Frank - O Caçador #58: "Chamas do Ódio"
Era perceptível para o ESP-47 que a mão de Frank segurando a arma tremia nervosamente, não sendo estranho que tivesse sido após ele apontar sua arma para Carrie intencionando um tiro covarde à queima-roupa enquanto a assistente dormia sob um profundo sono. O detetive não contou com outra opção viável.
- Você tá próximo demais dela... - disse Frank - E como tô bem ciente dos seus talentos sobre-humanos, seria arriscado o seu dedo no gatilho ser mais rápido que a minha bala. - jogou a pistola no chão.
- Não exagere. - disse o clone, infame - Tá me superestimando. Mas até que eleva minha autoestima. Falando sério, se você puxasse o gatilho, não ia acontecer nada a mim. Pra falar a verdade, matar a Carrie tá fora de questão. Eu tive que apelar pra um drama e testar sua coragem. Você provou ser bem sensível pra um homem que pensa ser uma rocha inquebrável.
- Pra um cópia descarada, você tagarela muito. O que fez com ela?
- Não venha me culpar, ela que decidiu vir até aqui ontem à noite se fazer de boba, achando que a atuação dela era mais digna de Oscar do que a minha. Tomamos um refresco e ela desde então está dormindo como um bebê.
- Primeiro você ilude a Carrie, depois gasta meu último sachê de refresco e ainda por cima tasca um beijo nela.... e na minha frente!- repreendeu Frank, visivelmente enfurecido.
- Ficou com ciúme? - indagou o falso Frank dando um sorrisinho de canto.
- O que você deu pra ela? Pôs o quê no refresco? Um sossega-leão não faz alguém dormir tanto...
- Foi um simples sonífero, ela logo vai acordar e quando acordar... vou negociar a sua vida em troca da cooperação dela de manter meu disfarce intacto. E você também vai ter que ficar de pleno acordo.
- Tá brincando, né? Acha mesmo que eu ou a Carrie vai se dobrar pro que um monstro feito você quer fazer com a humanidade te deixando livre, leve e solto e acima de qualquer suspeita? Tão fácil assim?
- Eu apenas quero voltar pro lugar de onde vim, relembrar as minhas origens. - disse o clone, falando rispidamente.
- Ah é? E o lance das tais células que estão espalhadas por aí? - perguntou Frank que logo percebeu ter cometido um erro ao liberar uma informação como aquela - Ahn... Esquece, eu tô meio bêbado...
- Não, você tá claramente sóbrio, não precisa inventar desculpas pra não parecer que falou algo importante. - disse o clone, aproximando-se de Frank e ignorando Carrie - O que são essas células? - flashes de memórias vagas e nebulosas transcorriam pela mente, mais de vozes do que de imagens. Vozes estas que mencionavam a palavra "célula" - No meu cativeiro... ouvi alguém dizer isso.
Carrie despertava lentamente, o corpo pesado de indisposição. Abria os olhos ainda estreitados e tentava se reorientar. Viu dois vultos parados na sala, duas figuras que sua visão tentava definir.
- O que foi repassado pra mim não tem nenhuma profundidade, nada mais que o básico. - disse Frank.
- Mas ainda preciso saber! - disse o ESP-47, furioso, mais próximo de Frank - Cadê essas células? O que elas são de verdade e como são? Eu não acho estranho essa palavra vir na minha cabeça entre memórias de quando fui uma mera cobaia daqueles humanos desprezíveis. Tem que me dizer!
- Frank! - gritou Carrie acordando totalmente e levantando-se do sofá.
- Ótimo, se não quer colaborar, vou fazer ela dormir pra sempre. - disse o clone mirando a arma em Carrie. Frank agarrou o braço da duplicara erguendo-o e arma disparou no teto. O ESP-47 deu uma cotovelada forte na nariz de Frank o derrubou no chão - Eu tentei pedir com educação.
- Tenta cursar o pré-primário pra entender o que é educação. - retrucou Frank, levantando-se e limpando sangue do nariz - Ou voltar no tempo pra me matar e viver uma vida com um pai e uma mãe do lado.
O clone desferiu mais um soco com a mão direita e em seguida pegara Frank para joga-lo contra a parede. Frank, ainda no chão, recuperou sua arma e se reergueu atirando várias vezes no corpo do seu falso eu. A duplicata mostrava resistência aos tiros que faziam buracos na camisa branca por baixo do sobretudo, recuando apenas uns dois passos e rindo da ineficácia das balas. Frank largou a arma mais uma vez, partindo bravamente com seus punhos, mas o clone possuía ampla vantagem de força física.
O ESP-47 defendeu-se dos socos de Frank e na sua vez de atacar dera uma sequência joelhadas na barriga. Em seguida o detetive levara um soco no queixo que o levou ao chão novamente.
- Frank... - disse Carrie, preocupada com a desvantagem crítica do detetive. Ela se atemorizou ao ver o clone pega-lo pela parte de trás da cabeça para bater o rosto de Frank na parede num impacto que ela acreditou ter resultado em alguma fratura no crânio. Na parede ficara um rombo com a metade da face de Frank "colada" nela. Frank não deixou barato e levantou-se dando uma cabeçada para trás que atingiu seu adversário em cheio, mas não suficientemente. Tentou desferir outro soco usando a mão esquerda, mas o clone defendeu-se com a sua mão direita e bateu sua testa contra a dele. Frank cambaleou tonto para trás, dando abertura para o clone desferir mais três fortes socos de direita.
