Capuz Vermelho #64: "Carne Fraca"


As fantasias íntimas de um ingênuo homem, que trabalhava como contador à duas quadras daquele motel de baixa categoria, estavam sendo realizadas numa profundidade da qual ele mal se preparou. A mulher estonteante, de cabelos castanhos ondulados e pele meio parda, passava seus sedutores lábios pelo corpo do parceiro até chegar à boca levando a um demorado e intenso beijo. Ele virou-se de repente, trocando de posição, ficando abaixo dela, completamente entorpecido de desejo. A dama fatal o estimulava com olhares sacanas para que o ápice tivesse início. Tocou seus dedos delicadamente nos ombros dele, mas depois fincou suas unhas as descendo para gerar arranhões. Mas ao mesmo tempo que o homem dava o seu melhor no ato, sentia uma fraqueza domina-lo.

Apenas ela continuava a se divertir, instigando-o para que ficasse mais selvagem. O rosto do homem ressecava gradualmente, mas estranhava não ter vontade de parar. Sua pele murchou, deteriorando, ficando num tom cinza. Até que seus olhos reviraram sinalizando a morte.

- Espero que quando chegar lá embaixo, sinta orgulho de ter morrido fazendo o que gosta. - disse ela, com deboche, olhando o cadáver degradado - Foi um touro brabo de montar. É um desperdício, mas... - saía da cama enrolada no cobertor - ... é minha natureza que manda, não tenho culpa. Os humanos já são descartáveis entre si mesmo.

Uma dor de cabeça acachapante recaiu sobre ela, fazendo-a grunhir em dor. Aquilo significava um demônio Íncubo ou Súcubo sofrendo danos num confronto, um efeito colateral da ligação mística desde a gênese desses demônios oriundos do poder da Luxúria. A causa da dor localizava-se à vários quilômetros dali, precisamente num bar onde a caçadora Guinevere Winston conduzia uma difícil luta contra um Íncubo asqueroso. O demônio lançou seu pulso de vibração, jogando-a numa mesa que partiu-se ao meio. A adaga de irídio se perdeu por um canto. Logo ele a pegou pelo pescoço, roubando a lâmina com telecinesia e apontando-a para ela. Sorriu com os dentes pontudos.

- Para o seu azar, eu sou diferente. Tem mais experiência com os molengas vermelhos né?

- Eu nunca baixo minha guarda... - disse Gui - ... sem uma carta coringa na manga. - a caçadora sacou do bolso um frasco contendo o ácido a base de ervas nocivo a demônios e despejou o líquido no rosto do Íncubo que afastou-se gritando pela ardência que destruía sua epiderme. Gui o chutou na canela, o desequilibrando e pegando a adaga de volta. Mas antes que o matasse, ele notou algo estranho.

"Seu incompetente! O que pensa que está fazendo? Se deixando vencer por uma caçadorazinha? Francamente, é de lixos como você que menos preciso.", dizia Luxúria por telepatia ao Íncubo.

Labaredas disseminaram-se pelo corpo do demônio rapidamente, não poupando nem os chifres. Gui não entendia absolutamente nada, assistindo o demônio gritar ardendo em chamas até virar cinzas.

- Mas... o que diabos aconteceu aqui? - perguntou ela, completamente perdida e impressionada.

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CAPÍTULO 64: CARNE FRACA

No dia seguinte ao descobrimento do cadáver do contador estirado na cama pertencente ao quarto de nº 69, o motel estava lotado de policiais fazendo vistoria no prédio atrás de indícios e informações de reforço. Puseram uma faixa amarela de "não ultrapasse" na entrada do quarto. Flashes de câmera fotográfica piscavam sobre o corpo àquela altura ainda não removido para a perícia forense.

Os detetives especialistas chegaram a tempo de investigar. Rosie e Hector passavam pelos policiais que os olhavam com desdém e estranheza. O caçador exibiu seu distintivo do DECASO para um dos oficiais que lhe retribuiu um cenho franzido com olhar confuso. Ele baixou a aba do seu quepe sobre os olhos, parecendo meio constrangido, retirando-se. Hector fez que não com a cabeça bem devagar, não acreditando. Era como se a polícia britânica não os reconhecessem mais como agentes do Exército. O chefe de polícia os barrou de modo austero, erguendo o queixo soberbamente.

