Frank - O Caçador #69: "Houston, Temos Um Problema"

Instalação subterrânea da fundação E.S.P.

A sala de reuniões dos conselheiros ainda não havia sido visitada pelo ESP-47 que tratou de acessa-la com um cartão de liberação que roubou do armário de um dos conselheiros. Passou o cartão no leitor que concedeu a passagem. Visualizou o amplo espaço logo ao adentrar: a mesa oval com várias cadeiras. Na ponta mais distante da mesa tinha uma cadeira giratória com um aspecto similar ao de um trono. O clone focou seu olhar nessa cadeira se dirigindo à ela para sentar como se fosse um verdadeiro rei. Sentara-se nela e pôs os pés sobre a mesa relaxando suas costas. Mas voltou sua atenção para o laptop fechado que estava à sua frente em cima da mesa. Abriu-o e fuçou informações sigilosas do presidente, desbloqueando uma pasta digital. No entanto, uma janela se abriu interrompendo a ação. O clone franziu o cenho, não entendendo nada. 

Na janela aberta repentinamente aparecia o logo da fundação num fundo preto. Uma voz falou, surpreedendo-o.

- Olá, ESP-47. - disse a voz que tinha um tom sintetizado e grave soando altamente robótico - Eu não esperaria menos de você agora que está sentado na minha cadeira tendo finalmente obtido acesso à sala de reuniões na qual o conselho determina os novos protocolos de contenção. Está se reunindo com os fantasmas dos que matou dentro da instalação? Você não tem escapatória para o que vou propor. É tipicamente pegar ou largar. Queremos reivindicar o que é nosso. O que acha de uma negociação diplomática?

- Quem está falando? - perguntou o clone, ríspido, batendo as mãos na mesa ao levantar-se. 

- Maximilliam Jones, presidente desta fundação que tem como propósito primordial manter duas faces de um mesmo mundo em constante equilíbrio. Mas em circunstâncias até então imprevistas como essa, estamos dispostos a gerar um desequilíbrio contanto que recuperemos o que vocês nos tomou de assalto.

- Acha que é assim? Vir fazer um trato comigo apostando todas as fichas num monstro que sua equipe fez mofar numa cela por anos? Façamos do meu jeito preferido: O lado que faz proposta sempre começa.

- Sabemos do plano-mestre cujas últimas etapas você está ás vésperas de concluir. - disse o presidente - E se em troca de algum item que nos interesse você teria a liberdade total de prosseguir na sua empreitada até a grande noite do alinhamento dos planetas? Pense no que satisfaria a fundação com a garantia de que a base subterrânea voltasse ao poder dela. 

- Nessa história eu só faço devolver. O que eu recebo além de liberdade? Parece tão pouco. Frank Montgrow, o cara cujo DNA corre no meu sangue, tá lá fora pra se opor a mim e ainda me deu uma rasteira depois que negociamos. Eu tentei revidar, quase consegui amassa-lo que nem papel, mas daí veio aquela esperzinha inconveniente... - cortou a frase ao ter um lampejo súbito que o fizera sorrir. 

- Por que esse silêncio de repente? - perguntou Max. 

- Acabei de ter uma ideia do que vou oferecer em troca. Se preparem. Quando iremos nos ver pessoalmente? Faltam somente três dias pro alinhamento e tenho pressa. Frank está com o triângulo montado e eu tenho as células-matriz... Significa que à essa altura estamos empatados. Mas se for pra garantir que um obstáculo saia da equação... então é sim. 

- Excelente. - disse Max, contente - Desembarco na Califórnia amanhã de manhã, indo direto à base operacional alternativa. Cheque meu e-mail nesse laptop, deixarei lá o endereço. Não é necessário marcar um horário específico, ficarei lá o dia inteiro pois vou avaliar o status de produtividade. Com a sua oferta, garanto oficialmente que não vamos interferir em nada do que fizer. Posso imaginar o que seja. É a esper que mencionou? 

- Sim, ela se chama Virginia. Ela fica sob custódia de vocês pra fazer o que quiserem com ela, não ligo se ela vive ou morre. Só uma dúvida: Como essa janela no laptop apareceu assim do nada? 

- Minha cadeira possui um sensor de movimento que é acionado sempre que alguém não reconhecido senta-se nela. E eu posso controlar esse laptop a partir de um computador ainda melhor. Estamos conversados?

- Perfeitamente. - respondeu o clone, embora não depositando confiança completamente irrestrita à parceria. 

