Frank - O Caçador #2: "Quando o dever chama (Parte 2)"


Nota do capítulo: Partes em itálico representam flashback ou menções específicas.

CAPÍTULO 02: QUANDO O DEVER CHAMA (PARTE 2)


Dois anos antes...

Eram cerca de meia-noite e meia. 

Alguns membros da catedral de Danverous City conspiraram com o objetivo de destruir uma farsa há muito preservada na instituição, ligando para um dos celulares de Frank, solicitando seus serviços imediatamente. Como o detetive soubera? Para começar, o casal Montgrow consumara a união lá mesmo e seu pai tornara-se um grande amigo do arcebispo da época, uma relação resumida à conversas agradáveis sobre tempos áureos da vida e visitas esporádicas na bela casa comprada por ambos alguns dias após a cerimônia. 

Ao falecer, o arcebispo deixara uma carta secreta em algum cofre de sua casa, o qual confidenciou ao pai de Frank sobre um terrível segredo acerca da paranormalidade recorrente na cidade. 

Com os pedidos de ajuda do grupo, Frank fizera a ligação entre os dois casos, relendo uma enigmática carta anexada aos arquivos de seu pai. 

O atual arcebispo, de acordo com os relatos do grupo conspirador, passou a agir de maneira atípica duas semanas depois de ser nomeado para o cargo. Nenhum flagrante foi detectado, mas estavam certos de que a personalidade do homem alterara-se drasticamente, da noite para o dia, levando-os a lidarem com um líder infame e aparentemente blasfemador. 

Então, exatamente à meia-noite foi posto em prática o plano ideal para emboscar o sujeito cujas atitudes e os trejeitos não condiziam com os princípios ali respeitados. O grupo mentiu dizendo que um grupo de crianças viria para compor o coral em um ensaio para uma apresentação marcada para determinada data e que a duração do primeiro ensaio seria de quatro horas... com início à meia-noite. 

O grupo informou à Frank a respeito da decisão do arcebispo. De que ele não assistiria ao ensaio, pois se comprometeria com outros afazeres naquela noite e que somente poderia comparecer à catedral minutos depois do término do ensaio. 

O caçador tivera a ideia de tirar um gravação de coro angelical da internet e passa-la à um pen-drive, utilizando-a como chamariz. 

Um pequena caixa de som com o objeto de armazenamento conectado foi colocada na parte central do deambulatório da catedral - iluminado por lâmpadas LED amarelas. 

Ao descobrir a verdade, o arcebispo, rindo com escárnio irritante, mostrara seus olhos negros e assustadores, desfazendo-se da atuação que vinha perdurando por anos. 

Frank estava escondido em uma coluna, logo irrompendo da escuridão e expondo-se por trás do impostor com um isqueiro aceso na mão direita e jogando-o no chão em seguida. O demônio virou-se no exato momento em que a presença do detetive ficou mais nítida, encarando a pequena chama ir de encontro ao piso quadriculado e uma marcação de pentagrama em posição normal ser contornada pelo fogo que a "redesenhava". 

- E a aranha consegue capturar a mosca. - disse o demônio com a face do arcebispo, com zombaria no tom, a luz laranja das chamas iluminando-o de baixo à cima. - O que vai ser, detetive? - perguntou, sorrindo com cinismo. - Nós dois concordamos que tortura é um método bem antiquado. 

- Mas sempre funciona. - retrucou Frank, a voz séria, aproximando-se do prisioneiro tomando cuidado ao evitar pisar nas linhas do pentagrama de fogo. Sacou de seu sobretudo marrom claro algemas com símbolos anti-demoníacos entalhados, logo as pondo nos pulsos do arcebispo. - Teremos uma bela conversa... sobre um assunto bastante específico. 

O demônio dera uma risadinha. 

- Pra sua informação... eu senti, de longe, o cheiro asqueroso de óleo sagrado. - confessou ele, a face de deboche. - Mas foi um bom plano, sem dúvidas. Por um momento achei que aqueles traidores o haviam feito, mas veja só... Aqui está, diante de mim, o recurso buscado por eles em função do desespero. - aproximou seu rosto ao de Frank. - Eu temi ser uma armação. Eu deixei você vir me pegar. Então, eu aceito avançarmos para o próximo nível. - disse ele, dando um sorriso amarelo e largo, mantendo os olhos cobertos por um preto vivo e pulsante. - Bem, apague a chama e... faça um desejo. 

- Sim... - disse Frank assentindo e forçadamente sorrindo de canto de boca. - Vou desejar que você volte para o buraco de onde nunca devia ter saído e apodreça nele eternamente. - pegou-o pelo braço com certa violência. - Depois, claro, de me contar tudo o que preciso saber. 

                                                                                             ***

- Reconsidere, por favor! - pediu Carrie, as mãos apoiadas na mesa da sala de reunião. Seu olhar de súplica direcionado ao diretor Duvemport transmitia um desespero contido à força. - Estime um prazo para que ele possa pensar melhor. Tudo, menos uma demissão tão súbita como essa! - seu tom passara a ser petulante de certa forma.

O diretor pigarreara forte, olhando-a com desconfiança, claramente indisposto a ceder à ideia da assistente de seu mais confiável agente que, naquele instante, parecia ter petrificado com as duas fortes palavras ditas pelo chefe.

- Isso não pode esperar. - rebateu Duvemport, o tom frio ao se dirigir à Carrie. - Eu vou repetir: São Bilhões, com B maiúsculo, investidos neste projeto. O que seu querido amigo demonstrou aqui na minha frente foi uma completa desconsideração pelos sinceros votos de confiança depositados por mim desde que o aprovei no teste. - olhou de relance para Frank. - Olhe pra ele. Quis dar uma de durão, cantando vitória antes do tempo, sem esperar o que vinha a seguir.

