Capuz Vermelho #51: "Um toque em sua alma"


"Ultimamente, tenho estado insatisfeita com meu emprego ultra-secreto. Se todo o perigo que corremos fosse medido numa balança com o nosso salário, talvez os chefões reveriam os conceitos."

                                                                    Trecho do segundo diário de Rosie Campbell - Pág 22.

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Um quarto de hotel três estrelas tornara-se espaço propício para um caso amoroso completamente alinhado para o limite. A mulher abrira a porta com sua chave oferecida pela hotelaria e entrara aos risos conduzindo seu parceiro para dentro pela mão. O homem era de aparência atraente e cheirava a álcool vindo da camisa branca com gravata preta longa. Ela se virou para ele, sorridente, entrelaçando seus dedos aos dele. As luzes foram mantidas apagadas, deixando apenas o luar atravessar a janela.

- Acabar desse jeito com um novato... Não tem preço. Um viva pra nós dois pela promoção.

- Podemos pensar no trabalho depois... - disse ele, querendo beija-la - Que tal prosseguirmos?

- Opa, calma aí. - retrucou ela, barrando os lábios dele com o dedo indicador - O que combinamos antes de vir? Não pus nada na sua bebida que fizesse se esquecer.

- Eu desmaiei no banheiro.

- Por ter bebido além da conta. Não vem com desculpa, eu sei que ainda lembra.

- Brindar nossa conquista. - falou ele, meio desinteressado, quase revirando os olhos. Visualizou algo à sua direita - Oh, vejo que peguei uma garota confiante. - andou em direção à uma cômoda onde estavam garrafas com uísque e dois copos de vidro.

- Não seja bobo. - disse ela, tirando as joias - Estavam aí desde a semana passada. Pra ser honesta, nunca me dei bem com esse tipo de experiência, sempre meus nervos fraquejam.

- Ah, sei... - disse ele, colocando a bebida nos copos. Uma olhadela rápida para trás para conferir para em seguida executar um truque clichê. Abrira uma tampa do seu anel do qual um pó branco caiu sobre a bebida. Mexera balançando levemente o copo até que se dissolvesse e então dirigiu-se à parceira de cama que usaria para sua diversão noturna.

- Obrigada. - disse ela, vestida com uma camisola de seda. Após brindarem, tomaram um gole. - Que estranho... Me sinto tão... excitada. - o olhou com fervor, até que o beijou forte, largando o copo que quebrou-se no chão. O empurrou à parede num demorado beijo de língua.

Algumas horas depois, a mulher acordara devagar, aos poucos notando uma atmosfera estranha. Não conseguia mover-se. Olhou para os lados, suas mãos amarradas na cabeceira da cama.

- O que é isso? Jason! Jason, vem cá!

Ele saíra nu do banheiro, olhando-a sacana.

- Que brincadeira é essa? - perguntou ela - Por quanto tempo dormi?

- Uma pergunta de cada vez, princesa. Você adormeceu tempo bastante pra me alimentar. Estava fogosa, do que jeito que eu gosto. - falou, demonstrando empolgação - Nos divertimos muito... - foi deitando na cama, passando os lábios pelo corpo dela. - Mas não estou satisfeito... ainda. - modificara seu rosto drasticamente.

A mulher gritara horrorizada ao testemunhar a face de um demônio com rosto enrugado de pele sépia e chifres curvos e grossos como os de um bode adulto. Ele abrira sua boca dentuça agarrando-a.

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CAPÍTULO 51: UM TOQUE EM SUA ALMA

Área florestal de Raizenbool 


No Casarão, em plena noite, Rosie procurava freneticamente na dispensa por alguns itens. Hector estava sentado no sofá vendo-se em dor por uma mordida fatal de um Lupus numa caçada contra bruxas numa cidadezinha. A visão do caçador convertia-se em vertigem, o mundo balançando e se desequilibrando ao seu redor como uma alucinação febril. A ferida tinha gotículas de sangue despontando. Rosie verificava em cada porta, desesperada.

- Rosie, depressa!

- Calma! Não tô conseguindo achar de jeito nenhum! - disse ela, olhando as portas de baixo, logo vendo um pote atrás de algumas panelas no qual armazenavam-se umas folhas. - Talvez seja essa.

- Está na última porta à direita. - avisou ele, resistindo ao máximo. - Banhe-as com meu sangue... depois bata as ervas até virar uma pasta... por fim derrame-a em cima da folha.

Rosie chegou a última parte do processo numa rapidez hábil. Colocou a pasta sobre uma longa folha verde escuro e logo levou-a até Hector.

- Não precisa dizer o último passo. - disse Rosie, andando rápido e agachando-se para aplicar o curativo - É só cobrir a mordida, essa gosma com cheiro de eucalipto e ferro vai bloquear os efeitos, certo? Quanto tempo ainda resta? É que não sei bem se... fiz corretamente, você assim me deixa...

- Rosie, apenas coloque, não hesite. - seu suor era frio e profuso - Já salvou minha vida uma vez. Uma mordida de Lupus é perigosa demais a um meta-simbionte... licantropos mordidos por uma espécie superior estão fadados à morte certa em poucas horas. Já faz uma hora e meia desde que saímos de lá. Vamos, ponha... - levantou o braço esquerdo.

- Está bem. - disse Rosie, aproximando a folha. A pasta encontrou-se com a ferida e Hector urrara tão forte em dor que a jovem assustou-se subitamente. - Ai, caramba... Por que não me falou que arde?

- Só continue, continue! - disse ele, cerrando os dentes e apertando os olhos.

Rosie enrolou o antebraço com a folha usando a pasta como "cola" para deixar firme.

- Tem uma coisa me incomodando desde que voltamos. - disse ela, levantando-se - Aquele Lupus enfeitiçado pareceu surgir do nada quando derrotamos as bruxas. Se a bruxa que o encantou for morta, o feitiço é quebrado. Ou estou enganada?

