Frank - O Caçador #40: "A Canção da Dama"



Clarissa e Robert possuíam grande influência num grupo de amigos que organizou uma festa de gala para comemorar o aniversário de um deles e eram valorizados pela boa relação que cultivavam há anos. No entanto, havia chegado num ponto em que a estima dos amigos se dava apenas porque o casal sabia manter as aparências. Nos bastidores, longe dos olhos de quem acreditava serem um "par perfeito com uma vida perfeita", desenrolava-se a verdadeira interação de ambos que ameaçava chegar num patamar crítico onde já não suportariam mais a presença um do outro. Naquela noite, voltando da festa, não fora diferente. 

- Se nada mais importa pra você, então acelera a merda desse carro e larga o volante. - disse Clarissa, seus belos cabelos castanhos bem alisados caindo no busto coberto pelo vestido púrpura - Vai em frente e acaba logo com isso. Até que a morte nos separe. Não foi assim que ouvimos no dia que cometemos o maior erro de nossas vidas?

- Melhor fechar a matraca e continuamos amanhã. Segundo round. - disse Robert, um homem de quase quarenta anos que já sinalizava uma pequena calvície que subtraía seus fios pretos - Tá bom pra você? Dá pra segurar? 

- Não, quero encerrar esse assunto hoje e agora. Não aguento mais. - fez uma pausa, receosa - Eu vi as fotos. 

- Do que tá falando? Bebeu além da conta de novo? 

- Tô sóbria o bastante pra afirmar isso com toda convicção. - disse Clarissa, seguindo irritada. Ela mexera no celular no qual estavam as tais fotos comprometedoras e mostrara-as - Nunca testamos essa posição antes. - na foto exibida na tela, Robert transava com outra mulher sobre uma mesa - Ou essa. - passou para a foto seguinte - Sua consciência tá tranquila demais porque sabe que nosso casamento vinha fadado ao desastre muito tempo atrás. 

- Quem te mandou essas fotos? - perguntou Robert, subindo o tom. 

- Não interessa! É a prova cabal de que precisamos dar um fim logo ou vamos acabar nos destruindo! 

- Me dá essa porcaria de celular. - pediu ele, olhando-a com expressão raivosa. Clarissa resistiu, porém teve o aparelho tomado à força. Ela tentava segura-lo ao máximo, mas Robert conseguiu arranca-lo de suas mãos. O carro quase perdia a direção no meio da estrada. Robert jogou o celular pela janela, deixando-a transtornada - Adeus fotos horríveis. 

- E adeus pro casamento também. - disse Clarissa, retirando a aliança do dedo anelar e jogando-a pela janela - Estamos "quites". Ou melhor, desquitados, tecnicamente. 

Robert parecia espumar pela boca a qualquer momento e acelerou o carro ultrapassando o limite. Virou para um barranco íngreme que dava numa lagoa vasta. O carro balançava com o solo meio rochoso e repleto de terra. 

- Robert, o que vai fazer? - indagou Clarissa, o medo soando na voz - Eu tava brincando quando disse pra acelerar e nos matar... 

- Pro seu azar, eu nunca estive brincando. - disse ele que em seguida tirou as mãos do volante para abrir a porta. Pulara para fora abandonando a esposa no veículo em movimento e cada vez mais indo de encontro às águas fundas da lagoa. 

- Robert! - gritara ela que quis arriscar sair pela mesma porta, mas seu cinto de segurança travara e lutou em vão para desprender-se. O carro caíra com impacto na água, submergindo rapidamente. 

Robert observou atônito o que impulsivamente fizera. Subiu o barranco e sacou o próprio celular efetuando uma ligação. 

- Alô? Emergência, por favor! Acabei de testemunhar um acidente de carro... Caiu no fundo da lagoa. - visualizou aterrorizada o fim do barranco, as luzes vermelhas dos faróis traseiros desaparecendo na água. 

