Frank - O Caçador #36: "Armageddon"


N.A: Não sei se a qualidade da minha escrita decaiu, mas se perceberem saibam que foi culpa da quarentena. Explico melhor (melhor não significa detalhadamente, mas acho que resumi o essencial) neste post. Boa leitura! 😉

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Departamento Policial de Danverous City

A área de videoconferência era um dos espaços mais estruturalmente sofisticados de todo o DPDC, frequentada na maioria das vezes por membros da alta cúpula da corporação como o rígido superintendente Hoeckler e Ernest Duvemport, o diretor operacional, para reuniões marcadas com o Conselho de Segurança. O complexo situava-se no último andar, o 20º, e continha paredes revestidas de placas de aço, além de duas portas de acesso, uma para a parte de baixo voltada para reuniões presenciais numa mesa e outra localizada com uma construção parecida com uma passarela começando da porta e terminando num ponto circular no qual o ocupante ficava de pé diante das quatro telas retangulares verticais.

Frank adentrava na suntuosa sala após a porta automática deslizar para o lado. As quatro telas estavam ligadas com os integrantes do CDS aguardando o pronunciamento do depoente que justificaria, ou apenas tentaria, o aparente ato de deserção cometido 5 meses atrás. O detetive andava pela passarela olhando para os lados, não apreciando a altura.

- Vou logo avisando que... se decidirem pela minha prisão, me jogo daqui e vocês terão um corpo estatelado lá embaixo pra fazer o que quiserem, jogar numa vala ou cavar uma cova funda pra enterrar porque meu plano funerário tá atrasado. - disse ele num tom ácido, desagradando os conselheiros - É uma queda de quantos metros? Uns 10 ou 15?

- Montgrow, nos poupe de suas insinuações levianas. - disse Herbert, o conselheiro mais velho, voz rouca e face severa - Ameaçar cometer suicídio não vai condescender nossa decisão. É a sua primeira vez aqui, portanto tenha compostura.

- Eu esperei por esse dia desde que forçaram meu afastamento. - disse Frank, parando no ponto circular e colocando as mãos na barra horizontal metálica de proteção - Vocês já causam tensão à distância, que dirá pessoalmente.

- Você também não nos causou uma boa impressão. - retrucou Elza, única integrante feminina do conselheiro, uma mulher na casa dos 50 elegante com vestido e brincos caros, olhos verdes e cabelo acastanhado liso que emoldurava sua face - Acho que sua imprudência é passível de pena máxima de reclusão para desertores. A menos que deponha com sinceridade desmentindo a acusação. Mas não gostei do que deu a entender sobre nós, não somos monstros, agimos em nome da lei.

- Podemos iniciar finalmente? - perguntou Anton, um homem bigodudo e gordo que estava bem impaciente - Respeitem o depoente tanto quanto ele deve nos respeitar.

- Valeu. - disse Frank - Eu só queria esclarecer que...

- Uma pausa longe, sinal de que está ganhando tempo para elaborar uma história. - disse Robert, homem de porte troncudo e olhar estreito - Pois é, caso não saibam, entendo de algumas técnicas pra detectar mentiras.

- Ah é, por que revelou isso agora? Podiam aposentar o polígrafo e chamar você. Se formou aonde? Na faculdade "Engana-me Se Puder"? - disse Frank, não medindo ironia - Uma pena que cancelaram aquela série...

- Mas vejam isso, que desacato! Vou ordenar que o prendam imediatamente! - disse Robert, raivoso.

- Acalmem-se! - pediu Herbert - Não permita que as emoções influenciem no julgamento. Sr. Montgrow, discorra.

- Obrigado, senhor. Mas ele que começou hein, tirando conclusão antecipada por uma mísera pausa na fala e bancando o espertalhão, tipinhos como esse não colam pra mim. - disse Frank recebendo um olhar de repúdio de Robert - Na noite em questão... bandidos roubaram meu carro e me renderam assim que entrei, eles aproveitaram a balbúrdia que acontecia na cidade, com o blecaute e tudo mais. O chefão encostou o cano da arma na minha cabeça me obrigando a ir com eles pra um cativeiro. Ao invés da negociação pelo resgate em troca de um montante bem farto, como todos os sequestradores fazem, eles apenas quiseram fazer tortura física e psicológica. Com três meses, eu escapei daquele inferno.

- Escapou... de que forma? - questionou Elza - O relato está cheio de vaguidade. Você narra os fatos como se fôssemos criancinhas ouvindo um conto de fadas para dormir. Creio que a análise prévia de Robert não seja tão equivocada...

- Não é o que estão pensando... - disse Frank, nervoso. Nesse instante, o superintendente Hoeckler invadiu a sala, pegando a todos de surpresa - Superintendente?! O senhor tá ferindo um artigo categórico das normas do departamento.

- Exato, interceptar reunião por parte de alguém sem envolvimento direto é contra as regras. - disse Anton.

- Perdoem a intromissão, senhores. - disse Hoeckler - Mas tenho uma sugestão a fazer. Proponho um abaixo-assinado. Um não, dois. Um em prol da permanência de Frank na corporação e outro pela sua destituição. Farei uma chamada de emergência para os outros membros da alta cúpula, incluindo Duvemport. O que acham da ideia?

- É uma medida viável. - opinou Elza - Todos de acordo?

- Sim. - responderam os demais em uníssono.

- Muito obrigado a todos. - disse o superintendente.

- Tire esse insolente daqui. - ordenou Robert, enojado com a postura ousada de Frank.

Hoeckler tocara-o no ombro o levando para fora da sala, mas para cochichar algo.

- Pelo visto, cheguei a tempo, né?

- Superintendente, essa foi uma ótima ideia, mas... o senhor e eu nunca fomos tão íntimos pra ficarmos juntos... desse jeito.

- É pra que não nos ouçam. Eu salvei sua pele, vou cobrar por essa gratidão. Na verdade, eu previ que você daria uma desculpa inconvincente e agi prontamente. Provavelmente sou um dos poucos do alto escalão que preferem você trabalhando aqui, por isso restringi as assinaturas para os empregados.

- Concordo que foi justo. - disse Frank que ainda assim não parecia tranquilizado, pois um problema infinitamente maior não saía de sua cabeça nem por um minuto. A possibilidade de ser exonerado do DPDC não o aterrorizava mais do que a artimanha espúria de Malvus que seguia a todo vapor.

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CAPÍTULO 36: ARMAGEDDON

A estadia de Fred na casa estava rendendo bons resultados no que relacionava com o entrosamento. O reaproximamento desejado pelo meio-humano e meio-anjo acabou superando as expectativas. Acompanhava Frank nos mais diversos hobbys.

O detetive sentou-se no sofá com uma tigela de pipoca para assistir a um jogo televisionado localmente naquele noite. Fred apareceu na sala retraído, hesitando até para dizer um "oi". Mas a coragem reassumiu o comando da atitude.

- Tem lugar pra mais um? - perguntou ele.

Frank virou o rosto para ele, afastando-se para dar espaço no sofá.

- Costumava não ter, mas... Agora tem. Vai, senta aí.

Fred andara, logo sentando-se no móvel. Frank ofereceu-lhe pipoca, o que ele recusou educadamente.

- Eu insisto. - disse Frank - Larga dessa vergonha, ninguém vai pensar que jogamos no outro time.

- Não é nada disso, é que... Ah, deixa pra lá. - disse Fred, desistindo de explicar seu ponto em relação á estar tão pouco à vontade ao lado de Frank num momento que ele geralmente vivenciava sozinho. Enfiou a mão para enche-la de pipoca, levando à boca - Aumenta o volume. - falou com a boca cheia.

