Crítica - Megamente


O vilão que se deseja ser ou o herói que se destina a ser? Eis a questão.

AVISO: A crítica abaixo contém SPOILERS.

Este certamente foi adicionado à série "Por que não vi isso antes?" por conta de uma identificação incrível que absorvi ao longo da duração, a história tem um cerne metaforicamente similar a algumas situações que já passei e questionamentos existenciais refletidos a fundo em períodos de trevas internas querendo aflorar dentro da alma. Nós somos aquilo que estamos destinados a nos tornar ou a sociedade dita as regras e impulsiona os fatores que definirão seu caráter dali em diante? São algumas das perguntas sugeridas pelo longa que qualquer espectador nesse reconhecimento de "nossa, esse filme parece ter sido feito pra mim!" consegue abstrair. Megamente foi uma grata surpresa atrasada.

O enredo logo no início de seu primeiro ato mostra-se extremamente linear, contando resumidamente a história de vida do personagem-título com as hilárias pregadas de peça do destino. Megamente foi enviado pelos pais numa nave ainda recém-nascido quando seu planeta natal estava à beira da destruição total. Obviamente que isso lembra o passado de um herói icônico, aliás o maior herói criado dentre todos os heróis (o que é discutível pra alguns). Essa alusão ao Superman encaixa na comédia proposta nesse lance de "herói de nascença" voltada a alguém que sofre uma virada do destino (ou por mero acaso) e tem um curso alterado coincidentemente por aquilo que fará o contraponto exato no futuro. Acontece que outra nave estava chegando na Terra e a mesma colide com a de Megamente fazendo o bebezinho azul cair num presídio (repleto de criminosos que estranhamente o acolhem cof cof roteirismo cof cof) enquanto ela, sem consequências, pára numa casa luxuosa e o garoto é criado como um herói que esteve prometido a se transformar (o Metro Man).

A transferência de Megamente a uma escola pavimenta o terreno onde o ponto determinante para todo o resto incorre na moldagem do eu influenciado externamente e de quebra prova que o roteiro valoriza esse dualismo como um fio condutor. O alienígena cabeçudo foi justo estudar na mesma classe que o garoto contra o qual seria um oponente persistente (mesmo que fracassando em todas as tentativas). Metro Man realizava façanhas exibicionistas na sala de aula, ovacionado pelos colegas ao passo que despertava a inveja de Megamente dando origem à sua vilania. Acontece com todo mundo (ou quase todo mundo): Encontrar certo alguém melhor do que você em alguma coisa, seja aquilo que você se interesse em fazer (no caso do Megamente, ser respeitado, popular e aceito como resultados de coisas que ele não estava psicologicamente apto a demonstrar) ou outra atividade qualquer. O superpoder de Megamente seria a superinteligência, porém ele não calcula friamente todas as possibilidades, o que faz parte da expressão de sua postura como um vilão inexperiente e falho.

Um indivíduo que tem limitações para ser posicionar em dois lados não tem razão própria de existência? Como adulto, Megamente é uma figura patética que não dá uma bola dentro para combater o venerado, idolatrado e invencível Metro Man, guardião e protetor de Metro City. Eis que a partir do sequestro da repórter Rosane Rocha (nome brazuca em filme de animação americano não é novidade, vide Os Incríveis, mas creio que é exclusivo da versão brasileira) que nada se surpreende com as táticas do "vilão" considerando-as ultrapassadas. Um evento que utiliza bem do artifício para destacar a condição de Megamente. Mas pela primeira vez em anos, Megamente vence uma batalha. No entanto, a morte de Metro Man, o "golpe de sorte" do vilão que aumenta sua popularidade negativa, causa prejuízos à Megamente que afunda numa onda de tédio pela falta de um desafio que o mantenha no seu posto. Parece até que o Metro Man era o único herói existente no mundo. Megamente acreditava noutros heróis espalhados por aí? O filme não perdoa o personagem nessas ridicularizações contínuas, é um fracasso atrás do outro, mas no meio de tantos tiros a esmo certamente um vai acabar acertando. Se nenhum herói vem à você, fabrique um (coisa que não seria motivo de orgulho pra um vilão que anseia por tocar o terror na cidade). O surgimento de Titan, um "herói" criado por acidente que por sinal... provoca um feliz acidente para Megamente ainda que ele não se desse conta do benefício à sua imagem que as atitudes irresponsáveis do Titan lhe traria. A "sub-trama" do relógio transformador agregou belamente ao conjunto.

