Capuz Vermelho #45: "Terra Inexplorada"
Stratford - Condado de Warwickshire
Em pedaladas frenéticas, Tony, de 9 anos, atravessava rastros de uma névoa sorrateira numa estrada que cortava uma floresta mergulhada no breu. As nuvens encobriram a lua e o vento soprava revolto. Ele olhava para trás a todo instante na mesma expressão temente, tentando escapar do que viesse a pega-lo. A névoa se intensificou quando ele avistara a mansão de um antigo aristocrata britânico.
- Ah, não... Tá chegando perto... - disse ele, logo abandonando a bicicleta e correndo à robusta casa.
Correu pela sala de estar, querendo ver sinais de uma alma viva que o acudisse.
- Olá? - falara bem alto, os cabelos castanhos em tigelinha com fios quase tocando os olhos - Tem alguém aí? Por favor, socorro! - olhou para a porta que se abriu bruta deixando um relâmpago entrar, assustando-o. Buscara refúgio numa sala qualquer no segundo andar, sem bater antes já que lhe era certo não existir ninguém morando.
Tony achou um paraíso de maquetes artísticas, soltando um "Uau" automático.
Ele vira uma com o Big Ben sem os ponteiros do relógio e com uma gárgula subindo na torre, o que julgou estranho. Logo sua atenção quebrou-se na chegada de alguém. Um homem careca, magérrimo, olhos fundos e pele acinzentada o fitou sério enquanto ele aquietava-se com medo. O morador usava uma roupa preto-azulada desbotoada com gola, prendida com cinto e parecida com um sobretudo, mas mangas rasgadas em tiras.
- Você quem fez todo esse trabalho? - perguntou Tony - É legal. Queria poder construir uma dessas... - olhou para a com o Big Ben - Me deixa ficar com uma? Tô afim de impressionar meus amigos.
- Posso fazer mais e melhor por você. Que tal... viver a experiência para si mesmo do que espalhar mentiras para autopromoção? - disse o homem, mostrando um boneco inspirado na figura de Tony que ficara perplexo. Ele aproximou-se, erguendo a mão direita.
Uma luz esverdeada atravessou a janela. Tony acordara caído sobre um asfalto frio e levantou devagar sem entender nada do que aconteceu. Sentiu o chão tremer de repente. Depois ouviu um rugido rouco. À sua frente, alguns metros de distância, estava o Big Ben com relógio sem ponteiros... logo vendo a pata de uma gárgula alcança-lo.
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CAPÍTULO 45: TERRA INEXPLORADA
Área florestal de Raizenbool
O treinamento físico e prático de Rosie e Hector seguia a todo vapor em algum ponto da floresta na manhã ensolarada. A jovem extravasava toda a carga pesante conseguida nos últimos casos em socos e chutes potentes contra as almofadas com alças e revestidas de couro usadas nas mãos para a defesa do auxiliar - no caso, Hector. Rosie desferia golpes com maestria única, fazendo o caçador sentir cada impacto.
Ambos estavam sem suas peças de maior destaque. Rosie não se sentia nua sem a capa-capuz. Hector não sentia-se incompleto sem estar com o sobretudo de couro marrom. Com a camisa preta de mangas, seus músculos relativamente avantajados exibiam-se como Rosie nunca tinha visto antes. O caçador suava excessivamente enquanto Rosie parecia com energia infinita num treino básico.
- Tenho que ser franca: Essas proteções de nada servem, são inúteis. Digo, não precisa delas para se defender de golpes tão... normais. Faria sentido se ainda fosse humano.
- Você é humana. Estou lhe fazendo um favor... para que sinta-se mais confortável. - disse Hector.
- Até parece. Espera, tá dizendo que... sua força me intimidaria se lutássemos mano-a-mano, sem trapaças ou truques? - perguntou ela, dando um último chute com a canela esquerda. Hector suspirou longamente com a boca antes de responder.
- Bem, agora você me pegou. - o caçador deu um sorriso torto - Se é para sermos sinceros, então eu diria que houvesse uma visível chance de 5% para que eu levasse a melhor num combate "desarmado". - as aspas dos dedos não foram vistas por causa das proteções.
- Isso não parece sincero, é aleatório. Está com medo de perder é? - questionou ela, com um sorriso sapeca. - Sabe, eu tenho pensado agora... O que acha de chegarmos num resultado justo numa forma mais divertida? Não apostando a força, mas sim na velocidade. A linha de chegada pode ser naquele pinheiro mais alto ali.
- Uma corrida, é o que está sugerindo? - Hector não levara a sério - Rosie, por favor... nós somos jovens adultos...
- Ah, vai! - disse ela, batendo de leve no ombro dele - Energia divina contra licantropia. No fim das contas, o que pode prevalecer é a experiência. Você tem 2 anos e 7 meses, já eu apenas 1 mês e algumas semanas. É a experiência que serve como intermédio para a força e o poder.
- Belas palavras. Se fosse uma repetição adaptada dos meus ensinamentos não teria me convencido.
