Crítica - Dumbo (1941)


Um antológico exemplar da fórmula "patinho feio".

AVISO: A crítica abaixo contém SPOILERS. 

É meio complicado pra mim discorrer sobre filmes das antigas devido a não me habituar a assistir coisas dos anos 90 pra trás (devo mudar tal postura e dar play num preto e branco), especialmente o mais antigo que já vi numa ocasião vaga nas lembranças quando teve exibição no SBT num domingo à tarde. Desde então carrego a memória do elefantinho de orelhas longas com bastante carinho e honestamente fiquei um pouco receoso nessa revisão após tantos anos em relação à primeira vez e um período relativamente grande sem ver animações cinematográficas em 2D bem datadas (sobretudo da Disney) e isso resultar num julgamento aquém da visão infantil que dialogava com os aspectos do filme na época que o conferi. Eu estava de bom humor e meu coração foi aquecido pela fofura do personagem-título logo de cara, numa simpatização instantânea que não se perde em minuto algum. O longa é um dos mais curtos já produzidos pela casa do rato (cerca de 64 minutos - uma hora e três minutos, aliás) e pincela um verniz de fábula audiovisual não dispensando a moral intrínseca e mantida na evidência ululante. Sentia saudades desse clima singular de uma animação velha - e que envelheceu bem, por sinal (não é a toa que produziram um remake em live-action) -, muito reconhecível na trilha sonora.

A história é uma ode à inocência. Cegonhas que entregam filhotes aos animais de um circo itinerante antes do mesmo instalar-se na próxima parada (mas quem na mais sã consciência decide montar a tenda de um circo numa tromba d'água caindo? x_x), dentre eles um acaba se atrasando e obviamente que estou falando do elefantinho que não tem como não se encantar. A mãe de Dumbo, Sra. Jumbo (eu poderia adivinhar o nome do pai, já sei que é [letra aleatória]"umbo") não tem sossego com suas """amigas""" fazendo chacota das orelhas do seu filho e julgando como imperfeição física ao ponto de considera-lo uma heresia aos elefantes. O trivial e básico instinto: Aquilo que é à parte de um determinado padrão tende a sofrer repúdio de uma maioria que o segue (físico, mental, comportamental, biológico). O barateamento dos custos de produção não é um fator prejudicial e, em última análise, só tornou o filme mais simples em razão do seu caráter narrativo igualmente simples. No meio do filme, temos o limiar da amizade teoricamente cômica entre Dumbo e o carismático ratinho Timóteo que faz seu papel magistralmente colocando o elefantinho no caminho da superação, é aquele amigo raro que se aproxima com empatia pela discordância ao consenso dos detratores, porque afinal de contas é triste ver alguém sofrer uma discriminação injusta estando solitário (ainda mais se estiver longe da sua mãe, o seu porto seguro, que foi trancada numa cela feito uma selvagem por defender seu filho da toxicidade alheia), não tem como conter a comoção diante de tal revés.

O último desafio surge meio que ao acaso. É ou não é de se compadecer do pobre elefantinho sendo alvo de risadas da plateia do circo, de cara pintada e ainda por cima obrigado a fazer parte de um número com palhaços estúpidos (e causando a destruição do circo)? O bullying é uma brincadeira na qual apenas um lado se diverte e nada mais. Voltando à última provação de Dumbo, temos o grupo de corvos que lança umas zoações escrotas e logo recebem uma lição de moral bem dada de Timóteo, o funcional sustentáculo do protagonista para lidar com as repressões. Eis que os corvos malandrinhos pedem desculpas e ajudam a realizar a ideia aparecida "do nada". Se Dumbo segurasse uma pena "mágica" ele seria capaz de voar com suas orelhas. Na minha interpretação foi puro trambique só pra fazer com que Dumbo ficasse dependente deles, sempre necessitando de uma nova pena mágica a cada voo e se a pena fosse perdida arranjariam outras, abusando da inocência da dupla. Pois foi então que no número brilhante de Dumbo a pena (mero placebo) mostrou-se inútil e o elefantinho seguiu o voo deslumbrante, encantando o público, tanto o fictício quanto o real. É o sublime valor das diferenças: o improvável pode guardar surpresas, acabar com a subestimação e fazer queimar a língua de quem duvidou.

Considerações finais:

Um verdadeiro clássico acerca da ridicularização do que se diferencia do resto. Dumbo será lembrado para sempre nos mostrando que qualquer "ovelha negra" ou "elefante com orelhas grandes" não pode ser meramente reduzido e muito menos definido pelo seu "defeito de fábrica".

PS1: Que raiva daquelas elefantas preconceituosas (até mais do que do apresentador/chicoteador do circo), o coitado é uma criança que nem falar sabe ainda...

PS2: O prêmio de cena marcante e inesquecível vai para: Alucinação bizarra de Dumbo e Timóteo (aquilo na bacia era água com detergente, sabão, água sanitária ou um ácido muito louco?)

NOTA: 10,0 - EXCELENTE 

Veria de novo? Com certeza. 

*A imagem acima é propriedade de seu respectivo autor e foi usada para ilustrar esta postagem sem fins lucrativos. 

*Imagem retirada de: https://observatoriodocinema.bol.uol.com.br/filmes/2018/04/dumbo-veja-primeira-imagem-do-elefante-no-filme-de-tim-burton

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