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CAPÍTULO 40: A CANÇÃO DA DAMA 

10 dias depois

Departamento Policial de Danverous City

Frank estava na sua sala compenetrado no arquivo de um caso irresoluto que nada mais era que um crime passional - ou feminicídio, como os portais de mídia se referiam. Batidas na porta o desconectaram da leitura atenta. 

- Entra aí. - consentiu, esperando ser Carrie. Porém, foi Ernest quem vinha entrando com certo ar entusiasmado - Diretor? Sinceramente não esperava que fosse o senhor. Algum problema?

- Problema não, solução. - disse Ernest, sentando-se na cadeira em frente ao detetive - Andei pensando com meus botões ultimamente e uma ideia não me largava da cabeça. 

- Seja o que for, é bom não ser outro blefe pra usar nossa boa vontade de fazer campanha gratuita. - disse Frank, alfinetando com relação à mentira que inventou para fazer ele e Carrie aceitarem o voluntariado para a propaganda eleitoral nas ruas -  Não tô muito bolado com aquilo, sei que queria nós participando ativamente, e eu quero que o senhor vença, mas pisou mais feio na bola com a Carrie. 

- É verdade... Nenhuma oferta de aumento vale um clemente perdão. 

- Acho que um pedido de desculpas sai mais em conta. 

- Vou tentar. - disse ele, desconfortável - Digo, o farei. 

- Mas fala aí, o que o senhor tanto pensava nesses dias? É sobre mim?

- Sobre nós, aliás. Lembra daquelas nossas pescarias? Ah, saudosos domingos esporádicos aqueles. 

- Não tá planejando marcar um dia pra gente reviver esses bons tempos, né? 

- Se estou pensando, é claro que não. Nós vamos reviver. - respondeu Ernest, enfático, parecendo otimista - O que me diz, hein? Não venha julgar meu saudosismo, quero aproveitar o máximo possível dos momentos felizes com meus amigos antes da rotina eleitoral me atolar até o pescoço. 

- Se não tiver nenhum caso emergencial, vou ser o primeiro a estar lá. É no mesmo lago? 

- E qual mais poderia ser? Amanhã à tarde. 

- OK. Isso é estranho... - Frank deu um sorriso tímido - Parece até que vou ficar um longo tempo sem vê-lo. 

Carrie adentrara na sala sem pedir licença. 

- Tô atrapalhando um papinho sério demais pra interromper? Ahn... - olhou para o detetive - Desculpa entrar assim, Frank. Bom dia. 

- Bom dia pra você também, Carrie. Não esquenta. Logo que te vejo trazendo uma papelada, pedir pra entrar não é necessário, pelo menos não quando outra pessoa já está aqui... - desviou o olhar para Ernest que estava sério diante da presença da assistente - Diretor, agora seria um momento apropriado, não ia?

- Eu... - disse Ernest, envergonhado demais para encara-la. As palavras travaram na garganta. 

- Tá, eu já sei exatamente quais palavras não querem sair da sua boca. Vou levar em conta essa postura de cachorrinho que fez bagunça e se recolhe todo. - disse ela, sorrindo com satisfação. 

- Não sou como um cachorrinho. - retrucou Ernest, finalmente olhando-a - E... me desculpe. 

- Pela proposta pretensiosa ou pela enganação que usou de nossa generosidade? 

- Os dois. - respondeu o chefe, fitando ambos - À vocês minhas mais sinceras desculpas. 

- Melhorou. - disse Carrie - Só por isso não anulo meu voto. 

- O quê? Pensou em votar nulo caso eu não me desculpasse? 

- Pensando na forma que nos tapeou, até seria justo. - disse Frank, dando de ombros. 

- Pior que seria sim. - concordou Ernest, expressando certa tristeza na face. 

