Frank - O Caçador #49: "Quero Ser Grande (De Novo)"



Há dois anos

O facão muito bem afiado que Frank segurava cortava vinhas e folhas pelo caminho da floresta que provavelmente levaria ele e seus dois colegas caçadores à toca do monstro que estaria fazendo refeições por aquelas bandas, devorando mais que só alguns pequenos animais. Diante da incerteza da criatura ter pares de convivência, o detetive chamara dois de seus contatos para missões das quais caçador nenhum sozinho sairia vivo com braços e pernas inteiros ou sem ferimentos pelo corpo. Garret e Floyd estavam bem atrás dele, alertas para qualquer sinal físico ou sonoro, apesar de ser final de tarde, horário em que a criatura poderia estar tirando uma soneca para descansar o estômago cheio da noite passada. 

- Ei, Frank, não é lá muito favorável a gente começar assim cedo, ainda tá clarinho demais pro bicho sair pra caçada. - disse Garret, um caçador ruivo e meio gordo, que segurava uma espingarda carregada com balas de prata - A não ser que você ache que ele esteja no horário de verão. 

- Falando por mim, é mais seguro pra nos instalar em algum ponto próximo do habitat natural dele e ficarmos de tocaia. - disse Frank - O sol tá quase se pondo, daqui à pouco escurece. Quanto mais escuro, mais vontade ele vai sentir de botar a cara pra fora. Sigam o plano do anfitrião: esperar, capturar, matar e sair. 

- Então é uma armadilha? Por que não disse antes? 

- O Floyd que combinou isso comigo. - respondeu Frank, olhando para trás - Chamei ele primeiro, afinal. 

- Mas os dois preguiçosos vão ter que me dar uma mãozinha hein. - disse Floyd, um caçador de porte esguio, cabelos pretos meio longos e uma barba meio densa - A rede que eu trouxe não se arma sozinha. A melhor parte vai ser adivinhar a direção que o monstro vai tomar quando sair do covil. 

- Ih, não pensou nisso, né Frank? E se ele passa longe da rede? 

- Quem disse que vamos armar a rede? - perguntou Frank 

- Você sugeriu isso, pelo que lembro. - retrucou Floyd. 

- A gente vai jogar em cima dele quando estivermos numa curta distância. 

- E se não for resistente o bastante? - questionou Garret, pensando nas possibilidades desvantajosas - Vocês nunca subestimam o poder das garras e presas dessas feras. 

- O Floyd testou em mim, demorei meia hora pra me desprender. - respondeu Frank, rasgando mais plantas com o facão. 

Garret olhou para Floyd com as sobrancelhas arqueadas, espantado com a ideia do teste. 

- Ainda bem que fui chamado por último, deve ter sido um sufoco. Em compensação, temos um ótimo trunfo pra facilitar nossa vida. - disse Garret, mais tranquilizado. Num dado instante, Floyd desacelerou seu passo ouvindo sons de choro à sua esquerda. Virou o rosto, curioso para saber de quem vinha. Seus ouvidos captaram com maior intensidade, o que moveu ele para o desvio do caminho de Frank e Garret.

- Quem está aí? - perguntou Floyd, esquadrinhando a floresta já meio escura devido ao cair lento da noite. Sacou uma arma do seu coldre - Aparece ou... 

- Espere! - disse uma senhora encapuzada e de postura curva - Não faça nada, só quero uma ajuda! 

- O que uma senhora de idade faz numa floresta dessas? - perguntou ele, franzindo o cenho. 

- Eu acabei de voltar do pomar pra colher essas frutinhas vermelhas. Mas sinto dores nas pernas e não aguento mais andar rápido. Poderia me ajudar a caminhar melhor até minha casa, por favor?

- Está muito longe daqui? É que preciso alcançar meus amigos... antes que percebam minha ausência. Ouvi alguém chorando e... não resisti. Era a senhora?

- Sim, minhas pernas estão me matando. Mas não precisa me carregar nas costas. - disse ela, dando uma risadinha - Estou com pressa, mas preciso caminhar mais devagar, sozinha não consigo.

- Tudo bem, vamos. Eu não sou útil pra eles agora. - disse Floyd, prestativamente. O caçador levou a senhora pegando-a pela mão esquerda conforme ela o guiava. Percorreram uma trajetória relativamente comprida, mas Floyd sentia-se bem pela boa ação e a deixou na porta de casa, uma casa de fachada envelhecida, visivelmente datada de muitos anos, tal como a própria moradora - Já vou indo, tá bem tarde. - assim que virou as costas, a senhora puxara-lhe pelo braço e o olhou com semblante triste. 

- Também preciso de companhia. 

- Meus amigos estão me esperando, coloquei eles em perigo... Olha, é contra as regras, mas vou ter que falar: Estamos no meio de uma caçada, à procura de um monstro que anda devorando gente nessa floresta. Se não costuma sair à noite, fique em casa. Não posso deixa-los na mão. 

A senhora soltara-o, mas não desistiu. Da sua cesta retirou um borrifador de perfume com um pó amarelo dentro. 

- Espere um pouco, tenho mais uma coisa a lhe dizer. - disse ela. Floyd virou-se, já irritado - Chegue mais perto, ainda não o agradeci direito. - o caçador aproximou-se - Não quer descansar e dormir como um menino? 

- O quê? - indagou Floyd que de repente levou uma borrifada na cara. O pó amarelo que invadiu suas narinas se efetuou como um sedativo imediato. Distante dali, Frank e Garret preocupavam-se com Floyd, pois sem ele o plano estava cancelado. 