- Então, está pronto? Lá vai. - disse Rosie, tocando no brasão. - Apotheosis. - a luz amarela ofuscante fizera Hector proteger o rosto com um dos braços. O caçador aqueceu-se, flexionando os joelhos ao prepara-se para dar largada. À sua esquerda, Rosie mantinha-se na posição. Hector, por fim, transformara-se e ambos partiram em disparada no mesmo instante em velocidades absurdas.
No ponto onde estava o pinheiro, o vencedor foi definido.
- Ai, caramba... - reclamou Rosie, suas botas quase derrapando no solo - Nunca testei minha velocidade neste estado por tanto tempo... Sinto que meus pés passaram num vulcão. Hector? - procurou-o ao redor. O caçador viera por último, parando abruptamente. - Medalha de prata. Combina com você. - sorria parecendo conter uma risada.
- Muito engraçado. - disse Hector, voltando ao normal, apoiando-se numa árvore para respirar - Parabéns por ter despertado o meu há muito tempo adormecido instinto competitivo. Não acredito que vou dizer isso, mas a energia bruta de Abamanu no meu corpo ligada ao amuleto dele cairia bem nessa ocasião.
- Cuidado com seus desejos. - alertou Rosie, saboreando a vitória.
Hector tornou-se sério ao apurar sua audição.
- O telefone está tocando. Pode ser o Derek com um novo caso.
- Arranjando desculpas pelo medo de comer poeira?
- Se chegarmos lá e não tiver parado de tocar, vou estar certo. Podemos voltar a agir como adultos?
- Foi uma competição justa, não brincadeira de criança. - disse Rosie, defendendo sua ideia, logo seguindo Hector pelo caminho direto ao Casarão.
***
- Tudo bem, endereço e lugar memorizados. Já estamos a caminho. - disse Hector, em seguida desligando ao virar-se para Rosie. - Surto coletivo de alucinações incontroláveis e bizarras em Stratford. Um sanatório precário regido pelos profissionais mais impiedosos da área.
- É o lugar mais óbvio pra esse tipo de coisa acontecer. Vou pegar meu manto. - disse Rosie.
***
As pegadas eram deixadas meio fundas naquela estradinha de terra ladeada por uma vegetação média com terrenos que abrigavam residências modestas naquela área. Rosie checou o pequeno mapa e franziu o cenho ao notar uma possível errata.
- Hector, espera um pouco. - parou bem atrás dele - O hospital psiquiátrico de Bayron Numel não fica à três quadras à direita, de acordo com o mapa. - mostrou-o - Fica na região oeste. Pra mim é estranho o Derek ter se enganado com a localização do ponto onde aconteceram as mortes. Ou vai ver ele não conferiu direito. Todo mundo se enrola de vez em quando na pressa.
- Ou talvez eu esteja certo. - disse Hector, constatando. Olhou para Rosie, sério - A região oeste é conhecida pelo censo demográfico por ser menos habitada e Bayron Numel se matou no seu próprio hospital que ergueu com sua fortuna. Enquanto você se arrumava, peguei recortes de jornais da época da fundação ao falecimento dele. Nenhum episódio ou detalhe que implique apontar ser sobrenatural foi registrado, nem suicídios ou alucinações. O que causou o fechamento do hospital foi o aumento da demanda por verba que apertou os cofres e, com a situação no vermelho... você sabe. A coisa mais preciosa nos bens era um relógio de ouro portátil.
- Bayron Numel suicida e falido. OK. - disse Rosie, impaciente - O lugar está fechado, você não me contou isso antes e estamos aqui parados à espera de algo que esclareça a pequena confusão que o Derek fez. Será que ele recebeu um trote? Acontece.
- Com alguém ligado ao Exército, dificilmente. O DECASO colhe dados precisos, é a primeira vez que somos mandados a um lugar com a certeza de trabalho e no fim percebemos que há uma grande pilha de nada. - uma névoa começara a propagar e fechar-se entre eles.
- E o que estamos fazendo aqui se sabia que o hospital foi fechado? - perguntou Rosie. - Podia ter me contado e então retornaria pro Derek. Nunca nos daria coordenadas erradas.
- Alucinações paranoicas se limitam a hospitais por acaso? Casas de repouso, escolas... - a crescente da névoa o interrompeu e o fez olhar para os lados - E essa névoa...
- Se espalhando muito rápido. - disse Rosie, intrigada - Algo me diz... que é mau sinal. Não sei bem ao certo, mas... tô com a sensação de que preciso correr e fugir de alguma coisa, alguma coisa que quer nos atacar a qualquer instante... - olhou para o caçador, vendo-o sumir em meio a brancura - Hector!
- Rosie! - chamou ele - Temos de ficar juntos. Não enxergo quase nada...
Era como se o mundo ao redor perdesse sua cor e tudo ficasse num vazio branco e entorpecente.
- Hector... Está aí? Talvez seja esse o caso, o que está causando essa névoa...
- Nenhuma relação com o que Derek disse. Aprecio um bom mistério, mas isso também é demais...
A névoa foi dissipando-se. Rosie foi acometida por um frio e entreviu Hector próximo dali.
- Que bom ainda estar aqui. - disse ele, tomando dimensão de onde estavam - Só que...
- O quê? - indagou Rosie, olhando em volta - Mas que... que merda é essa?