- O pedido do hóspede é uma ordem. - disse Frank pegando o controle e aumentando o som da TV - Já vai começar.

Na manhã seguinte, ambos se empenhavam numa caçada mirando num vampiro que estaria vendendo sangue humano fornecido por facções de grande influxo. O lucro das vendas era revertido para as gangues vampíricas que traficavam sangue humano e animal. O sanguessuga foi amarrado numa cadeira giratória por cintos de couro dentro de uma sala no local onde ele residia e onde aconteciam as vendas e compras. Fred cuidava de abrir a janela para expor o vampiro à luz do sol toda vez que negava-se a falar. Frank apontava o facão para o pescoço dele numa coerção que produziria efeitos positivos.

- Desembucha logo, chupa-sangue de uma figa! Onde fica o QG dos que te fornecem as bolsinhas de sangue?

- Só sabe encostar essa lâmina. - provocou o vampiro que logo mostrara as presas pontudas e os olhos de íris azuladas num ato de rebeldia - Posa de durão mas não tem audácia de fazer um arranhãozinho.

- Você tá me incentivando a fazer isso, na verdade fazer pior porque eu não vou apenas te arranhar e sim cortar fora isso que você chama de cabeça se não quebrar a lei do silêncio.

- Minha boca é um túmulo. Do contrário, eu ganho um túmulo. - disse o vampiro.

Frank acenou para Frank sinalizando para abrir a janela. A luz solar penetrou pungente na pele do vampiro, queimando ardorosamente o fazendo gritar.

- Enquanto pensamos no que fazer com você, já que não quer abrir o jogo, fica pegando um bronzeado. - disse Frank.

- Frank, me dá só um instante com ele. - disse Fred - Acho que sou o mais indicado pra arrancar dele as palavras que queremos. Termino em um minuto.

- Mas deixa ele entregar o jogo, pelo menos. - disse Frank, jogando o facão para Fred. Com a permissão, o caçador virou-se para o vampiro pronto para conduzir o interrogatório à sua maneira. Frank ficara esperando pacientemente no corredor, apesar de preocupado com a abordagem que Fred utilizaria dado sua instabilidade de humor. Olhou no relógio conferindo as horas - Um minuto é? Brincadeira. - o detetive estremeceu ao ouvir o grito estridente do vampiro e correu para verificar.

Voltando à sala, Frank deparou-se com a cadeira virada frente defronte à janela aberta, vendo uma boa quantidade de cinzas caírem às roupas do vampiro. Fred virou a cadeira, mostrando o encosto de couro verde chamuscado e as cinzas derramando, sorrindo com o êxito da sua intimidação e severidade.

- Quando disse um minuto achei que era força de expressão. - disse Frank, meio surpreso - Ele confessou ou você surtou?

- Foi simples, usei umas das minhas múltiplas habilidades de nefilim. Vermelhei meus olhos e o encarei bem fundo transmitindo imagens horripilantes com o meu pensamento, causa um efeito parecido com o gás tóxico do Zeta. - disse Fred, devolvendo o facão - Ele se borrou todo e deixou escapulir sem querer querendo. Você não ia mante-lo vivo, certo?

- Fomos bonzinhos de prometer que ele viveria a depender do comportamento. Mas você agiu bem, se eu soubesse teria ficado só esperando. De toda forma, não temos obrigação de cumprir acordos com monstros. Ahn, acho que não devia falar...

- Não, não esquenta, não alfinetou meu abalo com a retaliação da Lilith. Eu tô legal.

- Tem certeza que não cutuquei a ferida? Mesmo assim, desculpa. Qualquer coisa que eu disser e te fazer lembrar do pior dia da sua vida, vou me desculpar. Vambora resolver essa parada vampiresca. Ele deu nomes, endereço e tudo?

- Rua Madson Suncker, 1458. Tem um estabelecimento comercial de fachada onde mais compartimentos adentro fica o núcleo do cartel. Vou na frente porque tô louco pra detonar com os miseráveis. - disse Fred, saindo da sala.

À noite, ambos comemoravam num bar lotado, tocando suas garrafas de cerveja num brinde pela vitória obtida sobre mais um tentáculo da rede de tráfico de sangue humano na cidade. Frank deu um gole antes dizer algo.

- Eu apostava que num momento de aperto você ia apelar contra eles. Sabe, descer o sarrafo com força bruta extra.

- O que é isso, Frank? Me estimulando a trapacear? - perguntou Fred com um sorriso brincalhão - De agora em diante, vou caçar pra andar na linha como um caçador 100% humanamente. Poderes para casos extremos, humanidade para situações pequenas. Mas mudando de assunto... - deu um gole na cerveja - Você hoje de manhã cedo falou de um sonho, não explicou nada direito.

- Pois é, eu ainda... tava processando o lance da projeção astral e principalmente o que o anjo revelou.

- Então não foi sonho? Seu espírito saiu do corpo por causa de um anjo? Quem é esse?

- Raguel, ele é um ofanim, um dos fodões das galáxias na patente angelical. Trouxe minha alma pro mundo dos centuriões pra me contar sobre uma previsão ruim, catastrófica e terrível pra quando nos esbarrarmos com o Malvus da próxima vez.

- Eu não quero travar nenhum movimento seu pra conseguir esse tridente. - disse Fred - Por mais que o Malvus o queira também, afinal é a chave pra um feitiço que abre um portal pro mundo celestial.

- Olha, quanto à você, tô de boa. Sei que não vai me passar a rasteira em mim agora que estamos tão...

- Unidos? Pra ratificar: Estamos em times diferentes, apesar de juntos, se divertindo como bons amigos. Eu tô curtindo essa nossa vibração, faz tempo que não experimento a companhia de alguém que seja além de um colega. Mas encaremos que lutamos em lados opostos, você voluntariamente a favor dos anjos e eu forçadamente com os demônios.

- Pode ser meio contraditório o que vou te dizer agora... Mas convém você ser um agente duplo independente de qualquer risco. Falei que não inspira confiança, o que é diferente no seu caso. Assim que mandarmos o Malvus pro quinto dos infernos, vou pedir pro Adrael reaver as memórias da sua esposa e do seu filho.

- Se o Malvus descobre que tô com um pé em cada canoa, Pamela e Donald pagam com suas vidas sem nem saberem exatamente porque. - declarou Fred, incomodado ao tocar naquele assunto.

- A gente tem que considerar essa possibilidade, querendo ou não. - disse Frank - E não é Malvus... Esse nome é falso. A maior revelação do Raguel foi dizer o nome real dele: Azrael.

- Azrael... Soa mais bíblico. Por costume, ainda vou chama-lo de Malvus. Chega de falar dessa droga por enquanto. Somos de times diferentes numa guerra entre anjos e demônios. Mas é bem melhor sermos numa partida de sinuca. - disse Fred, levantando-se e colocando uma cédula dobrada na mesa - E aí, topa?

Durante o jogo, Frank acertara uma tacada, as bolas caindo nos buracos, surpreendendo Fred que passou a borracha no seu taco para seu contra-ataque. Porém, o celular de Frank vibrou e o detetive retirou do bolso do sobretudo. Constatou ser um mensagem de Carrie a respeito do orfanato Estrela do Amanhã, resultado de uma pesquisa feita pela assistente.

- Fred, me dá um segundinho, é que chegou uma mensagem...

- Não vai testemunhar minha revanche? - perguntou, preparando a tacada - Tá bom, pode ir, não sabe o que vai perder.