- Bem, chega de lenga-lenga: Aqui estão relatórios de mortes por afogamentos ocorridas nos últimos 10 dias e em curtos intervalos. O fator estranho é que todas as vítimas são homens. Ao menos duas não foram localizadas durante as buscas. A maioria deles não foram achados boiando na lagoa próxima da rodovia 35, mas estavam ensopados perto da margem baixa e os laudos de autópsia declararam que os pulmões estavam cheinhos de água. - disse Carrie, pondo os papéis na mesa de Frank que verificava um por um rapidamente. 

- E se os corpos estivessem secos, o que diriam? Um fantasma que controla a água para matar? 

- Já lidei com um fantasma que congela, agora um que manipula água?! Tá parecendo tipo uma sina pra enfrentar espíritos dos quatro elementos. - disse Frank - Qual será o próximo? Fogo? Terra? Ar?

- O fantasma de alguém que morreu afogado... - disse Carrie, pensativa - Se a Melissa que morreu dentro de um tanque de água gelada obteve um poder amplificado de reduzir temperaturas, então talvez este possa dominar a água ou se transformar nela para se esgueirar e dar o bote. 

- Exato. - endossou Frank - Faz muito sentido. Fantasmas especiais que matam em nome da vingança de maneira que corresponda à causa da sua morte. Além disso, têm alvos específicos, como a maioria dos fantasmas. Mas por que somente homens? 

- Vai ver essa mulher foi morta pelo seu marido afogada e virou feminista. - brincou Ernest.

- O ponto que contraria o padrão são as vítimas serem aleatórias. A única especificidade é o fato de serem homens. - destacou Carrie, focada nas evidências. 

- O cara que morreu por último se chama Robert Ramsey, foi achado perto da lagoa 15 dias depois de testemunhar um acidente de carro na mesma lagoa. Só que testemunhou muito mais do que a polícia imaginava. - disse Frank, achando interessante a reviravolta - Quando resgataram o carro da água, encontraram documentos do Robert espalhados nos bancos, provas que depuseram contra ele. A polícia bateu cedinho da manhã na porta dele. 

- Eu esqueci de ler essa parte. - disse Carrie, culpando-se pela pressa de entregar o caso à Frank. 

- Então o caso se fecha: Robert matou a esposa largando-a no carro. - disse Ernest - Nem tão fora do padrão. 

- É o que tá parecendo. - disse Frank, ainda lendo o relatório - Ele alegou ter perdido o controle da direção e não conseguiu tirar a esposa que ficou presa no cinto de segurança e dolorosamente escolheu deixa-la ir para salvar a si mesmo. 

- Conversa pra boi dormir. - resmungou Ernest, não vendo nada de convincente na justificativa. 

- Mas ele ligou pra emergência dizendo que testemunhou o acidente. Não diria isso se não tivesse realmente ligação. - enfatizou Carrie, também crendo que Robert é responsável direto pela morte. 

- Olha, sendo o Robert culpado, ele pagou caro. - disse Frank, levantando-se - Mas preciso focar nesse fantasma, no caso a esposa dele. Esses caras que morreram foram pra lagoa atraídos por alguma coisa... E isso me dá uma boa ideia do que provavelmente seja. - andou até a porta - Vou ver os meus arquivos.

- Ah, o seu bestiário de caçador. - disse Ernest - Tem certeza que não é melhor ficar para quem sabe esperar alguma outra vítima aparecer? A distância daqui para a lagoa é bem mais curta. 

- Não, tenho que cruzar os detalhes do caso com as descrições do monstro que pode estar por trás disso. - disse Frank, abrindo a porta - Se não for, é com certeza um fantasma. Aliás, é praticamente uma certeza, mas quero confirmar 100%. 

- Te ligo se uma nova morte for registrada. - disse Carrie. Frank deu um joinha com o polegar direito e uma piscadela, logo em seguida saindo da sala. 