- Me desculpem, mas esta é uma área para pessoal autorizado. - disse ele - O que querem?

- Autorizados pelo Exército Britânico. - respondeu Rosie, num tom meio irritado - Nunca ouviu falar no projeto DECASO? Somos os agentes prioritários designados a investigar causas misteriosas e pelo que vejo o senhor está infringindo uma cláusula rígida. Se não quiser problemas, é melhor liberar.

Hector deu uma olhadela tensa para ela, logo pensando em evitar atritos.

- É verdade, senhor. - concordou Hector, mostrando o distintivo - Digo, não estou de acordo com o que ela falou por último, na verdade nós só viemos averiguar sem interferir no trabalho da polícia.

- Já estão interferindo. - disse o chefe, um homem sexagenário de bigode branco - Deixe-me contar uma novidade à vocês: Sei o que é o DECASO, a força-tarefa paralisada pelo Exército há semanas, causando a destituição de ambos do cargo mesmo que continuem associados sob ordem do General.

- Espera aí... Quer dizer então que estamos fora? - indagou Rosie, descontente - Assim sem mais nem menos? Eu nem sei o que estamos fazendo aqui já que essa operação foi um tremendo fiasco por causa...

Hector tapou a boca da parceira agilmente, disfarçando para o chefe de polícia.

- Mil desculpas, por favor. Sabemos que houve alguns desertores, mas nós ainda estamos válidos.

- Querem corroboração? Vão até o General. Aqui vocês não passam de estorvos. Todos sabem quem vocês são e o que fazem, porém não são bem-vindos haja vista que a iniciativa estagnou.

- Não precisamos servir a ninguém para fazer nosso trabalho. - disse Rosie, logo saindo de perto.

- Sumam daqui e deixem com os profissionais. - disse o chefe, menosprezando-os - Pode falar com o General e saberá quem infringiu regras - finalizou ele, deixando Hector sentir-se diminuído.

Rosie arregalou os olhos tamanha sua surpresa ao se deparar com Guinevere trajada como detetive.

- Gui?! Caramba, o que tá fazendo aqui? Esse não parece ser um caso envolvendo demônios.

- Olá Rosie, é bom revê-la. Bem, eu não segui pistas e cruzei evidências para chegar aqui e concluir isso. Certamente há demônios metidos nessa morte, eu sei porque ela ocorreu no mesmo instante em que estava numa missão.

- Veja só quem resolveu aparecer. - disse Hector, feliz em reencontrar a caça-demônios.

- Hector. - disse Gui, sorrindo - Seria estranho não vê-lo junto à Rosie, afinal são detetives especiais.

- Corrigindo: Detetives chutados. - disse Rosie, insatisfeita - O DECASO já era e perdemos autonomia para cumprir nosso dever, o que não significa que vamos desistir. - olhou para Hector.

- E então? O que aconteceu com o diabrete que ajudamos a capturar naquele dia? - perguntou Hector.

- Lembram-se que revelei estar investigando uma organização chamada Caosfera? Pois é... Ele escapou com a ajuda de demônios adultos e bem experientes que também libertaram outros. Há pouco tempo o número de demônios tem aumentado, minha demanda quadruplicou. Certamente as pessoas por trás da Caosfera impulsionaram a fuga massiva.

- Tem certas coisas que você merece saber. - disse Hector - Isso tem relação com algo muito maior.

- Eu já suspeitava. - disse Gui - Minha intuição diz que estão no olho de um furação bem perigoso.

- Olha, a gente cuida disso, podemos ficar com a parte prática. - disse Rosie para o completo desagrado de Hector que havia percebido a intenção da jovem em eliminar concorrência.

- De modo algum, eu cheguei primeiro. - disse Gui, mostrando sua identidade detetivesca.

- Carmen Nottigham? - indagou Hector, estreitando os olhos ao visualizar - Falsificou credencial?

- Não esperavam uma ousadia dessas de mim. - disse ela, rindo nervosa - O que acham de uma nova parceria? Fui aceita oficialmente, posso contribuir mais com vocês do que com eles. - andou para um ponto reservado no corredor para conversarem discretamente - Ontem à noite enfrentei um Íncubo e criei uma situação para pega-lo no bar que ele frequentava para galantear as mulheres que vitimou. Esse mesmo demônio inexplicavelmente pegou fogo até virar cinzas antes que eu o matasse. Uma parte de mim ficou frustrada, foi uma luta árdua demais pra acabar daquele jeito.