Um cenário diferente se revelou. Uma cidade deserta, prédios e casas destruídos, carros capotados, céu nublado e cinzento... e um odor que fizera os pelos de Rosie eriçarem-se.
- Me diz que isso não tá acontecendo.
- Esse cheiro... - disse Hector, preocupado - Aquela névoa nos tirou de Stratford e viemos parar aqui... e sinto como se não só estivéssemos fora... mas muito, muito distantes de onde estávamos.
Um tremor abafado fora sentido.
- Isso, na verdade, é Londres... daqui à 3 anos num futuro alternativo.
- Como é que é? Espera, está...
- Olha, não faço ideia de como essa loucura foi possível, mas... tenho absoluta certeza, Hector. Fui enviada pra cá pelo Áker. Uma versão apocalíptica onde Abamanu não sai de mãos abanando e todos nós morremos. - o tremor fortificou-se. - É melhor cairmos fora, antes que eles venham...
O caçador avistou pontinhos pretos no céu que aproximavam-se rapidamente. Seu faro explodira.
- Miméticos. - disse, quase num tom selvagem de licantropo.
- Vamos, depressa! - disse Rosie, correndo freneticamente a algum lugar. Hector seguira-a.
Três nuvens de fumaça negra arrasavam por onde passavam como mísseis.
Uma delas alcançara Hector, empurrando-o contra um poste que caíra ao impacto. Outra viera até Rosie e batera num carro fazendo-o "voar" passando sobre ela que abaixou a cabeça. A jovem não diminuiu o ritmo e viu sua segurança numa casa qualquer. Os miméticos circundavam-a ameaçadamente. Hector, por sua vez, usou sua supervelocidade para achar refúgio na área residencial.
A porta que Rosie escolheu estava trancada, mas com um chute a maçaneta fora arrebentada. Entrando depressa, a jovem segurou na maçaneta do outro lado e fechara antes que outro mimético em forma de nuvem gasosa invadisse com tudo. Manteve fechados os olhos até a tensão passar. Não por muito tempo. Do lado onde estava não era o interior da casa, mas sim o exterior de outra localidade. Abrira a porta e vira apenas uma sala de estar bem organizada. "O que diabos está acontecendo hoje?". Dias estranhos eram comuns, mas aquele superava-se.
O lugar onde entrou em nada transmitia o perigo do mundo distorcido por Abamanu. Aparentava mais calmaria... uma calmaria desconfiável, entretanto.
***
Na sua particular da opulenta mansão, o magérrimo homem quase esquelético sentara-se à diante de uma maquete com várias áreas destoantes, não era como todas as outras que representavam uma só cidade. Pegara dois bonecos de tamanho menor inspirados em Rosie e Hector e os colocara na maquete em pontos diferentes.
Recitara um feitiço de ativação que os fizera brilhar em verde num piscar.
***
Naquela Londres deserta que parecia ser da Era Vitoriana, Rosie caminhava meio que sem rumo à procura de Hector chamando-o pelo nome incontáveis vezes. A fachada de uma casa lhe chamara atenção. "Qualquer uma dessas portas deve representar uma saída para algum mundo. Isso me traz más recordações... que eu nem merecia estar lembrando." Confiando na possibilidade, ela abrira.
No entanto, o velho seguimento "não custa nada tentar" que tanto confiou não foi bem o esperado.
Entrara num recinto familiar ao extremo. Ao virar para trás, deu de cara com uma pilastra no lugar onde estava a porta. Virando-se novamente, levara um susto que quase a fez vomitar seu coração.
- Você?! - disse ela, cética - Não pode ser. Esse dia tá cada vez mais estranho e pelo visto só piora.
A figura estonteante de uma mulher de cabelos pretos e lisos vestindo um sobretudo cinza e olhos azuis e ferozes num semblante de puro escárnio.
- Ora, ora, ora... O destino brinca com nossas vidas. - disse Sekhmet, no museu de mitologia onde Rosie aceitara ser possuída por Yuga. - Temos muito o que conversar, Rosie Campbell. - sacou uma adaga dourada reluzente.
***
A temperatura era relativamente amena, mas Hector sentia-se jogado num caldeirão junto aos maiores males da história numa sopa paranormal venenosa. Estava no meio de um cenário típico de velho oeste americano, como um cão solitário passeando. Ao ver uma placa com os dizeres "Vocês está deixando Westville" sua esperança renovou um pouco.
Porém, ao passar pela névoa por trás da placa reconheceu imediatamente as mesmas estruturas que observou em sua andança vazia. Vira o verso da placa e franziu o cenho.
"Bem-vindo a Westville".
- Muito bem. Ao que parece, alguém bastante poderoso a ponto de manipular nossa percepção de realidade e desocupado da vida está tentando nos pregar uma peça. - ergueu a cabeça, falando para o alto - Seja lá quem for, eu sugiro que pare com esses joguinhos de ilusão! Não falha no seu trabalho, mas não elabora uma estratégia convincente e você provavelmente não está ouvindo, o que faz de mim um completo idiota... - chutara uma pedra que atingira o vidro da janela de um bar.
Na sala particular, o homem esguio estava com uma mão na têmpora esquerda e a direita aberta ao boneco Hector. Abriu os olhos, dando um sorriso torto.