- Ele esperava que compreendesse seu ponto de vista. - disse Carrie, em total defesa do companheiro, sua face estando incrivelmente séria como não se via de costume.

- E o que devo fazer? - perguntou Ernest, dando de ombros. - Nada de prazos, senhorita Wood. Há pouco parecia estar favorável à mim, e agora que tomo uma decisão justa, você me recrimina como se eu tivesse explodido uma bomba.

- Por conta da sua decisão precipitada. - devolveu ela, cada vez mais desafiadora na postura.

- Precipitada!? - repetiu Duvemport, franzindo o cenho, claramente insatisfeito. - Não gosto de insinuações, senhorita Wood, então sugiro que esclareça melhor sobre sua opinião a meu respeito.

- Insinuar o quê numa hora dessas? - perguntou ela, também franzindo a testa, reprovando a má interpretação do diretor. - Eu fui bem clara. Só esperei que fosse tomar uma decisão mais... sensata, no mínimo. - disse, arqueando as sobrancelhas.

Os nervos do diretor entraram em ebulição máxima.

- Fui insensato... - disse ele, andando pela sala vagarosamente com as mãos para trás, ainda irredutível. - ... por demitir um funcionário negligente à uma iniciativa respeitosa e com um investimento sério e esforçado. - virou-se para ambos, raivoso no semblante. - Isso é insensatez, senhorita Wood! Justo agora que conseguimos uma chance, um momento ideal para cavarmos mais fundo, o homem em quem mais confiei, o homem em quem eu mais estimei neste departamento me decepciona vergonhosamente com uma opinião tão vaga, como se estivesse mais a par do que eu no projeto, quando na verdade não sabe nada além do que portais virtuais de notícias publicam com aqueles titulozinhos sensacionalistas de dar asco!

- Eu vou pedir pela última vez, diretor. - disse Carrie, aproximando-se dele com um ar de aflição. - Dê um tempo ao Frank. Por favor. Ou, talvez, torne-o mais próximo do projeto, se possível. Não queira barrar as saídas do vasto labirinto de possibilidades que temos à vista. - fez uma pausa, um pouco pensativa. - Espera aí... uma demissão só é realmente concretizada caso o distintivo seja confiscado pelo chefe. Então... - virou-se para Frank, mas logo foi impedida por Duvemport que dera alguns passos à frente.

- Frank. - chamou o diretor, sério, estendendo seu braço direito com a mão aberta. - Dá aqui o distintivo. - olhou-o com severidade. - Agora.

Carrie, rendida, fechara os olhos, passando rapidamente a língua entre os lábios, não acreditando no que estava presenciando. "Mas que cabeça dura! Isso, Carrie, você acabou de ferrar com a carreira de seu melhor amigo, bom trabalho.... que merda.".

O detetive saíra de seu transe reflexivo para desviar o olhar desalentado para a face austera do diretor. No entanto, o mesmo olhar alterara-se gradualmente... parecendo emanar um aura de determinação.

- E então, Frank? É pegar... ou largar. - definiu Duvemport, sem rodeios.

- Está bem, diretor. - disse Frank, assentindo de leve.

Duvemport, por outro lado, esboçou um sorriso discreto e um olhar de esperança.

- Traduzindo: Eu me rendo. - disse ele, em tom provocativo.

Carrie cruzara os braços, estática e focando sua atenção unicamente naquela conversa. Involuntariamente estava cruzando os dedos.

- Não, diretor. - negou o detetive, sorrindo de canto de boca. - Significa que tenho algo a contar. Algo sobre a falha que talvez tenha uma base verídica.

                                                                                          ***

No escritório paroquial, Frank trancara-se com o demônio aprisionado numa cadeira por amarras de couro reforçadas e apertadas. Ao redor do prisioneiro, estava desenhado no chão, na parte central da sala semi-escura - iluminada apenas pelo luar - um pentagrama em posição normal. Um dos principais fundamentos quando se deveria exorcizar um demônio é o de manter-se diante dele e do pentagrama, vendo-o em sua posição comum. Caso o demônio fosse posto em um pentagrama visto de forma invertida pelo exorcista, não funcionaria. 

- Então deixou de acompanhar a peça... - disse o demônio -  para fuçar os bastidores. Legal... 

- Primeiro... - disse Frank, aproximando-se com um semblante de seriedade pura. - ... diga-me de onde você vem. Seu lugar de origem. O berço de bosta onde você nasceu. 

O demônio rira debochadamente. 

- Até parece... até parece que já não nos vimos antes. - soltou ele, intrigando o detetive. 

- Como é que é? - perguntou Frank, pondo a mão próxima ao ouvido direito e inclinando-se de leve, fazendo como se não tivesse escutado direito. 

- 2008. Rua Blake Dash, 78. - disse o monstro, mantendo seus olhos completamente pretos. - Um barzinho qualquer. Negócio arriscado. Saí de mãos vazias. E, de quebra, fui dedurado por uns cretinos traíras. Viu só? Nem demônios podem confiar uns nos outros. 

Frank, pensativo, aparentava estar vasculhando em suas memórias o ocorrido mencionado. Não tardou muito para que pudesse recordar do caso envolvendo pactos entre demônios e pessoas desesperadas. Pessoas que desejavam ganhar na loteria, que desejavam vingança á outras, que desejavam curas milagrosas para doentes, que desejavam a pessoa amada... 

- Espera aí... - disse Frank, levantando uma sobrancelha. - Então era você!? O demônio que andava selando pactos de quarteirão à quarteirão num caso no qual eu tive que interrogar um penca de outros desgraçados como você para descobrir sua localização!? Agora que estou lembrado... - fez uma pausa, pondo uma mão na cabeça, parecendo confuso. - Mas... não parecia ser você. - falou, desviando os olhos para ele. 