- Agora essa, o maluco do Floyd tomou chá de sumiço! - disse Garret, aborrecido - Vou atrás dele. 

- Não, Garret, espera ele vir, o peso na consciência não demora pra chegar. - disse Frank - Merda... 

- Foi mal, Frank, mas tô achando que essa coisa papou ele. Saiu mais cedo do que pensávamos. O Floyd não ia ser babaca de nos trair. Aliás, não ia ser doido, porque se for isso, ele vai levar uma surra. 

Garret saiu para procurar Floyd com sua lanterna ligada e Frank, temeroso, ficou no aguardo. No meio do trajeto, Garret viu umas pegadas e as seguiu com o facho da lanterna apontando para elas. 

Após a andança meio longa, avistou uma casa com luzes acesas. Bate à porta e uma senhora atendera. 

- Olá... Em que posso ajuda-lo? 

- Eu, ahn.... Tô atrás de um amigo que se perdeu. A senhora viu um cara alto,e magrelo de boné vermelho, meio barbudo assim como eu? - o caçador escutou vozes do interior da casa - Quem está aí?

- Ninguém. - respondeu a velhinha, calma - É só o meu neto. 

- Seu neto parece estar gritando por socorro... - disse Garret, desconfiado. Entrou sem pedir licença, quase empurrando a senhora e se dirigiu para onde vinha a voz. Parou no banheiro e abriu a porta - Peraí, você é...

- Sou eu, cara! - disse Floyd sentado no vaso com outras roupas e como um menino - Fui transformado em criança, essa velha é uma bruxa, sai logo daqui antes que... 

A fumaça amarela foi borrifada por trás de Garret bem próximo do nariz dele. O caçador desmaiou e a senhora sorriu para sua mais nova vítima. 

- Só duas... É melhor do que nada. - disse ela. Floyd tremia de medo com a expressão aterradora no rosto da velhinha que em seguida soltou uma risada mefistofélica que fez eriçar os pelos do menino. 

Frank verificou o relógio do celular e a noite havia caído completamente. Lançou-se numa corrida para achar Garret e Floyd, descartando a caçada planejada. Seguiu as pegadas pelo caminho que ambos passaram e pôde enxergar luzes nas janelas da casa. Ao invés de bater, foi discreto em somente espiar da janela da direita. O detetive arregalou os olhos vendo dois meninos amarrados ameaçados por um cutelo gigante que uma senhora de cabelos brancos e pele muito enrugada brandia sobre eles. Notou que se tratavam de Garret e Floyd ao reconhecer uma semelhança das vozes infantis para as de quando eram adultos. Constatou que no momento era tarde para salva-los, pois possivelmente tornaria-se uma vítima do feitiço que regredia qualquer adulto à fase juvenil. A consciência pesava. Mas ciente da sua impotência, Frank correu, abandonando-os.

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CAPÍTULO 49: QUERO SER GRANDE (DE NOVO)

Departamento Policial de Danverous City

A tarefa de se dirigir ao gabinete de Hoeckler era forçosa demais para executar e importante demais para que fosse abortada. Frank seguia pelo corredor para entrar na porta à direita e encarar a face praticamente albina que gritava arrogância e maquiavelismo. Mas estacou ao ver Carrie saindo da sala enxugando o rosto e fungando o nariz. 

- Carrie, o que tá pegando? - perguntou Frank, aproximando-se dela com expressão desconfiada. 

- Não foi nada demais, só estou emocionada. - mentiu ela, passando por ele com a cabeça baixa. Porém, o detetive pegou-a levemente pelo braço esquerdo impedindo-a de seguir. 

- Pra um choro tem três emoções: Alegria, raiva ou tristeza. E você acabou de sair do santuário profano do superintendente Hoeckler cuja índole nós sabemos muito bem qual é, então sei que não foi de alegria. Logo você que diz detectar mentiras e segredos com sua brilhante intuição tá fingindo que não aconteceu nada pra te levar pra baixo assim. Eu tava indo ver ele agora pra ter certeza se ele vai manter a promessa de me liberar pros casos paranormais depois que eu cumpri minha parte do acordo das duas semanas de abstinência. 

- Ótimo, vai logo, te espero na sua sala pra falarmos do novo caso, deixei uma pasta lá pra que você tivesse conhecimento prévio, mas você chegou vindo primeiro aqui. - desconversou Carrie. 

- Você tá abatida, alguma coisa muito cabulosa esse verme fez ou falou pra te machucar. 

- Frank, por favor, já disse que não foi nada, nada com que deva se aborrecer. Vê se quando for falar com ele não toma minhas dores pra tirar satisfação no estilo Frank Montgrow de lavar roupa suja.  

- Olha, até tenho vontade de amassar a cara dele, mas tem que haver um bom motivo. E esse caso novo? 

- Se decide: O Hoeckler ou o caso. - disse Carrie, cruzando os braços. 

- Tá legal, vamos direto pro caso. A conversa com o Darth Vader pode esperar - disse Frank, acompanhando Carrie para a sala do detetive que ficava dois andares abaixo e ambos pegaram o elevador - Tem certeza de que não quer desabafar sobre o que rolou? 

