve a última palavra. - provocou Hoeckler que obteve o silêncio frio do detetive. Passou a mão na boca, cada vez mais repudiando o comportamento de Frank. 

                                                                            ***

Retornando à sua sala, Frank surpreendeu-se ao ver Brian sentado na cadeira de visitantes. O detetive parou na porta, estranhando. 

- Brian? Pensei que tava no playground. - disse ele, fechando a porta e aproximando-se. 

- Não tem playground nenhum. Procurei, procurei e... - deu de ombros. 

- Aquele filho da mãe. - na sua mente xingava Hoeckler de muitos nomes - Bem, tenho que me virar em dois hoje. Matar a saudade das horas extras. - foi sentar na sua cadeira, ligando o computador - Além de fazer o trabalho da minha assistente que recebeu folga de dois dias. Vou dar uma pesquisada aqui sobre as kitsunes. 

- Meu pai guardava um amuleto da sorte. - disse Brian despertando a curiosidade de Frank - Eu não acreditava muito nisso, mas ele me garantia que a mamãe gostaria que eu usasse o tempo todo. 

- E cadê esse amuleto? É algum artefato especial em relação às kitsunes?

- Acho que sim. - disse Brian, incerto - Tem só valor sentimental, não deve me proteger de verdade. 

Frank virou-se para a tela, digitando na pesquisa o nome kitsune. Porém, o toque de um celular quebrou a concentração do detetive que franziu o cenho para Brian. O garoto retirava do bolso um celular. 

- É o meu pai. 

- Peraí, se você tá com um celular, quer dizer que... - pensou um pouco - O seu pai sabe que você foi sequestrado, Brian?

Brian fez que não com a cabeça. Ele atendeu a ligação e levou o aparelho ao ouvido esquerdo. 

- Alô, pai, sou eu e... não tô em casa. Pra dizer a verdade... - olhou para Frank - ... aconteceu o que o senhor tanto tinha medo. Eles conseguiram me pegar. Mas já estou bem, o detetive Montgrow tá se encarregando de me manter seguro. Como foi a viagem? 

- Brian, me passa o celular. - pediu Frank, estendendo a mão direita. O menino relutou - Por favor. 

- Espera, ele quer falar com o senhor. - disse Brian, logo entregando o celular à Frank - O nome dele é Howard. 

- Olá, Howard, aqui quem fala é o detetive Frank Montgrow, assumi o caso do seu filho por interesse particular. Em outras palavras, pra ser direto, eu sei que os raptores dele são monstros carniceiros. 

- Eu tô falando com um caçador, é isso? Meu filho... sob a proteção de um caçador. E eu achando que esse pesadelo não tinha como piorar... 

- Olha, não interpreta mal o que acabei de falar. Eu me referia à eles, a alcateia do Maxwell, eles vinham rondando vocês há um bom tempo, segundo o que Brian me contou. 

- Engano seu, detetive. Quando chamou de monstros carniceiros, definiu exatamente o que lobisomens são. - redarguiu Howard - Eu e meu filho estamos inclusos nisso, certo? 

Frank ficara emudecido por alguns segundos, incomodado com o clima desagradável que se instalou. 

- Howard, compreendo você não confiar nos caçadores, mas posso te garantir que tô disposto a servir de escudo pro Brian seguir em frente até o fim desse problema sem nenhum arranhão. 

- Isso... me tranquiliza, de certa forma. - disse Howard, o tom de voz não passando muita segurança - Tô pegando uma estrada longa, indo pro aeroporto, só volto depois do meio-dia. 

- Você tem a minha palavra. Não vou cometer a loucura de matar seu filho pela natureza dele. Ele não tem culpa de nascer como nasceu. - fez uma pausa - Me diz uma coisa: Se você tava fora, com quem o Brian ficou? 

- Chamei o vizinho, um amigo, o nome dele é Barry. É uma viagem de dois dias, ele topou na hora. Imagino o tempo que eles gastaram jogando videogame. 

- Diz que ele morreu. - disse Brian, quase sussurrando. Frank arqueou as sobrancelhas, espantado. 

- Ahn... O Brian me falou que o Barry está morto. - fez um gesto de cabeça para pedir mais informações. No outro lado da linha, Howard se inquietava abalado com a notícia. 

- O bando do Maxwell devorou ele. - revelou Brian - Eu vi tudo, foi horrível. 