Frank se distanciou indo para um ponto mais reservado, perto de uma janela. Checou a mensagem de Carrie na qual ela informava que o orfanato foi refundado num outro local. No final do texto constava o endereço completo.

                                                                                  ***

Orfanato Estrela do Amanhã

Pelo vasto jardim da instituição acolhedora, andando por uma trilha de concreto ladeada por grama que exalava odor de terra molhada, Frank acompanhava a irmã Valerie, a única freira que remanesceu após o incêndio para unir-se às novatas na época da refundação com a mudança de localidade. Valerie era uma mulher de 60 anos de rosto simpático e olhar leve.

- Me é estranho que uma autoridade até hoje se instigue em desvendar o mistério que paira sobre aquele episódio que quero apagar da minha mente. - disse ela - Mas sempre que fecho os olhos para dormir é a mesma visão: Fogo do chão ao teto, gritos de agonia, correria, desabamentos... O que nos foi possível salvar, nós salvamos, apesar dos pesares, muitos pesares.

- Eu sinto muito. - disse Frank, sensibilizado com o semblante triste da freira ao rememorar a tragédia - A propósito, soube que existia um quarto específico reservado para órfãos tidos como... especiais. De quem partiu essa iniciativa?

- Ah sim, claro, o quarto das crianças favoritas da madre Lilian. Mas isso faz muito tempo. Pra ser exata, três crianças ocupavam esse quarto, chegaram a colocar em prática uma fuga pelo esgoto em 1986. Fiquei pasma com a coragem deles.

- Por que tentariam fugir?

- Alegavam medo de que não fossem adotadas antes dos 10 anos. Como se viverem na rua esperando que alguém as notasse para prover uma ajuda traria mais sorte. Se não fosse pela intervenção de Lilian aquelas pobres crianças viveriam uma situação degradante, estariam dormindo ao relento. Ela as tratava tão bem. Mas nunca entendi bem o motivo do apreço.

- A senhora não sabia o que significava a natureza extraordinária dessas crianças a ponto dela se interessar tanto?

- Não entendo onde quer chegar, detetive. Ouvia constantemente boatos, comentários de outras irmãs que não viam essas crianças com a mesma simpatia que eu ou Lilian. Eu reprovava que falassem mal de qualquer órfão pelas costas, mas sempre evitei atritos. Diziam que eram filhos do diabo devido a coisas estranhas.

- Coisas do tipo... paranormais? Olha, irmã Valerie, preciso ser honesto com a senhora. Essas crianças selecionadas pela madre Lilian são dotadas de habilidades sobrenaturais, muitas delas existem por aí.

- Eu não posso acreditar... - disse Valerie, franzindo o cenho - Jamais vi nada nelas que não parecesse fora do comum. Lilian influenciou bastante algumas freiras depois que se desligou do convento. Qualquer criança se sentindo deslocada e anormal era alocada para o quarto especial, praticamente virou uma tradição. Digo, especial no modo de falar, originalmente os quartos dos demais órfãos acomodavam mais do que só três. Inclusive, tem um álbum de fotos que sobreviveu intacto ao incêndio. Não quer dar uma olhada? Está guardado na minha cômoda, é uma valiosidade sagrada pra nos lembrar dos bons momentos que antecederam o fatídico dia.

- Ótimo, a senhora na frente, por favor. - disse Frank, educado. 

Chegando ao quarto, Frank esquadrinhou o ambiente de aparência não muito sofisticada para uma freira superiora. Valerie foi direto à cômoda, puxando a primeira gaveta, logo retirando o álbum empoeirado de capa vermelha com letras gravadas que diziam "Registro de Acolhidos". A freira o convidou a sentar-se na cama com um gesto de mão. 

- Agradeço muito sua gentileza, madre. - disse Frank, sentando-se ao lado dela na lateral da cama - Então, esses aí são os órfãos que viviam aqui antes do incêndio. Os favoritos da madre Lilian sorriram pra câmera também? 

- Se está tão interessado em saber... - disse Valerie, pulando algumas páginas. Frank notou uma lágrima escorrendo da maçã direita do rosto dela e a limpou com o dedo indicador - Oh, não precisava. Me desculpe... Tudo bem, foi um leve choque emocional. Olhar pra essas fotos rasgam meu coração. 

Enfim, ela havia chegado à página na qual os órfãos exclusivos posaram para uma foto com Lilian. 

- Aqui estão eles. Abigail, Max e Fred. Mas espere... - olhou-o com seriedade - Como disse mesmo que se chamava, detetive?

- Montgrow. Frank Montgrow. A propósito, imagino que esse do meio seja Fred Hackson, ele é meu colega de trabalho... Aliás, diria que à essa altura estamos mais pra amigos confidentes. 

- Não. Está errado. - disse Valerie, contrariada - Fred não tinha esse sobrenome, era dos pais que o adotaram um ano depois da tentativa de fuga. O pai dele o trouxe ao orfanato ainda recém-nascido, coitado. Tive pena daquele homem perdido, sem saber como criar seu rebento sozinho. A mulher dele morreu três dias após o parto. Eu aceitei de coração porque me abalava ver um homem desamparado com uma criança indefesa nos braços sentindo que não seria capaz de aguentar o pesado fardo de ser pai solteiro. Ele mesmo o batizou de Frederic. Portanto, no registro o nome da criança... consta com o sobrenome Montgrow. O mesmo que o seu. Detetive... Pelo seu semblante, imagino que não sabia de que estava próximo de seu irmão. 

Era como se o chão tivesse cedido sob os pés de Frank diante daquela revelação perturbadora. O detetive, olhando para o nada, esboçava uma reação de tensão, medo e surpresa, mal podendo exprimir palavras.

- Meu irmão?! - disse ele, baixinho, como se estivesse com algo entalado na garganta. 

                                                                              ***

Como o dia havia sido bem proveitoso, nada melhor do que se barbear após o banho na preparação para uma noite com mais diversão. Era exatamente o que Fred ansiava ao sair do box do banheiro apenas de toalha. Pegou o creme e o barbeador de um pequeno armário pregado na parede e virou-se ao grande espelho. Porém, alguma coisa não inspirava normalidade. O espelho estava embaçado, o que era ligeiramente estranho já que a temperatura estava amena. Fred encarou com incredulidade, levando sua mão direita ao espelho, pois sabia que tinha algo a mais. Passou a mão, desembaçando o vidro e à medida que o fazia seu espanto aumentava, um medo crescente que gelava sua espinha. Um par de olhos vermelhos que sinalizavam fúria e ódio mortais o fitava, presos a um rosto enorme, enrugado e cinzento. 

- Você não... - disse Fred, intimidado pelo monstro no reflexo - Eu devia tê-lo expulsado de mim quando tive chance... 

A manzorra do monstro ultrapassou o vidro agarrando o pescoço de Fred e o erguendo do chão. O reflexo parecia ter se materializado. 

- Você é fraco! - acusou a fera vorazmente - Não tem ódio! 

O detetive do DPDC acordou sobressaltado ouvindo uma buzina alta dentro de seu carro em pleno movimento numa estrada já à noite e bem na hora que um caminhão vinha de encontro ao veículo que o iluminava com seus faróis. Num instinto de rapidez, Fred desviou, mas não conseguira salvar o farol traseiro direito que parte da dianteira do caminhão bateu. O carro foi parar na beira da estrada e Fred saíra para olhar o estrago. 