- Eu vou dar uma chulipada na sua orelha cada vez que perguntar isso. - disse Carrie, apertando os botões e aparentando uma irritação contida. Frank se reservou ao silêncio enquanto desciam, mas sua curiosidade maltratava-o psicologicamente, se limitando a pensar em qual ato vil Hoeckler cometera. Saíram juntos do elevador, lado à lado, e se encaminharam para a sala de Frank. O detetive abrira a porta e ligou a luz - Ali está. Dá uma olhadinha ligeira porque o número de vítimas só vem crescendo. 

- Já vi que terei que bater na porta de alguma testemunha. - disse Frank, pegando a pasta e lendo os anexos sobre o caso. Ao fixar os olhos na localização dos desaparecimentos, uma sequência de flashes na memória ocupou sua mente. 

- Frank, tá me ouvindo? - perguntou Carrie, estalando os dedos perto dele - Te chamei três vezes, mas você parece que travou de repente. Imergiu tanto assim na leitura? Os relatórios são bem precisos. 

- Não, é que... Eu sei onde fica a floresta dos desaparecimentos. 

- E isso é razão pra você ficar paralisado como se o mundo ao redor não existisse? 

- Isso não importa. - disse ele, fechando a pasta - As vítimas que desapareceram caminhavam pela floresta com motivações diferentes de acordo com os relatos dos acompanhantes e tinham entre 25 e 40 anos. 

- Eu dei uma espiadinha e vi que a última vítima teria ido com dois amigos, um deles chamado Kyle Mandley, o outro, Gregory, não quis prestar mais nenhum depoimento à polícia. 

Frank reabriu a pasta tentando achar o endereço de Kyle. 

- OK, por sorte temos um possível depoente pra colaborar. - deu um peteleco na folha - Hora de fazer uma visitinha pro Kyle. E eu não desisti de te forçar a contar o que houve entre você e o Hoeckler. 

Carrie fechou os olhos por uns segundos, tentando manter a calma. 

- Sai logo daqui antes que eu o faça sair. 

- Essa é minha sala, não pode me enxotar. 

- Mas se insistir nessa dúvida quando estivermos na minha sala, pode apostar que vou. 

O detetive se incomodou com o enfezamento da assistente, levantando uma sobrancelha que denotava sua suspeita. 

- Melhor eu vazar. Se acalma, tá bem? O que quer que ele tenha te feito, a lei do retorno faz justiça. 

Frank andou na direção da porta, saindo da sala. A amargura que crescia em Carrie a fez derramar uma última lágrima. 

                                                                                ***

Kyle estava deitado no sofá ouvindo música através do celular e comendo um pedaço de bolo de chocolate cuja cobertura pingou na sua camisa vermelha de futebol americano que continha "Centaurus" estampado. Como se defrontava à janela, percebeu um sedã prata parando na calçada e se ergueu retirando o fone do ouvido esquerdo. O rapaz possuía 22 anos e tinha um rosto bastante jovem para sua idade que praticamente ninguém acreditaria se ele dissesse. Foi até a porta devagar. Um minuto depois, alguém batera, fazendo-o recuar de susto. 

Girou a maçaneta relutantemente, abrindo a porta. 

- Olá, você deve ser o Kyle Mandley, amigo de Clay Barrowman, desaparecido na última sexta-feira. - disse Frank, apresentando-se de forma amigável - Não treme na base, sou só um detetive afim de fazer uma apuração, não vou te levar no meu carro pra você depor outra vez pra polícia. Me chamo Frank. 

- Eu sabia que essa hora ia chegar. - disse Kyle, meio frustrado - Tá bem, pode entrar, a casa é toda sua.

- Gostei da hospitalidade. - disse Frank, entrando - Mas prometo ser breve, então vou te escutar de pé. 

Kyle deu um suspiro longo com a boca. 

- A gente se enfiou naquele matagal sem compromisso, sabe... Quando amigos partem pra um passeio divertido. Só que a diversão durou enquanto o Clay estava conosco. Ele não deixou um vestígio sequer. 

- Nenhuma pegada ou objeto largado? 

- Como se a gente soubesse por onde começar a procurar... 

- Não se deram nem ao trabalho de ampliar a busca? 

- Já tava quase anoitecendo e tínhamos hora marcada pra voltar. Nos separamos, mas não fomos longe.

- O que exatamente vocês foram fazer naquela floresta que é dita ser meio perigosa? 

- Vem comigo. - disse Kyle, seguindo para a escada. Subira os degraus e chamou novamente o detetive - Anda. 

Frank o seguiu pela escada rumo ao quarto do rapaz. Kyle adentrou no seu recinto particular e olhou para um armário.

- Já pode sair. - disse ele para o recluso no armário - A barra limpou. 

Frank franziu o cenho, intensificando sua curiosidade. Um menino pardo de cabelo semi-raspado saíra do armário apertado em que se confinou por uma razão que Kyle obrigatoriamente esclareceria. 

- Você tinha dito que a barra tá limpa e o que tô vendo é um... federal de sobretudo. Seu mentiroso. 

- Quem é esse guri? - perguntou Frank. 

- Acredite ou não... É o Clay. - disse Kyle, um pouco apreensivo - Uns aninhos mais novo, obviamente.

- É, eu acredito sim. - disse Frank, relembrando de testemunhar seus amigos transformados em crianças à mercê daquela velha asquerosa que os fatiaria perversamente - Acredito tanto que não precisa nem falar mais nada. 

                                                                                ***

A idosa de péssimas intenções adiou o abate dos meninos para verificar o que teria feito barulhos do lado de fora. Abriu a porta e olhou os arredores atentamente, segurando o cutelo afiado. Frank vigiava escondido numa árvore e reconsiderou salva-los. Porém, outra vez a impotência gerada pela incerteza.