- Ele tá dizendo que presenciou a morte do Barry... que foi vítima da alcateia do Maxwell. Obviamente foi nesse momento que pegaram o Brian. Eu não sabia da identificação do corpo, só fui lá ver pelas descrições do crime que associaram a um ataque de cão raivoso e eu, claro, associei a um ataque de lobisomem. Fui pra reserva florestal e uns moradores de lá denunciaram ataques recorrentes contra animais e pessoas. Lugar cheio de mato é terreno fértil pra lobisomens se agruparem e caçarem. Daí eu deduzi que havia uma cabana ali pelas redondezas e encontrei uma... justo a que a alcateia do Maxwell usa de quartel-general. - relatou Frank - Não me agradeça ainda, eles vão persistir. 

- É lógico que vão. O Brian pode ter dito à você o que eles tanto querem, mas ele não sabe o resto. 

- Amanhã a gente se vê e você me conta. E de quebra trago você pra cá. 

- Pra onde? Na delegacia? 

- Aqui no DPDC. Vocês ficam juntinhos enquanto dou um jeito na cachorrada. Que tal? 

- Desculpa, mas tem que priorizar o Brian. A minha vida de nada vale comparada à dele. 

- Eu tenho certeza que o Brian diria a mesma certeza sobre você. - contra-argumentou Frank - Toda vida inocente vale a pena, Howard. Não faz sentido deixar você desprotegido, sendo você também um alvo, apenas pra que o Brian saia ileso. 

Brian fazia ideia do quão séria estava a conversa e não tirava os olhos de Frank. 

- Está bem, está bem... Dá pra vir à noite, por mais arriscado que seja? Vou estar mais desocupado por volta das sete.

- Fechou. Te vejo amanhã. - disse Frank, logo finalizando a chamada - O seu pai é daqueles que confia desconfiando, né? 

- Ele nunca gostou muito de caçadores. Mas juro que ele nunca machucou ninguém. - declarou Brian.

- E acredito piamente. Lobisomens diferentes merecem ser protegidos por caçadores diferentes. - afirmou Frank, sua expectativa para o dia seguinte provando-se a mais otimista possível - Bem, voltando à pesquisa. - retomou sua tarefa de buscar dados sobre kitsunes que não constavam nos arquivos do legado Montgrow. 

                                                                                 ***

Na manhã seguinte

Hoeckler finalmente havia disponibilizado um segurança armado para tomar conta de Brian dentro de uma pequena sala de reuniões. O meio-lobo e meio-kitsune distraí-se jogando no celular sentado numa poltrona giratória vermelha. O guarda também mexia no seu, igualmente distraído. Até que Brian ergueu os olhos para ele, observando-o. 

- Você é assim sempre tão quieto? - perguntou ele, querendo puxar alguma conversa. 

- Só quando faço meu trabalho. Tipo agora. - respondeu o segurança. 

- Quer jogar comigo? Podíamos fazer uma competição. 

O guarda deu um sorriso tímido, parecendo consentir. 

Ao cair da noite, pontualmente as sete, Frank dobrava com seu sedã prata para a rua onde ficava a casa de Howard e Brian. Avistou um homem caucasiano de camisa preta, rosto quadrado, cabelo preto num corte basicamente social e porte meio esguio na frente da residência. O detetive encostou o veículo na calçada e saíra ativando o alarme. 

- E aí, você deve ser o detetive Montgrow. - disse Howard, indo até ele. 

- Em carne e osso. Mas não comestíveis. - brincou Frank esperando que Howard levasse na esportiva, o que não se viu muito bem. O pai de Brian desfez a face simpática para expressar certo constrangimento.

- O que estamos esperando aqui fora? Venha, pode entrar. - disse Howard, virando-se para recebe-lo em casa. 

- Pra um lobisomem que não leva fé na boa-fé de um caçador, você tá sendo um poço de gentileza. - comentou Frank, adentrando na casa. Howard acendeu as luzes, iluminando a sala organizada. 

- É o tratamento certo pro cara que jurou salvar a vida do meu filho. Você é uma raridade, Frank. - disse Howard, satisfeito - Assim como o Brian, você é único. Percebo quando alguém é inteiramente honesto e pude sentir no tom das suas palavras. Bem, aqui estou eu, entregue pro que desejar fazer pra manter dois lobos distintos longe de um exército insano. 

- Antes você podia me falar um pouco sobre a mãe do Brian? Ele mencionou ontem um amuleto da sorte que você guarda de lembrança e diz que tem um poder protetor. 

Howard achara graça ao ouvir aquilo, sabendo que Brian tinha dúvidas sobre o objeto. 