- Gosta de desafios, caçador?
Pegara o boneco Mollock e o enfeitiçara, fazendo-o brilhar verde fosforescente bem rápido. O pusera atrás do bar onde o real Hector entrara naquele instante.
Um furacão parecia ter devastado o local. Garrafas quebradas com cacos espalhados, respingos de sangue nas paredes, mesas e cadeiras viradas e destruídas... O caçador analisava a bagunça, mas sem deixar a guarda baixa. Ouviu um ruído atrás. Vinha da porta próxima ao balcão pela qual o barman entrava e saía aos "bastidores". Sacou uma arma, apontando-a. Uma voz saltou da escuridão.
- Ei, fica frio aí, amigão. - mãos de uma pessoa afro-descendente surgiram erguidas, seguidas de um sorriso branco que fizera Hector baixar o revólver imediatamente - Eu realmente não tenho palavras...
A face de Hector suavizou-se.
- Não... não posso acreditar. Josh?! É você mesmo? - pensou com clareza - Não, estou alucinando. Você não é o Josh, é apenas um produto deste jogo de truques e ilusões.
- E aí, Hector? Não ganho um abraço? Voltei dos mortos graças a você.
- A mim? Estou conversando com um falso fantasma de um grande amigo meu que...
- Me escuta, cara. Faz o seguinte: Abaixa essa arma, posso te provar que retornei mesmo, aquele monstro chamado Mollock, acho que esse era o nome daquela desgraça, me matou numa cravada só. Talvez você não lembre, mas...
- Mas nada. - disse Hector, severo, destravando a arma - O cabeça que maneja as cordas desse show de marionetes resolveu jogar sujo brincando com os meus sentimentos em relação à morte de alguém importante pra mim. Eu... não vou permitir que minhas emoções sejam usadas como brinquedos!
- Hector, não atira, por favor, estou vivo, se quiser pode me tocar, sou tão real que...
A fala de Josh cortara-se com um som grotesco. Hector encarou boquiaberto garras afiadas e gotejando sangue, atravessando o corpo do jovem caçador de aluguel enquanto ele expelia volumes de sangue expressando dor. Erguendo os olhos, Hector ficara estupefato.
- Era o que faltava...
- Exatamente. - disse Mollock, abrindo um largo sorriso ao deixar o corpo de Josh cair - Sentiu o deja vú, Hector? A sensação de revisitar um momento doloroso. Estou curioso para saber. Você se viu no passado agora há pouco? Saiba que matei seu amigo pela insolência e imprudência dele. Loub o mandou fugir enquanto era tempo, ele insistiu me atacar se exibindo pra você e sou o culpado?
- Cale a boca! - vociferou Hector, transformando-se em lobo e fugindo dali em supervelocidade como decisão consciente.
***
- Lamento ter que frustrar seus planos, você chegou ao fim da linha e tenho direito de estabelecer esse limite. - disse Sekhmet, altiva. - Meu amado não irá se encapsular neste saco de carne.
- E eu lamento dizer a você que... chegou atrasada. - disse Rosie, preparando-se.
- Me provoque outra vez para nossas fúrias ficarem igualadas. - disse a deusa.
Rosie tomara iniciativa, cansada daquele teatro, desferindo um cruzado de direita, depois um chute na barriga, fazendo-a largar a faca. Sekhmet dera-lhe uma cabeçada na testa e uma joelhada no estômago. Tentando recompor-se, Rosie tentou alcançar a adaga, mas a deusa a pegara telecineticamente, em seguida chutando-a no rosto. A jovem caiu, cuspindo um pouco de sangue.
- Não vou perder meu tempo com você... É apenas uma ilusão.
- Mas você é real o bastante para ter uma morte lenta e sofrida aqui.
- Hoje não. - disse Rosie, dando uma rasteira na deusa e, percebendo a faca girando em pleno ar, pegou-a num segundo e cravou-a na jugular antes que a deusa se reerguesse totalmente. - É essa cara que eu gostaria de ter visto no dia em que eu deveria ter matado você, no mesmo em que nos conhecemos. - pegou o cabo da adaga, levantando-a ao puxar pelos cabelos e se deliciando ao vê-la sofrer dolorosamente. - Não é forte o bastante. Assim como o marido. Ele esteve dentro de mim e posso te garantir... Ele era frágil psicologicamente, como um adolescente ansioso e desesperado por atenção. Não importa se é um fantasma... A parte ruim de matar você é que só posso ter essa chance!
Afundara mais a lâmina e Sekhmet refulgiu pela boca e olhos um brilho amarelo ao gritar.
Rosie removeu-a, jogando no chão. O corpo tombou carbonizado. Um traço de dó desenhou-se no semblante de Rosie ao olha-la. Logo a jovem correra à próxima porta, escolhendo aleatoriamente.
O próximo nível de provação contra fantasmas passados era no Templo dos Red Wolfs. Surpresa, ela se pegou relembrando a noite em que Hector fora desmascarado por Michael. O cenário estava praticamente intacto e propício para memórias ruins, exceto pela lua nova cuja luz atravessava a abertura redonda acima da estátua.