Após o que foram longos minutos, a velha convenceu-se de que não fora nada e retornou para dentro. Frank fechou os olhos e trincou os dentes ouvindo os gritos de dor emitidos pelos amigos sendo cruelmente esquartejados e correu o mais rápido que pôde. 

                                                                               ***

- Baba Yaga? Esse é mesmo o nome dela? A famosa Baba Yaga é a velha daquela floresta? - questionou Frank. 

- Sim, íamos caça-la pagando de durões pra faze-la provar do próprio veneno. Eu voltei pra lá no dia seguinte e achei o Clay, de início pensei que fosse só um garotinho perdido, mas ele me explicou tudo o que passou na casa da bruxa e o levei pra cá, digamos que o adotei. 

- Você mora sozinho? 

- Costumava morar. Agora tenho o Clay comigo e provavelmente como um irmão caçula até o fim. 

- Pois é, a lenda diz que quem respira o pó enfeitiçado da Baba Yaga vira criança pra nunca mais crescer. - disse Clay - Ela me viciou com doces e me paparicava como se eu fosse um bebê, até que da noite pro dia tentou me matar com uma faca. Devo ter sido o único a escapar. 

- Mandando a real pra vocês: Eu sou perito no que se refere a bruxas e feitiçarias em geral. 

- Um cara que caça bruxas e monstros? Tá falando sério? - perguntou Kyle. 

- Pareço falar brincando? Chega de papo, vou capar essa bruxa safada e devolver pro Clay a idade normal dele. Não é possível que não haja alguma poção que reverta o encanto. É promessa. - disse, esfregando de leve a mão na cabeça de Clay

                                                                            ***

A tentativa de falar com Gregory, o depoente não colaborativo, parecia desperdício de tempo, mas Frank ainda assim pediu o endereço do amigo de Kyle e saiu pela cidade no carro. 

O detetive resolveu ligar para Carrie, cautelosamente pretendendo não enveredar para aquele assunto... 

- Carrie, tá vidrada no computador? 

- Sabe muito bem que à essa hora do dia não passo um minuto fora da internet. Soei muito rude?

Frank estranhou a pergunta de imediato. 

- Ahn... Você foi você mesma, Carrie Wood sendo Carrie Wood. Por que tá preocupada com isso?

- É que pisei na bola ao falar com você daquele modo, querendo te expulsar da sua própria sala... 

- Olha, não esquenta, tem coisa mais importante pra gente discutir agora. Tô voltando da casa do Kyle que me forneceu o endereço do Gregory. Se ele não quis abrir o bico pra polícia é porque tem caroço no angu que nem o Kyle descobriu. E aí vem o mais estarrecedor: O Clay, amigo do Kyle, foi encontrado.

- Ué, mas como? No status da investigação ele continua desaparecido. 

- É bizarro pra dedéu, mas... Ele tá escondido na casa do Kyle que basicamente adotou ele porque uma senhora que vive no meio da floresta o raptou e ainda o transformou em criança pra fazer um ensopado.

- Peraí... Vamos devagar: Como o Clay reencontrou Kyle depois que foi enfeitiçado por essa bruxa?

- Kyle voltou pra floresta um dia depois do sumiço do Clay e achou ele fugindo da velha que é aquela típica bruxa caindo aos pedaços desdentada e com verruga, só faltando a vassoura e o chapéu. Kyle e os amigos dele foram pra floresta caçar essa bruxa conhecida como... Baba Yaga. Me soou bem familiar.

- Não é a toa. - disse Carrie, pesquisando rapidamente o nome da mítica bruxa - É uma das assombrações mais difundidas do folclore eslavo. Provavelmente é um codinome usado por várias bruxas ao redor do mundo, o que significa que a original Baba Yaga deve viver, há vários séculos, na Bielorússia ou Polônia, países que foram o epicentro da lenda. Essa descrição parece bem relacionável com a nossa Baba Yaga partindo do fato de que uma vítima voltou a ser criança. - fez uma breve pausa - Conta-se que ela sofre de uma maldição que lançou acidentalmente em si mesma na testagem de um feitiço para arruinar o casamento do filho com uma moça do interior. 

- Além de uma bruxa aliciadora e matadora de crianças, ainda é uma sogra que ninguém merece. 

- Calma que só piora: Ela matou o próprio filho após transforma-lo num menino e bebeu do seu sangue para que pudesse recuperar a juventude e a beleza. O sangue do filho a tornou um ano mais jovem. Obrigou a nora a criar seu neto sozinha acreditando que o marido estava morto. 

- Tem uma incoerência aí: Se sangue de crianças é o ingrediente principal pra ela rejuvenescer, não teria sido mais prático sequestrar o neto ainda recém-nascido do que descontar no filho? 

- Boa pergunta. É minimamente lógico que quanto mais novo, mais potencial de pureza pra que o feitiço de rejuvenescimento dela surta um efeito mais avançado. - disse Carrie, pensando a respeito - Mas e se ela tiver regrado o feitiço de retorno à infância? Exclusivamente adultos tornando-se crianças de novo ao invés de pessoas ainda crianças. Ela vive numa floresta em que crianças normalmente não passam ou ela não chega a encontra-las, mas precisa recorrer a adultos porque o feitiço assim restringe.