- Ah qualé... - disse, desapontado consigo mesmo. Precisava estar num certo lugar para encontrar Frank e não era um bar. 

                                                                                  ***

Transitando por uma outra estrada com os faróis do sedã prata rasgado o breu da noite, Frank retornava do orfanato após uma longa conversa com sua mãe por telefone do lado de fora assim que despediu-se da irmã Valerie. "Papai traiu minha mãe com um monstro. Acho que nesse caso minha idolatria por ele não perdoa, até porque ignorância nunca foi o mesmo que inocência.", pensou.

A aparição súbita de Adrael, banhado pelas luzes dos faróis e parado no meio da estrada, o arrancou dos seus pensamentos fazendo-o desviar o carro para a direita. Freou bruscamente e saiu rápido do veículo. 

- Cê tá maluco? - indagou, fechando a porta raivosamente - Olha, sei que não te mataria atropelado, mas ia fazer um belo estrago no capô, talvez bem mais feio que isso, e não tem dinheiro pro seguro cobrir. 

- Desculpe aparecer dessa forma, mas é urgente, o tempo está no fim. - disse o centurião - Tem que ser hoje. 

- Hoje o quê? Eu sei que você tá longe de ser meu guarda-costa angelical, não passo de um empregado grátis pra vocês, então não espero que você me trate como um gatinho que não sabe descer da árvore. 

- Ainda não ficou ciente da importância que tem pra nossa vitória? - questionou Adrael, enfezado. 

- Ah sim, claro, matar o diabo com um tridente que é tão secreto que literalmente ninguém sabe até agora onde tá. 

- Você quis dizer matar o nefilim. - corrigiu o anjo - Fui bem claro antes: De Malvus cuidamos nós, seus ex-semelhantes. 

- O Fred não. - disse Frank, balançando a cabeça num olhar melancólico.

- O quê? - indagou Adrael, franzindo o cenho - Quer abrir mão do que foi predestinado a fazer?

- Se meu destino é matar um familiar a sangue frio, então eu prefiro morrer lutando pra que isso não aconteça! - enfatizou Frank. 

- Já imaginava que uma hora descobrisse. - disse Adrael, baixando um pouco a cabeça. 

- Sabia que... o Fred e eu somos... irmãos? Digo, meio-irmãos? Não fica com essa cara de tacho, responde!

- Ele só está vivo graças à Lilith. Não fosse por ela, eu e meus subalternos teríamos entrado tranquilamente naquele quarto e o partido com uma lâmina bem afiada, ainda que fosse um bebê indefeso... mas não inofensivo. 

- E vocês recuaram porque faltavam culhões pra enfrentar um demônio? Na verdade, foi até bom vocês amarelarem. 

- Você pode defende-lo por vê-lo agora como parte da sua família, mas não pode negar que sabia da possibilidade dele encontrar Malvus que tem um imenso poder de manipulação sobre ele. Posso contar uma novidade? Ele, neste exato momento, está lá agora, na base de operações do inimigo de Deus. Não nos resta mais tempo, venha. 

Adrael pegara-o pela mão, teleportando-o para um recinto cavernoso, similar à uma cripta. O centurião apontou para um caixão ao iluminar o local com sua mão direita da qual saía uma luz branca. 

- É ali que guardaram o tridente. - disse ele. 

- Isso também você sabia o tempo inteiro!? - disse Frank, zangado - Só deve tá tirando uma comigo... 

- A ocasião é oportuna agora que Malvus tomou posse de um esper poderoso o suficiente para se tornar o mais terrível anjo caído de todos. Eu o visitei em segredo. Está num hospital e em coma. Torçamos para que não desperte cedo demais. 

- A Lilith parece não querer mais nada com o Malvus, ela cansou de lero-lero e quer ser independente. - disse Frank. 

- Isso não exime ela. - retrucou ela - É provável que tenha os mesmos interesses que o marido, não espero menos do primeiro demônio da existência, a primeira alma humana distorcida.

- Primeira? - perguntou Frank, olhando para ele. 

- Eva não foi a primeira mulher concebida no gênese. Nem Adão o primeiro homem. 

- Isso que é informação privilegiada. - disse Frank - Lilith e seu parceiro foram só testes? 

- Exato. Além disso, ela assumiu a forma da serpente que tentou Adão e Eva, eles basicamente foram o segundo ensaio. Foi Lilith quem os induziu a provar do fruto proibido. - revelara o anjo, logo empurrando com a mão luminosa a tampa do caixão que caiu com um baque surdo. 

- Onde é que a gente tá? Quase ia me esquecendo. 

- É uma igreja em Israel. Meus irmãos serafins depositaram o tridente aqui, um lugar sagrado onde demônios não pisariam sem serem hostilizados por homens devotos. Verdadeiros homens de fé. Agora pegue-o. 

Frank pegara a arma, sentindo a textura enrugada do cabo. O tridente possuía um revestimento meio descascado e as pontas eram curvas, apenas a do meio sendo reta. Adrael, num movimento ágil, tocou-o no ombro. 

De volta à estrada. Frank ignorou o enjoo analisando o tridente que segurava. 

- Já voltamos? Ah, que bom. É essa forquilha que vai matar a coisa? 

- Não ligue pra aparência. Faça bom uso. Dependendo de a quem se referiu com "coisa". 

- Ao Malvus. Tá dada minha palavra. Tá feita minha decisão. - disse Frank, firme - O Fred vive. 

- Na hora H você vai se impedir de cometer esse erro. - disse Adrael que em seguida desapareceu impaciente para discutir. 

                                                                              ***

No galpão de Malvus, Lilith escolhera um momento errado para lavar a roupa suja. O anjo caído a arremessara contra uma parede. Alguns demônios presenciavam a ação com sorrisos insanos e infames.

Malvus a erguera, pondo-a contra a parede agarrando seu pescoço. 

- Enquanto não decidir de que lado prefere lutar, você perdeu completamente a relevância pra mim. 

- Desde quando fui de fato alguém importante? Como percebi que fui mais um dos seus brinquedos, não tive opção senão priorizar eu mesma. - disse Lilith - O que foi? Tá triste porque usei seu vira-lata sem pedir licença?

- Não é apenas sobre o Lux! Atticus afundou num coma por causa do veneno que você pôs na última dose de elixir que reservei à ele. Você acha o quê? Que pode sabotar meus planos, saber que descobri e ainda assim vir aqui como se estivéssemos no mesmo lado do campo? O lanchinho do Lux devia ser você ao invés do Frank. 

- O cinismo é um dos principais atrativos que me fez cair aos seus braços. Você o queria morto tanto quanto eu! 

- E posso acreditar que você quer Fred vivo tanto quanto eu. - disse Malvus dando um sorrisinho de canto expressando ironia - Caladinha você fica. Eu já não pensava em dividir o comando com você... agora que não terá mesmo as regalias de uma imperadora ostentando poder e glória com o imperador. 

A largou no chão, jogando-a para os demônios. 

- Levem ela para aquela salinha especial. Você gosta de sentir o sol na pele? Prepare-se pra odiar. - disse ele, quase rindo malevolamente. 

Os demônios pegaram-a pelos braços e conduziram até a referida sala. 

- Esperava que fosse reagir. - disse Malvus - Acho que domei a fera. - olhou para os demônios - Parados aí por que? Rastreiem os centuriões, podem ter transferido o tridente a outro local! Movam-se! 

Enquanto o grupo corria para agir de acordo com a ordem proferida, um outro demônio vinha com certo receio na direção de Malvus, como se temesse uma resposta vendo o estado de humor do anjo caído. 