- Não, está correto. - disse Hector, mais acomodado - Eu... também tenho um pensamento que está incomodando faz um tempo. Na noite do jantar dos licantropos e felintropos em Manchester, quando o Derek veio nos buscar ele reparou bem nas manchas de sangue na minha camisa. Cometi a idiotice de falar que quase morri e exatamente na hora que ele perguntou ele olhou as manchas e uma desculpa de que me sujei de sangue por acidente não ia convence-lo.

- Tem razão. Você foi atingindo bem no coração e a mancha nesse ponto estava fresca ainda. - disse Rosie, andando devagar pela sala - Isso me leva a pensar uma coisa... - direcionou-se ao telefone.

- O que vai fazer?

- Ligar para o Derek. Temos direito de reclamação, lembra?

- Reclamação do quê, Rosie?

A jovem bateu com o fone na mesa, estressada.

- Só pra resumir a ópera, você quase morreu três vezes. É estranho isso em tão pouco tempo de trabalho. Quero reivindicar nosso direito de se manifestar quando o serviço vai mal.

- Não está nada errado pra mim, fomos hábeis, fomos profissionais, não há caso que não resolvamos.

- Só acho misterioso você sofrer três quase-mortes em espaços de tempo tão curtos. Primeiro com aquele caçador que lutava como se nem fosse humano, depois na instalação da quimera nível 4 e agora esse Lupus que te atacou quando vencemos as bruxas. Tem alguma coisa errada nisso tudo.

- Lá vem você começando com suas teorias de conspiração... - disse Hector, cansado.

- Conspiração nada. - disse Rosie, discando - Nós temos limites e o DECASO tem obrigação de reconhecer. - esperou a chamada por vários segundos. - Merda. - desligou - Ninguém atende. - discara novamente, desta vez o número do gabinete do General. - Não é possível, o expediente acabou? Anda, General Holt, atende... - mordeu os lábios. Suspirou frustrada pela demora - Desisto.

                                                                                   ***

QG Alternativo do Exército Britânico - Escritório DECASO. 

Hector dera cerca de dez batidas na porta do escritório de Derek, paciente por uma resposta. Notou que poderia ter chegado adiantado ao horário do expediente. Teve coragem de tocar na maçaneta e a porta, para sua surpresa, mostrou-se destrancada, abrindo com ranger fraco.

A sala tinha duas estantes altas com vários livros organizados e paredes verde escuro enfeitada com quadros de pintores famosos, como "O Pesadelo" de Henry Fuseli. Com sua excelente visão, o caçador detectara uma lombada grossa entre os livros da primeira estante perto da janela. Nela havia um pentagrama dourado. O retirou e o espanto foi imediato.

"Goétia?! Não, obviamente uma cópia, mas... Por que Derek deixaria um livro de bruxaria desse calibre tão exposto assim?", pensou ele, logo sendo flagrado pelo líder que entrou.

- Ora, vejo que minha biblioteca particular tem mesmo um poder de atração.

- Olha, Derek, não é o que está pensando... - disse Hector, nervoso, segurando o livro. - Eu... Não vim bisbilhotar nada, estava querendo falar com você, bati na porta, ninguém chamou, então descobri a porta destrancada. Agora sua vez, diga que eu não deveria estar aqui.

- Por que, afinal? - indagou ele, pondo sua maleta sobre a mesa - Não proíbo ninguém de tocar nos meus exemplares. Justo esse chamou sua atenção. Que coincidência.

- Coincidência por que? - perguntou Hector, intrigado.

Derek abrira sua maleta, retirando alguns papéis.

- Estudo demonologia há anos como parte de um meta pessoal. Alguns não gostam de como isso soa, mas... - virou-se para ele - ... eu sigo em frente, é o meu trabalho manter o mundo seguro.

- Não importa o que seja, Derek, se é um objetivo que represente o bem maior não deveria fazer disso um desejo egoísta. Ninguém sozinho consegue mudar o mundo. Por que não nos contou?

- Precisava mante-los focados nas tarefas que exigem menos trabalho.

- Tarefas essas que ultimamente tem se mostrado bem perigosas.

- Podemos deixar isso pra outra hora. - destacou os papéis - Nova ocorrência sobrenatural. Eis a coincidência: Uma mulher achada é achada morta na noite passada sem sinais de violência, mas seu corpo parece ter envelhecido anos até provocar falência múltipla dos órgãos. E hoje você surpreendentemente aparece no meu santuário pegando o maior grimório oculto da história.

- Não consigo ver a coincidência. - disse Hector, curioso.

- A mulher se chamava Meredith Vale e estava hospedada num hotel em Londres, sendo constantemente vista saindo para festas e baladas, sempre bem vestida, elegante, ela era uma profissional de uma grande corporação de mídia. Os hoteleiros prestaram depoimento e disseram que ela foi vista pela última vez entrando no quarto com um colega de trabalho. Me repassaram o nome do sujeito hoje cedo: Jason Travie. Ele era um novato. Ambos tinham sido promovidos e houve uma confraternização na noite de ontem. Meredith foi encontrada morta nesta manhã e Jason... desaparecido. Os sinais são bem claros. Já vi vários casos dessa natureza, sempre com mulheres, nesse padrão. Outros com homens também, mas em menor frequência.

- O que você deduz então?

- Que nosso cara é um demônio da espécie Íncubo, um ser oriundo do Tártaro com apetite sexual tão intenso que acaba matando suas vítimas se alimentando mais do que elixir de libido, absorvem a energia vital. Como pode ver nas fotos de Meredith, como uma múmia retirada do sarcófago.

- Impressionante. Então Mollock tinha razão. - disse Hector, o que chamou atenção de Derek.

- Como disse? Visitou Mollock uma vez? Quando?