- É, a escola da vida desregrada fez de mim um excelente ator. - disse ele, movendo os dedos intencionando querer se libertar. - Vocês, caçadores, nunca saberão fazer uma distinção correta. 

- Claro. São demônios. - disse Frank, andando para um lado, olhando pela janela. Ouviam-se sons distantes de sirenes de polícia - São todos iguais.. Dissimulados, fingidos e traiçoeiros, não estou nada surpreso. 

- Ah, pare... está ferindo meus sentimentos. - disse o demônio, irônico. 

- Responde minha pergunta. - disse o detetive, colocando a mão dentro do sobretudo com a intenção de retirar algo. - De onde você veio? 

- Eu sempre estive aqui. - revelou ele, o cenho franzido. 

- Aqui... onde? - insistiu Frank, sem tirar a mão no bolso de dentro do sobretudo. 

- Neste mundo triste. - disse ele, lacônico. 

- O que tem a dizer sobre os tremores de terra recentes na cidade? - perguntou Frank. 

- Pouco me importa. - disparou o monstro, destilando todo o seu desprezo. - Esta cidade vai cair... literalmente. - dissera, logo desatando a rir com zombaria. 

- Isso é uma ameaça? Parte de um plano? - questionou Frank, estreitando os olhos. - Você seguem ordens do chefão lá de baixo? 

- Uma pergunta de cada vez, amador. - retrucou o demônio, incomodado com a insistência de Frank. 

- Pra sua informação, trabalho nesse ramo há tempos. - disse o detetive, rodeando o círculo com o pentagrama em lentos passos. - Amador é a última coisa que eu esperaria que me chamassem. Mas não é nada demais vindo de uma aberração como você. - abruptamente, pegara-o por trás pelo pescoço, agarrando-o com a mão esquerda. O caçador cerrara os dentes demonstrando sua impaciência. 

- O que foi agora? Vai apelar para a violência?! Eu realmente esperava mais originalidade... 

- Responde logo! - disse Frank, em voz alta, sem soltar o pescoço do arcebispo possuído. - A menos que queira tomar um bom banho de óleo sagrado! 

- Eu não sei! - gritou o demônio, enraivecido. - Não sei nem mesmo como é lá! 

- Lá aonde? - perguntou Frank, soltando o pescoço do arcebispo e voltando-se a ficar diante dele e do pentagrama. Adentrou sua mão direita para um bolso interno do sobretudo, prestes a retirar um cantil com óleo sagrado ou um crucifixo. 

- Minhas fontes não são muitos seguras, mas... 

- Ah, então o desgraçado tem parceiros. - disse Frank, esboçando um leve sorriso e arqueando as sobrancelhas. Seu semblante voltara a ficar austero. - Quantos deles sabem? 

- No máximo, três. - respondeu o demônio, a fala rápido. - Sempre fui de poucos amigos. Trabalho melhor sozinho. 

- Pois é, eu também. - retrucou Frank, assentindo. 

- Temos algo em comum, pelo visto. - disse o demônio, sorrindo sarcasticamente. 

- Vamos lá, foco. O quanto seus informantes sabem? - perguntou o detetive, pondo as mãos para trás e olhando fixamente para o prisioneiro. 

- Não o bastante que os desconhecidos saibam. - revelou ele, misterioso. 

- Então não tem certeza se eles tem contato com esses desconhecidos? - interrogou Frank. 

- Como eu disse: nem demônios podem confiar uns nos outros. - disse ele, dando de ombros e sorrindo. - O nível de confiabilidade das informações não depende deles. Eu apenas sou o receptor. 

- Eles lhe disseram como é do outro lado da falha? - perguntou Frank, permanecendo calmo. - Forneceram uma descrição completa? 

- Foi a´ultima coisa que me falaram... - revelara o demônio, virando o rosto para a janela, pensativo. - ... antes de serem mortos. 

- Mortos por quem? 

- Eu lá vou saber. - respondeu ele, ríspido. - Pelo modo como me contaram, o lugar fede a carne podre. É uma terra infértil, chove sangue a cada meia hora e nenhum monstro está seguro. Eu sinto... todos nós sentimos... Está mais próximo do que pensam. 

- Então é algum tipo de profecia apocalíptica? - indagou Frank. - Era só o que faltava... 

- Basicamente. - disse o demônio, movendo os dedos levemente. - Há quem discorde... mas eu acho o andar de cima bem mais divertido. Mas vai acontecer algo... algo grande... de proporções gigantescas. E, juro, não sei o que vai vir depois. 

Frank suspirara longamente, logo virando as costas para o demônio preso na cadeira e dirigindo-se à porta a fim de sair, provavelmente dando uma falsa esperança ao prisioneiro. 

- É só isso? - perguntou o monstro, fazendo o detetive parar. - Não vai querer ouvir minhas últimas palavras? Tentar me arrancar deste corpo velho? 

O caçador o olhara por cima do ombro de modo suspeito. 

- Já que mencionou... Bem lembrado. - disse ele, retirando algo do sobretudo... 

                                                                                           ***

O diretor Duvemport já não sabia mais no que acreditar. Estagnado, ouvia as declarações de Frank, fazendo movimentos discretos na boca, como se quisesse balbuciar algo que soasse como uma palavra discordância àquele argumento inacreditável, ao mesmo tempo em que balançava de leve a cabeça em nítida negação.

Carrie escutava atentamente, mas não tão surpresa quanto o chefe.

- É a mais pura verdade, diretor. Posso não ter uma prova concreta agora comigo, mas digo, honestamente, que foi exatamente desta forma. Acredite em mim... por favor. - disse Frank, transparecendo sinceridade na medida do possível.

- Se pretende... - disse Ernest, apoiando as mãos na mesa, parecendo desnorteado. - ... se pretende causar um adiamento nas operações continuando indeciso... então por que, tratando essa informação com tamanha urgência, você não toma logo uma posição?