- Sobrenaturalmente, não significa nada. Mas sentimentalmente, sim. Eu falava que o espírito dela o protegeria onde quer que fosse se o usasse como seu cordão da sorte. Pra reconforta-lo. 

- Brian me disse nunca ter acreditado nisso. Ele é um garoto esperto. - era hora de Frank abordar uma questão crucial - Tem outra coisa, bem mais importante agora: Qual o lance da alcateia do Maxwell? O que faz do Brian tão útil pra eles? 

- Desde o início da gravidez da Naomi, discutimos isso. - revelou Howard, nervoso - Se um dia algum lobisomem faminto e mal-intencionado soubesse da existência de um híbrido de kitsune e lobo, a notícia ia se espalhar entre as maiores alcateias da cidade em poucas horas. Não sei como souberam, mas não importa. Eles tinham vantagem com o fim da minha viagem pra hoje. 

- Como assim vantagem? O que o sangue do Brian tem de tão especial? 

- Maxwell quer criar uma alcateia de lobisomens imortais. O sangue do Brian concede esse poder ao ser bebido durante um eclipse lunar, praticamente um ritual de sacrifício. 

- E quando é esse eclipse?

- Daqui à três horas, mais ou menos. Mas com o Brian isolado, eles perdem a chance. 

As janelas estilhaçaram-se repentinamente quando dois lobisomens da alcateia de Maxwell invadira a casa. Howard afastou-se, impactado com a chegada súbita. Frank sacou rapidamente seu revólver munido de balas de prata. Outros dois surgiram arrombando a porta que cedera ao chão. 

Um dos lacaios de Maxwell foi direto para cima de Howard que tentou derruba-lo para o outro lado, conseguindo segura-lo e joga-lo contra uma mesa com tampo de vidro. Frank trocava socos com os outros dois que não faziam parte da alcateia principal depois de ter sua arma tirada da sua mão. O detetive levou uma cotovelada forte no queixo, sendo derrubado no chão. Se arrastou rápido ao visualizar a arma largada e mirou-a no lobisomem que preparava um próximo golpe. Atirou a bala prateada na cabeça, depois levantou-se, chutando o outro que vinha agredi-lo. Howard jogara um vaso sobre a cabeça do outro lacaio de Maxwell, depois avançou contra ele feito um touro brabo o empurrando para fora da casa. Frank, para não ser pego de guarda baixa, notou que um estava por trás dele pronto para usar um caco de vidro e dilacera-lo, mas virou-se e disparou contra a cabeça dele. 

Porém, isso deu brecha para o outro agarrar Frank com uma chave de braço no pescoço. Howard pegara uma cadeira perto do sofá e quebrou-a violentamente na cabeça do algoz, livrando Frank do aperto que o mataria sufocado caso não agisse logo. Frank sacou uma grande lâmina de prata e se virou para finca-la na lateral do pescoço do lobo atravessando-o. O último que ficara no lado de fora avançou como uma fera, mas Frank efetuou um tiro certeiro na cabeça que nem o permitiu entrar de novo. 

- Fiquei convencido de uma coisa: Você é um prodígio. Não queria estar na pele deles. - disse Howard.

- Se sair da linha, já sabe, né? - indagou Frank numa nova tentativa de quebrar o gelo - Ahn... 

- Tá bem, você tava brincando. Eu faço somente a dieta do esquilo e da lebre. 

- Menos mal. Vamos nessa, o Brian tá louco pra rever o pai dele. - disse Frank, saindo apressado. 

Após saber do fracasso da missão de assassinar Howard, Maxwell, transformado, conduziu seus lobos para o penhasco onde emitiu o uivo de extensão ampliada. Desta vez chegara o momento de expandir um uivo ainda mais poderoso. Todos os lobisomens sincronizadamente uivaram alto. O som se estendeu de tamanha forma que alcançou os ouvidos de Brian que estava diante do espelho mexendo no seu cabelo para fazer um topete. O garoto alterou a expressão, os olhos se avermelhando e as presas crescendo tal como as garras. O guarda voltou depois de uma pausa para tirar urinou. Mas deparou com o garoto de costas agindo estranho.

- Ei... Brian? Não disse que ia dar um trato no seu visual? 

O menino-lobo virou-se para ele, rosnando feito um cão, os olhos totalmente vermelhos e as presas enormes à mostra. Brian, dando um salto, avançou selvagemente contra o guarda que soltou um grito apavorado. 

