Capuz Vermelho #55: "Eclipse Total"


"E de repente aconteceu naturalmente e pelo resto do dia me senti indecisa se gostaria ou não de ter lembrado. Nós moramos juntos há quase um ano... Cedo ou tarde não ia mesmo acontecer?"

                                                                       Trecho do segundo diário de Rosie Campbell - Pág 30.

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A mulher de curvas acentuadas e realçadas pelo vestido verde de seda - com abertas longas nas laterais das pernas - caminhava adiante segurando uma tigela de ferro contendo um litro de sangue puro coletado das outras quatro pessoas presentes no local fechado com paredes de pedra amarela iluminadas por velas em castiçais. Ela olhava para uma mesa de pedra onde um homem se atormentava preso à correntes implorando ajuda. Abaixo das costas dele havia um pentagrama desenhado com sangue na pedra. A mulher dizia palavras ao andar:

 - In essentia envolved. Sacrificium strepitus. Anima circunfusa tenebris. Animeque nigre crimina cedendum est mors spiritualis. Ista perfundes in sanguine peccatorum. Tutela est aeternum pro arregagiis inferna justorum. 

A última precisaria ser repetida mais algumas vezes, assim feito. O homem gritava "Não!" incontáveis vezes desesperadamente e ainda mais alto ao sentir o sangue descer pela boca e cruzar sua garganta. Repentinamente, em seguida, as quatro pessoas logo atrás que seguravam adagas apontadas ao seus pescoços enfiaram. Golfos volumosos de sangue expeliam das feridas enquanto caíam. Por último, a mulher pegara sua faca e apunhalou-se no peito corajosamente.

Uma rachadura no teto, acima do homem, com fachos de luz laranja tremeluzindo foi criando-se e aumentando até se abrir e liberar uma espécie de fumaça negra que envolveu o corpo da vítima parecendo ser absorvida por ele. O homem contorceu-se intensamente, fechando e arregalando os olhos e tentando se libertar, o que não tardou a acontecer. As correntes quebraram-se brutalmente.

Um rugido terrível e animalesco ressoou até o lado de fora. O sol nascia e pela floresta o homem caminhava trôpego com sua calça preta suja e descalço, sentindo os efeitos do ritual modificarem-o a cada raio solar que despontava. Seus olhos ficaram amarelo-escuro observando o sol. O corpo metamorfoseou-se, crescendo pelos marrom, garras, pés, dentes e orelhas. Um caçador de animais ali aproximando-se flagrou, logo apontando a espingarda, mas travou após a criatura cravar seus olhos macabros nele.

A fera avançou bípede, rugindo selvagem com suas garras prontas para o ato.

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CAPÍTULO 55: ECLIPSE TOTAL

Área florestal de Raizenbool 

A maior parte dos cômodos do Casarão encontrava-se na mais completa bagunça como se um furacão tivesse arrasado com tudo em toda rapidez. Rosie acordava lentamente, se espreguiçando ao sentir a brisa fresca da manhã atravessar pela janela. No entanto, notou algo atípico ao ajustar sua visão no ambiente. Definitivamente, não reconhecia. Em seguida veio a constatação impactante logo ao olhar para a sua direita. Ficara boquiaberta e espantada. "Isso... tá mesmo acontecendo? É um sonho?"

Hector estava dormindo virado ao outro lado com o lençol cobrindo-o da cintura para baixo. Rosie sentiu que era a única a estar vestida, a sua camisola branca. Tentou acorda-lo.

- Hector. - chamou, baixinho - Hector. - forçou mais, quase rosnando de impaciência - Hector acorda... Anda, acorda logo. - o caçador despertava devagar e se levantou. - Finalmente hein. Um lobo dormindo como um urso. Escuta... - ela ficou de joelhos na cama - Eu tô perdida... não sei...

- Rosie? O que tá fazendo no meu quarto? - perguntou Hector, arregalando os olhos depois - Espere... Não pode ser o que estou pensando que é. - saiu da cama abruptamente - Que bom, ainda estou vestindo minha calça. Por favor, não é querendo insinuar nada, mas isso é...

- No que você tá pensando? - indagou Rosie, franzindo o cenho - Olha, acho que primeiramente você deve se questionar do porque está dormindo com calça. E-eu... - apontou o dedo à ele - Eu não me ofereci, que fique bem claro! Tô falando a verdade. Não lembro de nada da noite passada...

- Pois eu sinto que algo de certa importância ocorreu ontem à noite. - retrucou Hector - Uma coisa é certa: Dormimos juntos e... não sei mais o que pensar a respeito. Isso é um sinal.

- Sinal coisa nenhuma. - disse Rosie, saindo da cama - Vou repetir: Não tenho culpa nisso. O que você quer que eu diga? - de repente uma dor de cabeça a afetou - Ai, ai... Esse sol batendo no meu rosto... Ai, que merda, fecha essas cortinas. - se afastou da janela protegendo os olhos - Será enxaqueca? Talvez não, minhas entranhas estão dando voltas e piruetas, acho que vou vomitar...

Hector virou o rosto enquanto Rosie expelia tudo numa caixa de papelão.

- O que é isso? - perguntou ela, pegando um papel dentro da caixa - Oh não... Hector, olha só. - mostrou o papel melado de vômito - É um recibo para entrega de bebidas. Tá no seu nome.

- Eu não vou tocar nisso. - disse Hector, com nojo - Quando inspiro sinto cheiro álcool puro... mas você tem os efeitos de um boa bebedeira, já eu, por uma razão óbvia, estou bem. Ou seja, você está de ressaca. Nós dois bebemos. Aconteceu um evento, mas...

- Nós dois não lembramos. Ótimo. Alguém no meio dessa festa nos dopou e forjou toda essa situação para fazer parecer que tivemos uma noite... incrivelmente apaixonante. - disse Rosie - E não sei porque falei isso com tanto entusiasmo. Vou descer.

A jovem descia quase cambaleante. Hector a seguia pulando degraus vestindo sua camisa preta.