Megamente, sob auxílio do aparelho, mimetiza a aparência de um bibliotecário chamado Bernard que Rosane conhece durante um instante contemplando o vigoroso monumento de Metro Man para evitar ser descoberto pela repórter que o culpa ferrenhamente pela morte do algoz. Daí é engatilhado um plot que insere-se na construção heroica do protagonista. A mocinha que apaixona-se pelo alter-ego do herói desconhecendo sua real identidade. Nisso o filme soube brincar com a mesma pegada cômica que é mantida intocável e muito balanceada em toda a animação. Uma brincadeira debochada de conceitos pertinentes a universos habitados por super-heróis. Da mesma forma que o "romance" de Megamente e Rosane avança nos passos do auto-descobrimento heroico, o advento do Titan se cruza com a trama de apoio na forja do conflito derradeiro que será tudo ou nada para Megamente acreditar em si e convencer de seu valor. Titan é o alter-ego do cameraman que trabalha com Rosane, Hal Stewart (referência bacana aos lanternas verdes Hal Jordan e John Stewart) e o tiro da arma que serviria para criar um novo herói através do DNA do Metro Man o atingiu em cheio numa coincidência absurda de tão boa. A revelação de Megamente sobre ter assumido a identidade de Bernard propulsiona a fúria de Titan sobre Metro City. O "herói" por ironia do destino desconta sua raiva na cidade pela dupla traição (antes disso, Megamente usou disfarce de um mestre a la Yoda). O terceiro ato, inclusive, traz uma reviravolta da qual eu não me preparei.

De fato, NADA me preparou para o plot-twist a respeito do Metro Man (de deixar boquiaberto). Desmontou completamente o sucesso que atribuíam ao Megamente na conquista da vitória sobre aquele que representava a justiça na ação e nas palavras. Pois é, o herói tá vivinho num local secreto abaixo da antiga escola que os dois ex-adversários estudavam. Entretanto, o cansaço chega para todos, até para um super-herói egocêntrico e poderoso levando-o a drástica ideia de forjar sua morte. E o próprio Megamente é responsabilizado por isso. Coerente tendo em vista que o "vilão" não tentava inovar nas suas artimanhas vilanescas e nos planos malignos para destronar seu inimigo. Era a mesma dança sempre. A aposentadoria do Metro Man (procurado para deter o Titan como a última esperança da cidade) é mais uma abertura para Megamente abraçar uma nova popularidade, desta vez para o bem. A grande ironia escrachada é o vilão mal-sucedido, que foi "obrigado" a ser como tal, perder seu oponente herói por um de seus muitos fracassos como vilão e criar um herói que não corresponde às suas expectativas vendo-o tornar-se um vilão melhor do que nunca ele foi e no fim das contas tendo que combate-lo para salvar a cidade como o novo herói. Às vezes você tem que se perder para uma hora se encontrar.

Considerações finais:

Megamente conceitua-se como uma criativa e divertida metáfora sobre pertencimento, auto-conhecimento e o lugar de ocupação na sociedade nessa bifurcação moral. A mensagem é a fonte de riqueza narrativa e ela afirma categoricamente que não existe ninguém tão mal que não possa descobrir bondade em si... assim como não existe ninguém tão bom que não possa vir um dia a tomar como verdade o que os outros definem e virar exatamente uma confirmação de visões equivocadas. Um longa original e que apresenta a realidade fugida da bidimensionalidade comum.

PS1: Megamente só assumiu o caminho da maldade pela discriminação sofrida e a sensação de ser diferente, um pária social, proporciona essa raiva que sem auto-controle não passa de uma etapa para tornar-se aquilo que você não necessariamente seria caso o destino fosse outro. Quanto mais filosofo, mais esse filme melhora...

PS2: Não sei como caí na pegadinha da morte do Criado (sidekick do Megamente que é um peixe num aquário acoplado a um corpo mecânico), achei bem bolada se tiver sido essa a intenção.

PS3: Dá um pouco de pena do Megamente quando ele espera o Titan chegar para bancar o herói e salvar o dia. Enfim, adorei essa subversão bem-humorada. Me atrevo a dizer que esse é "Os Incríveis" da Dreamworks (falando sério!).

PS4: Diferentemente da forma que encarei o filme da família Pera, eu não ligo se Megamente chegar a ter uma sequência. E qual a necessidade, afinal? Redondinho que é uma beleza. Tá melhor assim.

PS5: Somente acho que a maneira como o Metro Man poderia ser trabalhado poderia ficar menos caricata. Tirando isso, o personagem é bom, apesar de não tão interessante num sentido de aprofundamento em relação ao Megamente. 

PS6: Passamos a compreender o Metro Man pensando no seu cansaço justificado pela inexperiência de um vilão que não valia a pena ser confrontado. Metro Man: O herói completo e perfeito. Megamente: O vilão que não sabe ser vilão. E como diz o velho ditado: A corda sempre arrebenta do lado mais fraco.

NOTA: 10,0 - EXCELENTE

Veria de novo? Com certeza! 

*A imagem acima é propriedade de seu respectivo autor e foi usada para ilustrar esta postagem sem fins lucrativos. 

*Imagem retirada de: http://www.nivelepico.com/2010/12/19/megamente/

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