- Essa missão será um agravante. - opinou Frank, voltando-se para Ernest. - O demônio disse haver algo do outro lado da falha, então... - pensou um pouco. - ... é razoável presumirmos que exista alguma espécie de mundo paralelo do qual as criaturas que enfrento quase todos os dias se originam. Vocês querem cavar mais fundo, sem considerar todas as possibilidades, sem temer os riscos, sem nem pensar no que vão encontrar. E, acredite diretor, eu temo que, se a missão for oficializada, não vão gostar do que irão encontrar.

Duvemport aparentava estar preso em si mesmo, sem dar nenhuma palavra por vários segundos, deixando Frank e Carrie no limite da tensão proporcionada por todo aquele suspense desconfortável.

- E então, diretor? - perguntou Frank, olhando-o. - Mais convencido agora?

- Ainda há cogumelos de onde vem os Zetas em toda a área territorial da falha externa?  - perguntou Carrie para Frank.

- Da última vez que verifiquei no mapa online - respondeu Frank -, há três semanas, estava repleto deles. - voltou-se para o diretor. - O que é mais uma razão para adiar a missão para alguns anos mais tarde. A forma primária dos Zetas são cogumelos que lançam feromônios venenosos, letais para seres humanos, quando absorvem uma boa quantidade de oxigênio, tudo para se protegerem de invasores. E tenho certeza que o senhor, obviamente, não vai querer ouvir notícias sobre mortes de funcionários contratados pelo Exército numa missão que, sem recursos adequados, pode ser o maior fiasco da história da cidade. Já pensou? "Parceria entre DPDC e Forças Armadas é o maior fracasso já registrado em toda a história de Danverous City". Conhecendo bem o senhor, deve estar se sentindo bem envergonhado só de ouvir essa sugestão minha... quero dizer, não bem uma sugestão, não confunda as coisas, está mais para suposição se caso...

- Chega!!! - berrara Duvemport, virando-se bruscamente para Frank, pondo as duas mãos na cabeça. - Está bem, está certo!! - falou, olhando para ambos, bufando. Apontou para Frank. - Você: Demissão revogada. - apontou para Carrie logo depois. - E você: Trate de avisar ao superintendente. Pelo bem do departamento, pelo bem da minha imagem... eu... - mordera os lábios, ainda parecendo relutante. - ... peço um adiamento da missão ao Exército.

- Uhuu! - comemorou Carrie, logo indo em direção à porta.

- Ahn... Carrie. - chamou Frank, franzindo a testa. - Você se lembra de que lado estava há pouco?

A assistente virou-se para ele, parecendo perdida e nervosa com a pergunta. Relanceou o diretor rapidamente.

- Ah sim! - disse ela, de forma bem-humorada, rindo. - Olha, na verdade, eu fiquei feliz muito mais por você, Frank, por ter tido sua demissão suspensa. Não sabe o quanto eu fiquei aflita só de pensar naquela sala vazia, comigo falando com as paredes ou servindo à um outro agente que não tenha nem 1% da sua competência, do seu companheirismo...

- Não dá para resolverem isso quando chegarem em casa? - perguntou Ernest, interrompendo Carrie, pegando uma garrafa com bebida e servindo-se.

Um silêncio desconfortante os deixou pouco à vontade após a insinuação do diretor.

Ambos entreolharam-se rápido, corados.

- Err... eu posso saber... - indagou Frank, sem saber bem como se expressar. - ... Será que dá para o senhor ser mais específico com isso?

- Ué? - disse Ernest, dando de ombros. - Estão aqui há mais de três anos. Achei que o entrosamento alcançou o seu pico.

- O quê?! - soltou Carrie, claramente envergonhada. - Espera, então o senhor pensava que eu e o Frank... ahn... nós dois...

- Sim, Carrie, foi exatamente isso que ele pensou. - disse Frank, levantando o indicador levemente com os olhos fechados por uns segundos. - Não, diretor. - apontou o mesmo dedo para Ernest. - Dessa vez o senhor errou. Errou feio.

- Que pena. Formam um belo casal. - disparou ele, sem medo, pondo mais bebida no copo. - Sem ofensas.

- Tudo bem, melhor eu ir logo. - disse Carrie, visivelmente nervosa, andando e saindo da sala de modo apressado.

- Também vou nessa. - disse Frank, franzindo a testa e sorrindo desconcertadamente ao olhar para Ernest enquanto andava até a porta entreaberta.

No instante em que Frank dera as costas, Duvemport o chamara inesperadamente.

- Frank. - largara o copo, passando a olhar para o homem com quem nutria forte apreço, apesar das divergências sempre comuns em reuniões cujos assuntos eram de extrema gravidade.

- Sim, senhor? - disse Frank, voltando-se para o chefe.

- O demônio sabia da exata data desse provável acontecimento de proporções gigantescas? - perguntou ele, curioso.

- Não, senhor. - respondeu Frank, a face e a fala tranquilas. - Ele dizia não saber... mas sabe como é né? São monstros. Demônios são os mentirosos mais profissionais que existem. Não sei bem ao certo, mas... pensei ter sentido um fundo de verdade. - olhara para um canto da sala, reflexivo. - Os tremores... um mais intenso que o outro... a falha externa aumentando vários metros de ano em ano... - voltou os olhos para o diretor. - Prefiro acreditar não ser tão cedo quanto ele fez parecer.

- Eu também. - concordou Ernest, tomando um gole em seguida. Frank dera um passo na soleira da porta, quando novamente fora chamado pelo diretor. - Ahn... Frank, só mais uma pergunta. - pousara o copo na mesa metálica, fitando o detetive com seriedade.

- Pode falar. - disse Frank.

- O que houve com o demônio... após você exorciza-lo?

Frank dera um sorriso tranquilo, revisitando o momento mentalmente.

