Crítica - I Am Mother


A Inteligência Artificial que não desenvolveu inteligência materna.

AVISO: A crítica abaixo contém SPOILERS.

Apocalipse de máquinas é uma das temáticas mais batidas do cinema (perdendo só para a invasão alienígena que rendeu um zilhão de peças ao longo das décadas), mas, como todo clichê, é passível de uma refinada criativa que quando bem orquestrada narrativamente pode receber elogios pela sua capacidade de reinventar aspectos de um assunto explorado inúmeras vezes. Este filme, dirigido por Grant Sputore, é um exemplar desse tipo de caso que não se vê todos os anos. Parece (ressalto: SÓ parece) um remake de um clássico setentista ou oitentista de ficção científica bastante ovacionado e colocado no mesmo balaio de produções consagradas e famigeradas pela sua qualidade ou complexidade. No entanto, I Am Mother dificilmente será lembrado igualmente às películas que encantaram os cinéfilos mais saudosistas e que até hoje reverenciam essas obras. Não é um novo 2001: Uma Odisseia no Espaço (nunca vi o filme em si, somente comentários e nenhum detratando-o). Reinvenção de um clichê, não precisamente um potencial de revolucionar o gênero ou a indústria e posso imaginar que muitos críticos vão atribuir uma espetacularidade exagerada ao longa - não por ser lançamento da Netflix (cuja superestimação esfriou de uns tempos pra cá), mas sim pelos conceitos científicos e reflexivos que ele abrange.

Será que uma máquina poderia substituir um papel de extrema importância que até o evento apocalíptico pertencia exclusivamente à humanidade? O papel de uma mãe que do ponto de vista cristão representa uma proximidade com o amor divino. Faço um gancho com isso para falar sobre o Complexo de Deus do robô apenas denominado de Mãe - da mesma forma que a jovem protagonista chama-se Filha e nem mesmo a intrusa que adentra ao bunker altamente tecnológico de alta segurança abrigando uma criatura robótica altamente desconfiável que cuida de uma garota altamente curiosa sobre o mundo externo ganha um nome por parte do roteiro. A Mãe, no caso, pretendia repovoar o planeta cultivando embriões humanos que levam anos para se desenvolverem, para dar uma nova chance aos seus criadores que segundo ela se exterminariam e por essa razão foi responsável direta pelo evento que provocou a morte de bilhões (revelação nem um pouco surpreendente feita no ápice do terceiro ato que mostra o fervor do conflito entre "mãe" e "filha" e uma vida recém-nascida dividida entre duas perspectivas que em algum momento iriam se opor inevitavelmente), além do mais seu objetivo "nobre" consistia sim uma segunda chance, mas na espera de que a humanidade tornasse-se mais evoluída no que tange à ética. É arrogância pura que pouco se distancia do que muitos humanos seriam capazes, portanto não são as diferenças e sim as semelhanças.

Dar esse enorme poder decisório à uma máquina sem atributos psicológicos que humanos normalmente executariam bem passa longe de alguma chance de esperança. Não importa quanto conhecimento do mundo externo você enfie na cabeça de alguém dentro de um "mundo" fechado esperando que vá se contentar, o ser humano tem o afã do descobrimento e nada pode mudar isso, então o tratamento da Mãe sobre a Filha tem sua natureza ambígua (muito bem exposta e delineada, por sinal). Deixando as "filosofadas" de lado, o longa dá uma sensação meio claustrofóbica, faz sentir-se tão preso quanto a filha ao passo que sua relação com a "mãe" sofre instabilidade com a chegada da mulher baleada que é acolhida a contragosto da máquina tão categórica nas suas orientações para proteger a "filha" da contaminação do lado de fora - coisa que a mulher desmente, evocando o ciúme da "mãe" e dando início à um bem engajado "cabo de guerra" de figuras maternas antagônicas. Sem menosprezar o que ocorreu anteriormente por conta da impressão de "nada acontecendo", mas a movimentação que engata as tensões de fato, tornando o filme mais envolvente, começam a partir da "mãe" rebelando-se ao descobrir o plano de fuga da "filha" e da mulher que acaba coagindo a máquina a permitir a saída testando o seu afeto pela "filha" ameaçando mata-la. A princípio, eu xinguei mentalmente a "filha" por aparentemente recriminar a atitude da mulher, mas depois percebi que foi em relação ao outro bebê naquela incubadora o qual ela consideraria seu irmão e escaparam sem pega-lo (mesmo assim não justifica muito ela tentar agredir a mulher, bem ingrata a guria). A caminhada pelo mundo desolado apresenta um único momento de perigo (aquela nave que faz um rasante ameaçador), pra em seguida a "filha" resolver voltar ao bunker para resgatar o bebê sem que a mulher desaprove (como uma mãe que sabe quando o filho atingiu maturidade suficiente para seguir independente) e é até estranho ela não se deparar com obstáculos no retorno que não fosse o exército de robôs controlados pela "mãe" e que guardam o bunker (é um mundo pós-apocalíptico ou não?).