- Pouco depois da prisão na noite em que Londres foi atacada. Ele compartilhou a informação de que a maior catástrofe da Terra distorceu a realidade a ponto de abrir fendas inter-dimensionais e isso também afetou as portas para o Tártaro. A propósito, teve algum sucesso no interrogatório sobre Loub?

- Essa parte é estranha. Eu entrei na cela para termos uma conversa verdadeiramente olho no olho e de repente eu já estava fora. Não voltei com medo dele usar algum truque pra depois ficar me tripudiando. Não faço ideia do que aconteceu. Mas não importa mais, você tocou no X da questão. As portas foram reabertas, nos resta fecha-las uma por uma.

Hector fechou os olhos por um instante, passando a língua entre os lábios.

- Mas e quanto ao caso? Em vez de evitar novas vítimas, vamos focar na sua causa? As pessoas em primeira lugar, Derek. - seu tom beirava a rispidez.

- O que pretendo fazer é pelas pessoas, Hector. Os Íncubos são guardiões oficiais dessas portas. Em poucas horas meus homens investigaram a vida de Jason Travie e acharam uma localização residencial próxima de uma área com forte leitura de atividade que, por sinal, está sendo inspecionada neste exato momento pelos meus homens. Há uma porta escancarada debaixo de Londres onde saem os seres mais abomináveis que existem e precisa ser lacrada a qualquer custo. Avise para Rosie.

- Desta vez me convenceu. - disse Hector, mantendo a calma. - Mas vou logo avisando que Rosie não está nem um pouco satisfeita com as diretrizes. Inclusive, ela não sabe que estou aqui como porta-voz, então melhor ir antes que ela suspeite, vou dizer que temos uma emergência. - disse ele, em direção à porta, mas parou virando-se à Derek - Ahn... Quantas portas do Tártaro existem ao todo?

- Hum... cerca de cinco só na Inglaterra. Não sei no resto do mundo. Só pra constar: Sairemos à noite. Alguma objeção?

- Nenhuma. - disse Hector, voltando-se à porta e saindo.

                                                                                       ***

O caçador dobrara um corredor e deparou-se com ninguém menos que Rosie a passos largos e firmes.

- O que você tá fazendo aqui? - perguntou ele, alardeado.

- Em primeiro lugar, era eu quem devia ter vindo. E em segundo... - parou diante dele - não podemos entrar no escritório sem autorização expressa. Liguei pro General Holt, ele concedeu. Sai da frente.

- Não, pelo que conheço de você, Rosie, vai tentar resolver esse problema do jeito difícil.

- E existe um jeito fácil? Hector, são nossas vidas, o Derek precisa ser forçado a nos dar um tempo.

- Quer dizer férias? Não assinei naquela linha pontilhada para ficar acomodado. Desde o início, ficamos cientes de que nosso compromisso era proteger pessoas independente das dificuldades.

- Não é com você que eu devo discutir isso. - disse Rosie, desafiadora. - Ou você sai do meu caminho ou...

- Nós temos um caso. - disparou Hector, interrompendo-a - Vou deixa-la passar com a condição de me garantir que irá perguntar sobre isso ao Derek em vez de tirar satisfações do seu modo. Promete?

A jovem suspirou longamente olhando para os cantos, pensativa.

- Está bem. Prometo não faltar com respeito ao nosso querido chefe. - Hector tinha relevado a ironia.

O líder da iniciativa ainda estava na sua sala arrumando sua mesa, logo sentindo a presença de Rosie mesmo de costas, dando uma olhadas para trás.

- Que surpresa, chegou numa boa hora. Presumo que Hector tenha lhe...

- Não, fizemos um trato. - disse Rosie, entrando - Ia te colocar contra a parede pelo fato de nunca termos tempo para aprimorar nossas habilidades com mais calma e o quanto a falta desse tempo nos trouxe sérios problemas. Ele não me falou sobre o caso, mas sim eu quem devia saber de você com a condição de não fazer desse assunto o foco. Você entendeu...

- Puxa, que bom você ter repensado suas atitudes. - disse Derek, apoiando-se na mesa com as mãos de frente para ela - Nem quero imaginar no que Rosie Campbell se transforma quando está com raiva.

- É melhor nem tentar imaginar. - avisou ela - Mas vamos lá, me fala sobre o caso tão urgente.

- O Hector pode contar mais detalhes quando chegarem em casa pra discutir a relação, eu prefiro resumir. - disse ele, fazendo Rosie revirar os olhos - Eu não posso dar férias aos dois agora. Sei que tem sido árduo, mas...

- O Hector quase morreu. Três vezes.

- Pra mim foram duas. Se não me engano, na instalação um dos pesquisadores armou uma cilada cujo fim era especificamente tira-lo do jogo. Desconheço a terceira vez.

- Foi ontem, numa caçada contra as bruxas, um licantropo Lupus nos atacou e... - ela se interrompeu de repente ao perceber que quase entregou o ouro - Ele se feriu gravemente, cuidei de tudo no final.

- É isso? Ele apenas se feriu? Mas como?

- Tá vendo só? Estamos fugindo do assunto. - a evasiva repentina a preocupou.

- De fato. - concordou Derek - Bem, quero vocês dois me esperando... - escreveu algo num papel, depois arrancando um pedaço -... neste endereço. Um demônio da espécie Íncubo, com voraz apetite sexual, fez uma vítima ontem à noite e seus rastros nos conduz a uma localização específica onde se encontra uma porta para o submundo. - tocou Rosie no ombro amigavelmente - Ouça, Rosie. Nós podemos salvar o mundo. Podemos fechar essa porta e livrar as pessoas do mal.

- Agradeço o conselho motivacional. - disse Rosie, olhando o papel - Se vai conosco, tudo bem. Contanto que não fique de piadinhas sobre eu e Hector estarmos... num lance. - andou para sair.

O líder do DECASO deu um orgulhoso sorriso fechado para ela, satisfeito.