- Rosie, se me permite, eu tenho uma refutação a fazer. - disse o caçador.

- Tá vendo só? A casa tá revirada. - disse Rosie, olhando perplexa para a sala - Caramba... Fizemos isso tudo?

- Provavelmente muitos fizeram. - disse Hector - Não aposto na teoria do pózinho suspeito na bebida.

Rosie achara um papel largado no chão, pegando-o. Ao ler, a noite anterior voltara como um filme.

- Nossa... - ela riu rápido - Bem, desisto da teoria do "Boa noite, Cinderela". - exibira o papel à Hector - Alguém esqueceu esse convite... para a festa da Êmina. Hector, ontem foi aniversário dela.

- Menos uma dúvida. Mas não fico satisfeito. - disse o caçador - Por que beberíamos tanto ao ponto de dormimos juntos, logo no meu quarto, e não sobrar um fiapo de recordação desse dia?

- Eu não quero procurar a lista de convidados. A Êmina é perfeccionista, é claro que ela fez uma.

- Então vamos à cozinha. - disse Hector, apurando seu faro lupino - A razão contundente para termos acordado lado à lado pode estar nos copos... - chegara ao cômodo - ... largados na pia.

- Só podemos esquecer isso e curtirmos nosso último dia de folga. - sugeriu Rosie - Dentro de casa.

Hector pegara um copo, cheirando a borda. Notara um odor peculiar.

- Rosie, acho que descobri. O olfato licantropo é 50 vezes mais aprimorado que um humano. - olhou para ela, destacando o copo - Reconsiderando a teoria... aliás, aumentando-a... muitas pessoas foram dopadas. Tem algo a acrescentar?

- Sim, tenho. - disse Rosie, cansada - Conhecemos a Êmina, ela brinca com nossa relação... - deu de ombros - ... quase o tempo inteiro, fazendo piadinhas bobas e sarcásticas. Não chegaria a ser estranho ela estar por trás disso para... para nos aproximar... um pouco mais. Se é que me entende.

- Posso telefonar pra ela mais tarde e pedir explicações. Nós... - o caçador enrubesceu - Tem coisas vindo à tona na minha mente, Rosie. Honestamente, não estou nem um pouco à vontade pra falar.

- Que tipo de coisas? É sobre o que aconteceu antes de apagarmos?

- Mais ou menos... - Hector queria encerrar o assunto ali mesmo - Ahn... É uma amnésia temporária, eventualmente iremos nos lembrar de tudo. Efeito dessa droga misteriosa que alguém muito mal-intencionado, talvez um caçador convidado que resolveu levar um amigo não-convidado, resolveu adicionar em alguns copos e não tivemos sorte. Vou tomar um banho.

- Não quer mesmo falar sobre? Eu também começo a lembrar. - insistiu Rosie.

A campainha tocara, assustando-os. Rosie fora atender, como de costume.

Abrindo a porta, tivera um surpresa relativamente desagradável.

- Derek?! - disse, o semblante de surpresa com indignação - Você não tinha dito que...

- Primeiro de Março seria o último dia de folga. - disse o líder do DECASO, a expressão tranquila - Hoje são 02... Feliz segunda-feira. - entrara de repente. Rosie, frustrada, baixou rápido a cabeça, odiando a si mesma por ter esquecido, mas logo aceitara. - Espero que tenham disposição para o caso de hoje. Pode parecer comum superficialmente, mas algo me diz que não é para corpos moles. - entregara o arquivo à Hector - Ah sim, percebo que acordaram agora... - notara a bagunça na sala - Não acham que comemoraram um pouco tarde o retorno ao trabalho?

-"Ha-ha-ha". - disse Rosie, irônica, andando até ele - Sim, verdade, ontem tivemos uma noite muito... agitada. Aniversário de uma amiga nossa. O que você nos manda?

- Não, Rosie, aconselho que você fique... - disse Hector.

- Se não quiserem mesmo voltar ao trabalho, posso comunicar ao General e a próxima correspondência a passar daquela porta será uma bela intimação que os condenará como desertores. - disse Derek, sem tempo para brincadeiras. - Decidam.

- Também não precisa ameaçar. - disse Rosie - A gente se comprometeu de bom grado, temos uma responsabilidade a zelar... Mas como falei antes, os riscos são desnecessários para missões de nível médio ou, como você gosta de chamar, Alfa. Não é que buscamos o fácil, mas... tudo tem ganhado uma atmosfera diferente, me faz sentir que tem coisa errada no ar, sabe... intuição. - olhou para Hector - O Hector teve uma conversa com Mollock um tempo depois do ataque à Londres e...

- Rosie, por favor. - disse Hector, cortando-a - Agora não é uma boa hora. Derek, pode falar.

- Obrigado. Conhecem uma cidadezinha do sul chamada Crystal Valley? - perguntou, olhando-os - Com essas caras imagino que não. Pois bem, o território foi alvo, por muitos anos, de empresários e fazendeiros com intenções obscuras e muitas disputas se iniciaram. Compradores contra compradores e compradores contra a população. Prevendo retaliações, as famílias fundadores se reuniram e anunciaram que implementariam uma medida eficaz para defender a cidade de uma evacuação à força ou por ordem judicial. Você viu as fotografias, Hector?

- Sim. Cinco pessoas achadas mortas. Os indícios claros apontam para suicídio.

- Mas o que tem de bizarro nisso tudo? - perguntou Rosie, extremamente curiosa - O que justifica pessoas se matarem enquanto a cidade é ameaçada?

- Acontece que não são as únicas mortes. - respondeu Derek - Muitos outros corpos foram achados pela floresta e arredores... sem pele. Os suicídios datam de 30 anos atrás. Consegui essas fotos no banco de dados oficial da polícia há três dias. As mortes passaram a ocorrer com maior frequência a partir de Maio do ano passado de acordo com os laudos periciais. Alguns moradores correlacionam os suicídios à origem de uma criatura que estaria arrancando as peles das vítimas após mata-las. O chamam de Barghest, uma fera que nunca é vista à noite, eis o hilário.