                                                                               ***

Havia uma casa situada á alguns metros de distância da margem mais baixa na qual residia um homem que levava a vida consertando peças eletrônicas. Ele estava sentado à sua mesa completamente alheio à cacofonia de cantos de pássaros do lado de fora, sem também perceber algo sorrateiramente adentrando no seu recinto. Algo que se arrastava sob a forma de água, entrando pela brecha inferior da porta e passando pela sala de estar como uma serpente aquosa. A água se metamorfoseou numa forma humanoide até esclarecer a aparência de uma mulher descalça trajando vestido púrpura rasgado e encharcado que gotejava bastante no chão de madeira. Seus cabelos castanhos molhados emolduravam uma face extremamente pálida e tranquila, mas que transparecia frieza. Ela andou até a porta do quarto onde o homem realizava sua tarefa, porta esta que tinha um vidro retangular. O olhou sedutoramente por alguns segundos. 

O homem logo escutara um som melodioso que o fez não ouvir mais nada além disso. Parou o que estava fazendo e levantou-se da cadeira. A moça do outro lado cantava docemente, sua boca fazendo movimentos suaves e lentos que alteravam os tons. Ela começou a andar para trás à medida que o homem aproximava-se cada vez mais hipnotizado. Saiu da casa, inexpressivo, direcionando-se para a lagoa onde afundou os pés na água que ia cobrindo suas pernas, depois os joelhos, depois o torso, os braços e por fim a cabeça... Até que não se via-o mais fora a ondulação na água. 

No fundo do lago, a luz do sol refletida tornava o ambiente deslumbrante. Mas o paraíso aquático que cercava o homem não se comparava à beleza, para seus olhos iludidos, que estampava na moça que cantarolava e o tocou no seu rosto para aproxima-lo ao seu. Beijou-o na boca intensamente. Mas quanto mais se estendia no ato, mais a face do homem tornava-se decrépita, quebradiça e morta. Após saciada sua fome, ela o empurrara largando-o na água, sorrindo consigo mesma. 

                                                                                  ***

De volta à sua casa, Frank foi para os arquivos de seu pai remexer nas gavetas dos empoeirados armários de ferro a fim de encontrar a letra inicial da criatura que suspeitava ser a causadora do afogamentos, embora a hipótese do fantasma soasse muito mais plausível. Pegou a pasta com a letra "S" e folheou depressa. "Eu tinha visto uma vez o nome...", pensou ele. 

- Aqui está... - disse ele, finalmente achando - Tem muita coisa batendo... E agora? 

Seu celular tocou e rapidamente atendeu sabendo que era Carrie. 

- Ah não, não vai me dizer que outro cara morreu afogado na lagoa. 

- Bem, você já disse pra si mesmo, acertando em cheio. Mas pra não perder o costume de te informar: Outro cara morreu afogado na lagoa e há uma hora. A equipe de buscas já foi acionada. A vítima é um consertador de aparelhos que instalou sua moradia própria e ganha-pão na margem da lagoa. Se não fosse pela testemunha, um cliente dele, adiaria sua olhada de mais perto pra ver do que essa coisa é capaz além de matar afogada, porque minha intuição diz que faz bem mais que isso. 

- Eu li no arquivo agora há pouco. - disse Frank, na dúvida - As descrições do caso batem com o modus operandi das sereias. 

- Sereias? Bem, talvez seja, afinal os marmanjos são atraídos, obviamente pelo canto. Porém... Um fantasma naturalmente não teria essa habilidade. Teria? 

- O lance da atração... Só podem ser sereias, estão seduzindo as vítimas com seu canto hipnótico e as devoram e quando o som é obstruído a vítima tem chance de escapar ilesa se libertando, mas nem todas saem da água. 

- Lembra do que falei dos corpos? Estavam fora d'água. As sereias seriam rápidas o bastante pra pegarem de volta sua presa ainda na água. Mas fantasmas podem se teleportar, são extremamente rápidos... 

- A gente não tá chegando à uma conclusão definitiva. É um monte de semelhanças. - reclamou Frank. 

- Pesquisei por espírito que arrasta suas vítimas para a água. - disse Carrie, devorando o texto da lenda - Ninfas d´água. 