- Bem pensado. Ela de certa forma atrai seus alvos com algum papinho furado de necessidade. Afinal, quem recusa o pedido de ajuda duma velhinha indefesa? Aconteceu com um amigo meu, o Floyd. 

- Aquele caçador amigo seu? Já caçaram a Baba Yaga antes? 

- Faz dois anos, mas não a bruxa, a gente tava atrás de um monstro que não tínhamos ideia do que era. Percebemos que o Floyd tinha se separado de nós tarde demais. O Garret, outro amigo meu, foi procura-lo e fiquei sozinho esperando voltarem... ou um dos dois voltar vivo... - Frank silenciou. 

- O que você fez depois? - perguntou Carrie. 

- Desculpa, é uma história com um final muito infeliz. Não tô com estrutura pra contar nesse momento. 

- Parece que você também tem uma história que resiste em destrinchar. Estamos no mesmo barco. 

- Por enquanto. Olha, se liga: Quando eu voltar pro DPDC, talvez hoje ou amanhã, já que vou pra floresta no finalzinho da tarde chegar na casa da Baba Yaga com o pé na porta, a gente faz uma troca justa, você conta a sua historinha com o Hoeckler que eu conto a minha. Não vem pedir que eu conte a minha primeiro pra depois me tapear.

- Está certo. Mais do que justo. Um mata a curiosidade torturante do outro. - disse Carrie, consonante à ideia. 

                                                                             ***

Na casa de Baba Yaga, dois irmãos, uma menina  um menino, viam-se amarrados fortemente por um monte de cordas sentados num banco alto. Ambos choravam soluçando ao encararem a mulher de cabelos meio pretos e meio brancos afiando um cutelo. A bruxa os olhava intercaladamente. 

- Parem de se agitar ou vão cair daí, não quero que se machuquem.

- Vai pro inferno! - gritou a menina - Eu odeio essas tranças, odeio essas roupas que você me pôs! 

- Eu também! Pior que nem podemos dizer "quero a minha mãe". - disse o garoto - Essa gravatinha borboleta tá me sufocando. Tá achando o quê? Que somos seus brinquedinhos pra fazer o que bem entender?

- Brinquedos? - indagou Baba Yaga, dando uma risadinha rápida mostrando um sorriso amarelado e horrível que enrugou ainda mais sua pele branca envelhecida - Estão mais para meu jantar. 

- Não! - berrou a menina - Ela vai fatiar a gente com isso! Socorro! 

- Chega de gritaria! - mandou a bruxa e as "crianças" calaram-se num instante - Ninguém irá ouvi-los. O dia pode estar claro ainda, mas suas vozes não alcançarão ninguém que esteja passeando na floresta. 

Baba Yaga virou-se para seu forno de onde retirou uma panela quente colocando-a sobre a mesa. Removeu a tampa e pegou uma colher de pau. 

- O que tem aí dentro? Pata de coelho? Asas de morcegos? Tripas de gatos? - perguntou o menino. 

- Melhor. - disse Baba Yaga, saboreando a carne mal-passada - Acho que isto é o baço ou o fígado. Carne humana tem um gosto peculiar. - pegara um pote com um tempero que adicionou à carne e devorou mais um pedaço. Foi para a frente de um espelho onde viu metade da sua face perder sinais de velhice como as rugas, além do olho esquerdo que, antes cego, voltou a cor de outrora - Fascinante. 

A bruxa voltou-se para as crianças que passaram a tremer mais e chorar menos. 

- O teste foi um sucesso, mais do que esperava. Preparem-se para hoje à noite, minhas crianças. - disse ela, sorrindo com seus dentes de um lado bonitos e de outros tortos e amarelados. 

                                                                             ***

Com o sol prestes a desaparecer no horizonte, Frank caminhava na floresta com uma arma bem guardada no bolso interno do seu sobretudo, esta municiado de balas contendo um símbolo talhado nas pontas que servia como um sigilo anti-magia que neutralizava bruxas de qualquer espécie. Sentiu o celular vibrar e o retirou para conferir a mensagem. Frank olhou o nome do remetente. 

- Tomara que seja uma coisa que valha a pena me fazer parar pra ler. - disse ele, clicando na mensagem enviada por Kyle.

"Não sei onde você tá agora, mas espero que longe da casa da Baba Yaga. Descobri um método de acabar com ela. Deve ter uma coleção de poções e no meio pode haver tanto o antídoto pra quebrar o encanto quanto uma poção que vai eternizar a juventude dela, tornar ela imortal ou algo do tipo. Mas essa poção só pode ser tomada à meia-noite. Tem que encontra-la e destruí-la. Se ela continua mantendo reféns, quer dizer que ela ainda não tomou essa poção."

- E por que diabos ela ia seguir transformando adulto em criança pra matar se já tinha o elixir definitivo dando bobeira esse tempo todo? - questionou Frank, guardando o celular e retomando a trilha. 

A outra parte do percurso foi um pouco mais longa. Avistou a casa de Baba Yaga com as luzes não acesas ainda. O sol já se punha quase que totalmente quando Frank pisara no chão de madeira gasta. 

Estranhou que não houvesse aparentemente ninguém presente naquela casa de interior pouco convidativo. Porém, a bruxa surgira por detrás do detetive que virou-se agilmente. 

- Mais um adicional pra essa noite. - disse a bruxa usando um vestido vermelho escuro e elegante. 