- Está dizendo que... esse monstro ataca somente de dia? - questionou Rosie.

- Uma antítese interessante do lobisomem. Concordam?

- E assustadora também. - disse Hector - Cravar as garras para depois remover a pele. Muitos caçadores que conheço ficariam empolgados, ainda mais se houvesse recompensa.

- Por falar nisso, há residentes que ofertam boas quantias se capturem o Barghest. - revelou Derek - Mas obviamente não é nosso foco. Preciso que amarrem as pontas soltas. Os mortos de 30 anos atrás eram membros de uma família fundadora e os moradores associam a criatura aos sacrifícios...

- E como os fundadores tem controle e pensaram numa forma de barrar os empresários... - disse Rosie. - As peças se encaixam. Os sacrifícios podem ser parte de um ritual para criar o monstro e usa-lo como arma para atacar qualquer um que represente perigo à cidade. Invasores em geral, no caso.

- Um meio para um fim. Eficaz, porém drástico. - disse Derek - Prometo encontra-los por lá, em breve. - sacara um papelzinho - Este é o endereço da casa da família Beldon, também influente fundadora. É a terceira de cinco. Minha teoria é que há consenso entre famílias para a retaliação. Mas os Beldon chamaram minha atenção. Boa sorte. - andara para sair.

- E só isso? - perguntou Rosie.

- Na verdade, eu perguntaria sobre a bagunça e o cheiro de bebida, mas estou com pressa, espero resolverem logo para observarmos o eclipse solar no fim da tarde. Até mais ver. - fechara a porta.

- Um eclipse solar? Pra hoje? - se perguntou Hector, intrigado - Não tinha me informado.

- O mais surpreendente é ele nos convidar para um encontro sem envolver nada sobrenatural. - disse Rosie, parecendo meio chocada com o entusiasmo do líder em chama-los.

                                                                                         ***

Crystal Valley 

A sede do Comitê Governante aparentava ter uma estrutura de uma universidade ou escola católica. A dupla entrara pela porta da frente após subir os degraus da escada de concreto. Não demoraram a achar a presidente por um dos corredores lendo um jornal andando com uma xícara de café noutra mão e caminharam diretamente à ela, ansiosos. A mulher vestia calças pretas largas, uma blusa branca de mangas curtas e seus cabelos de um loiro escuro emolduravam um rosto caucasiano e fino de olhos amendoados e lábios estreitos.

- Olá, bom dia. - disse Rosie, gentilmente - Nós estamos aqui por jurisdição oficial do Exército Britânico. - mostrou o distintivo - Presumo que um Derek telefonou pra senhora.

- Ah, então são os agentes dos quais ele me falou. - disse ela, bem-humorada - Isso são disfarces?

- Não... - disse Hector - Nossos gostos de vestimenta são meio peculiares, mas garanto que fazemos um excelente trabalho. A senhora não é a primeira que pergunta isso e nem será a última. - olhou de lado para Rosie que o fitava com repreensão - Ahn... Queremos alguns esclarecimentos.

- Imagino para o quê. Prazer em conhece-los, eu sou Naya Gibbons. Proclamada presidente deste não tão reconhecido departamento. Hoje estou de folga, mas decidi dar uma passadinha para... reorganizar a casa. Preciso disso ao menos uma vez por ano.

- Que inveja. - disse Rosie, baixinho, apesar de Hector ter escutado e a olhado de cara feia.

- Tivemos acesso a um arquivo do banco de dados policial - disse Hector - onde estão listadas todas as mortes documentadas até agora com evidências iguais. Corpos largados nas florestas, perfurados, roupas rasgadas... e com boa parte das suas peles faltando.

- Por que isso me diz respeito? - perguntou Naya, desconfiada.

- A família Gibbons é uma das fundadoras de Crystal Valley. - disse Rosie - Os membros de outra família com a mesma influência se suicidaram há 30 anos no que pensamos ser um ritual e poucos dias depois surgiram relatos de uma criatura rondando a cidade e matando invasores. Agora são pessoas inocentes vitimadas e durante o dia. Há uma casa aqui perto...

- Ninguém deve entrar lá. - disse Naya, categórica - Não nego as tragédias que tem acontecido, mas recomendo não espiarem a casa. Há uma suspeita ou lenda de que mora o homem que transforma-se na criatura. Não forçamos ninguém a cometer suicídio. Por via das dúvidas, não entrem.

- Será que dá pra parar de ficar na defensiva? - perguntou Rosie, impaciente - Os fundadores querem o bem da cidade, mas dessa forma... só causa mais problemas. Melhor admitir que teve acordo.

- Rosie, espera, não precisamos ir tão rápido...

- Do que está falando? - indagou Naya, aborrecida - Eu sinceramente espero que isso não seja uma tentativa de difamar ou...

- Quer ser honesta? Vá em frente. Por que o monstro anda à solta? Do contrário, a hipótese de um consenso seria descartada. Arranjem uma outra maneira de enfrentar os que querem tomar a cidade ou aceitem as propostas de governo deles. É essa política que querem incentivar?

- Agora chega! - explodiu Naya - Não estou aqui pra admitir acusações infundadas. Queremos manter a população segura recomendando ficarem longe da casa. O meu marido trabalha como lenhador em frente à ela. Como acha que me sinto todos os dias quando ele sai? Os Watsons foram extremistas, nós somos diferentes, então se queriam reunir provas que correspondessem às suas teorias... sinto muito, mas perderam tempo e fizeram perder o meu. - os encarou - Fora daqui.

O filho de Naya, Darryl, observava escondido numa parede. Um jovem de casaco verde escuro, cabelo curto meio cacheado "escondido' por um boné branco.

- Vou falar com seu marido. - disse Rosie, virando as costas e andando. Hector se desculpou timidamente com Naya e seguiu-a. Na saída do prédio, ambos pararam.

- O que deu em você? - perguntou Hector.

- O que deu em mim? Eu fui direta ao ponto, é assim que acho certo trabalhar.