- O quê?! Uma ninfa?! Tô caçando uma ninfa, é isso mesmo? 

- É como ela é vulgarmente chamada. Os eslavos se referiam à ela como Rusalki, um espírito amargurado, incansável e vingativo de uma mulher que morreu afogada pelo próprio cônjuge, seja em lagos, rios, praias ou em banheiras. Mas elas não alvejam só o ex-marido e sim todo e qualquer homem que passar pelo lago ou lagoa onde morreu. 

Frank teve um repentino estalo, um lampejo de confirmação. 

- As sereias se alimentam das vítimas que conseguem fisgar... O que aconteceu com os homens que não foram encontrados na margem? 

- Deixa eu revisar aqui... - disse Carrie, voltando sua atenção aos relatórios - Você devia ter lido tudo. 

- É muito texto pra ler na pressa, peguei só o essencial. E você também, até porque esqueceu da parte que falava do Robert. 

- Quer fazer um curso de leitura dinâmica? 

- Não, obrigado. E aí? O que houve com as vítimas resgatadas na água?

- Caramba... Seus corpos vieram com pele pálida, apodrecida, como se seus sistemas vitais tivessem sido drenados até a última gota. E atualizando a página da Gazeta Danverous... eis que me deparo com a notícia de que a equipe de resgate já retirou o corpo da última vítima. Meu Deus... Frank, são as mesmas características. Essa súcubo aquática tem que ser parada e hoje. 

- Qual é a fraqueza dela? Não posso ficar só na defensiva com balas de sal já que é um espírito raro. 

- Diz aqui que uma adaga esquentada a uma temperatura extrema pode vaporiza-la, literalmente. 

- Peguei a visão. Vou indo pra lá agora, aproveitar a deixa. - disse Frank, logo desligando e devolvendo a pasta ao armário. 

                                                                            ***

Nas proximidades da lagoa, o grupo de resgate com auxílio de uma equipe vinda na ambulância trazia o homem deitado sobre uma maca. Frank chegara aproximando-se dos profissionais. 

- Cadê a testemunha? 

- Deve ter ido embora. Acho que tava abalada demais pra permanecer por aqui. - disse o membro da equipe de resgate - Tentamos fazer respiração boca à boca, mas pelos sinais visíveis... - balançou a cabeça negativamente, entristecido. O celular de Frank tocara naquele instante. 

- Bom trabalho. Apesar dos pesares. - disse Frank, acenando com a cabeça para ele e se afastando para atender á chamada - Diretor? - apertou no ícone verde - Fala chefinho, o que tá pegando? 

- Eu estive pensando... 

- Não, não começa desse jeito, por favor. Sempre que o senhor inicia uma frase com "estive pensando", não espero outra coisa senão um convite que não vou ficar muito á vontade em aceitar e menos ainda em recusar. 

- É o mesmo convite, seu idiota. - retrucou Ernest, levemente aborrecido - A diferença está no local. Pra ser direto, quero mudar nosso ponto de pescaria para a lagoa da sereia-fantasma. 

- Quê?! - disse Frank, sua voz chamando a atenção dos resgatadores que o olharam - Tá fora de cogitação, diretor. Já saquei qual é a senhor, essa estratégia não rola de jeito nenhum. 

- É a oportunidade valiosa que tem para detê-la. Eu serei uma isca. Podemos ir hoje à noite.

- Diretor, pensa bem... O maior pesadelo de um caçador veterano é assistir as pessoas que mais lhe importam morrerem bem diante dos seus olhos. E o senhor não pode se arriscar tanto assim. 

- Ainda tenho fibra sobrando. Se a sereia me laçar, você vem e me salva. Claro, não como um daqueles salva-vidas que carregam a mocinha afogada nos braços. 

Frank não controlou uma risadinha com a piada.

- Bem, não é exatamente uma sereia, mas... Pior que a ideia de uma isca cai bem pra esse caso. 

- Considero isso um "sim"?