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CAPÍTULO 69: HOUSTON, TEMOS UM PROBLEMA

O tempo parecia estar congelado tamanha era a demora de Virginia em regressar de suas viagens pela França e Holanda para se apoderar das duas peças que restam para montar o triângulo. Frank havia recebido Carrie na sua casa de manhã bem cedo antes do horário de irem trabalhar naquele sábado. A demora estava afetando mais a paciência de Carrie. 

- Chega, Frank. - disse ela, levantando-se da poltrona - A única coisa que me consola é uma carona sua pra irmos ao DPDC juntos e... nos atrasarmos juntos. E se tiver acontecido daquele maldito ter seguido ela e a acompanhado durante a viagem? 

- Que nada, acho que ele pegou leve em dar liberdade pra ela seguir sozinha, tá ciente de que a Virginia ainda treme na base pelo simples fato de que ela é humana independente dos poderes. - disse Frank.

- Mas ela peitou o seu clone naquele dia com um poder arrasador, eu senti minha coluna tremer por um bom tempo. Não acha plausível que ele tenha mudado de ideia e resolvido encoleirar ela depois de ter sentido na pele do que ela é capaz?

- Pois é, pra ser sincero é uma incerteza que me deixou tenso nos últimos dias. - disse Frank, pensativo - Mas me aliviava pensar que a Virginia se defenderia toda vez que se sentisse ameaçada diretamente. Vai dar tudo certo, ela tá chegando. 

- Já são quase nove horas. - constatou Carrie olhando o relógio no celular - Só nos resta uma hora pra chegarmos pontualmente e o diretor não arrancar nossas cabeças. Ou ligamos pra ele e inventamos a maior de todas as desculpas esfarrapadas. 

Eis que Virginia adentrava abrindo a porta. Frank levantou-se imediatamente para recebê-la. 

- Olha só quem trata de aparecer em cima da hora. - disse o detetive - E aí, como foi o passeio? 

- Bem produtivo. - disse ela abrindo uma mala e retirando duas peças do triângulo - Tcharam. 

- Ah tá aí, finalmente. - disse Frank, feliz - Carrie, me dá a última peça. 

Carrie pegara a peça que fazia a ponta superior do triângulo sobre uma mesinha alta ao lado da poltrona.

- Por um instante pensamos que estivesse na rédea curta com a cópia maldita do Frank. - disse ela, entregando a peça.

- Você não teve a sensação de ninguém te seguindo, né? - perguntou Frank. 

- Não, mas foi bem difícil consegui-las. Os antiquários onde elas estavam cobravam um absurdo. Tive que desembolsar mais da metade do meu salário. E o que é interessante: Esses antiquários são de propriedade de discípulos dos bruxos. Aquele templo era basicamente uma escola de aprendizes de feiticeiros. 

- Tipo Hogwarts? - indagou Carrie. Virginia a olhou confusa - Ahn... Deixa pra lá, não é do seu tempo.

- Bem, já que tudo fluiu nos conformes... que tal nós três montarmos o triângulo juntos? - sugeriu Frank. Carrie e Virginia aproximavam as duas últimas peças encontradas uma à outra para cola-las. Ao fazerem-no, as inscrições talhadas nelas exibiram um rápido brilho dourado. Frank logo encaixou a peça da ponta superior e todos os códigos brilharam rapidamente - Prontinho. Agora só falta decifrar pra saber qual é a frente e o verso. 

- No verso do triângulo existe o contra-feitiço para anular o despertar das três bestas. - disse Virginia. 

- Três bestas? As entidades dentro das células-matriz? - perguntou Frank. 

- Isso mesmo. Inclusive, vale lembrar que uma delas atacou você quando a tocou no dia que fui ressuscitada. Como tem se sentido desde então? - perguntou a esper - Num certo momento, enquanto fugíamos, você se sentiu mal e parou de correr. 

O detetive ficou emudecido por alguns segundos numa clara hesitação de relatar os efeitos aterrorizantes de dolorosos da cicatriz cuja inflamação se agravava dia após dia.

- Deixou uma cicatriz. - disse Frank, decidindo ser franco - Vou poupa-las de olhar como tem ficado nesses dias, mas digo que tá se espalhando como uma infecção e... de acordo com a inspeção que a Lisbell fez com a magia dela... tô perto de me transformar numa das criaturas monstruosas que ela viu quando tocou na cicatriz. 

- Não pode ser... - disse Carrie, apreensiva - Tem que existir uma cura pra isso. Virginia, você sabe?