Caindo no chão em derrota, Frank cuspiu um volume de sangue.
- É perda de tempo gastar minha energia com vocês. Quer sua vida entediante de volta, Frank? Te devolvo. - disse o ESP-47 - Ah, toma aí. - jogou a chave das algemas - Liberta sua donzela enquanto vou puxando o carro.
- O meu carro não, seu filho da mãe! - disse Frank com vários hematomas e feridas no rosto.
- Pensando bem... o dela parece ter mais cavalos. - disse o clone, saindo da casa.
Frank pegou a chave, levantando depressa para retirar as algemas de Carrie, suportando a dor dos ferimentos.
Após soltar Carrie, o detetive correu com outra arma para fora. O clone já adentrava no carro de Carrie, pronto para dar partida. Frank mirara a arma, mas Carrie interveio agarrando seu braço direito e baixando-o.
- Não, Frank, espera, não faz isso! É cedo ainda, pode chamar atenção dos vizinhos.
O falso Frank saía em disparada com o carro da assistente cantando pneus.
- E com isso voltam meus dias de pegar táxi... - ela olhou de soslaio para Frank - ... ou carona com o amigo.
Frank deu um sorriso fraco por conta das dores, mas a abraçou fortemente.
- A gente tem uma porrada de assunto pra colocar em dia. - disse ele.
- Nem me fale. Pela terceira vez: Bem-vindo de volta.
- Vamos pular o sentimentalismo de reencontro e... pegar uma compressa de gelo pra mim.
- É pra já. - disse ela, voltando para dentro da residência com ele.
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CAPÍTULO 58: CHAMAS DO ÓDIO
Departamento Policial de Danverous City
Apesar da dor um tanto ainda persistente na cabeça, Frank mal sabia mensurar o quão prazeroso era estar novamente vestindo seu habitual sobretudo marrom claro de trabalho, pisando no chão do departamento e caminhando ao lado de sua assistente para embarcar numa jornada árdua e produtiva. Os dois andavam num corredor rumo à sala do detetive.
- Fingir que tudo foi um pesadelo é o maior grau de autoajuda que você consegue alcançar. - disse Carrie.
- Talvez eu deva pedir uma injeção de amnésico pro Hoeckler. - disse Frank, fazendo a assistente olha-lo com estranheza - É brincadeira, tá? Ele moveu os pauzinhos pra que eu fosse solto, mas não ponho a mão no fogo por aquele salafrário nem a pau. Já pensou ele aceitar e fazer eu me esquecer da comida lixosa da prisão, dos vagabundos valentões, dos monstros que surgiram por lá, das pessoas que se aproximaram de mim e morreram, inclusive das informações top secretas que ele me falou? Tá bom que ele reconsiderou sobre minha volta à ativa, mas só foi por causa do meu usurpador de outro planeta.
- Pra ficar mais emocionante, por mais assustador que seja, é melhor que essa loucura toda siga mais parecido com uma história em quadrinhos do que com uma novela. - disse a assistente que segurava uma pasta contendo relatórios de um novo caso - E já que falou em mão no fogo... O caso de hoje tem literalmente tudo a ver com isso.
Frank sacou as chaves e abrira a porta de sua sala, logo adentrando e acendendo a luz.
- Será uma kitsune dessa vez? Ou uma mula sem cabeça? - Frank estalou os dedos lembrando de mais um - Ah, tem outro: Uma boitatá?
- Kitsune eu sei, mas esses outros dois desconheço. - disse Carrie fechando a porta.
- São lendas populares lá do Brasil. - respondeu Frank sentando na sua cadeira e lendo os relatórios da pasta entregue - Achou que eu só manjava de folclore americano e europeu? - indagou com ar brincalhão.
- Sinceramente, eu tô surpresa. E eu que pensava que era uma abundância enciclopédica de lendas.
- Mas você é uma. - afirmou Frank - Limitada, mas é. - essa frase não animou muito Carrie.
O detetive lia cada folha atentamente acerca do caso trágico. Carrie se mostrava calada, mas inquieta por dentro, fingindo olhar se suas unhas estavam bem pintadas. Ela olhava de relance para Frank.
- Frank, o que você mais espera do novo diretor que será admitido semana que vem?
A pergunta pegara-o desprevenido. Ele tirou os olhos dos papéis, desviando-os para a assistente.
- Que ele seja tão linha dura quanto o anterior. - disse Frank.
- O diretor interino não tem aquele pulso firme digno de nota, não que ele seja um frouxo, só... médio.
- Carrie, me referia ao... - nunca soube explicar porque relutava em chamar Ernest pelo nome.
- Ele não é mais nosso chefe, portanto será que podemos quebrar o grande tabu? Você primeiro.
- OK, você tem razão. Alguém como o Ernest jamais vai comandar essa bagaça à altura.