- Será que tem dedo do Belphegor nisso? - indagou Rosie - De repente decidiu punir seus servos.

- Belphegor? Parece nome de peixe graúdo e isso tá me interessando. - disse Gui, desconfiada.

- Não, é uma teoria equivocada. - discordou Hector - Ele parece ser do tipo que mantém as mãos limpas.

- O homem morto chama-se Ben Farriston, era um trabalhador da agência de contabilidade próxima daqui. - disse Gui - O recepcionista lembra de vê-lo entrar acompanhado de uma moça atraente. Isso mata o mistério. É uma súcubo, tenho certeza. Mas uma súcubo com capacidades mais amplas. Pouco antes de morrer, o íncubo parecia falar baixo com alguém.

O entreolhar de Rosie e Hector não deixava mentir a conexão de ideias formadas com aquilo.

- Temos uma boa noção do que realmente estamos lidando. - disse Hector - Vamos seguir meu plano.

                                                                                       ***

O refúgio numa floresta acabou sendo a opção menos estressante para que Pandora realizasse uma espionagem sobrenatural contra os membros da Caosfera utilizando um rastreador mágico implantado num mago durante sua captura. O mago grampeado não foi escolhido aleatoriamente. Em verdade tratava-se de um dos muitos "braços direitos" de Derek que o seguia lealmente como um capacho.

Aproximando-se de uma árvore que fazia boa sombra para proteger do sol forte da manhã, a semideusa tirou da bota esquerda o minúsculo objeto em formato de estrela do caos. Com os olhos fechados, recitou o feitiço. A escuta acionou-se.

- Ah, a tumba dos magos, só podia ser. - disse ela, concentrada - Mas... que estranho. Cadê o Derek? Um plano dessa grandeza devia ser coordenado somente por ele. Vamos... parem de enrolar.

A comunicação sofreu um brusco corte quando a bruxa sentira um toque no seu ombro esquerdo.

Ela reabriu os olhos sobressaltada, virando-se rapidamente. A palpitação se agravou quando viu.

- Não pode ser... - disse ela, pasma - Como você soube? - indagou, mas bateu em retirada sem querer saber a resposta. Derek a pegou pelo braço, impedindo-a de fugir - Me larga! Me larga! Socorro!

O ex-mago cobriu a boca dela firmemente, agarrando-a, mas claramente sem intenções agressivas.

- Grite mais alto e os coiotes virão atrás de nós. Quer machucar pobres animais selvagens? Sei que não, você é uma boa defensora da preservação da fauna. - disse ele, por fim a soltando.

- O que diabos você quer? Isso... Isso tá errado, você devia estar lá com eles, fazendo eles lamberem o chão imundo que você e seu pai pisam. - atacou Pandora, desafiadora na postura.

- Ahn, eu... Bem, tive que pendurar meu sobretudo. Coercitivamente. - declarou ele, sério.

- Então... - a bruxa o olhou da cintura pra cima - O fato de não estar uniformizado significa...

- Aquelas são as roupas formais de um mago do caos, portanto sem chacota, por favor. - repreendeu ele.

- Eu não ia fazer piada, só... tirar uma conclusão pelo que disse. - o observou - Foi expulso de lá?

O ex-mago não parecia nada confortável em ter que detalhar a punição. Pandora sorriu abertamente.

- Não dá pra acreditar. O papai do mal te botou de castigo?! Meu dia tá feito.

- Pare, não começa a rir da minha desgraça fingindo não admitir que sua situação está bem pior. A propósito, sei exatamente em qual dos magos você plantou o rastreador.

- E por que não sabotou minha estratégia?

- Porque seus truques são previsíveis demais pra mim e também não confiava que teria sucesso.

- Bem, você arruinou minha chance de sucesso quando chegou de fininho. Mas parando pra pensar... Se realmente quisesse me impedir, usaria magia contra mim, estava de guarda baixa.

- Agora você tocou no que é justamente a pior coisa desse castigo. - disse Derek, expressando raiva na face - Não posso mais quebrar ovos sem usar as mãos. Mas quer saber o que eles planejam?