- Desculpa... Eu não faço ideia de como reverter essa metamorfose que ele tá passando. Mas de uma coisa eu sei: Os bruxos me disseram que a entidade da célula que eles protegiam, Keter, é a regente do mundo de seres selvagens e irracionais. Esse outro mundo é o mesmo de onde veio as outras células. 

- Então a gente tá lidando mesmo com aliens de uma outra dimensão. Por essa nunca esperava. - disse Frank. 

- E essas três entidades trarão uma espécie de apocalipse pra Terra? 

- O significado do arrebatamento está num dos textos codificados. - disse Virginia. 

- Tô louca pra decifrar logo. Vou cuidar desse triângulo como um bebê. Num dia desses, configurei no meu laptop um sistema de desencriptação hiper-avançado, talvez tanto quanto o da ESP. - disse Carrie, empolgada - Eu sempre amei criptografia, desvendar enigmas, mas não segui carreira porque a vaga no DPDC tava preenchida, então fiz um cursinho de assistência investigatória e foi aí que conheci o garotão aqui. 

Virginia deu uma risadinha simpática. 

- Eu particularmente deixo nas suas mãos. Confiar na ESP é que não vamos. 

O celular de Frank tocara para a surpresa dele e das meninas. 

- É o Hoeckler. - disse ele ao verificar, franzindo o cenho - Alô, o que você manda? Boa ou má notícia?

- Me diga você primeiro. - disse o superintendente no seu gabinete. 

- Conseguimos montar o triângulo dos bruxos, devemos isso à Virginia. O meu clone sequestrou ela e a Carrie há quatro dias, mas resolvi a parada tapeando o idiota que exigia a peça do triângulo em troca. 

- Excelente, mas ainda não estão nem um passo à frente do inimigo. - disse Hoeckler. 

- Estaremos sim quando a Carrie decifrar os códigos nos dois lados do triângulo. 

- A Carrie decifrar?! De forma alguma vou permitir isso. Entregue o triângulo à mim para que eu deixe aos cuidados da equipe criptógrafa da fundação. Será que esqueceu? Você só conseguiu entrar no templo porque o supercomputador da fundação decodificou os caracteres talhados no piso numa velocidade inigualável a qualquer outro existente nesse mundo.

Frank olhou para sua assistente meio resistente em contraria-la. 

- E tem mais, Frank: O presidente da fundação voltou de viagem hoje cedo pra avaliar se os funcionários estão se saindo bem com a limitação de recursos ou tirando leite de pedra para se encarregar das contenções mais árduas. Você e Carrie devem chegar daqui à uma hora e venha com o triângulo. 

- Tá bem, como quiser. A palavra do soberano e indefectível Hoeckler é a que prevalece. 

- Me poupe dessa ironia. Não percebe que nos tornamos definitivamente aliados? 

- Esse é um termo bem apropriado, porque eu nunca vou te chamar de parceiro como se fosse amigo. 

- Sinceramente, eu também prefiro assim. - disse Hoeckler - Depois que salvarmos o mundo, volte a ser meu empregado. 

O superintendente encerrou a chamada antes que Frank abrisse a boca para retrucar. 

- O pé no saco desligou. - disse Frank, logo virando-se para Carrie - Olha, sinto dizer, mas... ele estragou sua diversão antes dela começar. 

- Como assim? O que esse crápula disse? - perguntou Carrie, esboçando raiva. 

- Me mandou levar o triângulo pra que ele entregue aos especialistas que vão decifrar o bagulho. 

- Ah não... - disse Virginia, preocupando-se - Já pararam pra pensar que pode não passar de uma aliança de fachada? E se Hoeckler estiver trabalhando com o inimigo? Não, Frank, não faça isso, é entregar o ouro ao bandido. 

- Não, você tá enganada, a fundação tá realmente tentando arranjar uma forma de acabar com a raça do meu clone e recuperar a base principal que ele tomou. Que motivo eles teriam pra ficar amiguinhos de uma coisa que eles mantinham presa pra nunca sair? - fez uma pausa, voltando-se à Carrie - Esse sistema do seu laptop demora quanto tempo pra decifrar?

- Não faria inveja à NSA, mas pode quebrar códigos complexos como esses em cerca de... três dias. 

- E hoje já é o quinto dia antes do alinhamento. - disse Virginia, tensa - Se eu não for até ele... 