                                                                                       ***

No ponto de encontro, Rosie e Hector aguardavam Derek próximo a uma encruzilhada completamente deserta. A jovem sentia o desconforto torturante em estar no "meio do nada" ainda mais à noite, ficando ao lado do caçador por todo o tempo.

Derek chegara, exalando tranquilidade.

- Vou ser sincero com vocês: Eu esperava chegar primeiro. - se aproximou deles.

- Olá, Derek. - cumprimentou Hector - Foi muita generosidade sua deixar um horário definitivo junto ao endereço, além do ponto de referência para tomarmos distância.

- Seria imprudente deixa-los esperando logo na entrada.

- Os subordinados desse Íncubo fazem guarda no local, por acaso? - perguntou Rosie, curiosa.

- Boa pergunta, Campbell.

- Você me chamou de Rosie hoje cedo. - retrucou ela, franzindo o cenho - Olha, já dá pra assumirmos que temos intimidade, você age mais aberto conosco, não te demos liberdade, mas como você se mostrou tão acessível... nós confiamos em você.

- Fico lisonjeado. - disse Derek, agradecido - Respondendo sua pergunta: Não exatamente nesse horário. Somente quando houver sinais de invasores, o chefe ordena que todos escondam-se nos arredores como índios preparando-se ao ataque. Hora de invadirmos o formigueiro. Está limpo, voltei de lá, sorrateiro é claro.

- Como assim? - indagou Hector - Afinal, você falou que seus homens fizeram varredura nessas proximidades com leitores de atividade. Até onde eu sei, e que no início eu não acreditava, demônios podem detectar frequências eletromagnéticas a longas distâncias.

- Os novos detectores leem atividade a alcances maiores que o sonar dos miseráveis. - esclareceu Derek, mostrando um, logo analisando o caçador - Que mal pergunte, mas... Não tinha se ferido gravemente? De acordo com Rosie, você foi atacado por um Lupus enfeitiçado pelas bruxas.

Hector a olhou com certa repreensão disfarçada e ela devolveu uma face insegura.

- Estou esperando. - disse Derek, dando um sorriso torto - Parando pra pensar, você, Hector, deveria estar em recuperação se o ferimento foi profundo. Você matou o Lupus, certo?

- Não, Rosie deu conta disso. - respondeu ele.

- Então... você foi mordido? - perguntou Derek.

- Ah, não, eu acabo de me lembrar... - disse Rosie , tendo um falso lampejo - Na verdade, o Hector caiu de uma ribanceira no momento em que empalei o Lupus, isto depois de recobrar a consciência...

- Eu vou querer um relatório desse caso. - disparou Derek. - É bom não estarem omitindo nada. - virou as costas, encaminhando-se ao lugar - Vamos. O Íncubo deve estar em reunião com seu bando.

Rosie suspirou forte pela boca como quem diz "Ufa, essa foi por pouco". Ela notou a insegurança de Hector com bastante clareza. Ambos o seguiram até a entrada, sendo guiados pelo facho da lanterna de Derek rasgando o breu denso.

- E chegamos. - disse Derek, apontando a luz para o portão duplo de metal em arco ornamentado nas laterais. Nos lados dois muros de tijolos dianteiros a uma estrutura quase decrépita. - Não haveria outro lugar mais sugestivo. Este é o mausoléu dos antigos magos ancestrais.

- Disse magos?! - falou Rosie, alertada. - Esse muquifo é um cemitério de magos?

- Exato. Não me admira ter sido o palco para sacrifícios ritualísticos, reuniões, práticas de magia negra arcaica... Tudo isso graças ao fundador dessa irmandade, Daemong, o primeiro a ser catalogado no Goétia, o que não significa superioridade em relação aos demais, números só são números.

"Daemong! Isso corrobora o que Noah disse daquela vez, esse demônio realmente fundou uma ordem de magos na antiguidade", pensou Rosie, atordoada.

Hector abrira o portão e passaram para a fachada do mausoléu. Porém, Derek, andando entre ambos, apontou algo.

- Esperem, vejam isso. - indicou um símbolo místico desenhado no piso de concreto ocupando-o.

- Me parece um sigilo de invocação. - disse Hector, estudando-o.

- Está associado... a esta caveira chamuscada. - disse Derek, apontando com a lanterna para um tronco fincado na terra com uma caveira carbonizada rodeada de arame farpado e abaixo dela havia uma placa dizendo "Não ultrapasse". - Toda a comunidade de bruxas reconhece este símbolo de longe e nenhuma ousaria ultrapassa-lo. Um passo à frente e... - fez um barulho de "puff" e um gesto de explosão com as mãos.

- Entram em combustão espontânea. - constatou Hector.

- Que horror. - disse Rosie, olhando para a caveira com nojo.

- Esses desgraçados foram espertos em restringirem o acesso a praticantes de magia. - disse Derek, seguindo - Vamos entrar.

- Espera. - disse Rosie, hesitante - Praticantes de magia em geral? Magos e bruxas. O Hector me falou que você tem uma cópia do Goétia na sua sala.

- O que está insinuando? - indagou Derek - O livro não concede poderes. Está lendo muitas histórias infanto-juvenis.

- Ahn, Derek... - intrometeu-se Hector - O que a Rosie quis dizer tem a ver com a suposição de que o fato de você possuir o Goétia indicaria que a partir dele não apenas estuda mas também pratica a magia negra, talvez como teste. Se isso é verdade, é impossível ir conosco.

O líder do DECASO pôs o pé direito sobre o símbolo feito à carvão.

- Questão resolvida? Ou tem fogo na minha cabeça?

Rosie bufara de impaciência.

- Vambora, estamos perdendo tempo. - disse ela, andando na frente.

O interior exalava odor de mofo de arder as narinas. Derek retomou a frente e dupla de caçadores mantinha uma certa distância do líder ao explorar visualizadamente o local. Rosie foi pega por uma uma teia de aranha e tirou logo dos ombros. De súbito, seu brasão brilhou, preocupando-a. Hector se virou, olhando, mais tenso com a reação de Derek que sentiu o detector vibrar no bolso do sobretudo.