Pandora mordeu os lábios numa hesitação que refreava a confiança, estando fortemente indecisa.

                                                                                   ***

Seguindo o plano de separarem-se idealizado por Hector, que se dirigiu ao QG do Exército Britânico para verificar o estado e descobrir o motivo da exoneração, as garotas ficaram com a parte de deter quem estivesse ligado à Luxúria para atraí-la ou até mesmo colher informações para chegar até ela. O íncubo combatido por Gui frequentava o clube restrito localizado no subúrbio, lugar este onde a caçadora era bastante temida pelos demônios que lá visitavam para selar pactos.

- Por fora não é tão chamativo. - comentou Rosie, analisando a fachada ao lado de Gui.

- Esperteza deles selecionarem um lugar discreto assim para fazerem o que fazem. - disse a caçadora.

- São apenas negociantes aqui, certo? Então deve ser o clube mais chato de toda a Londres.

- Antes fossem só pactos a diversão. Nem queira saber o resto. - afirmou Gui, logo adentrando.

- É até excitante imaginar o resto, visto que também há súcubos e íncubos como frequentadores.

A caça-demônios virou-se para ela, olhando-a com o cenho franzido.

- O que disse?

- Ahn... Não, nada. Eu falei bobagem, pensei alto. Vamos acabar logo com isso. - disse ela, insegura.

- Está bem, é que... Tenho a leve impressão de que você está meio diferente, é estranho notar isso...

- Olha, dá pra gente focar no que viemos fazer nessa espelunca? - perguntou Rosie, soando aborrecida - Eu estou bem, nunca estive melhor. Apesar de não concordar em você envolvida nisso.

Rosie andara a passos largos entrando no clube, enquanto Gui não parecia acreditar no que acabara de ouvir.

- Mas esse é o meu trabalho. - disse ela numa réplica tardia. Ignorando o estranho e desagradável comportamento da parceira, ela finalmente entrara logo incomodando-se com os odores pujantes. O interior era de um arquitetura relativamente sofisticada e a decoração correspondia aos seus visitantes, com paredes revestidas num vermelho nítido enfeitadas com quadros de pinturas profanas.

- Qual nosso primeiro passo? - questionou Rosie, falando baixo - Vamos pedir o cardápio?

- Eu receio que o antedimento não será muito receptivo conosco. - disse Gui, não ficando surpresa com as reações abismadas dos demônios ao redor delas levantando-se das mesas - Prepare-se.

Os monstros carmesins as fitavam odiosamente. Por outro lado, os clientes humanos não entendiam.

- Olá, em que posso ajuda-las? - disse uma súcubo que desempenhava como funcionária substituta - Me chamo Hayley - mexeu nos seus cabelos loiros e adotou postura altiva - Mesa pra duas?

- Não, não viemos nos sujeitar a nenhum pacto unilateral. - disse Gui - Parece que não sou muito bem-vinda. Queremos somente uma resposta e prometo deixa-los vivos. Minha parceira concorda.

- É, eu garanto que mesmo ela sendo o terror desse lugar, não estamos aqui pra causar estragos.

- Você é a caçadora que dizimou metade do nosso contingente ano passado... Ou estou enganada? - quis saber Hayley, concentrando-se em Gui - Ah, já esperava o silêncio, isso explica tudo.

- Nos diga o paradeiro de Luxúria. - pediu Gui, direto ao ponto - Temos a oferta perfeita.

- Ei, espera. - disse Rosie para Gui - Não seria mais inteligente pedirmos as localizações dos outros principados também? É muito importante descobrir logo, o Hector quer resolver isso depressa.

- O Hector é nossa moeda de troca, embora seja um licantropo.

- Não é necessário barganhar para oferecer um homem sobrenatural em troca de localizações dos outros chefes. - disse Hayley - Luxúria é a única dos sete que está na nossa alçada. Se querem mesmo saírem em paz, sugiro tomarem um drink por conta da casa. Sem ressentimentos né?

- É a minha alma que está em jogo! - disparou Rosie, surpreendendo Gui que expressou confusão - Ou você nos fala onde Luxúria está ou vou me obrigar a deixar de ser boazinha.