- Você não vai. - disse Frank, categórico - Ficará aqui, segura. Nem pensa em sair pra, sei lá, tomar um sorvete ou dar uma volta pra espairecer. Só volto às dez e pouco, isso se não tiver casos normais ou paranormais que levem mais tempo pra investigar. E Carrie, não tem choro nem vela: Os caras da ESP cuidam da parte dos códigos. 

- Pro Hoeckler exigir que você ceda à vontade dele, o computador da ESP deve ser a nível quântico... 

- Levou menos de cinco minutos pra desvendar o código do templo. Não é rápido o suficiente pra você?

- OK, estou convencida. Espero que a teoria da Virginia não se confirme pra eles quebrarem os códigos e nós quebrarmos a cara. 

                                                                               ***

Departamento Policial de Danverous City

Assim que chegara ao prédio, Frank caminhou diretamente para a sala de Hoeckler que o esperava pacientemente sentado na sua cadeira, tendo deixado a porta escancarada para quando ele viesse. 

Frank entrou sem dizer, o que chateou um pouco o superintendente. 

- Nenhum bom dia? - perguntou ele virando-se sentado na cadeira giratória. 

- Não vim discutir nossa relação conturbada de chefe e empregado. Só deixar a encomenda. - disse Frank trazendo o triângulo enrolando num pano de veludo. Hoeckler levantou-se para ir pega-lo - Por que o presidente da fundação voltou só agora? Andou fazendo o quê sabe-se lá aonde? Eu nunca ouvi ele ser mencionado antes por ninguém. 

- O presidente estava visitando as filiais da fundação no intento de tranquiliza-los quanto a crise. - disse Hoeckler retirando o pano do triângulo e passou os dedos nas inscrições - Esperava algo mais rústico. Os bruxos criaram um artefato muito bem conservado, impressionante. Parecem runas primitivas. 

- Manda direto pra Carrie a tradução do contra-feitiço que dá um curto-circuito no arrebatamento. 

- É provável que ainda hoje sim, mas com o presidente presente as coisas se tornam... imprevisíveis. 

- Por que? Não falou que ele apenas faria uma avaliação das condições da fundação? 

- Frank, vou lhe contar uma história... que o próprio presidente me revelou na última conversa que tivemos, poucas semanas antes. - disse Hoeckler deixando o triângulo sobre sua mesa - Diz respeito a um agente dos primórdios da fundação, mais precisamente no final dos anos 30, ele se chamava Phil Baxton. Quando os agentes recolheram a primeira célula-matriz numa escavação arqueológica, havia uma equipe de agentes cuja serventia era se voluntariarem a testes com certas anomalias. Baxton se entregou ao projeto experimental por livre e espontânea vontade após a célula-matriz abrir um portal. 

- Um portal pra dimensão de onde elas vieram, certo? 

- Exato. Dimensão essa que os conselheiros, na época, nomearam de Antiverso. E neste Antiverso naturalmente há uma Anti-Terra. Esse mundo é dividido em três zonas, uma que é habitada por uma civilização tecnologicamente avançada e hospitaleira, outra também avançada no setor tecnológico, mas pouco pacífica. E a terceira zona e a mais desprezível é habitada por bestas carnívoras e monstruosas. O presidente não foi nada específico quanto a origem dessas informações. 

- A Virginia me deu uma base sobre isso. - disse Frank cada vez mais curioso - As três células com as entidades governam as zonas. Mas por que caíram justo aqui? E logo nos Estados Unidos que não é o melhor país pra alienígenas passarem umas férias considerando que as forças armadas estão de olho nos eventos de OVNIs por aí. E é claro, a fundação ESP que tá coadunada com o governo americano pra manter essa treta bem longe dos olhos civis. Enfim... O que aconteceu com o Baxton?

- Obviamente ele entrou no portal, mas... esperaram dias pra que ele voltasse contando como é do outro lado da fenda. - disse Hoeckler pegando café na sua cafeteira e tomara um gole - Infelizmente o portal se fechou. Nunca mais se teve notícias de Phil Baxton que deixou uma esposa e dois filhos. Na primeira oportunidade de reabertura do portal, tentariam resgata-lo. 

- E outro portal foi aberto? 

- Sim, porém... ninguém da equipe retornou. É possível que tenham ido parar na zona vermelha. 

- O objetivo principal do meu clone era voltar pra seu mundo e ele tem a célula azul pra abrir um portal. - relembrou Frank - Mas não, o imbecil quer concretizar uma profecia se achando um messias. 

- Acho que ele deseja reestruturar sua sociedade aqui na Terra. - especulou Hoeckler. 