- Nada de bom. - respondeu ele.

                                                                                          ***

A língua do arcebispo passou por entre os lábios, o demônio que o possuíra saboreando cada segundo do recitamento de exorcização falado por Frank. 

- Espírito imundo, ordeno-te a sair deste recipiente do qual é indigno de tua malícia! - dissera Frank, com firmeza no tom, segurando e apontando para o demônio um crucifixo médio e de cor preta, feito de metal cobreado. Aproximou o objeto, esticando o braço direito que o segurara. Como esperado pelo detetive, os efeitos do exorcismo elucidaram-se. As luzes dos abajures piscando, a cortina da janela esvoaçando com intensidade devido à corrente de vento que se formara com o processo. 

- Grite mais alto! - pediu ele, como se estivesse divertindo-se, sem nem ao menos imaginar o que esperava. 

- Espírito imundo, ordeno-te a sair deste recipiente do qual é indigno de tua malícia! - repetiu Frank, com mais elevação na voz, tomando cuidado para não pisar no círculo com o pentagrama desenhado. 

- Mais! Mais! Mais! - gritava o demônio, com sua voz oscilando para um tom humano - do arcebispo - e outro mais macabro. Começava a se debater na cadeira, balançando a cabeça enlouquecidamente. Podia-se ver metade de seu verdadeiro e monstruoso rosto aparecer por segundos. Uma face preta, um pouco menos escura que seus olhos, e com dentes pontudos e brancos expostos. O rosto do arcebispo, por outro lado, apresentava sangramento no nariz e nos olhos. 

Não houve outro jeito. Frank acabou por pisar no círculo e aproximar o crucifixo ao demônio, vendo-o que o mesmo só estava testando sua paciência numa estúpida tentativa de resistir ao poder infalível do exorcismo. 

- Ora, seu desgraçado... - falou Frank, tomando uma medida drástica ao chegar mais perto do demônio e encostando o crucifixo no rosto do arcebispo, queimando a carne em uma ardência lancinante. - Me desculpe, se sair dessa inteiro, jamais vou me perdoar por isso. - disse ele, em baixo tom. 

- Não é pra tanto. - disse o demônio, os olhos fechados e gemendo com os dentes cerrados ardorosa e crescentemente. 

- Não tô falando com você, miserável. - retrucou Frank, apertando mais o crucifixo contra a bochecha esquerda do arcebispo possuído, produzindo uma leve fumaça branca em decorrência do ardor que a carne sofria. Era como submeter alguém à uma tortura elétrica ajustada em uma alta voltagem. - Se continuar assim... a única coisa a sair prejudicada disso aqui vai ser você, já vou avisando, hein! - disse o detetive, encarando-o com fúria. Pusera sua mão esquerda sobre a cabeça calva do arcebispo, logo fechando os olhos e recitando um novo exorcismo, enquanto a catedral parecia estar tremendo por conta da alta atividade demoníaca em manifestação. - Espírito malevolente e sub-mundano, eu ordeno que se desprenda deste corpo agora! - apertou um pouco mais a sua mão contra a cabeça do aprisionado. No entanto, as hemorragias nasal e ocular pareciam ter agravado-se. 

O demônio, enfim, berrara de dor, sem demonstrar mais resistência e, subitamente, saíra do arcebispo feito uma sombra fugitiva, praticamente dando um pulo para fora. Frank fora atingido e arremessado contra uma parede, mas nada que resultasse em um dano muito grave. O crucifixo fora parar em um canto qualquer da sala, perdendo-se nas partes opacas. Materializando-se, o demônio ficara de pé, cambaleante para uma direção para a qual o detetive torcia consigo mesmo para que fosse-lhe conveniente e não ter feito trabalho à toa. Frank olhou de relance para o arcebispo preso na cadeira, inconsciente e com a batina manchada de sangue. 

A aparência do demônio não necessitava de uma descrição muito longa, caso alguns dos bispos quisesse saber. Apenas um ser completamente preto, com unhas cinzentas e crescidas e dentes brancos pontudos e à mostra. Parecia estar bêbado. 

- Isso... vai... continue assim. - dizia Frank, enquanto se levantava, torcendo para que a armadilha desse certo. 

Por fim, o demônio mordera a isca. Pisara numa linha armada por Frank, a qual acionava a abertura de um balde com água benta amarrado no teto, fazendo-o tomar um belo banho. 

- Maldito! - disse a aberração sobrenatural, vendo-se encharcada e impotente, caída no chão. 

Frank, prontificando-se, pegara seu isqueiro e o acendera, logo em seguida jogando-o no demônio que rapidamente tivera seu corpo entrando em combustão instantânea. 

Batidas na porta fizeram-se alarmantes. Frank triara as chaves dos bolsos e destrancara-a, abrindo passagem para um desesperado reverendo, tão velho quanto o arcebispo, curioso quanto à situação que se passava na sala. 

- Mas o que significa isso? - perguntou o reverendo, estupefato com a terrível cena de um corpo nu debatendo no chão enquanto chamas consumiam cada camada de sua pele áspera. Recuou vários passos, olhando para Frank boquiaberto. 

- Calma, calma, reverendo Cloyd. - disse Frank, tocando-o no ombro para tranquiliza-lo. - Certamente deve estar a par dessa situação. Eu consegui. Viu só? Isso é o demônio que antes estava... 

- Oh, meu Deus...  - surpreendeu-se Cloyd ao visualizar o arcebispo desacordado na cadeira. 

- Ele vai sobreviver, fique tranquilo. - avisou Frank. 

- Mas... mas... - o reverendo olhara para o demônio rastejando no chão, apontando para ele. - Vou... vou precisar chamar um bombeiro! 