Para o total espanto da dupla, o chefe de polícia que comandou a investigação do assassinato no motel entrara no estabelecimento. A perplexidade tomou conta de suas faces ao ver o rosto do homem tonalizar-se de vermelho carmesim com rugas grotescas e dentes pontudos salientes.

- Está possuído?! - disse Gui - Todo esse tempo era uma armadilha! - sacou sua adaga de irídio.

No entanto, as demais súcubos cresceram suas garras, ameaçando crava-las nos pescoços dos reféns.

- Mova um passo e nossa clientela será sacrificada. - decretou Hayley - Sem ele não teria me preparado para a chegada de vocês duas. E agora meninas? Podemos negociar de verdade?

Rosie rangia os dentes suprimindo ao máximo suas emoções ferventes para não se descontrolar

                                                                                ***

QG Alternativo do Exército Britânico

Hector sentira o cano daquele revólver apertar na sua coluna e ergueu as mãos devagar parado num dos primeiros corredores do prédio. Topar com Hamilton Marshall naquele lugar era como encarar um leão sedento e faminto assim que chegasse numa selva. O caçador não tremia um músculo, mas forçava-se a não externar uma resistência audaciosa.

- Veio fazer uma visita ao general? É uma pena, mas não posso permitir que o veja, não no estado deprimente que ele se encontra. Sendo assim, é o fim da linha para você. - disse Hamilton.

- Voz de um homem mais velho... Presumo que seja alguém relevante na Caosfera. - falou Hector - Os magos dessa corja maldita no geral tem aparências mais jovens. Eu bem que senti um ar diferente quando entrei, é uma prova de que as mudanças que aconteceram aqui estavam sob seu controle.

- Vire-se. - ordenou Hamilton, seco. O caçador obedeceu, fitando o comandante britânico da organização - Hum, assim é melhor. Licantropos morrem com balas de pratas no coração, né?

- O que fez com o general Holt? O que fez com esse lugar? - exigia Hector, petulante.

- Eu só alterei alguns termos do regimento interno. Mas pude incapacitar Holt de uma forma que ninguém antes pensou. - disse Hamilton, a prepotência vibrante - Baixe as mãos, não vou estragar tudo apelando pra facilidade. - desistira de mirar a arma - As forças militares desses país estão acabadas. Nosso grandioso mestre vai construir um novo mundo em cima dos escombros do velho.

- Uma nova ordem mundial... sustentada por genocídios, mentiras, perseguições, tomadas de poder e sabe-se lá o quê mais nesse plano diabólico contra o qual vamos até as últimas consequências para impedir. - disse Hector, expondo sua firmeza brava - Belphegor não ganhará essa tão fácil.

- Mesmo que a sede britânica sucumba no fracasso, os outros quadrantes estão disponíveis para dar cobertura quando julgar necessário. - afirmou Hamilton, atiçando mistério - Nem faz ideia. - sorriu.

- Quadrantes? Do que diabos você tá falando?

- Nossa organização é dividida em quadrantes continentais, há escritórios espalhados pelo mundo todo, e o nosso, por sinal, é o único em atividade no momento. O único que se revelou até agora.

- Então os outros... não passam de células adormecidas. - concluiu Hector, atordoado - Miserável.

- Teve minha atenção mais que o suficiente. - disse Hamilton que gesticulou com a cabeça apontando ao corredor à direita - Faça o dia do general mais feliz, ele está na última porta desse corredor. - Hector seguiu andando na direção certa, mas à medida que aproximava-se ouvia um canto suave e abafado. Um canto lírico e de uma beleza encantadora, talvez a voz mais bela que já tenha ouvido cantar. Como uma sereia atraindo um navegante deslumbrado pelo som. Abriu a porta, as luzes estavam apagadas. No acender delas, o caçador deparou-se com uma mulher sentada na mesa com as pernas cruzadas e usando um vestido vermelho bem decotado.

- Sobrenaturais não fazem meu tipo. - disse Luxúria - Mas voltei com sede de desafio. E aqui está.

Hector voltou-se à porta para sair, mas ela fechou-se com telecinesia, trancando-o. Enquanto isso, no clube, Hayley dava gargalhadas escarnecedoras, se divertindo com o clima de medo que gerou juntamente às suas comparsas.