- Arrebatamento... - disse Frank, pensativo - Ele vai usar as células pra abduzir o povo dele pra cá? 

- Uma boa hipótese. - declarou Hoeckler tomando mais um gole do café. 

- O presidente da fundação não te disse mais nada? 

- Eu não entendo a razão pela qual ele me contou do desaparecimento de Baxton só naquele momento. 

- Agora você entende como eu me sinto, né? Sobre quem fala menos do que realmente sabe. 

Frank virou as costas para sair da sala deixando Hoeckler impactado com aquela fala, o que ajudou a elevar sua desconfiança relacionada ao presidente e a questionar o motivo de sua perícia na fundação. 

                                                                               ***

Na noite daquele dia, Frank voltara para casa por volta da meia-noite e meia e já entrava chamando por Virginia. Acendeu o abajur da sala e foi até a escada para chama-la mais alto, mas nada de resposta.

Frank virou-se e de repente sua visão detectou a pontinha de um papel debaixo do abajur. Retirou-o o papel dobrado e abriu-o vendo que tratava-se de um bilhete. A grafia se assemelhava bastante à dele. 

"Capturei a princesinha de olhos coloridos de novo. Por que será? Ah, talvez deva ser pelo fato dela ter ido contra a sua palavra. Já se passaram cinco dias. Dessa vez você não tem chance de salva-la, pois firmei negócio com um proponente muito melhor." 

Frank amassou o papel com toda a sua força querendo que sangue escorresse. 

Aquele bilhete significava que o ESP-47 havia alterado sua diretriz sem maiores explicações. 

O detetive controlou sua raiva fechando os olhos e respirando bem fundo. Jogou o papel no chão e pensou nos rumos que tomaria para proceder. Seu celular tocara e pegou-o para atender. 

- Alô? 

- Hoeckler falando. Algo no mínimo intrigante acabou de me ser reportado: o presidente Foster dispensou a equipe inteira de criptógrafos sem uma razão aparente. 

- Mas os códigos já foram todos decifrados, não foram? 

- Lógico que sim, mas precisariam de pelo menos um dia para revisar a tradução. Por isso não entreguei os resultados logo ontem. Mas agora que a criptografia foi temporariamente fechada, dificulta pedir que se faça uma cópia da tradução. É aí que entra Carrie. Amanhã a tarde vou envia-la como uma falsa revisora de desencriptações contratada para analisar as últimas feitas antes da suspensão da criptografia.

- Tomara que ela não caia na vista do seu chefão. - disse Frank - Mas esse é o menor dos problemas.

- O que houve? 

- O meu clone... raptou a Virginia de novo. E misteriosamente vai negociar o resgate com outra pessoa.

Hoeckler ficara lívido ao ouvir aquela informação, pensando na única suspeita que passara pela cabeça.

                                                                                 ***

Carrie foi permitida a entrar na base alternativa da ESP sendo acompanhada por um agente. 

- É melhor que seja rápida, o conselheiro Hoeckler agiu à revelia do presidente pra autorizar que uma especialista em criptografia analise as decifrações dos códigos. - disse o agente à direita dela. 

- Não quero causar nenhum transtorno, mas seria muito necessário que o presidente esclarecesse essa suspensão dos criptógrafos. - disse Carrie que recebeu um olhar de contrariedade do agente - Bem, acho que não devo me intrometer. 

A assistente entrou na sala da criptografia e deparou-se com vários computadores não sabendo identificar qual deles era o fantástico e veloz supercomputador que desencriptava qualquer código. 

- Termine logo o que tem pra fazer, o presidente tá vasculhando toda a base e eu não quero me encrencar quando ele ficar em pé de guerra com o conselheiro Hoeckler. Se eu desacato a ordem de um, não faz diferença, vou me ferrar do mesmo jeito. Mas preferi o conselheiro porque também achei estranho. Mantenha as luzes apagadas. Boa sorte. 

- Obrigada pela recepção. - disse Carrie, logo voltando-se para o mar de telas de computador após o agente fechar a porta. Ela foi para um que escolheu aleatoriamente imaginando que as traduções estavam numa pasta de arquivos contidas em todas as máquinas e não tardou muito para acha-la. Pegou o pendrive da sua bolsa e conectou-o, iniciando o download. No entanto, uma sombra podia ser vista pela janela andando pelo corredor e Carrie engoliu a saliva nervosa crendo que poderia ser Max. A sombra de Max parou olhando para a criptografia. Carrie se escondeu debaixo da mesa e somente depois de três minutos deu uma conferida. A sombra curiosa não estava mais ali para o alívio. O download prosseguia passando dos 50%. 