- Então cabe a mim te dar uns macetes básicos de como conduzir um interrogatório investigativo. Primeira regra: seja sorrateiro e incisivo, aos poucos você cava mais fundo em direção ao ponto central. É o modelo crucial para começar uma investigação quando se interroga um suspeito.

- Está bem, professor. Já entendi. Fui rápida demais. Mas você não percebeu no quão nervosa ela estava? Aquilo entrega o ouro. Os Gibbons estão diretamente ligados nessa história. E nem sequer temos uma noção de como o Barghest foi criado, se tem magia envolvida...

- Fica calma. - disse Hector, tocando-a nos ombros. Porém, a jovem ficara meio apreensiva. - O que foi? Não fique nervosa, acharemos as últimas peças do quebra-cabeça.

- Não, é que... - olhou para as mãos dele - Você me tocando... Está tão sereno. É diferente. Tudo está diferente hoje, algo mudou, tenho certeza.

- Você mudou. - disparou Hector - A Rosie de antigamente me daria um sermão ou um soco respondendo à minha lição de moral e ameaçaria romper a parceria. Nós... apenas amadurecemos. - suspirou, assentindo - Vou checar a floresta enquanto você conversa com o Sr. Gibbon. E mais...

- Tá, já sei. - interrompeu ela - Controle-se. Deixa comigo. Toma cuidado.

                                                                                     ***

Um amigo da família Gibbons administrava uma loja de penhores e até lá mesmo que Derek foi para conseguir acréscimos substanciais ao caso. O local era de ambiente modesto e muitas paredes tomadas por itens diversos sem quase nenhum espaço para outros.

O homem - senhor barbudo, calvo e gorducho de maças do rosto vermelhas - o recebeu olhando-o com suspicácia, parando de lustrar um objeto. Derek se aproximou do balcão, educado.

- DECASO, iniciativa do Exército. - mostrou o distintivo - Eu gostaria que me falasse se esteve sabendo dos recentes assassinatos nas redondezas. Mortes brutais, pessoas sem pele...

- Nunca ouvi falar. - respondeu ele - Do seu pessoal, claro. Não sei não, mas... esse distintivo parece falso. Não coopero com esquisitões, prefiro os credenciados locais.

- Tenho jurisdição, senhor. Soube que é amigo dos Gibbon. Então, vou apelar pra uma pergunta mais... invasiva. - estreitou os olhos - Por que a casa na área onde Ralph Gibbon trabalha está sob proteção da família? Uma casa decrépita e abandonada...

- Se eu contar, vai me chamar de louco.

Derek riu baixinho.

- Tente. DECASO significa Departamento de Controle de Ameaças Sobrenaturais. E nenhum animal ou humano arrancaria as peles das vítimas com tamanha precisão cirúrgica. Há muitas coisas neste mundo que escapam a nossa vã compreensão. Os loucos são os que não abrem a mente à esse fato.

- Você sabe como é... Família fundadora. - disse o homem - Escondem segredos até entre si. Por que um gato pingado feito eu saberia mais do que os outros? O Ralph e eu somos amigos de longa data.

- Provavelmente agorinha mesmo tem alguém na floresta investigando. É perto de onde ele trabalha? - perguntou Derek.

Celine, a filha mais nova do casal Gibbon, ouvia toda a conversa, assistindo-os. Logo tratou de ir um telefone numa sala fora do campo de visão de Derek. Discou um número rapidamente e olhou pela janela para o carro preto estacionado... o carro de Derek. A bela garota tinha cabelos de um loiro mais claro que o da mãe e um rosto mais suave com olhos castanhos encapsulados.

- Tem um federal aqui e trouxe reforços. Quer proteger a floresta? Hoje é um bom dia pra caçar. Cuida disso. Eu e o Darryl vamos fazer um passeio logo mais. Já temos nossa presa bem perto.

                                                                                     ***

Hector portava um aparelho EMF que marcava seu trêmulo ponteiro na escala de 0.5 e sem variar, o que representava um rastro de atividade deixado pela criatura em tempo recente. O caçador andava pela floresta em busca de um sinal forte, mas nada alterava. Um estampido soou atrás dele, mas algo o atingira nas costas. Largou o aparelho, verificando. Uma fumacinha saía por um buraco na parte detrás do sobretudo e depois viu um homem parado armado com uma espingarda.

- Por que diabos não caiu? Mirei bem na coluna. - disse ele, avançando contra Hector, tentando golpeia-lo com a arma, mas o detetive desviava e logo tomara-a dele. Golpeou-o no rosto com a coronha e depois com o cano e o chutara no tronco, derrubando-o. O atirador levantou-se rápido queixando-se de dor, mas fora pego por Hector que ameaçou estrangula-lo com o cano da arma, prendendo-o. - Ei, ei, por favor, não... Eu faço o que você quiser! - arquejou, o rosto vermelho.

- Responda honestamente: Para quem trabalha?

- Sou o guarda dessa floresta ou deveria ser se o monstro que eles prendem na casa assombrada não existisse. - disse ele, cerrando os dentes. - Me larga, imploro!

Hector cedeu à súplica e jogou a espingarda longe. O homem vira as balas espalhadas.

- Mas o que... - olhou para Hector chocado - Como descarregou a arma tão rápido?

- Não o libertei para que fizesse perguntas. Me parece um caçador de animais. Os Gibbons contrataram você?

- Sou pago e muito bem pago... - ele ofegava - ... pra vigiar a floresta, esta área aliás. Impedir que qualquer um entre na casa. Recebi um chamado. Nem federais são permitidos. Afinal, os Gibbon mandam na cidade, então é justo.

- Então já assassinou pessoas da lei por causa de uma casa a servir de cárcere para o Barghest?

- Só uns dois xerifes. Você não vai me matar vai?

- O mínimo que podia fazer era leva-lo à delegacia. Mas quero que me responda uma coisa: O Barghest ataca ao dia... Então se os Gibbon são responsáveis por mante-lo querendo proteger Crystal Valley, por que não querem que ele saia?