- Não, não será necessário. - contrariou Frank, recuando mais passos com o reverendo. - Porque o desgraçado vai queimar até morrer. - olhou de modo enviesado para o senhor de idade. - Mas vai precisar de um zelador. - olhara de relance para o chão molhado. - E chamar uma ambulância para o arcebispo Lobell, principalmente. 

                                                                                       ***

- Então você não contou à eles sobre ter sido egoísta? - perguntou Carrie, andando ao lado de Frank no corredor.

- Acha que fiz por egoísmo? - indagou o detetive, a face franzida ao olhar para a assistente. - Honestamente, pouco me interessava saber das intenções daquele demônio dentro catedral. Capturar um demônio com um grau de separação com um amigo de meu pai era uma oportunidade valiosa demais para se deixar escapar. O que fiz foi em favor de uma apuração maior de informações sobre a falha. Além do mais, era um demônio a menos na cidade.

- Um demônio a menos em Danverous City, numa noite qualquer, não faz a mínima diferença. - opinou Carrie, fazendo uma cara feia. - Foi mal ter chamado você de egoísta.

- Ah, que nada, está tudo bem. - disse Frank, sem se importar. - Talvez eu tenha sido mesmo... só um pouquinho. - olhou para ela, fazendo um gesto com os dedos indicador e polegar, representando menor quantidade.

- Aquele 1% não é? - perguntou ela, sorrindo discretamente. - Nem sempre faz muita diferença.

- No meu caso, pareceu que fez diferença. Mas não me culpei. - declarou Frank, andando com mais calma. - De início, não pensei em dividir essa informação com ninguém. Agora me sinto mal por ter escondido isso do diretor por dois anos.

- Não esquenta. Já foi. - disse Carrie, amigavelmente tocando no ombro esquerdo do detetive. - E foi essencial para convencermos aquela cabecinha dura a apoiar sua ideia.

- Convencermos? - perguntou Frank, levantando uma sobrancelha ao encara-la. - Sendo que fui eu o salvador do dia.

- Nem pra dividir o crédito? - perguntou Carrie, estreitando os olhos para ele.

- Pensei que você quase ia apelar para chantagem emocional. - brincou Frank.

- Ah, sai pra lá. - disse Carrie, batendo de leve no braço do detetive com o cotovelo. - Reconheça meu esforço. - fez uma pausa, pensativa por alguns segundos. - Mas e aí... Sobre os cogumelos na área da falha externa?

- Cuidarei disso ainda hoje. - determinou Frank. - Farei mais uma verificação no mapa. Quem dera estivesse propício para instalação de câmeras, assim ficaria mais fácil rastrear um Zeta depois de seu nascimento, vendo para qual direção ele resolveu seguir. Passados uns dois ou três dias, já veríamos um caso noticiado no jornal. Desvantagem conveniente para caçadores: Zetas não conseguem encobrir todos os seus rastros.

- Se lembra daquele que você deixou escapar? - perguntou Carrie, olhando para Frank. - No ano passado?

- O quê? Foram tantas caçadas com esses desgraçados como alvos. - disse Frank, vítima de uma amnésia temporária.

- Sendo mais específica: O maluco entomofóbico no telefone. - disse Carrie, tentando lembra-lo.

- Ah, sim! - disse Frank, pondo uma mão na cabeça e sorrindo levemente. - Ele não era maluco. - dera uma risadinha ao recordar do caso. - Mas foi confundido com um, infelizmente.

                                                                                 ***

Um ano antes...

O rapaz chamava-se Dave e residia em uma casa localizada próxima dos subúrbios de Danverous City, área considerada por Frank como a mais infestada de casos paranormais, principalmente os que envolviam seres como os Zetas, criaturas imprevisíveis e que utilizavam-se de aparições-surpresas para pegarem a vítima desprevenida e, por fim, lançarem por meio dos orifícios nas palmas de suas mãos um gás alucinógeno. 

Frank acelerara para socorrê-lo. No entanto, ao chegar à localidade, deparou-se com o jovem fora da casa, sentado na calçada, com um cobertor envolvendo seu corpo. Ao ver o detetive saindo do carro, correra ao seu encontro. 

- Olá, olá! Detetive Frank! - disse ele, aproximando-se do caçador, largando o cobertor na rua. 

- Não lembro de você. Nos conhecemos? - perguntou Frank, estudando-o. 

- Ahn, eu... - Dave balançara a cabeça em negação, parecendo perdido. - O quê?! 

- Ligou pro meu escritório me chamando de Sr. Frank - disse o detetive -, presumi então que já havíamos nos visto antes, em algum caso. Desculpe, não sou muito bom com memória... 

- Não, eu... eu... - disse ele, em gaguejadas. - ... eu consegui... consegui seu número de contato com o um amigo meu, o Owen. Não se lembra dele? O caso dos tabuleiros Ouija... 

- Oh, sim! Bem lembrado. - disse Frank, estalando os dedos. - O Owen! Lembro muito bem daquele rapaz. Como ele está? 

- Ele se mudou. Há cinco meses. - revelou Dave, tremendo. Voltou seus lhos arregalados para o detetive. - Ouvi muito falar do senhor desde aquele dia. Garanto que seu segredo está seguro. 

- Ah, tá OK. - disse Frank, sorrindo de modo amigável. - É sempre bom conhecer um fã. - falou ele, em uma vã tentativa de descontrair o clima. Vendo que o objetivo não foi alcançado, andou logo em direção à casa. Dave o seguira após apanhar seu cobertor do chão. 

O interior da casa - sala de estar espaçosa e toda com paredes brancas - estava repleto de baratas de várias espécies. Frank entrara, enquanto Dave permanecia do lado de fora, aguardando as conclusões da investigação. 

- Qual foi a última vez que essa casa foi inspecionada pelo Controle de Pragas? - perguntou Frank, elevando o tom para que Dave pudesse ouvir lá fora. 

- Na verdade, nunca foi. - disse ele, no mesmo tom, a voz trêmula. 