- O próprio Ernest sonhava em te passar o bastão. Mas pra isso a cidade precisaria de um caçador do mesmo naipe e calibre que o seu porque uma vida de chefe e outra de matador de monstros são inconciliáveis. Como até caçadores de pouca experiência estão fora, o melhor que restou não pode se afastar.
- Valeu pelo elogio, mas eu recusaria ocupar esse posto, com todo o respeito, não importando se eu fizesse por merecer. - declarou Frank honestamente - Vamos focar no caso. E tô vendo que vai ser fogo lidar com o que quer que esteja por trás dessas mortes por combustão espontânea. A pior foto é a desse cara queimando da cabeça aos pés e pulando de um prédio.
- Já houveram fenômenos assim registrados no mundo todo, provável que por razões diferentes. A pessoa num momento aleatório começa a incendiar pelo corpo inteiro sem uma razão aparente. Mas você viu aí que as vítimas possuíam denúncias na polícia. Sabotagem, roubo, estelionato, sonegação...
- Adoro criaturas com padrões. - disse Frank - Torna meu trampo mais fácil na maioria das vezes.
- A última vítima que escapou por um triz é um cara chamando Danton, ele trabalha num firma de telecomunicação. Prestou depoimento à polícia que suspeitava de um incendiário que teria ligações ocultas com as outras três vítimas e agiu por vingança, mas Danton disse não conhecer ninguém e que estava num acampamento com dois amigos quando foi atacado e perseguido por uma bola de fogo flutuante. Lógico que os policiais riram da cara dele, podem até ter perguntado se ele usa drogas.
- Drogado ele não é. Ele disse a verdade e o endereço da casa dele tá aqui. Depôs aqui mesmo no DPDC. Mas é um risco você depor como vítima de um ataque em que pessoas estão supostamente ligadas ao possível criminoso. É difícil alguém acreditar na tua palavra, ainda mais se disser não conhecer ninguém que tenha sido torrado. A única conexão lógica é o fato das vítimas terem cometido delitos. Danton foi atacado e alegou não ser próximo de ninguém que morreu.
- Nesse raciocínio, há uma vingança em curso, mas falta saber se movida por pessoas para atacarem seus respectivos alvos. A bola de fogo é apenas um instrumento. - disse Carrie.
- Até agradeço o meu clone de ter me dado cobertura durante um ano. - disse Frank, levantando-se da cadeira para finalmente se lançar numa investigação - Mas o único e original Frank tá de volta na área.
***
Ao chegar à casa de Danton, Frank deu uma bisbilhotada na janela coberta por uma cortina branca meio transparente. Tocou a campainha duas vezes. Temeu a possibilidade dele não estar em casa. Mas aguardou paciente. Suspirou longamente e pegou o celular para verificar mensagens que foram enviadas e recebidas nos últimos dozes meses, a maioria delas de Carrie fornecendo dados sobre os casos que o falso Frank havia solucionado no período. Uma certa inveja despertou em Frank.
Ouvindo o barulho da maçaneta, o detetive guardara o celular. Danton abrira a porta. Era um homem jovem caucasiano de cabelo meio raspado, forte e vestindo, naquele momento, uma camisa branca e uma bermuda xadrez.
- Eu posso ajudar? - indagou Danton.
- Você tá olhando pra um detetive que bate à sua porta um dia depois de você ir à polícia pra relatar um episódio fora do comum que por sua vez que tem um elemento diretamente ligado a um caso de pessoas morrendo queimadas do nada e ainda pergunta se pode ajudar? - indagou Frank, enfatizando o "pode".
- Não tenho relação alguma com os que morreram, só quero viver minha vida em paz.
- Calma aí, não tô aqui pra acusar. A gente podia bater um papo tranquilo?
Danton ficou um tanto pensativo, estudando se a presença de uma autoridade não lhe traria problemas emocionais como achar que estaria ligado a um crime usando magia negra sabendo que foi testemunha ocular do que havia de extraordinário relacionado ao caso das combustões espontâneas. Pensou que fosse mais um federal que o tacharia de drogado, porém...
- Entra aí. - disse Danton, concedendo passagem. Frank sentou-se no sofá e Danton ficou na cadeira um pouco mais à direita - Eu nem sei porque alguém do DPDC veio me procurar, deve saber que os policiais não deram o mínimo de crédito pro que eu falei. Por que seria diferente com você, um simples detetive?
- Olha, não menospreza a classe dos detetives, tá bom? OK, sou toda simplicidade, mas casos complexos me atraem mais. Tipo esse aí. O que você exatamente viu naquela floresta?
- O que eu vi e me perseguiu incansavelmente. - complementou Danton - Não era ninguém segurando uma tocha, nem nada. Era simplesmente uma bola de fogo levitando no ar que de início pensei ser um vagalume, mas foi crescendo, crescendo... até de repente vir atrás de mim bem rápido e eu corri.
- Como despistou essa coisa?
- Peraí, você não tá nem um pouquinho cético com a história? - perguntou Danton, franzindo o cenho.
- É, você me pegou, não sou um federal comum. Falei que gosto de casos complexos.
