A Violinista Mascarada


Quatro amigos, todos eles universitários, prestaram seus depoimentos aqui na delegacia onde trabalho referente ao misterioso desaparecimento de Vicky Hattori, reportado já faz uma semana pelos pais desesperados da garota que, a julgar pela foto, não parecia ser do tipo que é simplesmente marcada para morrer por certas inimigas e nem do tipo que faz, mas também me é o tipo de garota que é facilmente alvejada por estupradores que se fazem de amigos. Calouros ou veteranos? Qualquer um da universidade que tivesse se aproximado de Vicky pode ser marcado como suspeito. Vicky é descendente de japoneses e veio tentar a sorte aqui no país por pressão dos pais que queriam estar orgulhosos de uma boa carreira na faculdade de psicologia escolhida pela própria com o consentimento deles. Mesmo sendo popular entre os professores, Vicky possuía poucos amigos.

Os relatos de quatro deles são, no mínimo, intrigantes. Todos os depoimentos foram gravados em 15/07/2015, exatamente uma semana depois do desaparecimento de Vicky.

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Relato de Erick Thompson - 23 anos - Visto pela última vez em: 23/07/2015.

Eu não sei por onde começar. Só sinto um grande aperto no coração, desejando, tão profundamente, que a Vicky esteja sã e salva, onde quer que ela esteja. A última vez que a vi foi quando estávamos estudando para uma prova importantíssima que teria no dia seguinte, viramos a noite assimilando cada conteúdo. Sim, eu estava na casa dela, eu fui convidado, só pra esclarecer. Não me ofereci a entrar de maneira tão invasiva. Vicky era extremamente reservada. Passamos a maior parte do tempo somente estudando, não falávamos em outra coisa a não ser na matéria da prova. 99% da noite foi puro estudo. E aquele 1%... bem, foi um momento em que enxerguei um lado na Vicky que jamais havia visto antes. As 5 da manhã já estávamos exaustos, com o cérebro fervendo de tanta informação absorvida, foi então que ela resolveu amenizar o peso daquele momento me levando para conhecer sua sala de música. Sim... a Vicky estudava música desde os 5 anos de idade, ela até me mostrou alguns boletins com notas altíssimas daquela época quando frequentava a escola musical para crianças. Deve ser por isso que ela cativava a todos com sua inteligência e leveza.

Ela me mostrou um violino que ganhou de presente de um dos amigos da época do colegial. Então, com muita boa vontade, ela gentilmente fez um show para uma plateia composta por um só cara. Saí daquela casa com aquela melodia grudada na mente. Era linda. Até me emocionei um pouco... não sei como ela ainda não tinha sido convidada por algum músico ou maestro para compor o grupo de orquestra sinfônica da cidade que se vai se apresentar amanhã. Ela tinha dois ingressos... nunca terei a chance de viver esse momento ao lado dela.

Eu tento não pensar no pior. Só quero que quem tenha levado a Vicky... pague muito caro pelo que fez.


Relato de Rachel Lewis - 25 anos - Vista pela última vez em: 26/07/2015. 

Era ela que estava lá! Eu sei o que vi. Era a Vicky... Não, policial, não estou drogada... A Vicky está viva, só é uma pena eu não ter conseguido provas na hora exata. Eu fui àquele cemitério para visitar o túmulo dos meus avós. Na lápide mais distante eu pude vê-la sentada... com um vestido preto bem elegante com alças, os cabelos pretos dela estavam mais lisos do que nunca. Só tem um único detalhe estranho nessa história: Ela usava uma máscara branca com um boca desenhada e olhos redondos e pretos. E tocando violino.