- Já sei que está aí, não adianta se esconder. - disse Rosie, sacando uma adaga - Encarei uma deusa agorinha mesmo e levei a melhor, sem querer me gabar. Você por outro lado... - virou-se para trás - ... é fichinha, Michael.
O herdeiro de Bernard Von Trask surgiu das trevas com o manto vermelho, sorrindo cínico.
- Se me permite... estou disposto a continuar de onde parei. - disse ele.
***
A parada seguinte de Hector fora num depósito do bar repleto de estantes de madeira com caixas guardando garrafas. O sol entrava pelas frestas das tábuas nas janelas. Estudando o lugar, o caçador tentara detectar uma nova porta para sair e contar com a sorte. Uma voz fizera-o estacar.
- Continua vigoroso. Esse é o meu garoto.
Aquela voz proporcionou um embrulho forte no estômago.
- Loub. Você era a última pessoa que eu esperava. - disse Hector, virando-se.
- Eu estava esperando por você. Não vai cumprimentar o grande amigo do seu pai? - perguntou ele, aproximando-se com postura desafiadora.
- A coisa que está o controlando deixou sua cretinice bem fiel ao original. Não terei problemas em mata-lo novamente, na verdade será um imenso prazer.
- Me matar novamente? - indagou, franzindo o cenho com sorriso - Quando foi isso? Num sonho? Pesadelo? Alexia andou te dando a cola da prova? Um dia vou pega-la de volta, fique ciente disso.
- Não ligo. - Hector dera de ombros, o que deixara Loub um tanto furioso a ponto de pega-lo pelo pescoço e coloca-lo contra a parede.
- Não liga é?! O que há com você, fedelho? Ah sim, era como eu te chamava pelas costas. O John sempre largava reuniões importantes na universidade para bancar o papai coruja sempre que o filhinho mimado e carente espirrava. - dissera, raivoso, sacando um bisturi. - Proteger pessoas que ama não é sua missão, Hector? Eu sou o vilão, você é o herói. Vamos lá, entre no personagem!
- Agora não estou afim de ser heroico. Só quero... sobreviver a isso.
- Sobreviver a mim? Veremos. Sabe... - aproximou o bisturi ao peito do caçador - ... sua passividade não é o que mais me incomoda. É o fato de nunca ter tido a oportunidade de estuda-lo. Me desobedeceu escolhendo salvar a filha do traidor. Eu era para ter sido seu pai, Hector, não John, ele fez um péssimo trabalho. Como punição, eu o levaria para experimentar minhas habilidades. Você é a cobaia perfeita.
Cansado, Hector dera uma cabeçada forte na testa de Loub, afastando-o. Depois dera dois socos de direita e esquerda, pegando o bisturi e cortando-lhe a garganta. O cientista caíra apertando horrorizado o corte que golfava sangue.
- Não devia ser temente a mim...
- Ainda consegue falar? - sacara o revólver.
- ... mas a ele. - dissera, caindo duro no chão. Uma mão com unhas compridas e afiadas agarrara o ombro esquerdo de Hector, virando-o.
- Enfim a sós. - dissera a contraparte licantrópica de Hector o deixando tenso ao limite. Não tinha a visto desde a alucinação quando Rosie testou seu controle. - Voltarei a pertencer a você, de um jeito ou de outro. - empurrara-o com uma mão. O caçador "voou" até uma mesa que partiu-se em duas. Ao tentar se levantar, olhou para o lado sombrio com vontade insana de destroça-lo e transformou-se.
No Templo dos Red Wolfs, Rosie tentava manter sua guarda ante a Michael.
- Quem diria que a filha do herege voltaria só para ser morta sem que ninguém a proteja ou chore por ela...
- Eu sei me virar, não preciso do Hector me supervisionando, já passamos dessa fase.
- Isso significa que o perdoou? Mas como? - indagou Michael, exasperado.
- O Hector me provou ser forte. Provou ser leal, aliás. Ele passou dois anos apenas tentando me resgatar do perigo que eu corria naquele hospital...
- Não sei do que está falando, mas não consigo entender....
- Nunca, jamais vai entender. O traidor aqui é você. Se o Hector resolvesse cair fora do serviço sujo, não pensaria duas vezes antes de ir atrás dele e mata-lo. É, eu sei, o fato dele ter escondido segredos de mim ainda... dói. Um pouco, mas dói, já posso dizer que superei quase completamente. Não tenho obrigação de me justificar pra você. Se vai ficar aí lamentando, sendo um fantasma fraco e...
- Não diga besteiras! Eu não sou fraco! - vociferou Michael, sacando uma faca. - Morrerá hoje!
Uma porta nos fundos do salão abriu-se e um corpo caíra. Rosie reconheceu para seu desespero.
- Ah, não... Hector! - disse, vendo a poça de sangue crescer ao redor dele. No entanto, outra figura surgiu da escuridão, passando por cima do cadáver, deixando-a confusa. - Hector? Mas...
- Rosie... - disse ele, olhando à sua direita... para Michael. - Não pode ser...
- O que diabos é isso? Que corpo é aquele? Pensei que estivesse morto.
- Os dois brevemente estarão, porque hoje é minha noite de sorte. - disse Michael, empolgado.