- Sério? - insistiu Frank, franzindo o cenho. - Isso aqui virou uma zona da noite pro dia? - indagou, em seguida espantando com a mão esquerda uma barata voadora. 

- Eu sempre zelei pelo meu lar. - garantiu Dave, ainda tenso, encostado na parede. - Quando acordei hoje de manhã... já estava assim! 

- Seja mais preciso, Dave. O que aconteceu antes de você se deparar com as baratas? - perguntou Frank, examinando a sala de estar com um aparelho detector de ectoplasma. 

- Eu ia tomar banho... 

"Isso explica ainda estar de pijama", pensou o detetive, olhando embaixo de um vaso. 

- Depois... - continuou Dave - ... assim que abri a porta... eu só vi aquela fumaça amarela... 

- Você disse fumaça amarela?! - quis saber Frank, levantando-se para escuta-lo atentamente. 

- Sim... ela tomou conta do meu campo de visão, completamente. - relatou Dave. - Fiquei espirrando por vários minutos. Minha visão ficou turva, eu cambaleei feito um bêbado para fora do banheiro, mas... 

Um instante de silêncio deixou o detetive impaciente. 

- Mas...? - disse Frank. 

- Eu pensei ter visto alguém... uma pessoa nua, sei lá... 

- Só pode ser brincadeira... - disse Frank em tom baixo, andando em direção à escada, tomando cuidado para não ser "atacado" pelas baratas voadoras que zanzavam pela casa. - Continue! 

- Foi tudo muito rápido. Assim que cheguei ao topo da escada... ai, caramba... - fizera uma face de choro. - ... aquelas coisas asquerosas estavam por toda a parte! Meus olhos começaram a arder muito! Senti como se uma roga muito poderosa tivesse sido injetada em mim! Mas eu juro para o senhor, as baratas que pensei serem demônios não estavam aí antes. 

Nos degraus foram encontrados resquícios de uma gosma de coloração meio alaranjada roseada. Frank, sem perder nenhum segundo, sacara do sobretudo um saquinho e uma colher para coletar a amostra. Pusera o conteúdo gosmento dentro do recipiente de plástico. 

- Dave. - chamou Frank, saindo da casa. - Veja isto. - mostrara o saquinho com a gosma dentro. - A coisa que atacou você não é uma especialista em ocultar seus rastros. 

- Então o senhor sabe quem era aquele homem? - perguntou Dave, aparentando não ter mais nenhum discernimento do que era real ou fantasioso. 

- Não é um homem. - disse Frank, guardando a amostra. - Possui uma forma humanoide, mas não é humano. Muito provavelmente foi ele o responsável por atrair essa grande quantidade de insetos. Tudo indica que ele não esteja mais na casa e tenha escapado. - voltou-se para Dave, sacando um celular. - Vou ligar para o Controle de Pragas, depois eu vejo como vai ficar sua situação. 

Porém, Dave tirara algo do bolso da calça do pijama. Um papel com algo escrito. 

- Na verdade, eu sei exatamente como vou ficar. - disse ele, entregando o papel á Frank. 

- O que é isso? - perguntou ele, recebendo. 

- É o endereço do hospital psiquiátrico. O mesmo onde meu irmão está internado. Por incrível que pareça, acho que encontrei uma chance de revê-lo. - disse o jovem, parecendo estar controlando sua tremedeira. 

Frank olhou o número e a localização do hospital com minúcia. 

- Acho que conheço esse hospital. - olhou para Dave com seriedade. - Qual a causa da internação do seu irmão? 

- Esquizofrenia. - disse Dave, inclinando-se para perto de Frank. - Muito sinistro. - sussurrou. 

- Ah, eu imagino. - aquiesceu Frank, guardando o papel no bolso. - Vou ligar sim. Mas... só tem um problema. E dos grandes. 

- Com tudo o que aconteceu hoje... o que não poderia ser um problema na minha vida? - disse Dave, lamentando-se de sua condição. 

- Primeiro: Você dificilmente vai rever o seu irmão. - disse Frank, sensibilizado. - Segundo: Lá farão testes toxicológicos em você, o que, sem sombra de dúvidas, vai concluir como sendo consumo abusivo de drogas. E terceiro e o pior: Você vai ser preso em vez de internado. - tocara-o no ombro - Sinto muito, amigão. 

O semblante de Dave ficara estático de repente. O jovem sentia-se como se o chão houvesse desaparecido sob seus pés. O suor que descia pela testa passou a aumentar e sua respiração ficar mais pesada. 

- Jurei à mim mesmo... que se algo assim ocorresse comigo... eu não entraria em pânico. 

- Bem, acho que é hora de lutar contra isso. - disse Frank, demonstrando apoio. - Seja forte. 

- Não existe um antídoto? - perguntou Dave, os olhos marejados. 

Frank mordera os lábios, balançando a cabeça de leve em um "não". 

- Infelizmente, não. - confirmou ele. - Quando a substância alucinógena dessa criatura entra em contato com o organismo humano, ela passa se misturar com as células do seu sangue, transformando-se numa substância que o corpo se adapta rapidamente. É como se você tivesse ingerido drogas por via intravenosa. E é essa conclusão que os médicos terão quando você for examinado. 

Dave ficara alguns segundos em silêncio, pensando em como sua vida seria dali em diante. 

- Que loucura. 

- Se eu tivesse conhecido você na época daquele caso do Ouija, eu teria te dado um guia básico de como se proteger de certas criaturas paranormais. - disse Frank, parecendo ter desejado que aquilo acontecesse. - Essa espécie de monstro é vulnerável à eletricidade. 

- Já é tarde demais. - disparou Dave, alterando sua face para irritação. - Melhor você ir embora. - olhou-o de relance. - Mas obrigado. 

