Crítica - João e Maria: Caçadores de Bruxas
Quando o "felizes para sempre" é apenas o começo.
AVISO: A crítica abaixo contém SPOILERS.
O filme, lançado em janeiro de 2013, que traz no elenco Jeremy Renner (9 meses depois de ser visto flechando uns alienígenas) e Gemma Arterton (até então uma desconhecida pra mim) nos papéis titulares veio com a evidente proposta de reimaginar uma famigerada peça do universo dos contos de fadas, no caso a historinha de João e Maria, creditada aos Irmãos Grimm, que foram vítimas de cárcere privado na casa de uma bruxa malvada e faminta por devorar criancinhas inocentes usando a estrutura da sua casa feita de doces como atrativo para seus alvos (acho que todo mundo conhece a narrativa de cor e salteado, o que torna essa introdução bem enrolada heheh - já pensou alguém se orgulhar da própria infância, mas dizer que não conhece João e Maria? o_o). Dirigido por Tommy Wirkola, o longa imprime um viés adulto eficiente para a trama que originalmente já tinha seu toque macabro (atenuado) só pelo momento em que Maria empurra a bruxa no forno para morrer queimada, fazendo deste o conto, de certa forma, menos infantil dentre todos dessa linha voltada aos pequenos (acredito que diversos contos famosos como Chapeuzinho Vermelho e Branca de Neve sofreram modificações diversas ao longo do tempo para se adequar ao público para o qual quase exclusivamente seria voltado e até hoje é ).
O prólogo desdobra uma versão da história com umas adaptadas notáveis para trabalharem em favor da coerência do enredo no mais tardar. João e Maria estão acompanhados do pai caminhando pela floresta quando são abandonados pelo mesmo, em seguida ficam perdidos para depois encontrarem a casa da bruxa comedora de crianças. O mistério desse abandono repentino mantém-se instigante até a hora H da revelação dada por Muriel (palmas para a maquiagem + efeitos que deixaram Famke Janssen simplesmente irreconhecível de tão feiosa e grotesca), o que acabou enriquecendo a trama e amarrando as pontas, ela que é a bruxa a antagonizar contra os irmãos no auge de suas carreiras como exterminadores dessas mulheres horrorosas na aparência e no comportamento. O trauma do cárcere os motivou a crescer nessa empreitada justiceira, apesar da diabete que João adquiriu de tanto que se entupiu com doce na residência da bruxa, tendo que depender de injeção de insulina em curtos intervalos de tempo. Transformar esses dois personagens em agentes experientes e requisitados da caça às bruxas aproveitando a significativa existência da bruxa do enredo juvenil foi uma boa (e esperta) jogada criativa, nada mal termos releituras de clássicos que incrementam elementos que são dissonantes aos seus primeiros modelos seja na linguagem ou na construção. Aqui os personagens principais enfrentam as bruxas de maneiras inescrupulosamente brutais (em sequências inventivas, frenéticas e empolgantes) com aparatos à primeira vista moderninhos demais para a época em que aparentemente o longa se passa. Não sou muito fã de anacronismos, mas é uma preferência compreensível, embora fosse mais concordante ambienta-lo nos tempos da inquisição (por mais clichê que seja). O xerife Berringer é um vilão secundário fortificado por um bom texto e sua crueldade mostrou-se bem equalizada com a das bruxas em determinados momentos (o destaque nesse ponto vai para a surra que ele e seus homens dão em Maria, que o afrontou sem medo, dando para perceber num certo instante da pancadaria que o ambicioso "homem da lei" intenciona estupra-la), desde sua primeira aparição tomei antipatia desse personagem mal-caráter e teve o que mereceu graças à Edward, o troll serviçal das bruxas que salva Maria do espancamento mas que reluta em mudar de posição (que bom não terem forçado indicativos de romance).