- Nossa... - disse ele, sacando o aparelho - Uma descarga muito brusca. - o marcador apontava na leitura máxima, mas caiu rápido para 0,5 hertz. Neste instante, o brasão apagara. Rosie estava lívida. - Ou está com defeito... ou uma atividade muito oscilante, porém considerável, está ocorrendo. - guardou-o, retirando um estojo médio com três lâminas de um metal escuro. - Peguem.

- Já ia perguntar como íamos nos defender. - disse Rosie, recebendo. - É bem dura.

- É irídio. - disse Derek - Um metal raríssimo, mas de eficácia comprovada contra demônios.

- A lâmina é um pouco pesada, mas podemos nos adaptar. - disse Hector, manejando a adaga.

- Será que há passagens para câmaras secretas? - perguntou Derek, olhando em volta.

- Nos diga você, é nosso guia turístico. - disse Rosie, visualizando as tumbas dos antigos magos que pareciam sarcófagos egípcios em posição vertical.

- Tudo bem, podíamos nos separar a partir desses corredores. - sugeriu Hector. - Direções opostas, mas quem sabe há uma chance de nos encontrarmos.

- Ótimo, podem ir vocês dois, eu sei me cuidar. - disse Rosie - Ah, e não pergunte "tem certeza?". - dirigiu-se à Hector. - Vamos matar uns demônios. - destacou a lâmina com entusiasmo.

                                                                              ***

Em seu covil subterrâneo, o Íncubo tirou a coberta suja de uma mesa de pedra no centro de um amplo espaço observado por outros demônios em "arquibancadas" nas paredes acima.

- Está próximo... sinto cheiro. - disse ele, farejando com seu nariz achatado para cima. Seus robustos chifres de bode destacavam-se pela luz das tochas fixadas nas paredes. - Feromônio puro. Sigam o rastro, agora! Hoje estou poupado de caçar meu alimento. - sorriu monstruosamente.

Rosie desceu uma escada curta e reparou em desenhos na parede. Passou analisando-os.

O mais destacante era o de um ser vermelho com chifres acima de um abismo por onde "saíam" várias sombras disformes feitas à carvão. "Parecem... algum tipo de pinturas rupestres.", pensou ela.

- Apreciando nossa arte, mocinha? - perguntou um demônio. Todos eles eram vermelhos, enrugados e com chifres médios pontudos nas têmporas. Rosie virou-se, sobressaltada, logo sacando a lâmina de irídio para ataca-lo - Não tão rápido... - disse ele, metamorfoseando numa sombra espectral e possuindo a jovem. Porém, Rosie alcançou um estado de resistência, suas pupilas brilhando em amarelo. Trincou os dentes fazendo força, depois dando um rosnado seguido de um grito.

O demônio fora expulsado, voltando à forma normal, mas com um prejuízo.

- O quê? O que é isso?! - disse ele, afoitado, consumido aos poucos por chamas - Não! Não pode ser!

- É um pouco tarde pra avisar aos seus amigos... - disse Rosie, ofegando - ... que sou perigosa.

- Nããããoooo!! - urrou o demônio, o fogo pulverizando de baixo para cima.

Mais três vieram, atraídos. Rosie avançou contra eles ferozmente, desviando de golpes e aproveitando aberturas para cravar a adaga. Jogara um contra a parede, enfiando o irídio puro no peito dele. Testemunhou o efeito com surpresa, o demônio realmente virara pedra para depois desintegrar-se em cinzas. Outro a agarrou pelas costas, o que a fez dar uma cabeçada forte, virar-se e empala-lo na barriga, empurrando-o contra o chão. O demônio tentou reerguer-se, mas seu corpo petrificara logo reduzido à cinzas. Rosie pegara rapidamente a adaga e a lançou contra o primeiro que tinha lutado, acertando-o bem na cabeça antes que ele retornasse para vingança.

Com um corte no rosto, ela desafiou:

- Vou logo avisando pros que estiverem na moita: Eu não sou fácil de matar! Ouviram bem? - apenas silêncio. - OK, parece que assistiram escondidos e sentiram a noção do perigo. - virou para um lado, surpreendida por um demônio da espécie bestial rosnando e salivando como uma fera. - Ah, não...

O monstro abrira sua mandíbula tão grande quanto a um tubarão, expelindo um gás vermelho que provocara tontura em Rosie até leva-la à inconsciência.

                                                                                     ***

Derek e Hector seguiam atentos por um corredor. O líder precisou apelar para o detector.

- Não tinha descartado o EMF? - perguntou Hector. - Isso só vai atrai-los à nós...

- Que atraia. Podemos combate-los. Poucas adagas, mas bastante irídio na composição. Não tenho escolha, nosso único modo que garante segurança para acharmos a porta é esse. - fez uma pausa - Gostaria que me tirasse uma dúvida... sobre a Rosie.

- O que deseja saber?

- Aceitou tranquilamente a ideia dela de nos separamos e... ela decidir ir sozinha. Pensei que se manifestaria contra. Sem querer parecer machista, mas...

- Rosie simplesmente... - disse Hector - ... é uma mulher forte, sabe ser independente. Se ela sair sem nenhum ferimento grave, você tirará a prova. É uma das pessoas mais valentes que já conheci.

Derek assentiu devagar, mas ainda incerto.

- Por que eu discordaria? Ela é dura na queda. Mas comparada à você, é inexperiente. Com potencial, claro. Não quero desmerecer o talento dos meus melhores agentes.

Hector deu uma risadinha fraca.

Demônios surgiram, cerca de quatro deles saídos de outro corredor. Hector pegara uma tocha, jogando contra um deles para distraí-lo enquanto os demais atacavam-o. O caçador pegara sua lâmina, mas foi derrubado. Desferiu um corte no demônio, chutando-o depois. Ao se levantar, falou rapidamente com Derek:

- Vá! Eu cuido deles! Encontre a porta!

