Nem tudo é o que parece #50


Já estive envolvida num caso de uma amiga ansiando por suicídio rápido, indolor e discreto. Nada do que eu dissesse funcionaria para abrir a sua mente, então concordei, com muito aperto no coração, já estava farta daquele dramalhão adolescente. Na noite planejada, eu precisei correr a mil por hora no meu carro até a casa dela e verificar se ela aquela garota corajosa e determinada a tirar a própria vida estava ou não chorando num canto.

Éramos de uma intimidade praticamente fraternal. Realmente gostava dela.

Entrei no quarto e vi apenas a corda amarrada... ainda balançando bem levemente.

Impossível. Uma garota tão decidida jamais fugiria assim. Ela nunca desiste de algo. Mas chegou um ponto em que ela perdeu o poder de decisão.

Tive certeza de ter amarrado bem firme na primeira vez que eu vim só para dopa-la.
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Desde muito cedo eu aprendi a afastar qualquer sombra de ceticismo que viesse na minha mente quando uma coisa fosse considerada estranha, atípica, ou bizarra.

Minha mãe me levava a pé para a escola na época, tivemos sorte em morar tão próximo.

Nós tínhamos que passar pela casa vizinha. Nem questionava o fato da minha mãe apressar o passo toda vez que pisávamos no gramado alheio, o que me chamava atenção era uma menina de camisola batendo sua cabeça contra o vidro da janela. Bem, como vizinhos éramos super-distantes, se rolava uma interação, raramente acontecia, mais fácil ser num caso que demande contribuição comunitária.

Mamãe dizia baixinho para ela mesma: "Não olhe, não olhe, não olhe..."Mas era como ela se quisesse que eu ouvisse e fizesse o mesmo. Só depois de passarmos, é que voltávamos ao ritmo normal.

Era assim todos os dias. A menina batendo a cabeça na janela, minha mãe tentando ignora-la com medo, minha curiosidade aumentando e me torturando... Foi daí que num dia, sem aguentar mais, parei minha mãe, pedi que ajudássemos a garota pois eu achava que ela queria sair e não sabia usar a porta. Ela riu da minha ingenuidade, mas hoje sei que aquele riso foi pra não surtar em plena manhã. Ela me abraçou e disse que vai ficar tudo bem, que a garota tem sua família para ajuda-la sempre que ela precisar e nós não precisávamos nos meter nas vidas dos outros.

Na volta da escola, senti a mão dela esfriar, depois tremer e enfim desentrelaçar dos meus dedos.

Eu não percebi que ela tinha desmaiado antes de ficar olhando para a garota vizinha batendo sua cabeça na nossa janela e dentro da nossa casa.
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Eu comprava doces numa venda cujo dono era meio polêmico em querer manter o rosto coberto por uma máscara de porco raivoso sem olhos. Fui um desses moleques desobedientes mesmo, pouco ligava pro que falavam do cara. Os pais faziam a caveira dele em reuniões, mas ninguém nunca conseguiu uma liminar judicial para bani-lo com a desculpa que ele intimidava as crianças só por causa da maldita máscara fedorenta.

No último dia que comprei doces lá, concordei com essa ideia, mas precisava de maior incentivo... sabe, denúncias, colaboração, boletim de ocorrência, essas coisas...

Não era o mesmo cara. Era mais magro e tinha voz de cheirador de pós.

Comprei meus doces mesmo assim, mas não saí sem gravar na mente a imagem do sangue que escorria pela brecha da soleira da porta atrás dele. 
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Durante uma parte do trajeto ao trabalho, eu sempre escutava um abafado choro de bebê.

Hoje eu não pude passar pelo caminho de sempre pois chamaram os limpadores de fossas.

Eles encontraram um bebê.

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Num treino para a competição de um GP de moto, escolhi a noite logo na estrada mais deserta que conheço para dar alguma emoção e na hora acelerei cerca de 10 km/h à velocidade permitida.

É muito louco, sabe... Em algum momento, pensei ter visto, através do capacete, a mim mesmo... tipo, competindo comigo mesmo, lado a lado, disputa acirrada no páreo ou a empolgação que me fazia delirar... só que vinha aquela sensação lá no fundo de não ser bem piração da minha cabeça.

Era meio fantasmagórico, quase transparente e desapareceu quando acelerou em disparada.