- Não conte com isso. - disparou Hector, sem olha-lo. Exibiu o revólver e atirou na cabeça do Red Wolf deixando um buraco sangrando na testa - Velho amigo.
- Hector, o que aconteceu?
- Aquele lá atrás... é minha contraparte sombria. - disse ele, guardando a arma - Deixamos os detalhes pra depois, nos concentremos em voltar ao mundo real. Venha. - seguiu à porta de entrada do salão.
Um outro cenário se descortinou. Parecia o centro de Londres inteiramente deserto sob um céu pálido de inverno sem flocos de neve caindo. Correram à rua, olhando em volta.
- Ótimo, qual nosso próximo passo? Vamos ficar de porta em porta, de em ilusão em ilusão, encarando nossos inimigos do passado? Estou preocupada demais, num nível bem pessimista.
- Vamos manter a calma. Não sabemos como funciona a dinâmica dessa realidade alternativa. Na pior das hipóteses, deve existir uma lei em que horas aqui signifiquem dias no mundo real.
- Muito reconfortante.
Uma cacofonia de rugidos selvagens ouviu-se. Um exército de quimeras nível 3 avizinhava-se como uma manada de touros enfurecidos. Todas corriam sobre duas patas, sedentas e insanas.
A dupla correra frenética até uma casa aleatória. Hector resolvera barrar a porta com seu próprio corpo, permitindo que Rosie ficasse encarregada de achar pistas.
- O que tá fazendo? - perguntou ela.
- Meu corpo é forte o bastante para uma barreira improvisada. Sorte nossa não ter janelas. Vai, rápido. É o único jeito de atrasa-las.
A jovem apressou o passo ao procurar alguma biblioteca ou escritório. Cinco minutos depois dela seguir na busca, Hector sentiu as primeiras batidas. As dobradiças balançavam abruptamente.
Rosie achara o que parecia ser o último cômodo. Um raio de esperança na forma de prateleiras com um acervo literário imenso divididos em seções. Ela procurara por "Fantasia". Viu uma lombada marrom com um pentagrama dourado e retirou o livro.
- Lendas da bruxaria antiga. - disse, abrindo-o e folheando-o depressa. - Talvez algum tipo de magia avançada provoque esse efeito de falsa realidade. Warlock... - leu rapidamente a introdução - Não. - passou mais folhas - Caosfera... também não.
Hector passava por perrengues. Já podia ver as garras das quimeras passando pelas brechas. Resistia ao máximo, torcendo por Rosie. No entanto, um momento de distração pelos pensamentos diminuiu sua força, dando vantagem à algumas quimeras que conseguiram derrubar a porta com o caçador.
No chão, via os pés delas invadirem o local. Fora pego por uma e arremessado na parede.
Transformando-se em licantropo, avançara contra elas, abatendo ao menos três, indo superveloz até onde Rosie estava, seguindo os sons dos batimentos cardíacos dela.
A jovem assustou-se quase derrubando o livro. O caçador arrastou um móvel na porta e foi direto à parceira, voltando ao normal.
- O que descobriu?
- Só um instante... - ela continuava a busca - Elas invadiram, não foi?
- Sim. - disse Hector, logo o som das batidas na porta acalorando a tensão - E já estão próximas.
- Pode ser isso. - disse Rosie, mostrando a página. - Lich. Uma espécie de bruxo-zumbi. Lembro bem de uma vez que minha avó me contou uma história sobre eles quando mais nova São extremamente raros e... podem criar feitiços de manipulação no espaço-tempo. O Lich foi em vida um mago que ganhou imortalidade graças a um feitiço de hospedagem de alma. Destruindo o objeto que preserva sua alma, quebramos o feitiço e isso o mata automaticamente.
- Mas e quanto a escaparmos daqui?
- Um espelho mágico. Na verdade, dois. Servem como ponte de escapatória. Se acharmos o primeiro e pularmos nele... - uma batida interrompeu-a - ... saímos pelo que está no mundo real. O desafio parece ter aumentado, estamos praticamente encurralados. É um sinal de que o espelho está perto.
- Vejamos... - disse Hector, focando numa suspeita porta no canto mais obscuro. - Não está trancada. - abriu-a, vendo uma escada íngreme a um porão - É por aqui.
Rosie descera primeiro, logo alertando sobre um grande cofre há poucos metros. Como não haviam itens para improvisar barragem, Hector apenas trancou.
O cofre possuía o tamanho de um refrigerador e sua porta parecia pesar toneladas. A combinação podia ser destravada com giros no botão.
- Não olha pra mim, você é o especialista nisso. - disse Rosie, incomodada.
- Não custa nada nós dois tentarmos. Melhor agirmos rápido, não há tempo... - disse ele, girando o botão. Rosie não entendera.
- Qual senha você achou que iria funcionar?
- Os números das portas pelas quais entrei. 98, 24 e 71.
- Nós dois passamos pela 71. - lembrou Rosie. - Viu só? Não deu certo. Deixa eu ver... - tentara com os números das portas que passou. - A que abri quando fugíamos dos miméticos foi a 19. A segunda quando entrei no museu mitológico foi a 45. A terceira para o templo dos Red Wolfs era a 56. A última foi a 71. Qual é o critério, afinal? Quem passou por mais portas ou quem enfrentou mais fantasmas?