A bruxa Muriel tem sua presença genuinamente ameaçadora devido à performance exitosa de Famke Janssen (a eterna Jean Grey do X-Verse
A revelação que desfaz o mistério em torno do pai de João e Maria diz mais respeito à mãe deles, Adrianna, e contada por ninguém menos que Muriel justamente na casa onde os irmãos viveram na infância e como se não bastasse lidar com as memórias amargas ainda descobrem que abaixo da casa existia um covil de bruxas. A história por trás da resistência à magia negra que eles possuem tem explicação baseada na magia de Adrianna, uma magia inofensiva que a descrevia como uma bruxa branca (o que também se aplica à Mina, uma jovem acusada de bruxaria e que quase chegou a ser condenada por Berringer antes de ser salva por João e Maria e depois dá uns pegas no João que tem um ferimento curado pela magia boazinha da moça). Adrianna se envolveu com um fazendeiro, casou com ele, teve seu casal de filhos, mas chegou o fatídico dia em que Muriel a denunciou para as pessoas da cidade que a queimaram em praça pública e mataram seu marido enforcado - não sem antes ele proteger seus filhos deixando-os na floresta à própria sorte (tempos de desespero às vezes pedem medidas drásticas... fazer o quê né?). A agilidade do roteiro tem uns traços de pressa com relação ao terceiro ato e seu evento principal, deixando o espectador bem ansioso para o sacrifício cerimonial das crianças sequestradas e Maria é a última vítima desses raptos por conta de uma tentativa fracassada em usar o coração de uma bruxa branca para sua poção, mas como não teve chance contra Adrianna resolveu adiar para sacrificar o da filha dela. A batalha durante o eclipse não se desmede do que vinha oferecendo em sequências de ação anteriores, criando uma verdadeira guerra entre dois caçadores (aliados à Mina e Edward que novamente salva Maria) e um numeroso exército de bruxas asquerosas de vários tipos, estilos e espécies, mas nada que leve a dizer "oohh, que épico". Tirando uns exageros, essa caçada sanguinolenta tem o mérito de entreter e só (ou será que alguém esperava um filme que fizesse questionamentos intrincados para reflexões posteriores?).
Considerações finais:
João e Maria: Caçadores de Bruxas (Hansel e Gretel: Witch Hunters, no original) não executa nada além da sua obrigação como entretenimento passável em termos de filmes com criaturas sobrenaturais (numa pegada relativamente similar à Van Helsing) e personagens dispostos a mata-las para garantir um espetáculo sangrento de pura ação desenfreada, inclusive com excessos na maior parte perdoáveis, excessos estes que todo filme do gênero tem. Figurinos, maquiagens, cenários, efeitos e montagem são aspectos que pouco ou quase nada deveram. É assim que se aproveita um material prévio dedicado restritivamente à um público para dar-lhe uma roupagem nova com personagens carismáticos e escopo ampliado à outro.
PS1: O eclipse teve a duração de uma nuvem passando sob o sol e amanheceu tão rápido quanto @_@
PS2: A pancadaria final contra Muriel foi deveras boa de assistir, recheada de ótimos efeitos sonoros e sem forçar invencibilidade para os irmãos caçadores diante da poderosa bruxa de cara rachada.
PS3: Eu esperei uma lagriminha brotar de um dos olhos do João segurando Mina morrendo em seus braços.
PS4: Esqueci de mencionar o Ben, um jovem aspirante a caçador que admira o trabalho da dupla. Como alívio cômico - se é que era sua função - ele fraquejou na cena que aquele cara que teve vermes entrando no seu corpo graças à Muriel (que antes matara homens que invadiram seu território) explode em mil pedaços. Ele reage aquela nojeira toda com uma euforia bem idiota (na falta de outra palavra).
NOTA: 8,0 - BOM
Veria de novo? Sim.
*A imagem acima é propriedade de seu respectivo autor e foi usada para ilustrar esta postagem sem fins lucrativos.
*Imagem retirada de: http://cabinecultural.com/2016/01/18/terror-tensao-e-acao-tela-quente-exibe-joao-e-maria-cacadores-de-bruxas-nesta-segunda/
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