                                                                            ***

Às pressas, Frank e Howard desceram do carro próximo ao estacionamento e correram ao escutarem vozes alteradas andares acima. Pegaram um elevador que subiu ao quarto andar. Ambos mal deram um passo de tão perplexos que ficaram com a confusão nos corredores. Pessoas feridas e sangrando sendo carregadas em meio a um corre-corre quase pandemônico. Frank parou um policial. 

- Ei, vem cá! Que bicho tá pegando por aqui? 

- Literalmente um bicho. - respondeu ele, sua mão esquerda com uma ferida que ele cobria com a outra - Quem trouxe esse moleque estranho? Olha o que ele me fez! - mostrara enfim a mordida. Frank franziu o cenho recuando um pouco o rosto pela feiura do machucado - Saiu mordendo geral a torto e a direito feito um cachorro que não tomou vacina anti-rábica!

- Olha, muita calma nessa hora, corre pra enfermaria. 

- Enfermaria? Eu preciso de uma ambulância, isso sim!  

- Frank, a gente não tem tempo a perder, o único jeito de parar Brian é irmos até lá. - disse Howard, ansioso para frear o instinto feroz do filho. Os dois andaram a passadas largadas para onde a confusão estava mais concentrada. Brian estava num banheiro ameaçando morder um zelador que tremia na base encarando os dentes afiados, andando para trás até encostar suas costas na parede. 

- Brian, pára! - ordenou Howard, chegando a tempo - Já chega, esse não é você, filho! 

O garoto voltou-se para Howard, reduzindo a ferocidade na sua expressão. O vermelho vivo dos olhos desaparecia. As presas diminuíam. As garras voltaram a ser unhas humanas. Brian foi correndo para dar um abraço apertado no pai. Frank suspirou aliviado que a simples presença de Howard contornou tudo. 

Mas os problemas não cessaram. Do seu escritório, Hoeckler discava um número do telefone fixo. 

- Conselheiro Hoeckler falando. Traga uma equipe de força-tarefa móvel imediatamente. O lobo atacou as ovelhas. - disse ele, desligando em seguida. Saiu da sala procurando por Frank, mas sentia que a ausência do detetive por todo o departamento. Para sua surpresa, Ernest passava por ali e uma troca de olhares desconfiados foi inevitável - Duvemport, achei que estivesse ocupado com sua campanha. 

- Eu ainda não tirei licença pra me dedicar totalmente á ela. É mesmo, você não vai me conceder. 

- Viu o agente Montgrow por aí? Está o ajudando a fugir da minha advertência pelos danos que ele causou? 

- Eu que o mandei recorrer ao senhor para solucionar o caso do menino. Não deu muito certo, pelo visto. - disse Ernest num tom provocativo - Mas se quer saber no que quero ajuda-lo... É em preservar a integridade dele enquanto ele for meu agente prioritário. - aquilo esclareceu as coisas para Hoeckler. 

- Você também está a par, né? Saiba que se mover um dedo pra obstruir qualquer plano nosso, sou capaz de reduzir à sua carreira policial e política... às cinzas. - disse, aproximando seu rosto - Num estalar de dedos. - estalou os dedos. 

- Pelo Frank eu sacrificaria as duas. Principalmente se a vida dele for atentada. - retrucou o diretor - É o que se chama de colocar os amigos acima dos interesses pessoais. Homens como você nunca irão entender isso. - encerrara, retomando sua andança pelo corredor. O desprezo no olhar de Ernest ficou gravado na mente de Hoeckler por uns bons segundos, enxergando nele um obstáculo potencial de ser eliminado, se numa determinada ocasião for preciso. 

                                                                                 ***

Frank levara Brian e Howard para sua casa como um último refúgio seguro, ciente de que Hoeckler solicitaria membros da ESP para cumprir a ordem de matar o garoto. O detetive entrou logo após os dois, acendendo a luz do abajur. 

- À essa altura os homens do segundo emprego do meu maior chefe devem estar varrendo o prédio atrás de uma agulha no palheiro. - disse Frank.

- Tem certeza que não somos incômodo? - perguntou Howard. 

- De jeito maneira. Sintam-se em casa. - respondeu Frank, hospitaleiro. 

- Você falava bem sério sobre esse seu chefe. É verdade que ele prometeu te forçar a matar o Brian?

- Sim. No caso dele partir pro ataque. Afinal, por que Brian de repente teve esse gatilho de fome?

- Aqueles desgraçados. - disse Howard, sentindo-se cansado - Na certa, Maxwell e todo o resto da alcateia fez o uivo sincrônico. 