Sim, isso foi três dias depois dela desaparecer, àquela altura eu já a considerava morta. Pode parecer exagero, mas uma garota como a Vicky ser sequestrada não consegue durar muito tempo nas mãos dos desgraçados. Só sei que... até agora a música não sai da minha cabeça. Eu sabia que ela estudava música, afinal eu era uma das amigas mais próximas, sabia de certos segredos que ela não contava aos outros. Eu tentei falar com ela lá no cemitério... gritei seu nome várias vezes... e ela só continuava tocando como se não notasse minha presença. Outras pessoas que estavam lá me olharam estranho, achando que eu fosse louca por estar gritando para o nada.

Eu apontei para a direção onde a Vicky estava, a lápide onde ela estava sentada, mas foi inútil. Foram embora fazendo chacota de mim, fui chamada de insana. Eles não a viam.

Depois olhei de volta... e Vicky tinha sumido num piscar de olhos, apenas bastou eu tirar minha atenção dela para ela desaparecer de vez.

A melodia que ela tocava era mórbida, sombria e deprimente. Vicky podia ser um pouco tímida, mas era a pessoa mais bem-humorada que eu conhecia na faculdade. Não contei isso aos outros por medo de também pensarem que estou louca.


Relato de John Baker - 26 anos - Visto pela última vez em: 28/07/2015. 

A última vez que a vi? Olha, é meio difícil lembrar... Só posso dizer, com toda a certeza, que ela já não frequentava a universidade desde o mês retrasado. Normalmente, ela vinha às segundas e quintas, e eu parecia ser o único a questionar a ausência dela na maioria dos dias. Na terceira semana, Erick demonstrou preocupação e conversamos sobre irmos até a casa da Vicky para perguntarmos o que estava havendo com ela. Planejamos ir à noite, quando os pais dela não estavam em casa. Mas não pense mal de mim, policial, não fomos com segundas intenções.

Erick desistiu pouco tempo antes de irmos, então entrei sozinho, mas Vicky trancou a porta do quarto. Chamei, bati, gritei pelo nome dela e nada. Olhei pela fechadura, vi as pantufas cor-de-rosa dela perto da cama. Obviamente, ela estava dentro do quarto. Depois eu resolvi ir embora, não quis incomodar ninguém. Escondido de Erick - eu sei que ele nutria um amor platônico por Vicky - eu conversei com o senhor e a senhora Hattori por telefone... Como consegui o número? Vicky não tinha celular, nos deu o número do telefone fixo para nós quatro, antes dela ficar "estranha" tinha um planejamento de um grupo de estudos para a prova final do semestre e seríamos uma excelente equipe, um ajudando o outro, sem crise. Mas acabou que só Erick foi convidado. Não sei como as meninas reagiram, mas não devem ter ficado chateadas por pensarem nos problemas que Vicky poderia estar passando, talvez ela queria um tempo sozinha ou próxima de quem achava ter mais afinidade - nesse caso, Erick era o principal.

Após a prova, ninguém mais a viu ou teve notícias dela. Quando soube do desaparecimento, fiquei chocado. Os Hattori foram muito vagos. Só disseram que Vicky estava "diferente do normal" e que precisava de um tempo para se "situar". Com certeza, a partir da primeira presença dela depois de umas quatro faltas já não era mais a mesma amiga com quem gostávamos de ter ao nosso lado.


Relato de Lisa Birch - 25 anos - Vista pela última vez em: 31/07/2015.

Nem sei porque diabos me chamaram para vir até aqui. Eles não explicaram à vocês não? Sou muito pouco próxima da Vicky, mas geralmente a gente trocava algumas palavras, debates rápidos sobre o que cairia numa prova, emprestar coisas e tudo mais. Eu não faço ideia do que aconteceu com ela. Se sou suspeita, podem passar o pente fino na minha casa, não tem problema nenhum... Ah... estão trabalhando nisso? OK então... Olha, é que não faz o menor sentido eu estar aqui, ao meu ver não faz pois passei a ter contato reduzido a quase zero com a Vicky depois que ela andou faltando as aulas e vindo só nas segundas e quintas como se não precisasse de nenhum de nós para ir bem. Passou a prova, não a vi mais, sequer ouvi falar no nome dela nas conversas com o pessoal das outras salas.