- Qualquer um morreria duvidando, achando que é birutice ou que é efeito de drogas. O senso comum não deixa as pessoas pensarem fora da caixa. Mas você parece ser diferente... Por um lado, isso é bom.
- Por um lado nada, por todos os lados. - corrigiu Frank meio severo - Olha, pra escancarar tudo logo, Danton, você presenciou um fenômeno paranormal, não tenha a menor dúvida disso. De vez em quando eu esbarro com esses lances.
- Então posso falar à vontade sobre o que os moradores da vila, ali nas proximidades da floresta, me contaram. Todos que vivem lá tentam alertar caminhantes que exploram a mata pra acampar, por exemplo, como eu e meus amigos fizemos.
- Eles também foram atacados pela bola de fogo?
- Eu saí pra pegar mais lenha, mas não vi eles na barraca e fui atrás deles. Tinha perguntado como eu despistei a coisa, né? Bem, eu pulei no lago, pois... acho que é bem óbvio. E funcionou. Voltei pro acampamento e meus amigos estavam lá, pensavam que eu tinha desaparecido ou sido comido por um animal. Foram me procurar por eu ter demorado com a lenha.
- E quanto aos moradores da vila?
- Acreditam que seja uma entidade espiritual que eles chamam de Banaspati. O território onde acampamos foi habitado por índios num tempo remoto, há vários descendentes da tribo na vila. Visitei um deles que confirmou ser o Banaspati o responsável por expulsar invasores. Ele me revelou sobre um culto à essa entidade que chegava a envolver sacrifícios humanos, provavelmente traidores.
- Não consigo ver correlação com as vítimas da combustão espontânea. A menos que haja uma teoria sobre o Banaspati ser uma entidade invocada por quem praticou a vingança contra aquelas pessoas.
- Na verdade, o Banaspati não precisa ser invocado. Qualquer um que pise no território tá fadado a encarar ele de frente, olhar no olhos dele e receber uma onda de raiva e ódio. Ele procura por pessoas que guardem mágoas, o ódio é a comida favorita dele. Pode tanto induzir quanto extrair. Pra ter sua vingança perfeita, basta que você odeie alguém com todas as suas forças e esse alguém vira churrasco.
- As pessoas que foram prejudicadas pelas que morreram entraram no território sacro dos índios... Você foi a última que viu o Banaspati. Tem um arqui-inimigo ou uma lista negra cheinha?
- Ahn... Sim, apenas um. Por isso pedi atestado do trabalho, pra me isolar e concentrar meus pensamentos em coisas positivas, não enviando pensamentos ruins a ninguém.
- Poderia me falar desse seu rival ou inimigo?
- É o Charles. - respondeu Danton, baixando a cabeça - Sequestrou minha namorada e causou um acidente do qual só ele sobreviveu. Estávamos prestes a noivar e ele a raptou possuído de ciúmes...
- Eu vou até essa floresta tirar minha conclusão. - falou o detetive transparecendo certeza.
Danton se estremeceu na cadeira, olhando-o preocupado.
- Não, não pensa em fazer isso. Mesmo que tenha esquecido, o Banaspati dá um jeito de trazer lembranças ruins com uma pessoa que te fez mal no passado. Ou vou junto com você, por segurança.
- De forma alguma. Nessa eu quero trabalhar sozinho. Não existe nada nesse trabalho sem risco.
***
No seu escritório, Charles, que trabalhava de contador, recebera um telefonema no aparelho fixo. O rapaz de 27 anos, de camisa branca e gravata vermelha, atendeu a ligação. Uma ligeira sensação ruim o afetou ouvindo uma voz familiar.
- Danton? O que você quer? Por que ligou direto pro meu trabalho? - perguntou meio tenso.
- A gente precisa encerrar uma conversinha muito séria. - disse a voz similar a de Danton.
- Não tenho ideia do que seja...
- Vai bancar o desentendido depois do que me fez passar? É muita audácia sua ser tão cínico.
- Olha aqui, eu tô ocupado agora, não vou perder tempo aguentando você me dando sermão como se tivesse esquecido das milhões de vezes que falei e agora terei que repetir: foi tudo um acidente.
- Eu quero dar fim nessa rixa hoje. Não vou te matar, se é o que tá pensando.
- Tudo o que você mais desejava era vingar a morte da Dana. A primeira coisa que imaginei foi que finalmente criou coragem pra apontar uma arma na minha cabeça. Mas já que garantiu querer apenas uma conversa... eu posso ir até aí quando começar meu intervalo, daqui à uns quinze minutos. Vê se espera e não muda seus planos, tá legal? - desligara.
Enquanto isso, na casa de Danton, Frank amarrava os pulsos dele na cabeceira da cama com lençóis.
- Prontinho. Firmei bem os nós, acho que não prejudica a circulação. - disse Frank - Se você tem certeza de que tá reprimindo um ódio do Charles, a partir de agora você é um perigo. Imagina só se todo mundo que tivesse um assunto mal-resolvido com alguém cruzasse com o Banaspati. Ia ser fogaréu pra tudo quanto é lado. Muita gente que escolhe vingança ficaria saciada com isso.