Frank pegara um vaso de cristal verde e o quebrara na cabeça de Baba Yaga violentamente. A bruxa cambaleou um pouco e Frank aproveitou para soca-la no rosto e em seguida bater sua cabeça na parede três vezes. Mas a bruxa dera-lhe uma bofetada forte e sonora. Frank quase chegou a cair para trás, mas manteve-se firme, limpando o sangue no canto da boca que as unhas da bruxas tirou. 

- Não vai pensando que sou de facilitar. - disse Frank, confiante - Você até que tá meio acabadinha, acho que tem chance de virar um mulherão de parar o trânsito com seu elixir 100% anti-velhice, mas tenho que te fazer virar carcaça apodrecida de bruxa pra não deixar meu trabalho pendente. 

- Oh, uma pena interromper seu dever de casa. - disse Baba Yaga, logo desaparecendo como uma ilusão. 

O pó amarelo foi borrifado bastante próximo do nariz de Frank que tossiu ao inalar. Baba Yaga utilizara um feitiço de ilusionismo para criar uma cópia visível enquanto ela mesma permanecia invisível. 

O mundo enegreceu aos poucos para Frank à medida que ele caía. 

O detetive acordou sentindo que passaram-se horas, o que se confirmou ao abrir os olhos e ver pela janela que a noite estava no seu auge. Estava deitado numa cama com uma sensação que não tivera há muitos anos. Olhos para suas mãos constatando. Mãos que indicavam não pertencerem a um adulto. 

- Não, não, não... - disse ele, levantando-se depressa. Reparou no espelho de uma penteadeira e se horrorizou com seu reflexo - Fala sério... - disse, abismado - Que roupinha engomada é essa? - perguntou-se, tocando na camisa branca com uma gravatinha borboleta vermelha e na bermuda marrom - Parece que voltei pros anos 40. - virou o rosto para a porta que se abria. Baba Yaga fazia uma visita. 

- Como está o meu mais novo hóspede? - perguntou a bruxa, falseando um tom gentil. 

- Quero os pelos das minhas axilas de volta. - disse Frank com sua face de menino, o cabelo preto meio espetado com um formato de rosto um tanto gordinho - E também dos países baixos e, é claro, os meus fios grisalhos. Ah, e essa roupa é um saco! Esse modelito que você escolheu não faz meu estilo. 

- As mães escolhem o que os filhos vestem nesta idade. - retrucou ela. 

- Nossa, com esse tratamento merece um prêmio de melhor mãe. - disse Frank, indignado - Cadê minhas roupas? 

- Aquele sobretudo cafona... - disse a bruxa com desdém, dando de ombros - ... joguei no lixo. Fedia a... vida adulta em seu mais baixo ponto de frustração. 

- Tinha uma arma reservada só pra te detonar. 

- Oh, tolinho... - disse Baba Yaga, aproximando-se de Frank, logo tocando nas bochechas dele - Crianças não podem brincar com armas. E nem desrespeitar os mais velhos. Estou cativada, é um menino muito bonito. 

- Cai fora. - disse Frank, tirando as mãos dela à força - Tá me apertando como se fosse uma tiazona legal, mas no fundo tá doida pra arrancar um pedaço do meu couro. Me diz uma coisa: Você guarda uma poção mágica que te dá longevidade duradoura ou pura imortalidade?

- Não sei como soube disso, mas evito esta poção há décadas. É forte demais. Os efeitos colaterais são imprevisíveis sem uma dosagem muito bem calculada. E se de repente eu virasse um bebê? Não compensa tamanho risco. Mas... é uma sugestão tentadora. - sorriu com seus dentes meio amarelos e meio belos - Está perto de dar meia-noite... Eu fui uma covarde em não me arriscar. 

- Foi covarde torturando pessoas, isso sim. - rebateu Frank - Por que mudou de ideia quanto a poção?

- Porque minha paciência esgotou. Se funcionar, você pode morar comigo sendo meu faz-tudo ou meu pequeno filhinho adotivo e promissor aprendiz de bruxa. 

- Vou torcer pra não funcionar. - disse Frank que repentinamente saiu em disparada para fora do quarto. Baba Yaga fora atrás dele, transtornada. O detetive em seu tamanho juvenil correu até a cozinha e procurou pela poção na prateleira subindo numa cadeira. Mas sua atenção mirou no relógio de parede à sua direita e deu um sorriso fechado e sacana. A bruxa voltara, enraivecida e tirou das mãos dele o frasco contendo supostamente o antídoto - Ei, não te disseram que é errado dar palmada nas crianças?

- Seu fedelho, não toque nisso. - disse ela, logo pegado o frasco do elixir numa dispensa - Hum... Quase meia-noite. Torça para que funcione ou sua morte será lenta, agoniante e dolorosa. 

A bruxa, para tornar aquele momento algo marcante, foi para perto da janela, a luz pálida da lua atravessando-a e iluminando parte do piso. Tirou a tampa do frasco e esperou o relógio meia-noite em ponto. Assim que os ponteiros estavam no número 12, levou o líquido esverdeado à sua boca. 

- Você é a bruxa mais otária da história. - disse Frank, rindo por dentro. 

Baba Yaga deixou cair o fraco que se quebrantou no chão, sentindo uma tremedeira incontrolável. Ela lançou um olhar fulminante em Frank durante seu definhamento. 

- Fedelho maldito! - gritou ela, seu rosto envelhecendo numa velocidade impressionante e ganhando aspectos horrendo. Os olhos da bruxa embranqueceram e as pernas quebraram-se ao se reduzirem a pó.