- Desde que o senho não considere uma ordem e sim um favor. 

- Aqui quem está falando é seu amigo Ernest e não o chefe de operações do DPDC. 

- Tá legal, então. O senhor passa lá em casa às oito. Já sei de um jeito pra acabar com os dias de cantoria da morte dela. 

                                                                             ***

Horas mais tarde, um rapaz de pouco mais de 20 anos estava sentado na margem jogando umas pedrinhas para quicarem na lagoa como se quisesse matar o tédio. Ouriçou-se quando a última pedra fez um movimento distinto aos das anteriores, parecendo ter saltado. Ele franziu o cenho levantando-se, tirando seu boné laranja. De repente um canto melódico soou aos seus ouvidos, começando num volume baixo, mas aumentando gradualmente. Notando que o som provinha do que quer que se escondia na água, o jovem caminhou, entrando na lagoa entorpecido pela música suave. 

No entanto, o barulho alto vinda da sirena da viatura policial que passara na rodovia obstruiu o som, rompendo a conexão hipnótica que mantinha a presa da Rusalki sob controle. O garoto piscou os olhos inúmeras vezes, espantado por se ver com a água batendo na cintura e correu de volta à margem. Seguiu pela mata rapidamente, mas virou para trás imaginando ter escutado um ruído. Voltou-se para a direção em que seguia, mas sequer deu o passo direito. Clarissa estava diante dele com uma expressão raivosa, os olhos fitando com ódio sua presa que livrou-se do seu encanto. Temporariamente, claro. O rapaz recuou, sentindo naquele olhar uma fúria intimidadora. 

- O que você quer? Precisa de ajuda? 

- Fracotes como você merecem morrer. - disse ela, friamente, aproximando-se - Por que fugiu? Não gostou da minha voz?

- Aquele som de canto... Era você? - tropeçou para trás num tronco, caindo sentado - Eu achei... lindo. 

- Mentiroso. Todos vocês mentem. Se tivesse gostado... teria mais foco, mais paixão. - seu espírito metamorfoseou-se em água indo diretamente para a boca e para o nariz do jovem que se debatia com os pulmões enchendo-se de líquido até que caíra morto. 

                                                                            ***

A noite finalmente chegara para que Frank e Ernest pudessem realizar a pescaria de fachada que deveria ser genuína e livre de qualquer problema sobrenatural envolvendo o detetive. Frank pôs a caixa de iscas no solo gramado enquanto Ernest preparava as varas ajustando as linhas. 

- O céu lindamente estrelado. Ópera dos grilos. O doce ar do campo... - disse o chefe, dando uma inspirada funda - ... que logo mais pode dissipar. Pena que não vamos desfrutar como nos velhos tempos. 

- Foi ideia do senhor, pra constar. - disse Frank, pegando o maçarico - Olha, fazemos o seguinte: Quando sairmos dessa, a gente abstrai um pouco e aproveita conforme o planejado. 

- Soa tão confiante vindo de você. Parece brincadeira de criança lidar com um fantasmas desses, não?

- É uma dureza, nunca varia de fantasma pra fantasma. Mas eu geralmente mantenho ou recupero o fôlego pra umas atividades normais. 

- Escolheu a palavra errada pra esse momento. Talvez devesse falar... disposição. - disse Ernest, pronto para lançar a linha com anzol e isca na água - Se tudo acabar bem, prometa que vai se espelhar em mim. - jogara a linha sobre a água e esticou-a para afunda-la mais. Frank estava agachado de costas esquentando a lâmina que trouxera com o maçarico de chama azul - Frank, por que não deixa isso pra depois? Nos divertir agora enquanto resta tempo. 

- Ela vai dar um sinal daqui à pouco. Tem dois caras pra ela papar, não vai dar bobeira. 