- Ahn... Senhor, perdoe incomoda-lo, mas... Há um visitante indesejável.  

- Quem à essa hora? - peguntou Malvus, ríspido. 

- Eu. - disse Fred, vindo de uma área escura até seu "mentor" - Que tal batermos um último papinho antes da bomba estourar?

- Fred, mas que surpresa recebe-lo. É bom que não esteja seguindo os passos da traidora que acabei de neutralizar. 

- Se tá falando da Lilith, eu tô pouco me lixando em saber. - disse Fred. O nefilim olhou com rudeza para o demônio que encontrava-se entre ambos - Chispa. - mandou, gesticulando com a cabeça. 

- Você não me dá ordens. - retrucou o demônio - Meio-sangue. - falou com desprezo. 

- Retire-se, já. - disse Malvus, o tom autoritário. O demônio fora embora, desdenhando de Fred - Conferiu sua lealdade à ela?! Como pôde me trair desse jeito? Você é meu pupilo, necessito que permaneça comigo. 

- Eu queria achar um modo de controlar o monstro que adormece dentro de mim. Conciliar as duas metades. 

- Mentira, você queria se livrar da metade que realmente importa, mas que você tem medo. 

- Perdi o medo dessa coisa depois que tive um pesadelo e quase bati o carro. O Frank me orientou a escolher não confiar na Lilith. Devia agradece-lo, pois se eu tomasse a fórmula da sua ex-esposa era arriscado sofrer, sei lá... um choque anafilático fatal. Se o Frank salvou minha vida ou não, nenhuma diferença faz. Olha onde estou. Acorrentado a um contrato maligno. 

- Lilith contou do que Adrael fez à sua mulher e filho. Sinto muito. 

- Sente, é? Não vem com sentimentalismo forçado. Você é a última pessoa que eu consideraria um ombro amigo pra chorar. - disse Fred, ficando de costas. 

- Sabia que pode tê-los de volta? É o cheiro de proposta tentadora no ar que você sente agora, né? 

- O que tá querendo dizer? 

- Que posso restituir as memórias deles... em troca de um favor que beneficiaria tanto você... quanto esse mundo que você não quer abandonar. - disse Malvus lançando um olhar de expectativa à ele.

Fred virou-se olhando-o com uma face que denotava um misto de súplica com dúvida. 

                                                                                ***

 Carrie quase deixou escorregar a taça de vinho da mão ao ouvir da boca de Frank as seguintes palavras em alto e bom som: "Fred e eu somos filhos do mesmo pai, mas não da mesma mãe". 

A assistente tinha ido à casa do amigo para ver o primeiro debate de candidatos à prefeitura de Danverous City e conferir o desempenho argumentativo do seu chefe, isto sabendo que não daria tempo de chegar em casa antes dos primeiros 45 minutos. 

- Frank... - disse ela, estarrecida - De todas as notícias surpreendentes, bombásticas e arrepiantes do meu círculo de amigos, acho muito difícil que essa seja superada. Meu Deus... Ainda tô chocada. 

- Pois é. - disse o detetive, de pé próximo ao sofá - Mamãe nunca arrancou satisfações por medo dele reagir mal e dar numa treta violenta. 

- Seu pai era agressivo com sua mãe?

- Ele não, tava me referindo à ela. Ciumenta até o último fio de cabelo. 

- E como ela conseguiu deixar por isso mesmo? Ah sim, obviamente o amor venceu no final. 

- Não. - negou Frank, sério - A morte venceu. Minha mãe podia ter uma crise de nervos, dar chilique, armar o maior escândalo, mas preferiu que ele não soubesse o quão decepcionada estava, queria manter o casamento nos eixos de todo jeito. Tanto é que só flagrei uma briga deles, uma discussãozinha boba. 

- Quando o Fred chegar, espero que o debate já tenha acabado pra deixa-los a sós. - disse Carrie não reduzindo o impacto - Ter ido à esse orfanato foi a melhor coisa que fez hoje. 

- Carrie, tô num dilema infernal: Eu não posso me dar ao luxo de matar alguém sangue do meu sangue pra salvar o mundo. Os anjos, principalmente o Adrael, batem nessa tecla de que matar o nefilim é a missão prioritária e pro Malvus eles nem parecem ligar. 

- Aí está a confirmação: Fred é a sua besta. Possivelmente você encontrará o fim se resolver lutar. Seria a última repetição da história, de certa forma. Então, no seu lugar, decidiria o mesmo. 

O celular de Frank vibrou no instante que ele responderia. 

- É o Fred. - disse ele, visualizando a mensagem - Quer me encontrar agorinha na igreja presbiteriana, aquela perto da praça das fontes. Bem que o Adrael falou. É hoje que o bicho vai pegar. 

- Não Frank, não vá, por favor. - disse Carrie, levantando-se do sofá - Pode ser uma armadilha do Malvus tentando te remover da equação pra que aja sem obstáculos. Usar o Fred pra acabar com você e roubar o tridente. 

- Não Carrie, tá na hora de colocar os pinguinhos nos is. Vou levar o tridente, quem sabe o Malvus não fareja, vem e pede pra ser empalado. - disse Frank, indo à sua porta. Carrie o segurou pelo braço.

- Não precisa escutar um anjo metido. - disse ela - Nossa, me sinto mal dizendo isso. Enfim, colocar sua vida em jogo agora não é certeza de que vá se sair bem. Se o Fred vira aquela coisa, ele te parte em dois. 

- Ele tá confuso. De qualquer modo, a palavra dele vai selar eu destino. Vou nessa, acho que levo uns 45 minutos pra chegar. - disse Frank, abrindo a porta e saindo. O debate já começava na TV e Ernest podia ser visto nos cortes da câmera. Carrie voltou a sentar-se, suas mãos geladas e suando, ma concentrando-se na tela. 

- Vê se volta vivo, pelo amor de Deus. - disse, recostando a cabeça no sofá. 

                                                                                 ***

A porta de ferro da sala prisional onde Lilith estava cativa abria-se num lento e barulhento ranger. 

A demônia via-se deitada no chão, mais precisamente presa num círculo sob um farol, protegido com grades, que emitia uma forte luz amarelada que a torturava devido ao sigilo, conhecido como "Prisão da Inclemência", desenhado pelos subordinados de Malvus. 

- Mudou de ideia... - disse ela, olhando por cima do ombro - Me sinto até redimível ganhando uma visita íntima... do meu ex-sócio. 

- Como sabia que era eu? - indagou Fred, aproximando-se. 

- Ouvi sua voz com meus sentidos ampliados. - mal aguentava-se para levantar. 

- Então... O Malvus te pôs de castigo por agir pelas costas dele. É, ele pegou pesado. 

- Tá com peninha de mim agora? Vamos, diga que isso é menos do que eu mereço. - disse ela, virando-se para Fred. Seu rosto exibia pedaços de pele e carne humana junto a partes branco-acinzentadas da verdadeira face demoníaca, incluindo os olhos totalmente negros e as fileiras de presas salientes. 

- Estive pensando bem e... - disse Fred, um tanto inseguro - O inferno onde vivem os demônios vai ficar um caos sem um líder e as consequências podem chegar aqui, portanto... na hipótese de Malvus não sobreviver à essa noite...

- Ah, bolou um plano com o Frank pra pega-lo. Significa que é muito provável que ele já tenha o tridente. 