- Anda logo... - disse Carrie, baixinho, a impaciência e a ansiedade formando uma horrível combinação.

Dois minutos depois a barra de download foi preenchida nos 100%. Carrie arrancou o pendrive da entrada de dispositivo e o guardou na sua bolsa, logo saindo da sala às pressas. Caminhou com firmeza pelo corredor, porém Max Foster a pegara.

- Ei, você! Quem é? - perguntou o presidente da fundação, um homem elegante de meia idade com face robusta, barba por fazer e cabelo preto com predominância de grisalho nas costeletas. 

- Ahn... Fui contratada pra revisar as últimas quebras de códigos. - disse Carrie mantendo-se de costas para ele. 

- Por quem? Eu não autorizei que ninguém liberasse a criptografia até segunda ordem. - disse Max. 

Carrie hesitou bastante, mas teve de dedurar Hoeckler. 

- Foi o conselheiro Hoeckler, senhor. 

- Como se chama? 

- Carrie Wood. Meu trabalho aqui está terminado. Posso ir? 

- Hoeckler, não é? Eu não esperava uma atitude dessas vinda dele. Saia já daqui. 

Ela seguiu até por onde havia entrada com passos trêmulos. Ao entrar no seu carro seminovo que comprou numa concessionária de segunda mão, a assistente olhou para sua esquerda antes de ligar o automóvel para fugir dali. Um carro parara, um carro muito familiar para ela.

- Meu ex-carro?! Então... Essa não. - disse ela, o nervosismo voltando. Do seu antigo veículo saía o ESP-47 segurando pelo braço uma impotente Virginia que possuía um colete com bombas. O clone a levou diretamente à entrada principal da base alternativa da fundação que parecia um imensa fábrica. 

Carrie sentiu-se na obrigação de ligar para Frank e informa-lo. 

- Frank? Onde você tá? Corre, voa pra cá. Sim, já terminei, peguei as traduções... Mas vem depressa antes que uma tragédia aconteça. Acabei de ver seu clone levando a Virginia pra lá e... pôs um colete de bombas nela. O jogo pode virar pra ele.  

                                                                            ***

No interior da base, o ESP-47 levava Virginia para um recinto onde agentes se reuniam. O clone de Frank idealizou uma astuta forma de bloquear o poder de vibração que a esper manifestou com as bombas que certamente ofereciam extremo risco caso ela liberasse a onda pulsante.

- Não, pensando bem... - disse ele - Talvez seja mais desafiador pra eles trancar você num depósito. 

- Não vai se safar... - disse Virginia, tensa - Mas prometa que vai desativar essas bombas quando te derem o triângulo. 

Olhando-o friamente, o clone já possuía esse desfecho em mente, mas precisou alerta-la de algo. 

- Você é uma tremenda idiota, pelo visto. Posso até desarmar as bombas se eles cooperarem, mas isso não te salva do destino que a fundação escolher pra você. E se decidirem por te matar? Não que eu esteja me importando. Tá contando com o Frank, é? Ele nem sequer sabe que estamos aqui. Ele perdeu.

O clone a levou para um depósito de objetos de limpeza, trancando-a no exíguo local e em seguida se dirigiu procurando a sala onde os agentes estariam, balançando a chave no chaveiro com o dedo indicador direito já cantando sua vitória. Chegara à sala, dando um chute na porta. Os agentes voltaram suas atenções para o inesperado visitante, mas não apontaram suas armas. Ao invés disso, apenas ficaram inertes observando um tanto amedrontados a vinda do ESP-47 autorizada pelo presidente. 

- Boa noite, rapazes. - disse o clone de Frank falsamente educado - Podemos começar ou... o supremo chefe de vocês arregou? - perguntou ele olhando para cada um dos homens - Onde ele está? A gente combinou de se encontrar. 

- Caramba... Falando assim até parece o original. - cochichou um agente para outro ao seu lado. 

- Pois é, eu andei estudando. - disse o clone tendo escutado, o que surpreendeu o agente - Aliás, passei um ano estudando as facetas de Frank Montgrow e interpretando elas com maestria. Mereço até um prêmio. Agora por favor chamem o anfitrião.

- Alguém chama o presidente. - pediu um dos agentes - Senão ele vai matar a todos aqui. 