- Por essa razão que escolhi o isolamento. Mas logo vou ter que voltar ao trabalho. Dei um atestado alegando sintomas gripais e pediram que eu fosse pra casa, acrescendo dois dias. - disse Danton quase se arrependendo de sugerir que ficasse amarrado como se fosse perigoso à sociedade - Não posso ficar aqui pra sempre, não enquanto o Charles... estiver vivo.
- Tá vendo só? Você acabou de provar que o Banaspati te afetou mesmo escapando dele.
- O Banaspati, segundo me disseram, não influencia em alguém que não tenha desafetos. Ele faz pior.
- Ele mata, é isso? Carboniza todinho?
- Ele entende que você, sem mágoas nem ódio no coração, é apenas um invasor do terreno.
- Geralmente essas entidades cultuadas como deuses não costumam ser lá muito racionais. Às vezes o único instinto delas é matar quando suas vítimas não são o que esperam. - disse Frank, olhando para os nós numa avaliação para certificar-se de que estavam apertados - Só tem mesmo um único jeito de fazer você não matar ninguém e é se embrenhando na floresta com as armas certas pra dar cabo do Banaspati.
- E se não houver como derrota-lo? E se você tiver assuntos pendentes com alguém? - indagou Danton.
Refletindo, Frank passou a considerar a ameaçadora probabilidade de que Hoeckler, um dos seus maiores algozes, estivesse vulnerável pelo sentimento de raiva que o detetive ainda nutria contra ele.
- Pra qualquer beco sem saída, um caçador sempre pode se virar.
Batidas na portam foram ouvidas. Frank saíra do quarto para ir atender à inesperada visita.
- Olá, você é quem? - perguntou Frank, desconfiando de quem fosse.
- E-eu... sou um amigo do Danton. - disse Charles, intimidado com a presença de um detetive.
- Também sou um amigo dele, vim fazer uma visitinha casual.
- Corta essa, o Danton nunca ficaria tão íntimo assim de um federal, mesmo que pagasse pra me investigar.
- Me pegou. Você deve ser o Charles, né?
- É, sou sim, muito prazer. - disse ele, um tanto aborrecido, entrando sem permissão - Cadê ele? É um ótimo momento pra uma última lavagem de roupa suja.
- Se veio conversar com ele sobre o acidente que você causou e matou a namorada dele...
- Eu vim pra repetir o que eu falo desde aquela noite, a pior das nossas vidas!
Danton escutara a voz de Charles vinda da sala. Um impulso lhe tomou a razão imediatamente. Tentou desesperado afrouxar os nós que apertavam os pulsos para sair daquela cama e corre para olhar nos olhos do seu inimigo.
- Pra esclarecer: Não fui contratado pra te investigar, só tô aqui pra ajudar o Danton num caso especial.
- E cadê ele? - perguntou Charles.
- Bem aqui. - disse Danton, cuspindo um pedaço de tecido do lençol indicando ter usado os dentes para se libertar. Frank se atemorizou - É muita coincidência você chegar justo quando o detetive ainda não foi embora.
- Ei, por que você tá aqui? É uma coincidência estranha demais. - afirmou Frank.
- O Danton me ligou pedindo pra que conversássemos sobre a morte da Dana pela última vez. - disse Charles.
- O Danton não fez ligação nenhuma! Eu tava com ele o tempo todo desde que vim, faz mais de uma hora.
- Não importa, ele já disse a que veio. - falou Danton, aproximando-se, não tirando os olhos de Charles - É hora desse maldito pagar pelo que fez. - disse ele, fazendo Frank dirigir-se à ele a fim de para-lo.
- Espera, se controla, Danton! Resiste, faz um esforço!
- O que tá havendo? - perguntou Charles - Pensei que não quisesse me matar... Ah já sei, foi tudo uma armadilha, né?
- Não provoca! - disse Frank para Charles - É melhor você correr daqui! Tô falando sério!
Porém, o aviso viera tarde. Labaredas começaram a brotar das mãos de Charles e alastraram-se pelo corpo inteiro em questão de segundos. O contador saiu rodando e gritando pela sala em pura agonia.
- Essa não... - disse Frank, frustrado por não ter avisado a tempo. A imagem de Charles coberto de chamas evocou lembranças horríveis do policial que não conseguira salvar de ser queimado vivo.
No rosto de Danton não existia um único traço de compaixão ao ver seu desafeto rolar pelo chão tentando inutilmente apagar o fogo que causticava sua carne e ouvir os berros diminuírem lentamente.
***
Seguindo em retorno ao DPDC, já pela tarde, Frank ligara para Carrie a fim de compartilhar informações do Banaspati encontradas nos arquivos de seu pai. A assistente atendeu prontamente.
- Acabei de fazer minha pesquisa agora há pouco. No fundo eu sabia que o nome da coisa não era estranho.
- A minha impressão é que o Danton soltou umas revelações bem robustas sobre o monstro, entidade, seja lá o que for.
- O cara foi mais além, teve contato com moradores de uma vila nos arredores da floresta que por sinal tem habitantes descendentes de indígenas de uma tribo que louvava a entidade, o Banaspati.