- Foi muito simples. Luxúria e eu fizemos um contato telepático, nessa conversa a avisei que vocês viriam. Ah não, estou contando a metade da história. Na verdade, foi ele - apontou para o demônio possessor do chefe de polícia - quem me repassou a mensagem e mantive Luxúria informada depois.

- E onde ela está? - perguntou Rosie, a paciência quase esgotando.

- Fazendo o amigo de vocês, a ironia ambulante de caçador e monstro, morder a isca com anzol e tudo. - disse Hayley - Ele falou que iria visitar alguém no quartel-general, não foi? Não se preocupem, ele agora está muito bem acompanhado.

Havia sido a paciência de Gui que esgotou-se primeiro. A caçadora tirou uma granada do bolso do sobretudo abotoado e removeu a tampa, a largando no chão em seguida. O objetou estourou subitamente levantando uma cortina de fumaça cinzenta que preencheu todo o ambiente. Gui aproveitava para mandar os reféns saíram rápido enquanto as súcubos e os outros demônios sofriam reações adversas com a exposição à fumaça tendo suas peles corroendo ardentemente.

- Rápido Rosie, temos que ir! - falou Gui, em meios aos gritos de agonia dos demônios, querendo puxa-la até a saída.

- O que foi isso? Essa fumaça... O que tem nela pros demônios ficarem assim?

- Fragmentos de irídio com cinzas de demônio. É só agitar e está pronto. - disse a caçadora - Extremamente mortal contra eles, não vão resistir, mas podem ter pedido reforços telepaticamente, vamos embora!

                                                                                ***

Num casebre abandonado, Pandora e Derek ainda lidavam com o desconforto daquela aliança repentina e forçada após anos de desavenças, ódio, inimizade e picuinhas de casal. O ex-líder irritava-se com as teias de aranha que tirava dos ombros. À sua frente, Pandora sentava-se no canto menos sujo do chão para executar o feitiço de projeção astral após desenhar o círculo que proporciona uma redoma invisível e protetora ao seu corpo para inutilizar fatores externos.

- Menteque re deiectionem animi vincere corporis obiectu. 

A diferença abissal entre o feitiço de projeção astral comum e este estava na vantagem do local ser imaginado e a alma desencarnada surgir exatamente nele como um teletransporte extra-corpóreo.

No cemitério dos magos, cerca de 5 membros da Caosfera recitavam o feitiço de reanimação diante de uma tumba aberta. Pandora xingou mentalmente pelo atraso, mas tentou não se descuidar e produzir ruídos com os passos. Aproximou-se mais um pouco. Um dos magos segurava um lampião enquanto os outros excetuavam o serviço. O cadáver gradualmente era revitalizado. A bruxa agilizou e segui adiante para fazer o contra-feitiço. Porém, seu ombro esquerdo bateu numa pilastra frágil, fazendo pedacinhos caírem, o que alertou o mago que portava o lampião. Pendurou a fonte num gancho e andou para detectar a presença oculta. Ele proferiu um feitiço que desprotegeu Pandora.

O espírito da bruxa ficara visível ao mago que logo tratou de lançar um feitiço danificador de alma.

- Espertinha. Pensou em nos tapear com esse truque barato?! - disse o mago, logo atacando-a.

Pandora sentia o ardor de chamas pelo corpo e sofria. Mas o fogo real afetara o seu corpo físico. Derek se afligiu e imediatamente tirou o casaco para apagar o fogo, mas não adiantava.

- Essa não, essa não! Você tem que voltar! Volte! - largou o casaco queimado - Pandora!

Espírito e corpo se interligaram novamente, o fogo apagou-se num segundo. Pandora acordou expressando dor e sofrimento na face. Mas ela capturou um detalhe fatal antes de ser expulsa.

- Você apagou uma parte do círculo. - disse ela olhando a marca da bota de Derek que rompeu o efeito do círculo de giz - Se não tivesse feito isso, com certeza eu teria virado churrasco agora.

- A palavra mágica... Qual é? - disse Derek, apoiando-a.

- Obrigada. Mas não está tudo bem. E não quero tirar proveito da sua falta de magia.

- Conheço você mais do que pensa. Podia escolher me matar, mas preferiu minha companhia. Eu podia deixar sua alma queimando até não sobrar nenhuma migalha, mas ajudei a traze-la de volta.