A linha de Ernest fez um balanço significativo que apenas poderia indicar que fisgou algo. Mas Ernest não disse nada para comemorar a conquista. O diretor estava inebriado pelo canto de Clarissa que emergia da água entoando sua melodia e segurando a linha da vara de pesca. Ela nadou para mais distante sem cessar o canto. Ernest não titubeou em acompanha-la, entrando na água num ritmo acelerado. Quando Frank terminara de esquentar a lâmina e reergueu seu corpo para virar-se à Ernest, o detetive arregalou os olhos, tomado por um senso de urgência máxima. 

Frank correu afundando os pés nas águas escuras para alcança-lo. Tomou uma atitude rápida: Pegou seu celular que ficava no bolso externo de cima no sobretudo, que encharcou na parte baixo, e ativou um toque no limite mais alto do volume. Mas percebeu que Ernest ainda via-se afastado para o som não fazer frente ao da Rusalki e aproximou-se mais, já boiando. Esticou o braço direito para tocar no ombro esquerdo de Ernest e sacudi-lo, logo pondo o aparelho no ouvido com o toque altíssimo. 

- Diretor! Vê se reage! - gritou Frank, desesperado. Ernest retornava à sã consciência e logo recuou sua cabeça incomodado com o toque estridente. 

- Tira isso de perto de mim! O que tá fazendo? - deu-se conta que estava na lagoa - Mas... O que faço aqui? Como cheguei aqui? Ouvi uma voz, uma voz deslumbrante e lírica... - parecia fascinado.

- É, posso imaginar, só que não é hora de ficar elogiando o talento dela. Vem logo. - disse Frank. 

Ambos voltaram para a margem. Ernest mostrou-se preocupado com sua libertação.

- Frank, acho que sofrerei o mesmo destino dos que escaparam. E se ela...

Clarissa aparecera repentinamente diante deles, a face pulsando de cólera. Ela avançou contra Frank tentando ataca-lo com golpes genéricos, mas o detetive desviava e conseguiu derruba-la com uma rasteira. Frank dera um soco, no entanto, Clarissa transformou-se em água e o punho do detetive atravessou-a. Logo ela alvejou Ernest, arrastando-se sob a forma aquosa. A Rusalki envolveu-o como uma serpente de água, imobilizando-o, logo adentrando pela boca dele a fim de mata-lo afogado. 

- Essa não... - disse Frank que logo pensou em ir para a lagoa com a lâmina. O ímpeto de Frank irritou Clarissa que não aceitava que invadissem seu lar sem fossem chamados e desistiu de inundar os pulmões de Ernest para perseguir o caçador. O diretor caiu no chão, engasgado e tossindo água. Clarissa pulou para cima de Frank gritando como uma fera e caíram juntos na água. A faca infelizmente estava inutilizada e Frank baixou a cabeça de Clarissa na água como uma provocação.

- Quer se afogar de novo? Toma! 

Clarissa revidou pondo suas mãos no rosto e transmitiu lembranças horrorosas que lhe revelaram imagens tenebrosas da entidade que originava as Rusalkis, além das mortes por absorção de energia vital. Clarissa estava pronta para aplicar seu beijo mortal quando o detetive tirou na força bruta as mãos que pareciam coladas no seu rosto, libertando-se das visões aterrorizantes. A empurrou fortemente, voltando para a margem. Ernest já prontificava-se esquentando uma segunda faca, trazida por ele, com o maçarico. 

- Pensa rápido, Frank! - disse ele, jogando a lâmina. Frank pegou-a pelo cabo firmemente. 

- Tava na hora! - exclamou ele. Clarissa o agarrou por trás segurando sua cabeça na intenção óbvia de quebrar seu pescoço. 

- Eu não sou tão limitada quanto pareço. - disse Clarissa - Quando um homem escorrega das minhas mãos, vale tudo para puni-lo! Chegou a sua vez! O próximo será ele! 

- Vou me ferrar primeiro, é? - disse Frank que, mesmo de costas, cravou a adaga quente bem fundo na barriga de Clarissa. O espírito da moça se liquefez por inteiro - Sou um cavalheiro, então... Primeiro as damas.