- Olha, apenas faço o serviço e me mando. Mas sei de algo... eu tô quebrando uma regra importantíssima aqui com você, amigo. De dia, o cara é um monstro trancafiado na casa. À noite, ele é um membro do Comitê, a serviço dos Gibbon e remunerado, o que faz dele o funcionário efetivado. O Sr. Gibbon é o único a ter permissão pra liberar a fera e aí encerra meu turno. Sempre às 8 horas.

- Já passou das 8 e não rastreei quase nada - salientou Hector. O caçador expressou preocupação.

- Acho que tem a ver com o eclipse.

- O quê? - indagou Hector - O que um eclipse solar significa para manter o Barghest preso?

- Nada de bom. - respondeu, nervoso.

Enquanto isso, Rosie tentava conversar com Ralph Gibbon de forma harmoniosa. O pai de família era um cinquentão parrudo de rosto quadrado e barba e cabelos grisalhos, sempre com um macacão jeans por baixo de uma camisa xadrez. Tacara o machado num tronco, partindo-o em dois.

- Menina, vê se me erra. Como pode ver, tô no meio do trampo. Se a Naya não satisfez as suas dúvidas, eu lamento, não posso fazer melhor.

- Eu vim buscando respostas. - disse Rosie - Tenho direito de ser atendida, a lei manda isso.

- Já disse e vou dizer novamente. - disse Ralph, ríspido - Trabalho pra sustentar minha família, não me preocupo com o que acontece nessa cidade, não me interessa.

- Já que é assim... Poderia me deixar fazer uma vistoria na casa. Ou você permite ou...

- Vai chamar o Exército pra me prender? Me engana que eu gosto.

- Espera, tá duvidando do meu trabalho? Sou autoridade, não tenho que provar nada, o senhor por outro lado...

- Não sou criminoso! - vociferou Ralph, jogando o machado - Some daqui antes que eu infarte. - virou as costas, andando na direção da pilha de lenha. Rosie suspirou longamente, tentando manter-se controlada e se perguntando sobre Hector ter tido melhor sorte.

                                                                                ***

Derek seguia com seu carro pela estrada de mão dupla no sentido contrário, distanciando-se de Crystal Valley. Passara pela enferrujada placa que indicava claramente. O sol matutino fazia a lataria negra do carro reluzir como obsidiana. Assoviando, o líder calmamente aguardava os desdobramentos com Rosie e Hector tomando as rédeas do caso por definitivo.

Porém, o sossego foi quebrado por outro carro irrompendo da vegetação à esquerda e colidindo brutalmente com o de Derek que foi arrastado para o lado até bater numa árvore.

Após uns minutos desacordado, ele saíra trôpego do carro, ferido nas têmporas. O motor fumaçava bastante e a lateral estava completamente retorcida. Do carro agressor saiu Darryl, o primogênito Gibbon, carregando um rifle.

- E aí. Gostei do sobretudo, bem descolado. - disse Darryl - Que pena mancha-lo de sangue.

- Não tão rápido. - disse Derek, se aproximando e pegando a arma dele velozmente e usando a coronha para primeiro bate-la no tórax e por último na cabeça, deixando-o inconsciente. Contudo, sentiu uma presença atrás.

- O plano era esse. - disse Celine, as mãos para trás. Derek virou-se, espantado - Ficou dormindo e aproveitei a deixa. Hora de voltar pra soneca. - mostrara uma pá e a bateu forte na cabeça de Derek, desmaiando-o.

Meia hora passou-se após o incidente. Hector fora à loja de penhores que o caçador de animais mencionou enquanto revelava até onde sabia.

- Ué, mas um cara desse tal DECASO já passou por aqui. - informou o dono - Alto, branquelo, sobretudo de grife, cabelinho intocável, meio metido...

- Sim, já sei quem é, a descrição... foi bem fiel, a propósito. - disse Hector - Passar bem.

No outro lado da rua, dois agentes rodoviários conversavam a respeito do acidente envolvendo o carro de Derek e o dos irmãos Gibbon que na verdade pertencia aos pais e o dirigiram sem consentimento, muito embora o resultado fosse um trunfo para manter o Barghest ativo.

Rosie estava por perto e ouvira. A dupla de policiais mencionaram a Rodovia 42, a estrada pela qual ela e Hector passaram no sentido oposto ao que Derek vinha. Impulsionada, ela fora direto à delegacia específica para colher um relatório pronto.

Hector, por sua vez, voltava a pé da loja de penhores e atravessou uma rua ao encontrar Rosie que acenava com um papel na mão.

- O que é isso? - perguntou ele - Ah, mas antes que fale, deixe-me contar: Derek falou que iria nos encontrar, mas passou pela loja de penhores cujo dono é amigo íntimo dos Gibbon. Foi embora por não ter coletado informações suficientes.

- Eu peguei um relatório da polícia rodoviária - disse Rosie, entregando-o -, ouvi falarem de um acidente na rodovia 42 e você sabe bem que estrada é.

- A placa do carro... - disse Hector - ... é a de Derek. O carro foi achado danificado como se outro tivesse colidido, mas não uma colisão acidental.

- Pois é, diz aí que as marcas de derrapagem partiram do matagal do lado esquerdo ao sentido que sai da cidade. E o pior: Derek não estava ferido no carro como os policiais esperavam.

- Nem sinal do outro carro. Logicamente um sequestro. Serão os Gibbon?

- Soube que a filha do Sr. Ralph Rabugento trabalha na loja. Provavelmente Derek partiu da cidade enquanto ainda estávamos tentando reunir provas. Ela pode ter avisado a algum capanga. O que você sugere? Tenho uma ideia. - sorriu torto.

Hector demonstrava estar de acordo.

- Vamos invadir aquela casa. Do resgate cuidamos depois.

Na casa dos Gibbon, Naya entrara se deparando com Darryl sentado no sofá com uma compressa de gelo na cabeça.

- Mas... o que houve? - chegara perto - Como tá se sentindo? Deixe ver...