O líder, mesmo relutante, correu na direção que a leitura disparava alta e Hector aproveitou para transformar-se em licantropo, matando cada um demônios com a adaga em supervelocidade.

No entanto, um deles reergueu-se, o que foi atacado com a tocha, pegando Hector de guarda baixa, depois dele apanhar a adaga, logo quebrando seu pescoço por trás.

                                                                                       ***

No covil do Íncubo, Rosie despertara sentindo seus membros imobilizados.

- O que tá acontecendo? Onde estou? - se perguntou, logo notando as cordas que a mantinham presas. Estava deitada na mesa de pedra com manchas de sangue salpicado. As seis cordas eram firmes em pregos grossos fincados no solo. - O cão de vocês tinha um péssimo hálito.

- Estava sob meu controle. - disse o Íncubo, aproximando-se, assustando Rosie - Justamente para evitar que seu belo corpo fosse estraçalhado. - passou os dedos enrugados com unhas grandes pela cintura da jovem - Este corpo... - inclinou-se para lamber o rosto dela, o que causara nojo na mesma - será inteiramente meu. É parte do meu trato.

- Que trato? O que um demônio superficial feito você pretende fazer comigo? Vocês demônios... por acaso já foram humanos? Já amaram alguém ou não se lembram?

- Amor é uma fraqueza meramente humana. - disse o Íncubo. - Não fomos concebidos a uma coisa tão rasa. Não é o bastante, por isso desprezamos sem culpa. - subira na pedra, ficando por cima de Rosie, seu rosto ficando próximo do dela - Nós gostamos da nata.

- Então fala logo qual é seu maldito plano. Ou com uma só palavra, farei vocês se arrependerem.

- Seus amigos estão conosco, como animais enjaulados. Não sofrerão dor, a menos que firmemos o acordo. Você e eu... aqui nesta mesa... copulando. Diga sim e eu lhes mostro como fechar a porta permanentemente e ainda falo onde estão as outras. Diga não... e eles serão jogados na vala mais profunda do submundo. Pegue ou largue, jovenzinha. - deu uma risada, balançando sua cauda.

Rosie empalideceu. Um beco sem saída se viu. O fitou furiosa.

- Fechado.

                                                                                        ***

- Nos tirem já daqui! - exigiu Hector, irritado, segurando as grades da jaula. - Qual é a garantia de nos manterem cativos quando poderiam nos matar facilmente?

- Para ganharmos tempo, claro. - disse um demônio que fazia vigília. - São um estorvo para o grande acasalamento.

- Oh, não. - disse Derek, pasmo, em sua própria jaula - Isso significa que... Rosie está à mercê do Íncubo, pronta para ser vítima de um estupro.

- Não é bem estupro se ela consentir sob ameaça. - disse o demônio para Derek.

- Uma barganha? - indagou Hector - Deixa eu adivinhar: Nossas vidas em jogo até que Rosie aceite ser objeto sexual de um demônio maldito.

- Acertou. E já recebi as boas novas.

- Demônios podem enviar mensagens por ligação psíquica. - informou Derek a Hector - Ele já está começando, não é? Responda!

- Nos preparativos. - disse ele, logo sendo pego por Hector pelo pescoço. - Tente escapar e vou ser autorizado a mata-los antecipadamente. Quanto a você... foi bem hábil da sua parte vencer meus irmãos com tanta agilidade. Qual o segredo, humano?

- O segredo... - deu uma olhadela para Derek que preparava algo - ... é uma boa experiência. Vou dizimar todos vocês se algo acontecer a Rosie. As lâminas estão conosco, então presumo que não podem tocar no irídio. - largou-o.

- Podemos possui-los... mas é desgastante.

Enquanto isso, no covil, Rosie surgira nua, as pontas dos cabelos cobrindo os seios, diante do Íncubo que sorrira abertamente.

- Por onde extrai o seu alimento se você não tem... - disse meio desconcertada.

- A minha cauda. - respondeu o Íncubo, enfatizando ao balança-la. - Diga-me... você sabe o que acontece quando um humano e um ser da minha espécie cruzam seus sexos até o ápice? - rodeou-a, parando atrás dela quase sussurrando na nuca.

- Bem, até onde eu sei, a pessoa morre porque tem sua energia vital sugada ao máximo.

- Não... engana-se. - mexeu nos cabelos dela deixando-a enojada - Nem sempre há intenções de matar. Às vezes é somente prazer momentâneo com um objetivo.

- E qual é, afinal? - perguntou Rosie, controlando-se.

- Fecundação. - disse o Íncubo - A extensão da raça são os híbridos, muitos os conhecem por Cambions... já pessoas mais especiais os chamam de...

- Olha, estou ficando entediada. - disse Rosie, andando - Vamos começar logo ou não? A vida dos meus amigos depende disso, certo?

Na prisão, Derek jogara um líquido nas grades da jaula e assoviou ao demônio.

- Então tente possuir a mim. Não tem coragem, né? Como pensei, são todos uns covardes.

O demônio se dirigiu à ele, raivoso. "Isso, mais perto...".

- Seguimos um protocolo bem rígido aqui. Infelizmente, temos que acatar as regras. Mas se não fosse assim... teria o imenso prazer de arrancar seus corações e...

Derek o pegara pela cabeça, fazendo as maçãs do rosto do demônio ficarem entre as grades molhadas com o líquido ácido que efervescia a pele dele com direito a fumaça emanando.

- Me responda duas perguntas. - disse ele, severo - Cadê a chave?

- A-ali... Ali! - apontou tremulamente a um molho de três chaves pendurado - Para! Paraaa!

- É doloroso, né? Segunda pergunta: Onde fica o covil do Íncubo?

- Três lances de escada! Me deixa sair!

O libertara, forçando-o a pegar as chaves.