- Tive uma ideia. - disse Hector. As quimeras faziam barulho no alto. O caçador tentara uma outra vez. Rosie percebera.
- Todos os números?! E se isso exige a ordem exata em que as portas foram abertas?
- Você matou a charada. - disse ele, afastando a mão e esperando. Olhou para cima - Estão cada vez mais perto. É bom esse espelho não ser tão pesado.
Um bipe soou agudo. A porta destravou-se lentamente. A dupla se entreolhou contente.
- Golpe de sorte. - disse Rosie, aliviada. - Como sabia?
- Não sabia. - disse ele, retirando o retangular espelho. - Me ajude aqui... - Rosie pegara na outra ponta. O deixaram na parede em vertical. Um alto som de madeira quebrando os fez estremecerem.
As quimeras rosnaram, avançando ferozes. Arrombaram a porta com tudo.
- Muito bem. No três! - disse Hector, assentindo para Rosie. - Um... dois... três!
Pularam simultaneamente. Ao entrarem, parecia que atravessaram uma camada aquosa.
O espelho real emitia fachos de luz verde nas rachaduras.
Despedaçou-se completamente quando Rosie e Hector irromperam de dentro até caírem no chão de madeira rangente.
O caçador apontou para cima, indicando ter encontrado o Lich ao escutar sua respiração.
A sala particular do Lich tivera sua porta arrombada violentamente por Rosie. O bruxo por sua vez rangera os dentes em cólera.
- Aí está você. - disse Rosie, visualizando as maquetes - Dá uma olhada nisso... - voltou os olhos novamente ao Lich - Então foi isso? Fomos suas peças de brinquedo esse tempo todo?
- Vieram perder tempo se esperam conduzir um interrogatório seguro. - disse o Lich. - Mas sendo generoso... Não foi difícil acessar suas memórias e canalizar seus piores medos ao feitiço. A pior parte mesmo foi mergulhar fundo nessas lembranças horrendas, vocês escaparam de tudo o que passaram e recomeçaram suas vidas como se todas as feridas tivessem cicatrizados. Eu quis constatar que não era verdade, que vocês reprimem as frustrações, sedando seus demônios interiores e enganando a si mesmos sobre controle do medo, da raiva, da angústia, humanos são incapazes disso. Não existe controle, apenas fuga e mais fuga e o medo... é só o que resta.
- É assim que costuma se divertir? Brincando com os medos alheios e testando as fraquezas dos seus alvos até que padeçam na loucura. - disse Hector, logo reparando nas vestes do mago e detectando algo curioso. - Espere... Já vi essa roupa antes. - pensou um pouco - São do batalhão 13 da guerrilha de Stratford em 1892. - retirou do bolso um recorte de jornal com uma foto do grupo e o desdobrou - Um certo jovem chamado Bayron Numel lutou neste confronto. - Rosie ficara boquiaberta.
- Recordar é viver. - disse o Lich. - Eu era famoso. Herdei o sanatório com as medalhas ganhas e recriei aquele lugar a partir das cinzas. Mas de nada serviu. Nunca estive satisfeito.
- Por isso se matou. Viu na magia negra uma salvação porque os fins justificam os meios. - disse Rosie, enojada - Além do mais, se fez passar por um amigo nosso nos atraindo pra sua armadilha. Como fez isso? Como sabe tanto sobre nós?
- Eu modelo os bonecos de acordo com as memórias que recebo através do poder da névoa. Leva uma fração de segundos, mas é doloroso. Quando a presa está próxima demais, eu a atraio a esta mansão antes pertencida ao meu pai. E a ligação... A magia permite ver meus alvos e estuda-los de antemão e tive tempo para traçar tudo. Não se preocupem, o tal Derek está sem arranhões. Mas vocês... - erguera as duas mãos, empurrando telecineticamente contra a parede e imobilizando-os. - A imortalidade é uma benção. A morte nunca foi tão vantajosa e nem sei porque praticantes como eu são tão escassos.
O Lich resolvera andar em direção à uma saída oculta.
- Ele vai escapar. - disse Rosie.
- Ah, que graça tem? - perguntou o Lich, soltando-os. - Vocês são moscas que se recusam a sair.
- Dá um jeito nele enquanto eu queimo as maquetes. - sugeriu Rosie, levantando-se. Hector sacou o revólver, mas antes que apontasse o Lich permaneceu parado mas infligindo magia contra ele. O caçador ajoelhou-se gemendo, sentindo os ossos apertando e os olhos lacrimejando sangue.
- Vou deixa-los bastante ocupados. - disse o Lich, tocando no rosto de Hector cujos olhos piscaram uma luz verde indicando enfeitiçamento. Ele transformara-se em licantropo e mirou em Rosie que tentava usar o poder do brasão para gerar fogo.
Rosie fora pega pelo caçador, sendo derrubada, mas chutara-o no rosto. Vendo o Lich fugir tranquilamente, ela entendeu porque.