- Não foi nada... Só uma pancada... numa briguinha de rua.

- Pelo visto não herdou o mesmo dom para mentira do seu pai. - disse ela. Ralph chegara vindo da cozinha - Belo plano usando nossos filhos para capturar o próximo. Eu estou cansada. Por que não confiamos que o Barghest não sobreviverá até o eclipse?

- Você esteve enganada por todo esse tempo. No último eclipse solar, eu comprovei com meus próprios olhos. A fera torna-se indomável quando a lua e o sol se cruzam.

- O Barghest é fortalecido pelo eclipse. Que controverso para um ser sanguinário em plena luz do dia.

- O cara no nosso porão é um federal ligado aqueles detetives que nos importunaram. Vai ter que ser ele, me desculpe. Eu queria nossa família unida nesse dia tão especial. As crianças enxeridas não são detetives comuns, são atrevidos e vão entrar na casa e mata-lo. Enquanto isso...

- Um inocente é usado para assumir o lugar do outro Barghest. Acha que criar um novo durante um eclipse o tornará permanentemente imbatível? - fez uma pausa - Quer saber? Façam como quiserem.

A matriarca dos Gibbon saiu irritada da casa. Paralelamente, Rosie e Hector estavam diante da casa.

O caçador chutara a porta e entraram rápido. Ambos estranharam a textura dos móveis da casa empoeirada e repleta das teias de aranha.

- Hector, olha só... - disse Rosie, tocando na cabeça de um abajur - Aliás, sinta. - o caçador tocara no sofá e entendeu.

- É pele humana. Na sua forma humana, o Barghest confeccionou esse revestimento de pele humana para os móveis desta casa, o que me leva a crer que este é seu antigo lar.

Subitamente, algo agarrara Hector e derrubou-o. Rosie se alarmou, vendo o Barghest ataca-lo. A jovem pegara um pedaço de madeira e desferiu um golpe que o tirou de cima dele. Hector levantou-se na mesma hora que a criatura, uma espécie de fera quase bípede com ferozes olhos amarelos e uma bocarra com presas similares a de um tigre dente-de-sabre, mas menores. O Barghest dera uma bofetada em Hector, jogando-o contra uma parede à esquerda. Rosie continuou usando o pau como arma, tentando acertar o coração enquanto desviava das garras. Porém, seu braço direito sofreu um corte.

De guarda baixa, ela foi golpeada no rosto, voando até uma estante que espatifou-se. O Barghest virou-se para onde Hector estava, rugindo furiosamente. O caçador pegara dois pedaços de madeira pontiagudos e arremessou um contra o Barghest que destruiu com uma mão. O outro pedaço jogado acertara-o no peito, fazendo-o parar. Hector esperou para certificar-se.

Rosie viera pro trás, batendo na cabeça dele com um pedaço maior, mas o Barghest revidou com outra bofetada forte, derrubando-a. Rosie o chutara do chão, levantando-se e empurrando a madeira na ferida e depois chutando-o contra a parede.

Uma voz emitindo palavras em latim soou. O Barghest aparentemente desistira de rebater o golpe e aquietou-se, ficando quadrúpede. Era Naya, entrando e recitando um feitiço. Surpresa, a dupla assistira o monstro andar para trás rosnando até o cômodo escuro.

- Isso foi... conveniente. - disse Rosie - E também revela bastante.

- O curioso é que a magia não produziu o efeito esperado. - disse Hector - Acalmou em vez de ferir.

- Este feitiço - disse Naya - é um dos mais letais para criaturas místicas. Para os outros, é uma hemorragia interna enquanto no Barghest é só um tranquilizante. É o bônus demoníaco.

- O que quer dizer? - perguntou Rosie - Afinal, por que nos ajudou?

- Digamos que me demiti. Ralph foi longe demais. Inicialmente, o Barghest foi criado através de uma força demoníaca, precisamente chamada Amon, o demônio goético protetor dos governantes e territórios e requer um ritual de consagração onde cinco pessoas, sendo uma delas bruxa ou mago, sacrificam-se em oferenda e um portal é aberto por onde sai a essência de Amon... contaminando a vítima e transformando-a na coisa que vocês acabaram de enfrentar. As almas oferecidas motivam Amon a tornar o homem de coração justo no guardião sanguinário.

- Um demônio... dando origem a outro ser sobrenatural diferente. - disse Rosie - É novo pra mim.

- Idem. - respondeu Hector - Naya, já que resolveu se desligar do propósito da família, então pode nos dizer onde está nosso amigo, o Derek, ele passou na loja de penhores.

- Está preso no porão, Ralph está fazendo os preparativos. Foi com a ajuda de Celine, que por sinal roubou o nosso carro com Darryl, que o Barghest foi reprogramado, por assim dizer.

- Sua filha é uma bruxa? - perguntou Rosie - Então foi ela que manipulou para alimenta-lo.

- Sim. A razão pela qual as mortes aconteceram há tão pouco tempo... é a aproximação do eclipse. Daqui à uma hora. Ralph e as crianças farão o ritual para criar um novo Barghest confiando na chance de vocês matarem o que vive aqui. O eclipse fortalecerá o Barghest atual. Porém, se não tiverem sucesso no resgate... o novo Barghest terá um força tão superior quanto.

- E como o derrotamos? - perguntou Hector - Madeira não o afeta pelo que constatei.

- Mas é claro que afeta. - retrucou Naya, os braços cruzados - Entretanto, é impossível mata-lo por meios físicos. Em outras palavras, o Barghest apenas pode ser morto por projeção astral.

- Como um fantasma? - perguntou Hector - Não... deve haver...

- É o único modo. - destacou Naya - Um espírito humano é capaz de obliterar o espírito demoníaco, embora não salve a vida do miserável que foi transformado. Resumindo: Um sacrifício para cria-lo e outro para mata-lo. Mas nada que a magia não possa colaborar. - sorriu tranquila.

Rosie fitava Hector com certa preocupação ao vê-lo assentir para si mesmo com tanta determinação.