Os efeitos estão razoavelmente bem (a "mãe" se beneficiando mais) e as ambientações colaboram para uma imersão espontânea (dá um alívio ver a "filha" sentindo a terra nas mãos e respirando o ar natural). O drama do resgate do irmãozinho (a "filha" o ganhou como recompensa do resultado de um dos exame) é o último ponto de fechamento, enquanto a mulher torna-se descartável ao ser rastreada por um dos robôs e já que a "mãe" é a consciência geral de todos eles significa que ela a matou dentro do seu refúgio após a sobrevivência dela servir ao plano da "mãe". Na minha pesquisa sobre o filme, a primeira coisa que vi de cara é a frase "final explicado". A "filha", que numa certa altura já havia descoberto do que a mãe é capaz se um filho seu não corresponder às expectativas (não é à altura do que ela planeja para o renascimento da espécie humana), dispara contra a máquina depois dela se convencer de que a mesma possui uma moral forte e uma ética admirável, logo conseguindo aninhar o bebê no lugar mais seguro (mãe é quem cria e /ou concebe, mas a história de que "mãe é tudo igual, só muda de endereço" é falaciosa). Além disso, ela herda os milhares de embriões armazenados e o mistério que dá o tom de livre interpretação está na sua expressão meio indecifrável, mas suspeita... muito suspeita.

Considerações finais:

I Am Mother tem construção firme num roteiro sóbrio nas questões que aborda, mas não tão forte para ser reverenciado como uma obra-prima digna de levar várias estatuas douradas, por mais que pareça uma versão de algo pré-existente e que fez um estrondoso sucesso no passado. Talvez fizesse caso produzido nos anos 70 ou 80 com o toque cinematográfico desses tempos áureos que certamente esse filme não chega nem perto, mas por outro lado acerta nas suas boas pretensões.

PS1: Um adendo que gostaria de fazer é salientar que... não há nada de extraordinário mesmo, só uma temática bem explorada usando de um clichê direcionado para entreter sem ficar muito cansativo.

PS2: Eu demorei pra me atentar que a menina (Hazel Sandery) do início não era a "filha" (interpretada pela Clara Rugaard). Muito provavelmente a arcada dentária em meio às cinzas foi o que sobrou dela O_O.

PS3: Sem ler explicações do final internet afora, eu interpretei da seguinte forma: a "filha" foi corrompida pelo poder de administrar o cultivo dos embriões, ou seja, a conclusão da "mãe" sobre a moralidade dela estava errada.

NOTA: 8,5 - BOM 

Veria de novo? Sim. 

*A imagem acima é propriedade de seu respectivo autor e foi usada para ilustrar esta postagem sem fins lucrativos. 

*Imagem retirada de: https://olhardigital.com.br/noticia/-i-am-mother-filme-da-netflix-confronta-humanidade-e-inteligencia-artificial-confira-o-trailer/86653

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