- Verdade, ouvi um som de uivo como se fosse no pé do meu ouvido. - disse Brian. 

- Quando o líder e seus asseclas uivam em conjunto, ativa um interruptor no cérebro de um híbrido que o faz se render à fome. É quase um controle mental. 

- Ahn... Eu tenho algo a contar. - disse Brian, meio retraído - Desculpa pai, mas... - baixou a cabeça, tristonho - Eu que matei o Barry.

- Você o quê? - indagou Howard, pasmo - Então... Foi assim que eles te encontraram. Já havia acontecido antes. Frank, infelizmente você falhou, todos nós falhamos. O uivo sincrônico é um recurso que rastreia um híbrido a partir do derramamento de sangue. - o advogado parecia surtar a qualquer instante - Howard feriu muitos lá no DPDC. E quando um híbrido cede ao instinto, não importa onde ele vá, fica exposto, como se tivessem plantado um rastreador. 

- Por que a gangue do Maxwell não tentou isso desde ontem? 

- Talvez pra esperar até a noite do eclipse. 

De inesperado, um porrete desceu sobre a cabeça de Frank num golpe covarde. O detetive caiu desmaiado, vendo as figuras de Brian e Howard tornarem vultos desfocados até seus olhos fecharem-se na escuridão. Ao acordar, sentiu terem se passado várias horas. Viu-se num ambiente florestal, um espaço cercado por tochas que crepitavam sob o uivo de vários lobisomens transformados que estavam em rochas formando um semi-círculo. Depois percebeu que seus pulsos estavam atados por cordas. Com a visão melhor ajustada, vira Howard num tronco também amarrado e em seguida Brian preso à uma longa estaca de madeira fincada no solo e diante dele Maxwell portando uma faca. 

- A cerimônia já começou. - disse Maxwell - Acordou pontualmente, hein, caçador. É, seus batimentos cardíacos aceleraram um pouquinho. Fica quietinho aí e aproveita o show junto do papaizinho. - deu uma risada zombeteira olhando para Howard com escárnio. 

- Por favor, não me mata. - suplicou Brian - Se quiser sangue, posso te dar quando quiser.

- Parece que não entendeu o jogo, né? Esse é um momento único pro nosso sonho se realizar. Pensa que um eclipse desses acontece ano após ano? A gente vai te sugar até a última gota, moleque. Hoje. - levou a ponta para a bochecha de Brian, espetando-a. A lua se eclipsava. Frank tentava afrouxar o nó das cordas esforçadamente. Maxwell estava prestes a deslizar a faca sobre a garganta de Brian. Sem que os demais lobos notassem, Frank movia os pulsos mais livremente, desatando o nó com menos força - Antes que a lua de sangue apareça, melhor rasgar um ponto bem irrigado. 

Frank soltara-se completamente, levantando-se e sacando uma lâmina de prata do bolso interno do sobretudo. Maxwell detectou a presença dele e arremessou sua faca, mas Frank agilmente desviou e avançou contra ele. Porém, o lobisomem segurou seu braço antes que fosse apunhalado. 

- Caçadores e seus truques de mestre pra se libertarem. - disse Maxwell, logo empurrando-o - Estão servidos? Façam um bom proveito. - perguntou para sua alcateia salivando ao ver Frank dando sopa. Mas o detetive não deixou-se vulnerável e aproveitou que Maxwell virou as costas para pega-lo pelo ombro e enfim cravar rapidamente a adaga no coração. Expelindo sangue na boca, o líder parecia horrorizado com a precisão e rapidez do ato. 

- Só pra dar um toque: Confiança demais é ponte curta pra guarda baixa. - disse Frank, destemido. 

Os lobos desceram das rochas alvoroçados e ensandecidos, todos querendo cair de boca em Frank. 

O detetive foi prontamente libertar Howard cortando as amarras com a lâmina. 

- Eu dou conta deles. - disse o pai de Brian, tirando o casaco preto e a camisa branca - Pode fazer o favor de não assistir à transformação e ir rápido salvar meu filho?

- Óbvio que eu não ia ficar vendo você tirando a roupa. - respondeu Frank, correndo até Brian para liberta-lo - Acabou a festinha dos vira-latas. 

- Mas meu pai... - disse Brian, sendo solto, preocupado com os lobos que rodeavam Howard que transformava-se - Eles vão mata-lo! Você tem que fazer alguma coisa! - implorou Brian, apreensivo. 