- O Frank e eu somos adversários, desta vez mais do nunca. Não vou ajuda-lo. Mas vou te ajudar... somente porque confio que Malvus não passa de hoje. - disse Fred, logo rompendo o círculo do sigilo com o seu pé direito. A luz do farol já não causava mais seu efeito causticante em Lilith, cujo rosto reconstituía - Não sei o que vai ser de mim, tá tudo imprevisível... Cansei de promessas vazias. 

- Me vê como sucessora para governar aquele mundinho decadente? Eu gosto daqui, por incrível que pareça. Mas vou agradecer a ajuda, embora recuse educadamente a oferta. Adeus, Fred. Você nunca mais vai se deixar seduzir por uma palavra que eu disser. Uma pena que não vou estar no camarote vip pra ver o sangue do Frank ou o seu ou do Malvus jorrar que nem cascata. 

- Por que? Tem coisa melhor pra fazer? 

- Digamos que estou afeiçoada ao prazeres humanos. Tenho muito que aproveitar. E assistir uma luta de dois contra um envolvendo um anjo caído, um nefilim e um reles detetive não está marcado na minha agenda. 

Um som de alarme soou chamando atenção de Fred que virou o rosto escutando o barulho agudo. 

- Isso é um alarme?! O que tá havendo? - voltou-se para Lilith, porém ela já havia desaparecido num abrir e fechar de olhos - Não faça eu me arrepender de te salvar, sua demônia desgraçada. 

No hangar principal, uma horda de centuriões invadia ardorosamente a base de Malvus. Um grupo de demônios veio correndo, despossuindo corpos para enfrentarem nas suas formas reais e selvagens. Um deles pulou sobre um centurião derrubando-o. 

- O tridente! - falou, expelindo saliva dos dentes. 

O centurião dera uma cabeçada como resposta que o fez voar longe e arremessou sua lâmina que o atingiu certeiro. Todos os demônios viraram fumaça ao serem apunhalados pelas espadas que os bravos centuriões manejavam como se fossem mata-moscas. O líder do bando, Adonel, conseguira ultrapassar o pequeno exército demoníaco, passando pelos corredores que levavam à sala prisional. A porta foi empurrada até cair pesadamente no chão. A missão conferida por Adrael consistia capturar Lilith. 

- Ela escapou. - disse Adonel, olhando furioso o círculo incompleto com os olhos brilhando em branco. Fred fugira pelos fundos saindo assim que os anjos arrombaram a entrada principal. 

                                                                               ***

A igreja presbiteriana estava passando por reformulações, o que explicava a ausência total dos assentos, deixando um amplo espaço para se movimentar. Fred aguardava a chegada de Frank de costas para a entrada observando as pinturas e os variados detalhes arquitetônicos. 

- Que ironia eu ter escolhido esse lugar. - disse ele, sentindo que não deveria estar ali. 

- Pra mim é bem apropriado. - disse Frank, entrando de repente. Bateu a ponta do cabo do tridente no chão cujo barulho fez Fred virar-se - Já trouxe o espeto pra gente fazer churrasquinho de anjo caído. 

- Pois pode tirar seu cavalinho da chuva, Frank. - redarguiu Fred, sorrindo com sarcasmo - O espetinho que você vai fazer, ou morrer tentando, é de nefilim. 

- Por que tá falando desse jeito? Até parece que foi possuído. Ou, já sei, o Malvus virou tua cabeça de novo. 

- Não me surpreende você conseguir o tridente, afinal você é a menina dos olhos dos anjos, era óbvio que eles te dariam de bandeja. 

- Qual é o lance da vez? O Malvus te mandou vir aqui, teleguiou você pra armar uma emboscada? 

- Não tem emboscada nenhuma. Ele nem deve saber que chamei você pra uma conversa isolada. 

- Como não sabe? O cara te tem no radar 24 horas por dia. Inclusive, eu trouxe o tridente pra servir de chamariz pro Malvus. 

- Eu disse que ele não deve saber que tô aqui... por causa dos centuriões que estão invadindo o galpão e arrasando com todos os demônios. Um ataque-surpresa. Talvez usaram a estratégia do cavalo de Troia. 

- E você acha que essa operação anti-demônios vai distraí-lo? É bom que ele dê as caras logo. 

- Frank, presta atenção: Eu e você teremos que resolver isso numa luta visceral pelo fato de que fiz um acordo com Malvus, um bom acordo. Eu sei, você vai surtar comigo agora, mas não ligo, eu tenho minhas razões pra aceitar.

- Tá de sacanagem, né? - indagou Frank, olhando-o com reprovação - Será que você não aprendeu droga nenhuma com a artimanha da Lilith? Vê se raciocina direito! Não se confia em nenhum ser do mal!

- Eu sei, mas escuta: Os termos do acordo preveem que o Malvus exclua o mundo humano da destruição que ele almejava ver eu causando, ou seja, ele apenas assiste o mundo dos centuriões incendiar. E sabe o que é melhor? Ele devolve minha antiga vida ao lado da Pamela e do Donald restaurando as memórias deles, memórias que o seu amigo paladino da justiça apagou sem piedade. 

- Não vou aceitar você jogando isso na minha cara de novo. O Adrael insistiu que eu matasse você, mas quero mesmo é acabar com a raça do Malvus com essa arma que só pode ser usada uma vez.

- Mas o Malvus não é páreo tão duro assim se todos os centuriões de todas as classes se unirem e descerem o sarrafo nele. - argumentou Fred, na defensiva - Restam só nós dois. Tem que acabar assim. 

- Eu morro e você fica de boas com sua família. Seria um sacrifício justo... 

- Não, não seria. Eu arranjaria um modo de te reviver. 

- Não, se esse acordo não for marmelada, o que acredito ser extremamente difícil, você teria que se aposentar da vida de caçador, pra todo o sempre. Não pode fazer e depois desfazer uma coisa tão fácil quanto você pensa. - disse Frank, dando alguns passos adiante - Eu me recuso a sujar esse tridente com seu sangue. Não posso cometer assassinato... - olhou-o fixamente - ... contra alguém da minha família.

A expressão de Fred moldou-se em estupefação contida, num leve arquear de sobrancelhas. Frank deu um sorrisinho de canto involuntário, enxergando Fred com uma perspectiva que o condicionava a trata-lo como ente querido. 

- Não quero isso terminando com sangue e morte. Mas sim com um abraço entre irmãos, mesmo que não sejam da mesma mãe. O que acha?

- Você foi lá no orfanato né? Era questão de tempo. Mas tem algo que deve saber: O motivo pelo qual substituí você no DPDC não foi mera coincidência. Malvus sistematizou tudo pra acontecesse o momento certo. Ele veio direto à mim assim que soube da existência do nefilim. Me chantageou ameaçando minha família caso eu não entrasse no joguinho diabólico, pra isso pedi demissão do departamento local. 

- Não obedece esse acordo. - aconselhou Frank - A gente dá conta, detonamos com ele. Não age como se não tivesse mais nada a perder. - uma lágrima descia pelo rosto do detetive.

Um som de lentas palmas foi ouvido. Frank segurou com mais firmeza o tridente ao ver Malvus de pé no altar fitando-os com sua infâmia no olhar. Fred se virou, encarando o anjo caído com repulsa. 

- Que cena comovente. Mas está faltando mais ação nesta versão moderna de Caim e Abel. Ou quase isso. Chega de drama. Me deem espetáculo. 

- Sabe, Malvus... Ou Azrael, tanto faz... - disse Fred - ... tem sim uma coisa que vamos dar à você com muito gosto. É um belo chute no seu traseiro. - olhou para Frank - E pra finalizar esse tridente como presente pra viagem só de ida. 