- Este é um ácido líquido à base de ervas especiais misturadas à água. Tenho um frasco aqui comigo e não vou hesitar em esvazia-lo todinho em você. - mostrara-o, espantando a Hector.

- Muito inteligente. - disse o caçador.

                                                                                          ***

Derek e Hector atravessavam as passagens descendo as escadas o mais depressa que conseguiam.

- Agiu muito bem em mata-lo. - disse Hector - Mas ele era informante aos outros sobre nossas condições, podem estar nos caçando ou já chegaram primeiro no covil...

- Hector, dá pra você ser um pouquinho mais otimista? Não temos muitos recursos, mas a cerimônia do acasalamento pode ser interrompida. Aliás, deve ser. Há um destino pior do que a morte em se tratando de demônios vitimando mulheres, especialmente Íncubos.

- O que pode ser pior?

Derek se virou sério para ele, parando num degrau.

- Rosie corre o risco de passar por uma gestação demoníaca. Dar à luz a um híbrido em pouco tempo comparado a uma gestante normal. Quando a fecundação ocorre... não tem mais volta.

No covil, Rosie retornara completamente vestida, amarrando seu capuz, olhando séria para o Íncubo.

- Me diverti como nunca. - disse o Íncubo, sorridente - Já vou autorizar a soltura dos dois caçadores.

- E você acha que vou cair nessa? - a jovem sacou uma adaga de irídio.

- O que está tentando fazer? Tínhamos um acordo!

- Só mudo de ideia quando eu vê-los aqui na minha frente ilesos. - disse ela, categórica.

A dupla chegara por uma passagem meio estreita, deparando-se com o Íncubo próximo a Rosie.

- Rosie! - chamou Hector, correndo. Porém, a legião de demônios saltara das "arquibancadas" para barra-los numa ameaça de ataque caso ousassem. - Droga...

- Chegamos tarde...? - se perguntou Derek.

- Lamento frustra-los, mas já concluímos o ato. Foi delicioso, me excitei como nunca. - falara, olhando para Rosie.

- Vou acabar com você. - disse Rosie, furiosa.

- Espere... Isso é verdade? - quis saber Hector - Rosie, preciso ouvir de você. Copulou com o Íncubo?

- O que fiz foi intimida-lo com a adaga pra ganhar tempo porque sabia que arranjariam um jeito de escapar e eu me provei muito habilidosa.

- É mentira! - vociferou o Íncubo, lançando uma espécie de rajada de pulso vibratório em Rosie, derrubando-a contra uma parede. - Acasalamos de verdade! Tem um corpo bonito demais para se decompor, então resolvi que termos um filho sairia mais benéfico.

- Acredito em Rosie. - disse Hector, convicto. - Ela não parece fraca ou diferente na postura.

- Ela devia estar um pouco indisposta pela força que exerci. - disse o Íncubo - Invadi suas lembranças e descobri a pessoa com quem uma vez se satisfez lascivamente e assumi sua forma para que ficasse à vontade.

- É verdade, bem lembrado, vocês também conseguem acessar memórias. - disse Derek.

- Mas não aconteceu. - disse Rosie, levantando-se - Demônios mentem. Não deixe que ele tire a esperança de vocês. Ainda há uma chance!

- Ataque-os! - ordenou o Íncubo. Os demônios avançaram contra Hector e Derek que não perderam tempo e mergulharam no confronto com suas lâminas, petrificando cada demônio.

- E você, garota... - disse o Íncubo, agarrando Rosie pelo braço - Pagará caro por dizer mentiras.

Derek o pegou pelo ombro, virando-o e desferindo um soco. O Íncubo resistira e o empurrou com telecinesia. Rosie o chutara na canela. Ela tentou revidar, mas a jovem esquivara-se e o golpeou com um cruzado de gancho. Derek reerguera-se, jogando o ácido contra ele. O corpo do Íncubo fumaçou bastante enquanto ele gritava de dor. Nesse ponto, Rosie avaliou a situação. Hector tinha certa dificuldade com os demônios e Derek estava em plena desavantagem pois perdeu sua adaga.

O líder do DECASO socava o demônio aproveitando que ele estava vulnerável com sua pele que se regeneraria logo pela quantidade ínfima do ácido que sobrou. Rosie pegara uma pedra, numa ação drástica, e bateu-a na cabeça de Derek, deixando-o inconsciente.

- Estranho você me salvar... - disse o Íncubo, reconstituindo seu rosto. - Um bom sinal?

- Cala a boca! - disse Rosie, tocando no seu brasão que brilhara intensamente. Uma aura dourada a revestiu e seus olhos refulgira. Contudo, seu cabelo permaneceu preto.

O Íncubo lançou outra rajada de impulso que se anulou em contato com Rosie.

- Não... Que tipo de poder é esse? Eu bem que achei esse colar exótico demais... - se virou para uma parede meio distante, soltando palavras que pareciam um código. Uma rachadura se abriu com fachos de luz amarela simultaneamente com duas runas ao redor dela acendendo como sigilos.

Rosie esticou seu braço direito, infligindo seu poder contra ele ao subjuga-lo.

- Não libertará mais nenhum dos seus. - disse ela, imponente. - Então essa é a porta, certo? Feche-a!

- Ainda faltam mais duas runas... - disse o Íncubo, contorcendo-se em dor quase de joelhos - O acordo está efetivamente cancelado.

Adicionou mais carga para tortura-lo. Hector observava após derrotar todo o exército.

- Chega de bancar o chefão! Você tá quase implorando. - disse Rosie - Anda, logo! Sairá vivo se trancar a porta! Eu juro.

O Íncubo manteve-se resistente por uns segundos. Depois, olhou para a rachadura horizontal meio diagonal, logo falando o código reverso. A fenda se fechou rápido e as runas desapareceram.