- Ainda restam dois minutos pra meia-noite. - disse Frank, zombando dela com sua expressão - Tudo que fiz foi só uma ajeitadinha nos ponteiros. 

Rastejando, a bruxa intencionava agarrar Frank com sua mão direita decrépita levantada. O aspecto de Baba Yaga já ultrapassava a aparência cadavérica, seu corpo esfarelando em cinzas. Frank encostou-se na prateleira recuando. A bruxa enfim se desfez completamente, sobrando o vestido e os cabelos brancos. Frank pegara o frasco que a bruxa havia lhe tomado e foi para o quarto dela correndo. Tirou a camisa branca e arrancou a gravata borboleta apertada. 

- É tudo ou nada. - disse ele, abrindo o frasco e bebendo a poção. Sua silhueta na parede engrandecia - Não acredito... Era essa mesmo! - falou comemorando. Se dirigiu ao espelho grande, seu ânimo decaindo e a vergonha aumentando - Ah não... - disse olhando para a bermuda marrom que ficara absurdamente apertada, rasgando nas laterais - Ainda bem que é meia-noite. 

                                                                              ***

Kyle ligara várias vezes para Frank na manhã seguinte, mas não obtinha retorno, preocupando-se. O jovem olhou para Clay com um semblante tristonho fazendo que não com a cabeça e o menino ficou a imaginar no que poderia ter dado errado na caçada do detetive. No entanto, eles sentiram o coração palpitar ouvindo a campainha tocando. Kyle levantou-se do sofá correndo para a porta. Clay saiu do degrau da escada onde estava sentado e o acompanhou. Para a alegria dos rapazes, Frank reapareceu vivo e ileso parecendo que nada o afetou gravemente. 

- Detetive! - disse Kyle, mal contendo sua felicidade - Cara, é ótimo ver que o senhor conseguiu voltar sem nenhum arranhão da casa daquela bruxa horrorosa. Te liguei milhares de vezes e nada de atender.

- Acontece que a velha desgraçada me pegou de jeito. - disse Frank, entrando - Me despiu todo e jogou minhas roupas no mato, com o celular e a arma dentro. Pôs uma roupinha ridícula em mim. 

- Respirou aquele pó amarelo que ela borrifa? - perguntou Clay - Esqueci de falar sobre isso, aí o senhor poderia prender a respiração se preparando. E a tal poção? Conseguiu se livrar dela? 

- E como conseguiu voltar à idade normal? - perguntou Kyle. 

- Não apenas ferrei com o plano dela, como também... - disse Frank, tirando um frasco com líquido azulado de um bolso do sobretudo - ... achei a poção que reverte o encanto. Tomei um pouco mais da metade pelo desespero, mas logo lembrei de você, Clay. Acho que a dosagem não é tão importante. 

- Tem certeza? - indagou Kyle, receoso - Foi tão fácil assim acabar com a Baba Yaga? 

- Ué, qual foi, rapaz? Tá duvidando da minha palavra agora? Eu senti o efeito imediatamente, na primeira gota que encostou na minha língua. Você disse que a poção da juventude total era pra ser tomada à meia-noite, certo? Eu meio que induzi ela só de tocar no assunto, daí mudou de ideia quando antes achava a poção perigosa por conta da dosagem. Tapeei ela mudando os ponteiros do relógio. Mas eu sou prova viva de que a reversão do encanto nas vítimas funciona que é uma beleza. 

- Por favor, Kyle, confia nele. - disse Clay - Ele prometeu e agora está cumprindo. Dá uma chance. 

Kyle comprimiu os lábios, mantendo-se relutante de tomar certeza absoluta quanto à poção reversiva. 

- OK, manda ver. - disse o rapaz, concordando. 

Frank entregou o frasco para Clay após abri-lo e o garoto bebera o resto que sobrara. Kyle fez uma cara que denotava um certo medo aliado à desconfiança. Frank mostrava-se na maior plenitude de calmaria.

- Vou pra cozinha e fazer uma surpresa pra vocês. - disse Clay, correndo para a cozinha. 

A mão direita dele apareceu fazendo um joinha, mas não dava para vê-lo por causa da parede. 

- Funcionou. - disse Kyle, sorrindo ao ver que a mão de Clay estava no tamanho adulto - Valeu, detetive, o senhor é o cara. Que sorte. 

- Não foi bem sorte. Peguei a poção e ela tirou de mim, isso bastou pra sacar que era aquela, de fato. 

- Aí, Clay, vem cá dar um abraço no detetive. - chamou Kyle, feliz da vida. 

- Ahn... Eu acho que não é um bom momento pra partir pro abraço. - disse Clay. Frank entendeu de primeira. 

- Ele tem razão, Kyle, melhor você pegar umas roupas pra ele. - disse o detetive, embaraçado. 

- Opa, não tinha pensado nisso. - disse Kyle, surpreso - Vou ver se tem umas minhas que servem.

- Ah, e obrigado detetive! - disse Clay, novamente mostrando seu polegar. 

- Não tem de quê, amigo. - disse Frank, satisfeito com mais uma missão concluída com êxito. 
 
                                                                             ***

Departamento Policial de Danverous City

Dobrando para um corredor, Frank esbarrou em Carrie quase fazendo-a derrubar umas folhas. 

- Frank... Que susto. Achei que você vir no seguinte era conversa fiada, afinal você geralmente volta pra cá depois de um caso 

- Essa foi por pouco hein, ia espalhar papel pra tudo quanto é lado. 