- Pus na pesquisa. - disse Carrie, rapidamente buscando as referências - É do folclore indonésio. Aterroriza quem invade um território reivindicado por ele, drenando toda e qualquer emoção negativa que este possuir, mesmo que reprima, especialmente... a raiva. Mas as vítimas da combustão espontânea não o viram, somente as pessoas com quem eles tinham alguma rixa. Peguei os depoimentos das outras três testemunhas, elas passaram pela floresta que é um terreno sem apropriação legal, explicando a ausência de guardas. Essa entidade espanta até mesmo quem quer proteger a área. Os casos de combustão espontânea aconteciam numa frequência de uma vez a cada quinze ou vinte anos.
- O Banaspati deve estar faminto com os poucos invasores que pisam no gramado dele. Mas ele apenas se alimenta de quem possui ódio, muito ódio no coração. Quanto aos que não atendem à demanda, ele simplesmente frita sem dó. O Danton quem falou. Inclusive, ele também tinha um desafeto.
- Tinha? - indagou Carrie, notando a ênfase com que Frank dissera.
- Exato. Tinha. Um cara chamado Charles sequestrou a namorada dele há um ano e causou um acidente de carro do qual só ele se safou. Ele veio na casa do Danton enquanto eu ainda tava lá e o desfecho dessa história não podia ser outro, por mais que eu tivesse tentado manter o Danton sob controle.
- Triste fim de um triângulo amoroso. - comentou Carrie - O que pretende fazer? Disse que pesquisou, então nos arquivos do seu pai tem algo referente à algum método de matar esse monstro?
- Meu pai anotou pouca coisa, mas sei de algo interessante: Ele muda de forma.
- Um outro visual além da bola de fogo? Seria basicamente o quê? Forma humana, animal...
- Aproximadamente humana, segundo os desenhos que meu pai fez. O bicho é feio, parece uma caveira num corpo marombado pegando fogo ou aquele motoqueiro do inferno das histórias em quadrinhos. Ahn... Carrie, vou ter que desligar, tem uma chamada na espera, mais tarde a gente se fala.
A chamada era de Danton que estava no seu carro em movimento por uma rua distante de onde Frank transitava.
- Danton, o que foi? Não levou a cabo sua ideia de partir pra floresta e encarar o Banaspati sozinho, né?
- Bem, como já tô livre da influência ruim, achei que seria bom sair pra tomar um arzinho puro.
- Cara, deixa de omissão, fala logo pra onde você tá indo ou já foi.
O silêncio breve de Danton não favoreceu nada à ele. Frank insistira:
- Se você me ligou, na certa quer que eu saiba de alguma coisa a respeito do Banaspati, uma informação adicional, mas tá dividido entre cooperar ou esconder de mim pra poder agir sozinho. - declarou Frank.
- Eu te subestimei como detetive. Olha, sabe porque quero me envolver nisso sem ajuda de ninguém? Pra impedir que você seja afetado! Se liga: Quem mais adequado pra lidar com esse desgraçado senão um invasor que não sirva mais pra ele?
- Esqueceu que ele mata quem não tem uma raiva a oferecer em troca?
- Não se tiver uma pedra mágica pra destruir ele completamente. Consegui ela com um descendente.
- Ah, então você foi mesmo à vila. Que pedra é essa?
- Parece um cristal meio transparente ou uma pedra preciosa. Detetive, tô mais que decidido a acabar com isso, é a única forma de me redimir pelo que fiz ao Charles, nunca foi minha intenção mata-lo.
- Mas você não teve culpa, foi a influência do Banaspati agindo sobre seus instintos. Usou sua raiva como arma e essa raiva saltou pra um nível que te deixaria fora de si, cegou sua razão.
- Agradeço o conselho motivacional, mas eu assumo daqui.
- Quem é esse descendente que te deu a pedra?
- O nome dele é Abenu. Se quiser, pode ir na vila procura-lo. Paguei uma grana preta por essa pedra.
- O quê? Comprou a pedra?! Esse cara pode ter te tapeado. Ele é um descendente da tribo que adorava o Banaspati como uma divindade com sacrifícios e tudo mais, não faz muito sentido ele vender a pedra pra um estranho que promete acabar com a farra de se alimentar do ódio dos que entram no território!
- Por isso te digo pra ir lá e conhece-lo. Não quer tirar sua conclusão? Eu tirei a minha e não abro mão. Abenu sabe que o Banaspati não tem interesse de proteger a floresta, quer apenas se fartar e ver o circo pegar fogo. Enquanto você vai, fico esperando anoitecer pra começar minha caçada. Pro seu próprio bem, não usa seu faro de detetive.
Danton desligou imediatamente, mas Frank lidou como se ele tivesse desligado na sua cara.
Transtornado, o detetive deu meia-volta como seu sedã prata para se dirigir ao caminho para a vila.
***
Abenu era um descendente de indígena com cabelos pretos longos e amarrados num rabo de cavalo. Estava cortando verduras numa tábua quando ouvira sons de batidas rápidas e fortes na porta. Frank foi logo entrando sem pedir licença, visualizando o ambiente simples da casa. Abenu se zangou com a atitude.
- Ei, quem é você? Não te deram educação pra pedir licença antes de entrar na casa dos outros?