- Ele jogou sujo dessa vez. Encantando você pra me atrasar. Me desculpa, mas vou ter que te dar uma boa surra pra nocauteá-lo logo. - disse ela, esquivando-se de um golpe, dando uma joelhada no queixo de Hector e usando uma estaca longa de madeira para bate-lo no rosto várias vezes. Olhava para o Lich entrar num compartimento pequeno. - Tudo bem, medida drástica. - tocou no brasão que brilhou. Rosie conseguiu empurra-lo com telecinesia longe o bastante para que pudesse completar sua tarefa. Hector impactou-se contra uma estante com inúmeros itens que caíam sobre ele. Balançou a cabeça, querendo recobrar orientação.
Concentrada, Rosie ateara fogo na maquete que representava os locais que enfrentaram. Sentindo como se um leão vendo seu filhote morrer, o Lich voltou para ataca-la, disparando um raio esverdeado da mão direita, o qual Rosie esquivou-se ao se abaixar.
Hector já havia recuperado do feitiço devido ao impulso da energia divina sobre seu corpo. A dor no pescoço foi ignorada com o achado de um baú caído e aberto, do qual saíra um relógio dourado. O caçador visualizou o confronto entre Rosie e o Lich e agarrou a chance. "Destruindo o objeto que preserva sua alma, quebramos o feitiço e isso o mata automaticamente."
Rosie estava em desvantagem pela forte pressão que o Lich infligia, tentando asfixia-la.
- Ei! Parece que seu feitiço tem validade curta. - disse Hector, mostrando o relógio.
- Largue já isso! É impossível, ninguém jamais encontraria, estava num local extremamente secreto!
- A sua estante, por exemplo?
- Não estava naquela estante. Nunca ele ficaria tão exposto. Eu disse pra largar ou ela pagará.
- Rosie! - disse Hector, jogando o relógio, confiando nela. A jovem canalizou o poder do brasão em concentração máxima e seus olhos brilharam amarelo, fazendo o relógio explodir em pedaços no ar.
- Não! - gritara o Lich, definhando-se até reduzir-se à cinzas.
- Mais um golpe de sorte? - perguntou Hector, exausto.
Rosie sorriu fraco, encostando-se na parede aliviada.
***
Ao saírem da mansão, ambos sentiam-se obrigados a levantarem questionamentos pendentes.
- Olhou no relógio? - perguntou Rosie.
- São onze e meia. - disse Hector - Eram onze e vinte e nove quando a névoa nos encobriu. Por incrível que pareça, passou-se somente um minuto enquanto lidávamos com nossos fantasmas.
- Nem fico mais tão surpresa. Sabe... Gostaria que falasse quais foram seus fantasmas. Se não quiser conversar sobre isso, tudo bem.
- Mollock... depois Loub... e por último o meu lado oculto. Sou meu pior inimigo.
- Eu matei a vadia da Sekhmet.
- Meus parabéns. Gostaria de ter entrado no mesmo local e presenciado, talvez te ajudaria.
- Enfiei a própria arma dela no pescoço. Não foi difícil. Mas foi estranho. Aquela sensação de saciedade... como se tivesse sido real.
- Sei bem como é. Consegui matar Loub pela segunda vez também me levou a essa sensação.
- Podemos esquecer esse pesadelo de uma forma descontraída, sabia? - disse Rosie, olhando-o.
- Ah é, qual seria sua ótima ideia para tornar esse dia mais leve?
- Revanche. - disse ela, parando - Velocidade máxima. Não se contenha. Quero ajudar nós dois a superarmos esse dia ruim. Enterrando o passado... criando um presente memorável.
Hector suspirou, rendido.
- Está bem. - disse ele, prontificando-se - Última vez, ouviu bem? Não importa o vencedor.
- OK. Vamos lá. Pronto?
- Quando quiser. - disse o caçador, esfregando as mãos. Transformou-se.
- Apotheosis!
O brilho distraíra Hector que fechou os olhos. Ao abrir, não vira mais Rosie ao lado.
- Devo considerar isso uma trapaça? Sou sensível a esse tipo de luz!
Sem discutir, disparou em supervelocidade até a floresta enevoada.
***
Um vulto cruzava a porta caminhando sob cautela precisa. Um corpo feminino trajando vestes negras e um manto que lhe cobria a metade superior do rosto. Subira as escadas ao se convencer do silêncio.
Fora direto à sala do Lich, cujas cinzas continuavam esparramadas no piso. Ela andara até uma estante de madeira vermelha e tentou empurra-la para o lado. Sua chegada havia sido uma hora depois de Rosie e Hector dispararem numa nova corrida. "Não era um blefe, pelo visto", pensou.
O móvel ocultava a marca de uma estrela de oito pontas em forma de setas gravada na parede.
O telefone tocara e ela atendera imediatamente.
- Eles fizeram o dever de casa. O bruxo morto-vivo agora está de fato... morto. Mais alguma coisa, meu senhor?
- Por ora, não. No nosso meio temos certos problemas de confiança, por isso liguei pra confirmar. Com esta já são três. Fez um ótimo trabalho... Dora.
CONTINUA...
*A imagem acima é propriedade de seu respectivo autor e foi usada para ilustrar esta postagem sem fins lucrativos.
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