Eu preciso ir, não tenho nada a ver com isso, sinto muito pelos pais dela, mas não estou afim de perder meu tempo numa sala de interrogatório... Eu estou calma... Não, tudo bem, só quero deixar bem claro que eu adorava Vicky, não tinha nada contra ela, nem inveja por ela ser a mais aplicada. Posso ir? Esse lugar me deixa desconfortável, me faz sentir uma criminosa mesmo não sendo.

Sim, eu sabia que Vicky estudava música, mas nunca fui até a casa dela, jamais tive a oportunidade. Espero que eu não seja acusada injustamente, mas sugiro ficarem de olho no John... não sei, minha intuição me diz para não confiar nele, por mais amigos que sejamos, mas ele tem me encarado com um olhar acusador ultimamente, deve achar que fui cúmplice do sequestro da Vicky... Como sei que foi um sequestro? É o mínimo que se pode supor não é? Poxa, mas... Sim, é verdade, a Vicky já não parecia mais a mesma quando passou a faltar, eu reparava bem nas feições dela, mais pálida, mais séria do que o normal... ainda assim ela falava com os outros, não muito comigo, mas ao menos interagia quase naturalmente como antes das faltas. Ela não sofria de depressão até onde eu sabia, não consigo imagina-la fugindo de casa por causa disso.

Eu posso ir agora?

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Nós mentimos para eles sobre termos, por dia, reunido um grupo de quatro alunos da área de Psicologia. Nossa fonte mais segura nos convenceu de que aqueles quatro e somente aqueles quatro poderiam ser incluídos na lista de suspeitos por serem tão próximos da vítima. Até onde se sabia, Vicky não possuía amigos fora da universidade. A alegação de Rachel pode parecer fantasiosa e desprovida de maiores detalhes, mas conseguimos elementos que podem corroborar o relato dela, para o total espanto meu e da equipe.

Nas investigações das casas dos quatro suspeitos encontramos celulares pessoais de cada um deles. Durante a verificação, foi descoberto que eles receberam a mesma mensagem, no mesmo dia e na mesma hora. O conteúdo era uma música com melodia sinfônica, claramente um violino.

Bem, a verificação nos celulares só ocorreu após as mortes dos quatro amigos de Vicky um dia depois da música ter sido enviada. Erick morreu após a hélice do liquidificador se soltar e rasgar sua garganta. Rachel estava limpando a janela de seu apartamento do lado de fora e caiu bem na cerca elétrica, morrendo eletrocutada por 260 volts. John sofreu um acidente de carro em plena luz do dia, seu corpo tendo sido carbonizado pela explosão. Quanto à Lisa, nos a encontramos morta em sua banheira, ficando a dúvida se alguém entrou na casa dela e a afogou ou ocorreu de um jeito menos convencional se é que me entende.

Ouvi a música num dos celulares, mas não inteira por questões de segurança. Como Rachel disse: uma melodia triste e mórbida.

Não fomos autorizados a entrar na casa de Vicky... por enquanto. Os Hattori se mudaram, angustiados pela perda e pessimistas quanto ao resgate da filha.

No diário de Vicky, oferecido pelos pais dela como o máximo de investigação que podíamos fazer àquela altura, está escrito que o maior sonho da garota era se tornar uma violinista de sucesso.

Arquivaremos o caso, sem previsão de reabertura... mas não sei, existe uma força dentro de mim querendo me manter motivado a continuar investigando... deve ser a música ainda presa no meu subconsciente querendo me atrair para algum lugar essencialmente infeliz... como um cemitério.

Se Vicky está morta, quem enviou a sinfonia para os quatro?

E se ela não estiver morta...

... no que ela se tornou? 

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Este conto foi escrito e publicado exclusivamente para o Universo Leitura. Caso o encontre em algum outro site com créditos e fonte ausentes, não hesite em avisar! 




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