Frank suspirara, sentindo-se um pouco mal pela situação do jovem. 

- Se cuida. - disse ele, despedindo-se. - E boa sorte. - desejou, sacando o celular para telefonar para o sanatório

- É, vou precisar. - retrucou Dave, tendo ciência dos horrores que poderia passar na prisão. 

                                                                                       ***

Indo à sala particular de Carrie, Frank sentia-se carregando uma imenso peso nas costas. 

- E então, como foi? - perguntou Carrie, levantando-se de sua cadeira de modo súbito tamanha era sua curiosidade. 

- Bem, não fiz muito. Ele foi encaminhado para um hospital... e chamei um dedetizador. 

Carrie franzira a testa, estranhando. 

- Um dedetizador? Por que?

- Era uma infestação de baratas. - disse Frank, pondo seu sobretudo numa cadeira. - Pra ser mais exato, foi a ação de um Zeta. - sentara-se na cadeira ao lado. - Encontrei amostras da gosma que ele deixa sempre que passa por um lugar onde mais está ativo. Deve haver mais no banheiro, mas não passei da escada, considerando a hipótese de ele estar escondido. 

- Se achou amostra, então porque diabos não seguiu o rastro? - perguntou Carrie, cruzando os braços. 

- Sabe como é trabalhoso seguir os rastros de um Zeta. - disse ele, lembrando-a. - Levaria semanas, talvez meses para encontra-lo. E Zetas, muitas vezes, costumam retornar ao local de origem, nem sempre ao local do crime. 

- É, tem razão. - concordou Carrie, olhando para um canto. Voltou seus olhos para Frank. - Parece deprimido. Aconteceu alguma coisa?

Frank parecera despertar de um transe. 

- Hã? O quê? Não. Me sinto ótimo. 

- Tirou o sobretudo. Na minha sala. - disse ela, sem deixar-se enganar. - Essa carinha de cão sem dono. Até parece que falhou na missão. Mas não. Alguma coisa o comoveu pra deixa-lo assim. - aproximou-se dele, sentando-se na mesa. - Sou todo ouvidos, Frank. Nos conhecemos há quase três anos... e o que temos aprendido um com outro só prova que você não hesitaria em se abrir comigo. 

- É... você tem sido uma grande conselheira. - disse Frank, sincero. - Melhor deixar pra lá. Quando houver um outro caso envolvendo Zetas, quem sabe eu consiga acabar com o mesmo que atacou o cara com fobia de insetos, mas desta vez seguindo os rastros dependendo de como eles estiverem. 

- Acabo de revelar um talento na arte da desconversação. - disse Carrie, comicamente decepcionada por Frank ter recusado contar a história de Dave. - Você é terrível, Frank. - disse ela, sorrindo com ironia, sentando-se na cadeira. 

Frank desatara em gargalhadas que iam aumentando a cada segundo. 

- Você me curou, pelo visto. - disse ele, levantando-se. 

- De nada. - respondeu ela, sorrindo amistosamente, mesmo sabendo que não fez muito para alegra-lo.

- Estou contando com você... sempre. - disse Frank, com sinceridade, pegando seu sobretudo. Dera uma piscadela para sua assistente e saíra da sala. 

Uma sensação de orgulho acometeu aquela mulher de 40 e poucos anos. Orgulho por ter obtido um parceiro que a completava profissionalmente. 

                                                                                          ***

Ao sair do DPDC bastante tarde da noite, Frank seguia em direção ao seu carro no estacionamento iluminado por lâmpadas fluorescentes verdes. Parara ao ouvir o sinal de uma mensagem de voz enviada para seu celular. Retirara-o do bolso antes de abrir a porta do carro e verificara o remetente.

- Mensagem de voz... Anônimo. - disse ele para si mesmo.

Aquilo só poderia significar uma coisa.

- A bala de prata. - disse Frank. - Mas não sei. Pode ser um belo de um trote. Não conheço meus seguidores do canal. - guardou o aparelho. - Não faz muito tempo que pus o áudio no ar. À essa altura, pode ser qualquer coisa. Ameaça de morte, trote, uma pegadinha... menos a localização da bala. - abrira a porta do carro, entrando logo depois.

A mensagem fora rejeitada. O carro de Frank saíra do estacionamento... enquanto uma figura feminina, oculta nos cantos sombrios, observava à uma certa distância.

Uma mulher caucasiana, de cabelos pretos e lisos, usando óculos de grau médio, um casaco para o trabalho e um batom vermelho vivo... anotando algo em uma prancheta após ver Frank visualizando a mensagem.


                                                                                    - x -

Confessionário:

Hoje tive uma reunião tensa com meu chefe. Não foi nada fácil, não foi nada tranquilo.

Estou com pressa... ainda há uma montanha de trabalho a fazer, vou virar a noite. 

Então não posso falar muito. Não hoje. Apenas que eu quase fui demitido hoje e me safei expressando uma justificativa convincente sobre uma missão financiada pelo Exército. Querem escavar fundo para analisar a falha. 

Nada de monstros nesse dia.

Por hoje é só. 

       _________________________________________________________________________


Nota do autor: A trama do último flashback foi abordada na edição 14 de Nem tudo É O Que Parece, no ano passado, a qual serviu como um "teste" para os personagens, e foi reutilizada nesse capítulo para um melhor aprofundamento, tanto para explicar o que houve após a revelação da história publicada, que teve ares de trollpasta, quanto para apresentar uma criatura nova que será melhor desenvolvida em capítulos futuros.


Edição Nº 14 de Nem Tudo É O Que Parece:

http://universoleituracontoscreepys.blogspot.com.br/2015/05/nem-tudo-e-o-que-parece-14.html



*A imagem acima é propriedade de seu respectivo autor e foi usada para ilustrar esta postagem sem fins lucrativos ou intenções relativas a ferir direitos autorais. 


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