- É, vejo que minha persuasão enferrujou bastante. - disse Malvus, logo tirando o longo casaco de couro preto - Não domei a fera. - retirou a blusa cinza - Se o espetáculo não vem à mim, eu o obtenho por mim mesmo. 

Malvus destravou suas asas negras que se abriram elegantes. O anjo caído se impulsionou num voo súbito contra Frank, mas primeiro deu uma bofetada em Fred com o dorso da mão direita e em seguida desferiu um soco em Frank que não largou o tridente e revidou. Malvus segurou o cabo por reflexo, mas deu-se conta que foi um erro: suas mãos ardiam queimando em contato com a arma. Aproveitando a fraqueza, Frank sorriu e empurrou o cabo para bater no queixo de Malvus e depois apontou as três pontas. 

- Vai ser mais fácil do que pensei. - disse Frank, pronto para finca-lo - Ah não... - viu as pontas queimarem feito ferro na brasa. - Opa, ah sim. - delas uma potente rajada de fogo saíra atingindo Malvus em cheio. O anjo caído foi repelido e rolou pelo piso de ladrilhos, as asas queimando. 

Mas levantou-se, passando a mão pelo rosto terrivelmente queimado, com a arcada dentária à mostra nua e crua, regenerando-se. Produziu um fogo azulado da mão esquerda e o lançou contra Frank. Fred ficara com os olhos vermelhos, afetado pela tensão, e correu para salvar o meio-irmão. 

- Frank, não! - disse Fred, partindo em alta velocidade. Tomou a frente do detetive sendo engolido pela rajada de fogo fátuo que destruiu seu casaco e fez estragos na sua camisa. Fred ajoelhou-se, bastante ferido. 

Malvus usara telecinesia para tirar o tridente da mão de Frank, mas quando pensava que executaria outro ataque, mirou sua atenção em Fred pegando-o pelo pescoço.

- Você é a maior decepção que já tive. Amoleceu seu coração. Fraquejou de propósito. - disse Malvus que dera um soco na barriga de Fred e desferiu uma sequência de mais outros no rosto, esmurrando-o descontroladamente - Eu vou ser generoso... e te dizer quem matou sua mãe biológica. Não fui eu. - dera uma cotovelada no nariz - Nem os centuriões - um chute na lateral do corpo - Foi ela! - aplicou um chute que o fez voar contra uma pilastra que rachou com o impacto. - Aquela vadia matou sua mãe por ciúme. Aliás, não foi gratuitamente, foi por ciúme. Afinal, foi uma das minhas amantes. 

Frank correu para reaver o tridente, mas Malvus usou telecinesia para empurra-lo e mante-lo no chão.

- Merda... Não consigo... mover nem o amigão entre as pernas. - disse ele, sofrendo com a imobilização quase total do corpo. 

- Sua vez, Frank. Que castigo é mais adequado à você? - perguntou Malvus, estralando os ossos do pescoço como aquecimento para torturar Frank - Arrancamento do baço? Do pulmão? Do coração? - pisara forte sobre o peito do caçador. Frank gemeu alto de dor - Sua caixa torácica quebrada em pedacinhos? - riu maldosamente - Você me fez esperar muito tempo pra me fazer isso. 

- Frank... - disse Fred, tentando reerguer-se, o rosto ensanguentado. 

Malvus iniciara uma sequência de chutes e pontapés no corpo e na face de Frank. O último golpe fora um pisão no braço direito que provocou uma fratura grave. Frank gritara com a reação dolorosa. 

A fúria de Fred o instigava a mover seus membros para atacar. Os olhos avermelhando cada vez mais, a pele se acinzentando, os dentes mais cerrados e a expressão de cólera se intensificando. 

- Deixa... o meu irmão... em paz! - disse ele num tom monstruoso. Avançou contra Malvus, engrandecendo seu punho direito. Malvus sequer focou nele aproximando-se como uma fera ensandecida. Fred dera um retumbante soco no peito do anjo caído que o mandou para a parede atrás do altar. Rapidamente correu e pegou o tridente, arremessando com toda a força. Mas Malvus o parara com telecinesia à poucos metros de acerta-lo. Não se dando por vencido, Fred também combateu telecineticamente, empurrando o tridente para mais perto. Um feroz duelo telecinético. 

A única forma de fazer o tridente encostar na pele de Malvus foi soltando um rugido poderoso que faria o mais bravo leão se afugentar de medo. Mas fez mais que apenas encostar. Malvus abriu a boca, olhando para baixo. Viu o tridente na vertical cravado no seu peito. Fred, aos poucos, retornava ao normal enquanto Frank ainda sofria com a dor insuportável da fratura no braço. 

- Os centuriões não são... lá muito confiáveis. - disse Malvus - Frank certamente... não sabia... do preço.

- Do que você tá falando? - perguntou Fred, cansado. 

- A consequência de se matar um anjo caído que... governava... o submundo. - o tridente emitia pequenos fachos de luz das partes descascadas rachando do cabo às pontas, indicando que iria se destruir - É sucede-lo. Você terá muito trabalho a fazer, Fred. Vocês não venceram. Tem um algo a mais... - a pele de Malvus enegrecia - Sentirão saudades minhas quando ele chegar à este mundo.

- Ele quem? - perguntou Fred. 

- Os humanos deste continente... o chamam.... de Big One. Mas nós, seres obscuros que o louvamos, o conhecemos por... - a frase foi interrompida com o fim da degradação do tridente. Malvus rachou por inteiro com feixes de luz branca saindo pelas fissuras até que explodiu, por fim, numa fumaça preta que se espalhou por toda a igreja. Fred protegeu-se com os braços e Frank fechou os olhos apertadamente. 

A fumaça dissipou-se em poucos segundos e a igreja mergulhou novamente no silêncio da madrugada. 

Porém, os gemidos de Frank recomeçaram intercalados por tosses secas devido à fumaça densa. 

- Frank. - disse Fred, correndo para socorre-lo. Agachou-se próximo ao meio-irmão tentando examinar os pontos agredidos por Malvus - Tá com o braço quebrado... - tocou no abdômen e Frank soltou um grunhido de dor - ... e as costelas também. - pensou no que deveria fazer e descobriu olhando para a sua renovada força interna - Não custa tentar. Se não funcionar, chamo uma ambulância... pra nós dois. 

Pousou sua mão no braço direito suavemente, bem acima da lesão. Fechou os olhos, concentrando uma energia dentro de si que sentia fluir pela primeira vez desde que nasceu. Uma luminosidade azulada, de repente, emanou da mão da mão direita de Fred, começando tremeluzente e fraca, mas logo se regularizando. A luz parecia queimar de tão intensa que brilhava. Frank movia o braço com menos desconforto até que não sentiu mais nenhum traço de dor. Em seguida, Fred passou para as costelas, mantendo o equilíbrio, e realizou o mesmo feito aparentemente miraculoso. Frank estufou a barriga arregalando os olhos. Os ossos avariados foram consertados e o detetive levantava-se ficando sentado no chão. 

- Fui pro céu e voltei? Quem me ressuscitou? - perguntava-se Frank - Cara, o teu rosto tá um bagaço... - disse, com uma risadinha fraca. 

- O seu idem. - disse Fred, sorrindo de volta - Acabou, Frank. Nós vencemos. E uma boa notícia: Meu lado puro despertou. Mas senti medo de que não tivesse efeito, por isso hesitei. 