- Aí que você se engana, só tem uma única pessoa correndo risco de ser morta essa noite. - disse o clone mostrando um objeto retangular preto com dois botões, um azul e outro vermelho - Lembram da esper que o meu gêmeo do bem implorou pra que vocês não prendessem? Ela tá aqui hoje, aguardando ansiosamente o resultado da negociação que o chefão da ESP e eu faremos. O que acham de uma troca justa? O triângulo pela esper viva e inteira pra vocês fazerem o que bem entender. 

- O presidente não nos avisou que ia negociar com você, apenas que... - disse um agente, nada confortável com a situação - ... estávamos desautorizados a hostiliza-lo. Cadê a esper? Onde a deixou?

- Num depósito de limpeza. Estão querendo passar por cima de mim pra ir salva-la. Vejam isso aqui: é o controle das bombas. Azul desativa, vermelho detona. Um passo que um de vocês derem, ela já era e esse lugar inteiro aqui também vai pros ares. Se o presidente tiver mudado de ideia, eu saio admitindo derrota, mas ainda aperto no botão vermelho bem de longe pra ver um grande espetáculo de explosão. Mas não é de todo ruim, muitos de vocês teriam chance de escapar com vida. Só que não é melhor do que simplesmente aceitarem a troca. O que será? Chamem logo Max Foster e eu... 

- Não tem mais necessidade. - disse Max aparecendo na entrada da sala, dando um respiro aliviado aos agentes - Muito prazer, ESP-47. - mostrou o triângulo que escondida atrás de si - Era isso que tanto cobiçava? - perguntou entregando. 

ESP-47 tomara o triângulo da mão de Max e sorriu canalhamente. 

- Fácil como tirar doce de criança. - disse ele, novamente destacando o controle da bomba - Ela tá livre. - apertara o botão azul. Dentro do depósito, Virginia não ouvia mais o barulho de "tic-tac" das bombas presas ao colete. Seu suor profuso descia pelo pescoço. Repentinamente, a porta de ferro do depósito emitiu ruído indicando que alguém tentava abri-la. 

- Quem está aí? - perguntou ela, quase aos prantos. 

A porta abriu-se. Toda a expressão de angústia se desfazia no rosto de Virginia ao ver Frank diante dos seus olhos. 

- Ah, é você, Frank! Graças a Deus! - disse ela indo abraça-lo.

- Epa, calminha aí! Cuidado com essas bombas. - disse o detetive acreditando que um abraço apertado que gostaria de dar fizesse com que as bombas detonassem - E como você teve certeza que sou eu? 

- As bombas pararam de fazer ruídos, então significa que ele conseguiu o triângulo e fui salva... por enquanto. Ele não teria me tirado daqui já que eu fui entregue à fundação. - declarou Virginia. 

- Não... - disse Frank, balançando a cabeça negativamente - Você não vai ser ratinho de laboratório da ESP se depender de mim. Vambora puxar o carro. - a pegou pela mão esquerda e ambos correram. 

A dupla percorreu alguns corredores, mas Frank tinha se dado conta que havia se perdido. 

- Merda! - disse ele, olhando para os lados não lembrando por onde tinha vindo. 

- Pela esquerda. - disse Virginia - Eu tava nervosa demais pra lembrar do caminho, mas... arrisca. 

O detetive e a esper foram pela direção indicada, porém Max e um grupo de agentes veio barrando ao dobrarem o corredor. 

- Puta merda... - disse Frank recuando com Virginia e encarando Max pela primeira vez, seu olhar de fúria contra o de soberba dele - Você que é o dono da bagaça, né? Não vou deixar que transformem uma inocente em cobaia de experimento. 

- Eu posso ter negociado a vida dela abdicando do triângulo, mas nem para cobaia ela serve. Portanto, de nada me serve a vida dela. Mas à você sim, porque ela é uma arma em potencial para deter meu sócio que a princípio eu não gostaria de ter, mas as circunstâncias me induziram a essa decisão. 

- Você traiu o lema da sua própria organização se aliando com aquele desgraçado! - acusou Frank. 

- Peguem ela. - ordenou Max. Os agentes armados tiraram Virginia de perto de Frank que levou um soco e uma joelhada na barriga - A tranquem na câmara de gás. Não há nada que possa para-los. 