- Me deram sim, mas nesse caso eu prefiro usar isso aqui - mostrou o distintivo do DPDC - pra provar que invadir não é tão deselegante assim pra um detetive policial. Ainda mais quando se há suspeita de venda de objetos falsificados. Olhando bem sua cara, tá começando a suar de nervoso. Isso me anima, é sinal de que você tem culpa no cartório e eu não tô errado.
- O que você quer de mim? - perguntou Abenu, não fazendo o menor esforço para fingir tranquilidade.
- Primeiro uma confissão. Aí vai depender do que disser. A pedra que você vendeu pra um rapaz chamado Danton... É verdadeira ou falsa? Tô à caça do Banaspati, disposto a acabar com a fartura dele e o show de fogo e vingança.
- É um caçador... - constatou Abenu, a tensão na expressão aumentando. Subitamente virou-se para a porta para fugir de Frank, mas o detetive deu alguns passos esticando seu braço direito para puxa-lo de volta pela gola da camisa branca e coloca-lo contra a parede pressionando seu antebraço no tórax.
- Piorou sua situação tentando escapar pela porta da frente, camarada. Desembucha.
- Aquela pedra... é uma das muitas que eu forjei pra enganar aqueles que mostrassem um desejo ardente, com perdão pelo termo, pra deter o Banaspati. Mas sigo o código à risca, nada vem antes da tradição. O último incauto que veio pedir minha ajuda será a próxima vítima para sustenta-lo.
- Já passou de vítima da influência, mas ainda será vítima se eu não for lá pra avisa-lo da sua tramoia. Ele sabia quase tudo sobre a entidade antes de te procurar. Restava uma coisa que pudesse mata-la. E por falar nisso, cadê a pedra real?
- É uma herança valiosa. Entrega-la seria manchar o legado dos meus ancestrais. Por favor, desista.
- Me pede pra desistir e deixar que mais pessoas morram queimadas pra satisfazer a entidade e aqueles que querem se sentir vingados? - questionou Frank - Tá de brincadeira, né? Não arredo o pé até você me dar a pedra.
- O feiticeiro e curandeiro criou essa pedra justamente com o mesmo propósito que o seu. Como punição ele foi servido de oferenda. O Banaspati protege e honra os espíritos dos seus devotos.
- Protege coisa nenhuma. Abre a mente, cara. - disse Frank, tocando-o no ombro numa abordagem menos truculenta - Eu também sigo um legado. Meu pai, meu avô, meu bisavô... nunca pararam pra tirar umas férias. Mas tem sempre um ponto fora da curva. Não que eu tenha abandonado a missão... Eu apenas escolhi parar por um tempo pelo cansaço, ora pensando em voltar, ora pensando em largar... Mas eu parei e isso por si só fazia eu carregar uma culpa que até me trouxe pesadelos. No fim das contas, voltei à ativa, mas com a diferença de ter superado a culpa porque eu não tinha obrigação de continuar no negócio da família podendo eu mesmo seguir minha vida. Só que essa é a vida que escolhi em respeito à eles, o que não significa viver para uma coisa só sem uma pausa pra respirar.
- Já entendi. - disse Abenu, logo indo para um outro cômodo. Após alguns segundos, voltou trazendo a pedra verdadeira que se assemelhava a um cristal na sua textura de cor turquesa - Não traímos nossos legados. - entregou-a para Frank - Mas diga pro garoto me devolver. Assim vou reembolsa-lo.
- Eu cheguei a acreditar que não íamos falar a mesma língua, mas... Obrigado. - disse Frank - Eu te prenderia, na verdade eu devia fazer isso enquanto detetive. Enfim, tem problemas maiores lá fora.
- Eu contei à ele sobre o procedimento para criar a chama azul que é fatal contra o Banaspati.
- É, isso me dá uma boa ideia de como seguir pras coisas ficarem nos trinques. - disse Frank, elaborando um plano.
***
A escuridão da noite sem lua não se fazia um desafio para desencorajar Danton na empreitada de grave risco para aniquilar o Banaspati seguindo o tutorial repassado por Abenu para tornar a pedra funcional.
Mal havia iniciado o trajeto e já se deparara com a bola de fogo pairando entre as árvores. Congelou observando o fogo materializar-se numa forma humanoide transformada num corpo masculino de aspecto tonificado. Entre os ombros e o peitoral um fogo crepitante se acendeu, bem como na cabeça que se assemelhava a uma caveira negra com as órbitas dos olhos fumegando em chamas junto à boca.
O Banaspati avançou correndo bastante rápido. Em resposta, Danton correra segurando firme as alças da sua mochila. Se embrenhou na mata, passando por galhos, vinhas e folhas em apertados espaços como forma de despistar a entidade perseguidora que aumentava sua velocidade a cada passo, suas chamas deixando rastros de fogo nas árvores. Danton cortou caminho usando arbustos grandes como artifícios para se perder de vista e olhou para trás, felizmente não vendo mais a luz alaranjada.