No entanto, Rosie fechara sua mão, fazendo o Íncubo ser coberto por labaredas ardentes e enfim explodir em fogo e cinzas que se espalharam. Faíscas e brasas voaram pelos ares. Da narina esquerda de Rosie saía um filete de sangue assim que desativou. Hector correu para ajuda-la.

- Rosie. Está se sentindo bem? - limpou o sangue do nariz dela.

- Sim, não foi nada. - disse ela, recompondo-se - Só... acabei me excedendo, senti uma tontura, mas passou. O portal era aberto com aqueles sigilos e como guardião apenas ele sabia o feitiço.

- O que não entendi é você utilizar a energia divina...

- Espera! - disse Rosie, desesperada, fazendo Hector sair de sua frente. - Ufa... Ele ainda tá apagado.

- E a responsabilidade pela desculpa vai recair à mim. - disse Hector, insatisfeito.

- Foi necessário, por mais que eu odiasse quebrar minha promessa de usar o brasão somente em ameaças nível Ômega ou Sigma. E ainda não me acostumei com essas classificações. Tudo bem, acabamos por aqui, não vou me culpar por apelar com metade do meu poder.

- E isso explica não ter usado a palavra mágica.

- Foi apenas parcial. - disse Rosie. - Melhor irmos depressa. Mais deles podem estar vindo.

- Derek me falou que Íncubos não formam exércitos muito numerosos por não serem patente alta. - disse Hector, indo até ele. - Espero que ele não acorde até chegarmos ao carro. - pegara-o para carrega-lo.

                                                                                ***

QG Alternativo do Exército Britânico 

Hector tivera a arriscada ideia de visitar novamente Mollock em sua cela adequada.

- Então o X da questão é aquele elitista desgraçado não ter conhecimento das especialidades suas e de Rosie. - disse Mollock, andando com as mãos para trás. Hector mostrava-se calmo.

- Pode fazer ou não? Soube que passa necessidade por comida e se enfraquece por inanição.

- Eu posso fazer muitas coisas... - disse o híbrido, olhando-o incisivamente com seus lupinos olhos amarelos - A fome que me entorpece não é nada... comparada a vontade de esmagar meus inimigos sem misericórdia e você está incluso. Não é algo que me impeça de usar minhas habilidades - aproximou-se da proteção de vidro -, mas também não posso aceitar sem um prêmio.

- O que você quer então? - perguntou Hector - Se puder hipnotizar Derek e apagar as memórias do dia 12 de Janeiro, prometo fazer de tudo para saciar qualquer desejo que tiver.

- Hum, estou gostando da disposição. - disse Mollock, sorrindo - Sugiro... me trazer bolsas de sangue demoníaco, especificamente da classe besta. Um daqueles que sua amiga bruxa encantou para tentar me distrair no museu. - seu bafo embaçou o vidro. - E que também é uma metade de mim, claro.

O caçador ficara imerso em pensamentos por vários segundos.

- Sorte que não há vigilância, até agora não autorizaram uma. Três bolsas de um litro por semana. Combinado?

- Cinco... de dois. Estou em fase de crescimento. Quando disser que estou satisfeito e não levará tanto tempo... eu o farei. - disse Mollock, de braços cruzados - Espero que saiba inventar desculpas para visitar seu prisioneiro favorito com mais frequência. Seja inteligente e tudo seguirá nos conformes.

- Não precisa me avisar. - disse Hector, sério, logo virando as costas para sair.

                                                                                     ***

Donnington, Oxford

A segunda porta para o Tártaro localizava-se à vários quilômetros de Londres numa armazém em estado precário de higiene e abandonado há anos. Hector descravara a lâmina de irídio de um robusto bestial assim que Derek entrara com ar de comemoração.

- Eu mal consigo acreditar, é incrível a sorte que tivemos. Não acha?

- É, concordo. - disse o caçador, voltando-se à ele.

- Íncubo e sua turma escolheram um péssimo dia para passearem. - disse Derek, contente, mas notara algo diferente em Hector - O que há com você? - o olhou estreitamente - Parece tenso, meio triste. Veja só: Mais um portal lacrado dessa vez com um feitiço do Goétia que consumiu anos do meu estudo para decifra-lo. A espera valeu a pena. Por que não está feliz?

- Não, está enganado, é claro que me sinto ótimo em completarmos mais uma missão. - disse Hector - Mas o que vem depois do último selamento? Derek, toda essa infestação de demônios pode estar nos reservando um futuro sombrio, como se algo maior estivesse pra se levantar. Erradicar todo esse mal é mera ilusão, talvez só estejamos atrasando o inevitável.

- Mais otimismo, meu amigo. - disse Derek, tocando-o no ombro - Foquemos no presente. Ah, lembrei de uma coisa: O Íncubo da primeira porta transpareceu uma certa... sinceridade no jeito de falar depois que Rosie deu sua versão. Só vamos comprovar quem foi a voz da razão com uma bateria de exames. Avise à ela, por favor.

- Ó-ótimo... Está bem. - disse Hector, inseguro - Mas continuo firme acreditando nela. Me dê um minuto pra limpar a bagunça, não demoro.

Derek assentiu, amigável.

- Bem, espero você no carro, parceiro. - disse, logo saindo pela porta da frente.

Havia uma parte do armazém que permanecera restrita até mesmo posterior ao fechamento.

Hector carregou o cadáver de um bestial até lá e fechara. O interior se assemelhava a um amplo matadouro clandestino. Enfiou um gancho no corpo, logo puxando a corrente para eleva-lo à mesma altura dos demais.

O caçador, em seguida, sacara um facão afiado e pegou um pote de vidro. Contemplou a vastidão de cadáveres pendurados de demônios bestiais prontos para serem cortados.

                                                                              CONTINUA... 

*A imagem acima é propriedade de seu respectivo autor e foi usada para ilustrar esta postagem sem fins lucrativos. O Pesadelo, de Henry Fuseli (1741 - 1825). 

*Imagem retirada de: http://www.isleep.pt/o-pesadelo-de-henry-fuseli/

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