Frank ousadamente levantou para enfrentar os agentes outros dois que estavam ao lado de Max vieram com duas armas de eletrochoque e o eletrocutaram. O detetive caiu de joelhos e ergueu os olhos desalentados para Virginia sendo levada pelos dois agentes. "Não... Os bruxos... Jurei pra eles que ia protege-la...", pensou Frank, recordando-se da promessa feita aos bruxos e que naquele momento fatidicamente se descumpria. Virginia virou o rosto para trás trocando olhares tristes com Frank pela última vez. Uma lágrima derramou pelo rosto dele. Max sorria altivo com a vitória sem baixas de seus homens. 

- Não! - gritou Frank outra vez no ímpeto de salva-la, mas logo foi segurado pelos dois agentes e facilmente carregado para fora devido a sua resistência ter sido enfraquecido pelo choque elétrico. 

A câmara de gás venenoso geralmente era utilizada como meio punitivo a agentes desertores. 

Virginia conformou-se com seu destino entrando na câmara e sendo trancafiada até que o gás a sufocasse envenenando seus pulmões. Pela janelinha quadrada da porta de aço ela olhou para os agentes tristonha. Um agente apertou o botão no painel para acionar a liberação do gás que logo saiu pelas fissuras dentro da câmara seja no teto ou nos cantos das paredes. O gás esverdeado preencheu todo o ambiente e Virginia tossia sentindo o oxigênio a cada segundo mais escasso. 

                                                                              ***

Com mais quatro dias de espera pelo alinhamento, o ESP-47 estourava um champanhe caríssimo sentado na cadeira do presidente e encheu uma taça, logo saboreando um gole. O triângulo estava sobre a mesa e o fitou por vários segundos como um troféu glorioso. Com Virginia morta, um obstáculo perigoso que mesmo tendo renegado aos poderes ainda oferecia ameaça se fosse impulsionada por alguma circunstância a usa-los contra ele, e as três células-matriz reunidas junto com o triângulo, nada o impediria de seguir à risca as derradeiras etapas do plano. Encontrou na internet o local ideal para apreciar o evento que virá em sucessão ao alinhamento dos planetas: um observatório astronômico. 

- Parece um ótimo lugar pra um último confronto. - disse ele dando um zoom numa foto do observatório.

Enquanto isso, no DPDC, Carrie entrava na sala de Hoeckler que estranhamente estava com as luzes apagadas e a porta entreaberta. A assistente deparou-se com o superintendente afogando as mágoas mergulhado numa fossa emocional estando sentado encostado na mesa sem seu terno azul. Carrie veio aproximando-se não entendendo ao vê-lo naquela condição. 

- Mas o que é isso? Superintendente, o que aconteceu pro senhor estar desse jeito? Problemas com a esposa?

- Pior. - disse Hoeckler após tomar um longo gole de uísque direto da garrafa - Fui destituído. O presidente arrancou palavras de um agente sobre seu falso trabalho de revisora de códigos e descobriu nosso esquema. Ele foi morto pois esse é o castigo pra desobediência à maior autoridade da fundação. E o fato de eu estar contra o ESP-47 é uma razão a mais. 

Carrie, entristecida, sentiu a culpa maltrata-la. 

- Foi por minha causa. - confessou ela - Ele me pegou justo enquanto eu saía. Não tive escolha...

- Tudo bem, Carrie. - disse Hoeckler olhando-a com seu semblante depressivo - Se dissesse a verdade, você estaria acabada. E não sinta nada por mim. Eu mereci ser descartado feito um lixo. - pegara uma arma que estava à sua direita e a apontou para sua cabeça - Depois de tudo que fiz, me autodestruir seria um ato redentor. 

- Não, não faça isso. - disse Carrie, afligindo-se. Inclinou-se pegando dele a arma devagar - Cometer suicídio é sua maneira mais pura pra se redimir? Vê se acorda pra vida e olha à sua volta. Tem uma corporação policial sob seu comando, uma das mais influentes e gigantes do estado. Com esse presidente se desmascarando, você não perdeu nada. Mas deve ter aprendido que uma traição pode vir de quem menos se espera. 

A assistente virou as costas para ir embora deixando Hoeckler sozinho refletindo sobre o que dissera.

Paralelamente, Frank, em sua casa, se contorcia gritando de dor no chão da sua sala, rasgando sua camisa branca e tirando a gravata. A cicatriz emitia um brilho vermelho piscante enquanto a infecção alastrava-se. 

                                                                               -x-

*A imagem acima é propriedade de seu respectivo autor e foi usada para ilustrar esta postagem sem fins lucrativos. 

*Imagem retirada de: http://www.butecodoflamengo.com/2018/02/bomba-relogio.html

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