Clarissa tivera seu espírito evaporando dos pés à cabeça rapidamente ao mesmo tempo que ela urrava furiosamente. O vapor quente subiu até esmaecer. 

- Já deu de pescaria por hoje. - disse Ernest, exibindo cansaço - Que tal algo inédito pra nós? - deu um sorriso de canto - Fontes termais? 

Frank soltou uma risadinha nervosa, seu cabelo meio grisalho completamente molhado assim como suas vestes. 

                                                                               ***

A casa dos pais adotivos de Atticus recebeu uma visita atípica naquela noite. Martha atendeu os três homens truculentos que vestiam roupas pretas de tropa de choque com capacetes e coletes à prova de balas. Um logotipo que ela nunca havia visto estampava as braçadeiras que usavam nos braços esquerdos. 

- O que desejam? Quem são vocês? - perguntou ela, desconfiada. 

- Recebemos um mandado de mandado de apreensão. - declarou o do meio.

- Vieram apreender... o quê? 

- Rastreamos a localização de um jovem chamado Atticus. Ele se encontra?

- No momento, não. O que querem do meu filho?

- Queremos que nos diga onde ele atualmente está. - disse o da esquerda. 

- Eu exijo saber quem são! - disse Martha, engrossando o tom - FBI? CIA? Serviço Secreto? Por acaso, sabem... do que meu filho é capaz?

- Mais do que gostaríamos. - respondeu o da direita - Onde ele está?

- Passeando no Parque Central. Não vou convida-los a entrar pra tomar um café e esperarem. 

- Não mesmo, isso é tudo que queríamos saber. - disse o do meio, sacando um pequeno cilindro metálico com o qual borrifou um gás similar a um desodorante. Martha inalou, sentindo-se tonta, o mundo girando ao seu redor. De repente, quando voltou a si, os homens não estavam mais lá. Na verdade, ela sequer lembrava que os mesmos bateram à sua porta. 

- Por que eu... abri a porta? - se perguntou, confusa. Ignorou a dúvida e fechou. Meia hora depois, Atticus voltava e avisou que estava chegando. Porém, assim que abriu viu seu pai armado com um rifle que disparo. Atticus automaticamente parou a bala e repeliu-a, fazendo acertar no peito de seu pai. Martha correra para socorre-lo aos gritos. 

- Eu sempre soube... Ele me odiava. 

- Fora daqui! Fora senão eu chamo a polícia! Suma da nossa casa! Você é um assassino! - vociferava Martha abraçada ao corpo de David. 

Atticus balançava a cabeça em negação, não acreditando no que ouvia. Correu atordoado. Os agentes da ESP o abordaram entre as árvores, estavam escondidos de tocaia. 

- Você vem conosco. - disse um deles.

- O que fizeram com meus pais? - questionou Atticus, furioso. 

- Salvamos as vidas deles. - respondeu um outro - Apagando suas memórias, inventando uma historinha... de que você é um assassino procurado que se infiltrou em segredo no porão deles. Foi moleza. 

- Não! - disse Atticus, teleportando-se juntamente com os agentes para um recinto fechado - Eu não vou permitir que façam de mim o que bem entenderem. 

Esmagou os crânios dos agentes com seu poder psíquico e telecinético, matando-os cruelmente. Alguns outros espers vieram de uma porta do mesmo local. Uma garota de suéter marrom e cabelo castanho em chanel postou-se à frente do grupo olhando para Aticus fixamente. 

- Vocês vieram. 

- Dá pra ver que a rebelião dos intolerantes começou mais cedo do que eu esperava. Prazer, sou Abigail. Abbie pros mais íntimos. E já que seremos parceiros, pode me chamar assim. E aí? O que nos diz, grande líder? 

                                                                                 -x-

*A imagem acima é propriedade de seu respectivo autor e foi usada para ilustrar esta postagem sem fins lucrativos.


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