- E você me ajudaria a catar como o bom cavalheiro que és. Não mente pra mim. 

- Olha, dá pra notar que ainda tá bolada com a história sensível entre você e o Hoeckler, então não força pra quebrar o gelo. Somente quando você se abrir comigo, seu melhor amigo, é que finalmente vejo alguma naturalidade no seu verdadeiro jeito de ser. Tava indo pra minha sala ou pra sua?

- Ia levar essa papelada pra sala do diretor, hoje ele veio dar um pulo, mas só um pulo... tem comício às dez. Nos convidou pra ir. Quer furar dessa vez? Eu não. Vai que ele aprende com o superintendente.

- O diretor não ia se igualar ao caráter do Hoeckler. O máximo do absurdo que ele pode chegar é pregar uma peça, como naquele dia da panfletagem. Não aparecendo nenhum caso urgente, talvez eu vá. 

Ambos ficaram num silêncio incômodo sobre o qual não sabiam explicar. 

- Pra sua sala. Tanto faz. - disse Carrie. 

Foram para a sala particular de Frank enfim compartilharem suas experiências conforme acordaram. 

- Você primeiro, Frank. - disse Carrie, virando-se pra ele após deixar a papelada sobre a mesa - Se confia de verdade em mim, tem uma boa oportunidade de provar. Como terminou sua história resgatando seus amigos caçadores? 

Frank suspirou pesadamente. 

- Não houve resgate. - disparou Frank, lacônico - A Baba Yaga destroçou eles. Não fiquei pra assistir pela janela. Cometi um dos piores pecados de caçador: Virei as costas pros meus amigos. 

- Mas... você não tinha lá muita escolha. Era tentar salva-los arriscando ser enfeitiçado ou fugir. 

O detetive se encheu de conforto ao ouvir a declaração compreensiva da assistente que não se confundiria com frieza. 

- Usaria esse argumento também. - disse ele, controlando sua emoção - Agora você. 

- O superintendente me chamou pra uma conversa franca sobre nossa relação. Eu e você, pra ser exata. Ele confessou sentimentos por mim que nem sonhava que ele tivesse. De certo modo, ele se sente ameaçado por você, disse que eu seria uma funcionária tão boa na ESP quanto sou aqui. 

- Ah, então foi esse o objetivo. Fingir que tá caidinho por você pra te engabelar na proposta. 

- Ele não fez proposta alguma. - disse Carrie, extremamente séria - Só foi um... devaneio. - revirou os olhos - Parecia meio extasiado, sei lá... Mas acabou se empolgando e... me beijou à força. 

- Essa é a coisa que você não gostaria de revelar?! O Hoeckler te roubou um beijo. E daí?

- E daí que não foi só isso. Ele me debruçou na mesa como um troglodita e tentou tirar minha saia pra... você sabe. 

O sangue de Frank fervia de impulso. 

- Caramba... Mas que... Eu não tenho nem mais nomes pra xingar esse cara. Tem que denunciar, Carrie.

- Se fizermos uma denúncia de assédio, somos dois na rua da amargura. Pra dizer a verdade, nem estou preocupada comigo, mas com você. O Hoeckler é parte de uma organização que tinha você na mira por um bom tempo. Por incrível que pareça, um inimigo totalmente humano e nada sobrenatural te colocou num mato sem cachorro. Isso me levou a refletir se o ser humano talvez não seja o pior dos monstros. 

- Carrie, se depender de mim, ele nunca mais vai encostar um dedo em você. 

- Frank, pensa antes de falar. Um movimento brusco contra ele é perigoso pra mim, você e o diretor. 

- Eu já apontei uma arma pra ele que até me desafiou a atirar pra testar minha coragem. 

- Me referia a ações premeditadas com intenção de sabota-lo, planos que o peguem desprevenido. Ele não fez nada quando o chutei no saco e saí da sala chorando. Vamos deixa-lo livre, leve e solto, por ora.

Frank assentiu, esfriando o ânimo. 

- Sem retaliação. Mas até quando? Vocês dois são os únicos companheiros na minha trincheira. E a gente só tem levado bomba na cabeça. Chega um ponto que o limite estoura. Eu tô quase lá, Carrie. 

A assistente o olhou com mais seriedade ainda e respirou fundo. Sacou o celular para verificar algo. 

- Lembrei de algo que pode vir a ser um possível caso. É uma matéria na internet sobre uma loja maçônica recentemente fechada, mas que misteriosamente foi reaberta há poucos dias recebendo uns jovens descolados. Tem umas fotos aqui e uma delas vai te fazer ter um pequeno surto ou não. 

Carrie mostrou as fotos da reportagem nas quais uns jovens eram vistos na calçada em frente à loja maçônica. Desceu para a última foto. Frank congelou de pasmo ao ver a pessoa em destaque. Um rapaz alto, magro, de cabelo castanho claro e olhos heterocrômicos. A face do detetive endureceu de tensão. 

- Esse é... Esse é o Atticus. 

- E suponhamos que esses novos amigos dele... 

- São espers. - disse Frank, olhando para Carrie, depois voltando o foco para a imagem. 

Fosse o que fosse o planejamento de Atticus para reunir espers num templo maçônico, certamente não era algo que um caçador do naipe de Frank deveria permitir passar batido para não ver mais de perto. 

                                                                          -x- 

A imagem acima é propriedade de seu respectivo autor e foi usada para ilustrar esta postagem sem fins lucrativos. 


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