- Preciso que esperem. Não vou demorar. - disse ele, saindo da casa.

                                                                                   ***

As algemas ferrosas, presas à correntes, maltratavam os pulsos de Derek que forçava para quebra-las.

Diante dele estavam Ralph, Celine e Darryl. O pai entregava aos filhos suas respectivas facas para o sacrifício.

- Já aviso do tremendo erro que estão cometendo. - disse Derek, o corpo da cintura para cima desprotegido - Não querem me explicar qual o plano? Eu preencho os requisitos ao ritual?

- Cale-se, seu filho da mãe. Senão te ponho uma mordaça. - disse Ralph - Mas a boca é uma abertura importante para o éter de Amon em toda sua graça. Só quero que lembre-se da primeira pessoa a matar quando finalmente se transformar.

- Nossa mãe nos traiu deliberadamente. - disse Darryl - Ela não merece morrer por nossa cidade.

- Matar sua mãe?! - disse Derek - Espera, há uma discrepância aqui... Recapitulando: Cinco pessoas achadas mortas por suicídio neste mesmo local há 30 anos. Período no qual o Barghest foi originado. O ritual necessita de cinco pessoas, há somente três. Esperam mesmo que funcione?

- E daí? A alma mágica da minha filha tem mais valor como oferta. - disse Ralph.

- Pai... - disse Celine, atordoada - Nós... somos quatro, na verdade. - afagou levemente sua barriga. Ralph a encarou com repulsa ao compreender. - Sei que devia ter contado antes...

- Oh, que milagre. - disse Derek, sorrindo - Sua filha está com um pãozinho no forno, aposto que virá uma bela criança. Agora podem se abraçar, comemorar e desistir dessa loucura sádica.

- Calado! - vociferou Ralph, logo pegando Celine pelo braço - E você mocinha... Disse que somos quatro para somar ao ritual né? Espero que sim. Quantos meses?

- Três. - respondeu ela, chorando.

Uma pessoa surgira descendo a escada do porão. O dono da loja de penhores cujo nome era Dave.

- Não pode ser... - disse Derek, surpreso - Impossível, o ritual é restrito a consanguinidade.

- Não quando se é próximo da família a ponto de saber todos os segredos. - disse Dave, pegando sua faca. Cortara seu antebraço esquerdo. - Mas só pra garantir...

Dave levou seu antebraço cortado à boca de Ralph que sugou seu sangue avidamente. Logo depois, o patriarca fizera o seu corte, compartilhando seu sangue com Dave.

- Laços de afinidade também são considerados. - disse Celine - Prepare-se. - fez uma pausa, fechando e abrindo os olhos - In essentia envolved. Sacrificium strepitus. 

Enquanto isso, Hector tinha voltado do Casarão usando supervelocidade, o que deixou Naya curiosa. As duas estavam num quarto. Um grande círculo com velas ao redor estava pronto.

- Aonde foi? - perguntou a bruxa. - De mãos vazias...

- Pelo contrário. - disse ele, tirando do bolso um revólver que Rosie viu como familiar.

- Não acredito, você foi até o Casarão?! - disse Rosie - Pegar logo isso... não... - balançou a cabeça.

- Rosie, por favor, olhe nos meus olhos e entenda. - disse ele, fazendo-a segurar a arma - Tudo conspira ao nosso favor agora. Não vamos deixar a oportunidade escapar.

- Mas foi com essa arma... que testei você e quase te matei. Se me atacasse, eu dispararia. Mas agora... Por que justo agora? - questionou,  chutando um banco de madeira. - Não aceito.

- Então vai se prestar Hector? - perguntou Naya, olhando pela janela - Melhor começarmos. O eclipse está começando. - voltou-se à eles - Esqueçam os traumas do passado, não me interessa, mas esqueçam. Rosie, você deve tomar essa coragem. Confie em mim. Não acredita no poder da magia?

- Ela tem razão. Sua avó é uma bruxa, Rosie. A reencontrou há pouco tempo e sei que ela demonstrou seu potencial para escaparem daquele antiquário.

- Mas é o hoje, o agora... É difícil pra mim... porque estou me importando de um jeito que nunca antes senti. - disse Rosie, emocionada. - Fazer o quê né? Uma boa causa. - destravou a arma.

- Hector, fique no círculo. - disse Naya - A conexão será feita entre mim, você e o eclipse. Uma vez que não consiga derrotar o Barghest a tempo, não será possível voltar. Você tem 3 minutos, o tempo máximo de um eclipse solar. - olhou para Rosie - Atire.

As mãos da jovem tremiam e a hesitação pulsava no dedo perto do gatilho. "Nossa primeira vez..."

Disparou. A bala prateada acertou em cheio o coração do caçador que caiu para trás. Naya conjurara o feitiço que requeria poucas palavras. Não tardou para Hector se ver fora de seu corpo, estarrecido.

- Tá, vamos assumir que isso é aterrorizante. - disse ele olhando a si mesmo morto - Então essa é a sensação de uma experiência extra-corpórea...

- Sinto sua energia, Hector. Não perca tempo, chame o Barghest, provoque-o. - disse Naya.

- Tudo bem, já vou. - disse ele, saindo - E falar é inútil já que... deixa pra lá. - dera de cara com o Barghest na sala. - Venha me pegar.

No porão dos Gibbon, Celine continuava recitando o último trecho do encantamento.

- Tutela est aeternum pro arregagiis inferna justorum! 

A rachadura no teto começava a formar-se de dois pontos até cruzarem-se. Derek olhou-a e pensou numa medida desesperada e desesperadora.

- Crudus et abiit. In quas maledicta congessi nullo introeunte! 

- O que está fazendo? - perguntou Ralph.

- Parece um contra-feitiço! - alertou Darryl - Eu nem sabia que ele...

- Tutela est aerternum pro arregagiis inferna justorum. 

- Crudus et abiit. In quas maledicta congessi nullo introeunte! 

- ... inferna justorum! 

- ... nullo introeunte! 