- É, eu acho que escutei você dizer "ambulância". Bem, receber poder de cura é mais prático do que passar semanas com o braço engessado. - disse Frank, bem-humorado - Do resto eu cuido lá em casa, rebocar os estragos. - cuspiu um pouco de sangue ao levantar-se com a ajuda de Fred - Valeu. 

Ambos saíram da igreja para passearem no parque gramado e respirar um ar puro. 

- Agora você controlou o lado maligno e potencializou o lado puro. Pensei que o negócio tava mais balanceado. - disse Frank - Como tá se sentindo?

- O que sinto ainda tá complicado descrever. - respondeu Fred - Pra equilibrar direito tenho muito que aprender, preciso de mais... autoconhecimento. - deu um suspiro pesado - Continuo o seu hóspede? 

- Você é mais do que um hóspede a partir de hoje. Por que eu te mandaria embora depois do que passamos hoje?

- Ahn, Frank, tem uma coisinha pra contar. - disse Fred, interrompendo o assunto - Desculpa mudar de assunto, mas é importante. Antes de morrer, o Malvus mencionou que uma força que todos os seres malignos adoram como um deus estava pra vir ao nosso mundo. Ele diz que o conhecemos por Big One.

- Big One? O único Big One que conheço é o mega-terremoto que os cientistas previram, um terremoto tão devastador que pode destruir a Califórnia. - seu celular vibrara - Espera aí... - verificou a mensagem - É a Carrie. Disse que o debate acabou e já tá em casa. O diretor aumentou sua taxa de aprovação em menos de uma hora após o debate. Sortudo. 

- Legal. - disse Fred - Mas... você acha que esse Big One citado pelo Malvus e o terremoto são a mesma coisa? Talvez essa força venha através de um terremoto bem ao estilo daqueles filmes de desastres. 

Incrivelmente, um tremor de terra começou exatamente após Fred comentar. 

- Foi só você falar. - disse Frank, tenso - Não pode ser... Será possível? 

- Frank, sai de perto! - disse Fred, empurrando-o forte. A terra rachou-se e cedeu sob o nefilim que caíra, mas não sem antes ser segurado por Frank - Você vai ter que largar! Esse buraco é como um aspirador gigante! 

- Não! Não vou deixar você ir! Segura firme, vou te puxar!

- Frank, tem mais outra coisa! - a mão de Frank escorregava - Malvus avisou que... aquele que mata o diabo com o tridente... se torna o sucessor dele no submundo! 

- Como é que é?! 

A mão suada de Frank não conseguiu agarrar-se à de Fred por muito tempo e o nefilim foi tragado pela força sugadora da cratera que logo se fechou com os pedaços voltando à superfície. Frank desabou por dentro, caindo no chão de costas e pondo as mãos na cabeça. Mas conteve as lágrimas. 

Do alto de um prédio, Adrael observava a cena calmo. Virou-se para ir embora, convencido de que a missão foi cumprida, embora não como pressupunham os anjos. Ainda assim, orgulhou-se de Frank. 

No entanto, o centurião viu objetos parecidos com granadas rolarem aos seus pés. Eram quatro dispositivos de alta tecnologia que acenderam luzes verdes de LED que acionaram um efeito incapacitante para Adrael. O anjo sentia uma forte dor de cabeça, ajoelhando-se. Ergueu os olhos e só viu dois pés chegando perto, alguém calçando botas de couro vindo acompanhado de mais passos. 
  
                                                                               ***

A exaustão desacelerava os passos de Frank quando o detetive adentrava no seu lar. Pensou tomar um porre que aliviasse sua dor emocional, não tirando da mente a imagem dramática de Fred e seus olhos que transmitiam o desespero mas ao mesmo tempo uma aceitação de seu próprio destino. 

Jogou as chaves do carro no sofá e fechara a porta. Porém, antes que acendesse a luz pelo interruptor, notara uma forma estranha situada no outro sofá. Não tardou para que sua percepção lhe dissesse que uma presença inesperada estava ali tranquilamente sentada na escuridão. 

Frank sacara a arma rapidamente, apontando para a figura nas trevas. 

- Se não der um pio, é bala no teu couro. Bem depende do que vai falar, porque é assim que eu trabalho: atiro primeiro e pergunto depois. Mas você tá calminho demais pra um gatuno qualquer.

- Eu desde já peço desculpas por essa visita sorrateira e inconveniente. - disse a pessoa com uma voz distorcida, parecendo um monstro das profundezas de algum inferno - Não me leve a mal, não quero assusta-lo.

- Assustar? Camarada, você não faz ideia de com quem tá lidando. 

- Ah, eu faço sim, tenho plena ciência de quem você é, o que faz e como age.

O abajur foi ligado a luz acendeu-se, clareando o intruso. Frank sentiu um nó nas tripas. 

- Su-superintendente Hoeckler?! - disse Frank, espantado, baixando a arma - O que o senhor faz aqui? Tudo bem que minha casa nunca ficou oculta pra lupa gigante do DPDC, mas... sair do seu pedestal pra me visitar às duas da manhã? Explica isso, por favor. Não dá pra entender. Por mais que a minha cabeça esteja cheia demais pra pensar. É que acabei de perder alguém. 

- Eu sei, Frank. Mas não lhe dou os pêsames. - disse Hoeckler numa frieza calculada - Você retardou uma tragédia. A maior catástrofe que esse mundo poderia testemunhar. Somos gratos eternamente à você. 

- O quê? Como assim "somos"? Peraí... O senhor tá a par de tudo que faço? Até mesmo...

- A sua vida dupla jamais foi um segredo, Frank. - disse Hoeckler, abrindo seu laptop que mostrava o logotipo de uma empresa chamada Fundação ESP - Vimos que hoje você alcançou um nível muito acima do que antecipamos. - clicou num ícone que abriu uma janela a qual exibia uma foto de um ambiente semelhante a uma caverna onde podia se ver um círculo de pedra com 12 símbolos entalhados, todos organizados numa formação redonda. Dois símbolos queimavam numa chama esverdeada - Este é o relógio do apocalipse. Havia saltado para um minuto, mas agora está à três minutos. 

Frank mal podia absorver aquela verdade. 

- O relógio é mesmo real. - disse ele - Senhor... O que significa tudo isso? O que é essa tal de ESP? 

- A fundação à frente de seu tempo que vai erradicar o mal deste mundo. - disse Hoeckler, olhando para Frank - O que você fez hoje nos deu a certeza absoluta de que está pronto. 

- Pronto pra quê? O crédito por ter matado o diabo não é meu, caso o senhor não saiba. 

- Não recorra à mentira para se fazer de modesto e fugir do que estamos propondo. 

- Mas é a verdade! Primeiro o senhor invade a minha casa, depois fica me esperando no escurinho pra falar comigo numa voz sinistra... 

- Ah sim, este é o novo modelo de sintetizador vocal. Cortesia da ESP. Frank, você foi muito além do que esperávamos, apesar de existir todo um macrocosmo aqui dentro e lá fora que mal passa pela sua mente. Seres que nem supunha. Anomalias que precisam ser contidas, estudadas e catalogadas, nessa exata ordem. Há um mundo mais vasto à sua espera e queremos da-lo de presente. 

- O que vocês realmente querem de mim? - questionou Frank, a suspeita pulsando na sua expressão. 

- Queremos você, Frank. - disse Hoeckler, sereno - Não precisa mais ficar sozinho. Junte-se a nós. 

                                                                                CONTINUA...

                                                                        FIM DA 3ª TEMPORADA

*A imagem acima é propriedade de seu respectivo autor e foi usada para ilustrar esta postagem sem fins lucrativos. 

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