Contrariando a preocupação, Howard lidava com os lacaios de Maxwell com uma bravura notável, se engalfinhando com eles sem medo de sangrar. Um acesso de coragem tomou conta de Brian. A batalha feroz de Howard contra 12 lobisomens em pé de igualdade incitou o animal dentro de si. 

Frank impressionava-se com a performance de Howard que dava cabeçadas, mordidas profundas e patadas seguidas de arranhões. O detetive admitia que nenhum documentário do reino animal com brigas de gigantes da selva estaria à altura daquele embate. Howard dera um pulo contra um remanescente que também pulara e ambos chocaram-se caindo brutalmente ao chão. Para a total surpresa de Frank quando voltou-se para Brian, apenas as roupas e os tênis do menino estavam ali jogados. Frank virou o rosto e novamente o espanto: Brian juntara-se à luta para auxiliar o pai como um lobisomem propriamente transformado. A pelagem volumosa de Brian se diferenciava na cor, sendo uma mistura de laranja com um tom amarronzado. O "lobitsune" dominou a briga, escanteando seu pai.

Brian agarrou com os dentes finos e pontudos o pescoço do adversário, pressionando-o impiedosamente, facilitando a imobilização. Mas seu pai sinalizou com latidos para que o soltasse. Obedecendo, Brian descravou as presas e o lobisomem correu afugentado tal qual os companheiros. 

- Caramba, gostei de ver hein. Botaram todos pra correr. - sorriu achando comicamente irônico um caçador elogiar dois lobisomens plenamente transformados. Brian e Howard esfregaram suavemente seus focinhos um no outro e também seus rostos num gesto mútuo de comemoração. 

Abruptamente um estampido alto ecoou. Frank viu que Howard cambaleava para um lado, em seguida podendo enxergar uma mancha de sangue no seu peito. Brian, assustado com o tiro, fugira para uma direção aleatória. Howard caíra de lado, arfando, porém não resistiu, ficando perceptível pro detetive que o mesmo falecera. Atordoado, saiu em disparada para a direção tomada por Brian. Correu entre as árvores, afastando galhos e folhas, o coração a mil pulsando de uma agonia que se externava na sua face. 

- Brian! - chamou o mais estridente que pôde - Brian! - pôs as mãos na cabeça em desespero. 

Uma dúzia de homens vestidos de preto trajando coletes e portando armas de grosso calibre passaram por ele ignorando-o. Mas houve uma exceção. 

- Agente Montgrow! - chamou um operador da força-tarefa da ESP vindo até ele - Tenho ordens expressas pra não deixa-lo ultrapassar esse limite. 

- Por que estão aqui? Como sabiam?

- O chefe pôs um rastreador no seu carro. Acredito que pensou ter se safado de nós levando as duas aberrações antes que ele nos chamasse. 

- Vocês iriam pro DPDC, o superintendente não sabia que eu já tinha caído fora. 

- Assim você supôs. Mas o rastreador disparou o sinal e ele nos retornou mandando trocar a rota a tempo de alcançarmos vocês. Vinte minutos depois seu carro se moveu até essa floresta e agora estamos aqui pra terminar o serviço que você negligenciou. - ouviu vozes bem próximas - Acho que o encontraram.

- Não... - disse Frank, amedrontado - Tenham piedade, pelo amor de Deus... É uma criança! 

Frank saiu a passos largos atrás do agente, infringindo a ordem de Hoeckler. 

Alguém do grupo mirou o facho de uma lanterna em Brian no meio de arbustos. O garoto estava nu e protegia seus olhos da luz com os braços. 

- Foi mal, campeão. - disse um agente, aproximando-se com uma arma em punho - Somos apenas caras legais cumprindo ordens cruéis. - puxou a trava da arma e mirou-a - Tenta partir dessa em paz. 

Frank visualizou os agentes reunidos e a luz da lanterna. Parou o agente que o notificou tocando-o no ombro, mas levara um forte soco que o derrubou. A impotência que invadia seu corpo era uma sensação nova, frustrante e arrasadora. "Não se pode salvar todo mundo. A limitação de todo caçador. Eu já devia ter aceitado...", pensou. Frank levantou-se, mas ao invés de persistir, encostou-se numa árvore e deixou-se sentar devagar, a expressão de pura tristeza misturada à raiva decorrida da falha. O barulho seco do tiro o fez tremer rápido enquanto uma lágrima escorria pelo seu rosto. 

                                                                                -x-

*A imagem acima é propriedade de seu respectivo autor e foi usada para ilustrar esta postagem sem fins lucrativos.


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