Correu mais alguns metros até que tropeçou numa raiz grossa de uma árvore gigantesca. Sentiu ter machucado a canela esquerda, pressionando com as duas mãos. Resistiu de gritar com a dor. O Banaspati acabou reaparecendo ao irromper de um arbusto que incendiou todo e se aproximava de Danton que convenientemente para ele não conseguia se levantar esperando que a dor passasse.
- Ei! - gritou uma conhecida voz para Danton que olhou na direção de onde vinha.
O Banaspati acompanhou o olhar de Danton vendo Frank perto de uma árvore com a pedra mística na mão direita.
- Segura! - exclamou, jogando a pedra para Danton que ignorou a dor para pega-la certeiramente. O detetive tinha um rifle na mão esquerda e atirou para cima na intenção de chamar o Banaspati para brincar de pega-pega.
- Vem me pegar, fogaréu! - gritou ele, logo correndo. Banaspati, sabendo que ali havia uma presa suculenta, repleta de um ódio que ele detectou de primeira, seguiu no encalço do detetive. Danton aproveitou a deixa para achar uma área segura. A aparição surpresa de Frank colocou sobre ele uma responsabilidade enorme: preparar a labareda azul a tempo de Frank não ser afetado. Desviou para um área aberta, mas aparentemente calma. Abriu a mochila e retirou luvas térmicas, um isqueiro e a pedra. Pegara alguns galhos e os quebrou em pedaços para fazer uma fogueira.
Enquanto isso, a corrida de Frank desacelerava quando ele notava que pareceu ter despistado a entidade. No entanto, o Banaspati ressurgira abrindo sua boca flamejante assim que ele virou o rosto para a frente. Frank inevitavelmente olhou direto nos olhos de fogo da criatura de rosto caveiroso.
Lembranças de Hoeckler iam e vinham. Recordou do sorriso infame dele no funeral de Ernest, da confissão de que fora o mandante do atentado, das chantagens, das ameaças, do abuso que cometeu a Carrie...
Frank fechou os olhos e balançou a cabeça em negação numa tentativa árdua de resistir à influência que esviscerava seu ódio vingativo pelo superintendente. Pôs as mãos na cabeça, esforçando-se mentalmente para refrear o desejo intenso de vingança. Paralelamente, Danton esquentava a pedra usando um galho de duas pontas como um improviso para mantê-la agarrada durante o aquecimento.
Quando julgou que a pedra estava aquecida o suficiente, a retirou do fogo e com as mãos enluvadas segurou-a após colocar uma coluna de madeira fina entre as pernas. Apertou a pedra quente da qual gotejou um líquido que caía na ponta da madeira. Acendeu o isqueiro sobre as partes liquefeitas da pedra e uma chama de cor azul surgiu. Frank ainda lidava com seu demônio interior. O Banaspati ameaçava queima-lo se não abrisse os olhos, levando sua mão esquerda imbuída de fogo para perto do rosto do detetive que expressava uma calma que apenas irritava a entidade.
- Um homem sábio me aconselhou a não vingar sua morte. Não faria por ele, mas por mim. Fiquei preso nesse estágio do luto por um ano... pra sair dele agora. Não é você e sua força que vão me atiçar pra atingir uma pessoa que eu jurei matar. - disse Frank, suando com o calor das chamas - Eu venci esse ódio. Não pelo Hoeckler me soltar, mas por compreender... que não teve lado pra se tomar partido nessa história. Cada um fez o que acreditou que era certo. O diretor transgrediu a proteção da segurança nacional visando o bem da sociedade e o Hoeckler usou uma medida drástica pro mesmo objetivo. O engraçado... é que eles teriam o mesmo pretexto também: o mal necessário. - sorriu.
Danton interrompeu a meditação de Frank para chama-lo.
- Detetive! - gritou segurando o bastão de madeira com a ponta queimando de fogo azul.
Frank reabriu os olhos e virou-se. O detetive correu escapando da mão do Banaspati que quase o pegou.
Danton jogara ao bastão e Frank pegou com firmeza, apesar de cair no chão de joelhos. O Banaspati veio rápido para tostar os dois, mas Frank virou-se para ele, ainda de joelhos, fazendo a ponta do bastão com o fogo azul tocar na entidade que soltou um grito gutural e horripilante com o suas chamas laranjas sendo tingidas de azul. Frank afastou-se, largando o bastão, assistindo ao lado de Danton o declínio do Banaspati cujo corpo ressecava-se e fragmentava-se em cinzas dos pés à cabeça até pequenas labaredas azuis pairarem no ar. Ambos deram um bom suspiro que se traduzia em "missão cumprida".
- Vamos nessa, tenho que tomar uma aspirina pra essa dor de cabeça latejando minha cuca. - disse Frank.
A dupla se distanciou. Porém, eles deveriam permanecer mais um pouco para ver um fenômeno intrigante.
Duas labaredas acenderam-se no solo, uma de fogo normal e outra azul em meio às cinzas negras.
-x-
*A imagem acima é propriedade de seu respectivo autor e foi usada para ilustrar esta postagem sem fins lucrativos.
*Imagem retirada de: https://www.tribunatop.com/noticia/mae-se-tranca-em-casa-e-coloca-fogo-em-colchao-para-matar-o-filho-e-a-si-mesma
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