- Estamos quites. - disse Pandora, levantando-se - Não é isso que queria ouvir? Estou feliz pelo que fez e pra ser sincera achei que seria um covarde. Enfim, nós estamos bem. Exceto por uma coisa.

- O quê? - indagou Derek com suspeita.

- O mago ressuscitado é... um profeta. - disse ela, decepcionada - Ele estava no Tártaro acompanhando a Rosie. Leonard Straux, o receptáculo de Daemong, fundador da Caosfera.

Derek recebera a notícia com certo choque pelo nome do profeta lhe soar altamente familiar.

                                                                             ***

QG Alternativo do Exército Britânico 

Luxúria empurrara Hector contra a mesa numa atitude dominadora. O caçador era uma muralha impenetrável aos avanços do demônio. A ineficácia da hipnose não foi motivo para livra-lo.

- Não me importo se não posso compeli-lo - disse Luxúria -, você será tentado facilmente.

- De que outro modo vou ser seduzido? Só está aumentando a minha deixa para mata-la.

- Pode levar um tempo, mas as trevas no seu coração irão guia-lo para o pecado. - passou suas mãos no torso de Hector - Quanto mais difícil, mais excitante. - o olhou fixamente - Desejo um prole.

- Engravidar um monstro como você?! Nem pensar. - retrucou Hector - Melhor que se renda.

- Percebo o quão nervoso está. Vou acalma-lo. - disse ela, logo beijando o caçador na boca. Os movimentos labiais forçavam um sugamento. O rosto de Hector ressecava e murchava aos poucos, as veias salientes e a pele acinzentando. Estava preso àquele beijo, literalmente. Retirou do bolso sua adaga de irídio mirando a ponta nas costas dela, mas a arma escapuliu, voando até cravar na parede graças à telecinesia de Luxúria que tinha cansado-se do jeito educado, passando para a sorver a energia vital do caçador ao invés de influencia-lo com apetite sexual. Hector lutava, mas em vão.

Eis que Luxúria sentiu algo fincar profundo nas costas. Tão fundo que seus lábios desgrudaram dos de Hector num instante. A expressão do demônio foi de puro temor. Rosie estava na entrada da sala, satisfeita pelo excelente arremesso de lâmina.

- Não! Ele era meu! - vociferou Luxúria, em seguida seu corpo petrificando e desfazendo em cinzas.

- Morreu sem cair na real de que ele tem dona. - disse Rosie, sorrindo torto. Hector voltava ao normal, apesar da indisposição causada pela absorção poderosa de Luxúria.

- Eu ouvi isso. - disse ele - Me deu esperanças. - deu um fraco sorriso - Chegou numa boa hora.

- De nada. Era uma cilada pra você. E sobre a Gui... Ela não teve como se despedir direito, foi correndo cuidar de uma emergência do trabalho, um caso pendente que voltou à tona. - disse Rosie que inesperadamente sentiu a dor terrível da parte de sua alma encaixando-se. Hector a ajudou - Tá tudo bem... É o que acontece quando recupero parte da minha alma. Eu contei à Gui... Ela disse que vai fazer uma investigação intensiva, mas sem muita certeza. Não aguento mais, isso dói.

- Fique calma, isso vai passar. - disse Hector, abraçando-a - Juro pela minha vida. Iremos conseguir.

Rosie assentiu positivamente, os olhos lacrimejando. Paralelamente, na capela de São Miguel, Hamilton foi reportado sobre a situação que envolvia a intromissão de Pandora e sua tentativa de impedir a ressurreição de Leo. Se dirigiu até Adam para dar um ultimato.

- Você responde a mim a partir de agora. Derek violou com o código. Amanhã mesmo vá à casa de Rosie Campbell e a sequestre, tome a liberdade de agir como bem entender. Pressione Crannon para que ele entregue Pandora e a troque pela vida da sua companheira desalmada.

- Sim, senhor. - disse Adam, batendo continência como um bom soldado obsequente.

                                                                                CONTINUA...

*A imagem acima é propriedade de seu respectivo autor e foi usada para ilustrar esta postagem sem fins lucrativos. 

*Imagem retirada de: http://www.acreditanisso.com.br/wp-content/uploads/2018/01/lux%C3%BAria.jpg

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