- ...inferna justorum!!!

- ... nullo introeunte!!!

A fenda fora fechando-se lentamente apagando sua luz laranja. Dave tivera um impulso estranho naquele momento o levando a usar sua própria para esfaquear Ralph no pescoço. O patriarca caiu de joelhos, a artéria carótida danificada e expelindo sangue feito água corrente.

- Pai! Não! - gritou Celine, abraçando-o. - Seu monstro!

Darryl tentou esfaquear Dave, mas o lojista o perfurou na barriga. Logo depois, fora libertar Derek.

- Celine... Nada está perdido. Crystal Valley prosperará... com outra família no comando. A menos que mate sua mãe. Agora vá...

- Ela vai escapar. - disse Derek.

- Não, tudo bem, seus amigos podem cuidar dela. - falou Dave - Eu já estava farto. Isso é doentio.

- Que bom ter tomado juízo. - disse Derek, feliz - Eu teria feito o mesmo. - olhou para o corpo de Ralph.

No terreno "proibido", Hector e o Barghest se enfrentavam bolando no chão. A lua encobria o sol pela metade. Ambos ficaram andando de lado e se encarando. O caçador tomava dimensão.

- Mata-lo antes do fim do eclipse... Posso me transformar neste estado? - a dúvida o acometeu.

O Barghest avançou em toda ferocidade. No instinto, Hector acionara sua licantropia e rosnou tão selvagem quanto o oponente, avançando contra ele superveloz e canalizando sua força numa mão. A mão que usou para atravessar o peito do Barghest que rugiu de dor. Incrivelmente, a mão da fera atravessava o corpo de Hector como se fosse intangível.

O caçador arrancara o coração da fera logo na totalidade do eclipse. Como consequência final, o corpo do Barghest fora convertido numa fumaça da cor do seu pelo que subia como se estivesse sendo drenado por um "portal invisível" até desaparecer completamente.

Era a chance de voltar correndo. Porém, ao fazê-lo Hector fora barrado na entrada, como se batesse num campo de força. Tentou mais duas vezes e nada. De repente, uma dor aguda torturou sua cabeça.

- Às vezes me impressiono com o quanto a mamãe é previsível. - disse Celine, infligindo dor com um feitiço - Matar o Barghest pode ter sido moleza, mas de mim... você não escapa. - apertou a mão.

- Como pode me ver?

- Eu não estou morta. Feitiço de visão fantasmagórica. Só aproveitei a deixa pra pega-lo de jeito. Agora sofra até que sua alma desapareça, literalmente.

Hector podia ver suas mãos reagindo como se fosse uma projeção arranhando.

Um estampido soou. Celine viu um buraco vermelho na sua barriga e caíra. Num instante, Hector sentiu voltar ao normal, levantando-se. Notou Rosie vindo com um revólver.

- Desgraçada... - Celine agonizava - Covarde. A mamãe te mandou fazer isso?

- Acertou. - disse Rosie - Ela sentiu sua magia bloquear a ligação com Hector. Mas antes soube que você detectou um fantasma e deduziu que fosse um plano para matar o Barghest. Eu não queria ter feito isso, mas...

- Foi preciso. - disse Celine - Pode ir buscar o federal, ele tá livre. - cuspira sangue.

Rosie olhara para o sol eclipsado.

- Hector, onde quer que esteja, pode passar. - vira a sombra da lua deslocar-se - Depressa!

Hector entrara superveloz, chegando ao quarto e tocando no seu corpo. Naya suspirou aliviada ao vê-lo acordar sobressaltado. Poucos minutos depois, Rosie entrara, mais despreocupada.

- Fiz o que me pediu. Ela tá morta. Me fala como pode carregar isso pro resto da vida.

- A dor me acompanhou por muitos anos. - disse Naya - Posso viver com ela me conformando pela insatisfação de um casamento fracassado e duas gravidezes indesejadas. Pense e repense no que quer, Rosie. Ainda lhe resta tempo. - olhou para Hector - Defina suas escolhas com sabedoria.

Derek surgira surpreendentemente.

- Como estão todos? - perguntou, logo olhando para Naya. - Você...

- Ei, espera. - disse Rosie - Calma aí, ela cooperou com a gente.

- O que achou que eu faria? Estou sem meu sobretudo, logo sem armas. Más notícias para a Sra. Gibbon: O amiguinho íntimo matou seu marido e seu filho. A bruxinha está morta lá fora.

- Rosie a matou para me salvar. - disse Hector - Nós agradecemos, Naya.

- E que droga. Perdi o eclipse. - reclamou Derek, vendo o sol já brilhando novamente.

- Rosie, preciso falar com você em particular. - disse Hector, gesticulando com a cabeça para sair.

No lado de fora, ambos conversavam. Hector tocou no assunto irresoluto.

- O quê?! Então mentiu sobre a droga nas bebidas? Criou teoria falsa... pra quê?

- Por timidez. - disse Hector - O que houve na noite passada tem muito mais a ver comigo.

- Não quero tirar nenhuma conclusão precipitada... mas tá me parecendo que você encheu meu copo além da conta... com segundas intenções. Não fica bêbado graças à vantagem licantrópica. E eu não estaria se ativasse o brasão, mas cinco minutos sem embriagar... - deu de ombros.

- Sim, fui eu. Havia uma necessidade... e a oportunidade perfeita. Unindo os dois... e o resto você já deve se lembrar.

- Fingiu amnésia... Por que não estou brava?

- Talvez... pelo fato da nossa relação ter chegado a um novo patamar. - disse Hector - Ah, devíamos cuidar desse corte quando chegássemos. - disse olhando a ferida pertinho. Os rostos estavam bastante próximos e ambos não evitaram. Um beijo demorado se fez em meio ao sol do fim da tarde.

                                                                                        CONTINUA...

*A imagem acima é propriedade de seu respectivo autor e foi usada para ilustrar esta postagem sem fins lucrativos. 

*Imagem retirada de: http://the-demonic-paradise.wikia.com/wiki/Barghest´

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