Mas era eu! Minhas roupas, vestia um casaco xadrez que ganhei no natal passado! E o farol da moto... essa foi a diferença. Uma luz azul meio branca em contraste com o amarelo intenso da minha.

Tentei esquecer essa droga no dia seguinte, mas eis que chegou uma encomenda do meu amigo.

Um farol novinho em folha de luz azul que ele enviou para que eu pudesse inaugurar na corrida.

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Nunca mais durmo com os pés expostos, agora sempre me cubro inteiro por via das dúvidas.

Acontece que numa determinada noite senti lambidinhas nos meus pés de uma língua gelada.

Eu tenho só um cachorro, o nome dele é Minato.

Nessa noite ele estava dormindo ao meu lado e quando descobri isso enquanto meus dedos eram lambidos, petrifiquei de medo.

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Por que criei coragem para tirar carteira de motorista tão nova?

Eu ainda sou meio viciada nesses aplicativos novos, os de condução então, nem se fala... tudo que lançava e bombava eu instalava na hora. O último que baixei não era tão famoso, mas como gosto de testar novidades, achei uma boa embarcar e se fosse agradável ia indicar pras minhas amigas. Você tinha acesso a uma lista integral de todos os motoristas credenciados. No entanto, apareciam só nomes, coisa que alguns me avisaram não transmitir muita segurança.

Mas fui mesmo assim. Marquei um compromisso inadiável com minha supervisora no trabalho à noite, então combinei com o cara de me pegar às 10, dei o endereço e tudo. Com todo respeito a quem é introvertido e meio tímido, mas... o cara bem que podia puxar uns assuntos né? Poxa, silêncio assim não dá. Então, comecei a tentar perguntando se ele soube daquela tal notícia sobre tal político... Mas ele me interrompeu com uma freada brusca.

Os carros dessa companhia tinham controle remoto, ele apertou um botão e saiu me deixando sozinha trancando as portas. Apareceu uma contagem na tela do GPS... acho que não era bem um GPS.

Depois que fui me tocar no aviso dentro do carro: "Não fale com o motorista".

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Tinha sido um passeio divertido pela floresta até me entediar e ficar jogando uma bolinha verde meio peluda para o alto por entre as árvores e sempre indo pela sombra... o sol e o calor estavam de matar.

Me defrontei com uma árvore grossa, maior do que todas as outras eu acho, com uma espécie de toca, um buraco embaixo num formato quase triangular e como meu tédio aumentou de um jeito tremendo joguei a bolinha para dentro do buraco.

Uns 15 segundos depois, sei lá, a bolinha veio voltando na minha direção. Estranhei, lógico, sem entender merda nenhuma, peguei a bolinha de volta e joguei novamente. Passou-se um tempo mais longo dessa vez. Reclamei, sem levar a sério e nem ligar para o que poderia ser, pedindo a bolinha de volta ameaçando entrar lá e pegar à força.

Seja o que for que mora naquela árvore, me devolveu outra coisa.

Era um negócio no formato de feijão... sim, era um rim humano, tenho certeza, veio quicando no chão. Na hora tive duas escolhas: Jogar de volta ou correr dali.

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Não fez nem 1 mês vivendo nesse bairro tão diferente do outro que vim e já sofro de estresse com vizinho. Latidos altos de cachorro chato é um ótimo começo. Pouco contato eu tinha com os vizinhos, ainda mal sabia os nomes direito, eu costumo ser sociável... só que depois de reclamar eu mudei meus planos de entrosamento com o pessoal da casa à esquerda da minha.

Os cães latiam muito alto, atravessava meus tímpanos. No momento que fui fazer minha queixa, uma linda garotinha, agarrada a um urso de pelúcia quase do tamanho dela, me atendeu, acho que era a filha mais nova do casal. Me respondeu que os pais não estavam presentes, mas mesmo assim não desisti. Falei o seguinte:

- Desculpa, mas é que o cachorro de vocês tá incomodando, fica latindo sem parar, não consigo dormir. Pode estar com fome ou só precisando de atenção.

- Ah sim, é o Cérbero. - ela respondeu. - Ele tá bem aí atrás de você.

Nenhuma criança como ela daria um nome daqueles sem um conhecimento mitológico, mas fui me virar e entendi.

Os latidos vinham dos cães trigêmeos siameses.
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A prefeitura notificou todos os moradores de que o carro que despeja fumaça para matar o mosquito da dengue passaria logo de manhã bem cedo algumas horas depois do meu voo para os EUA rumo ao intercâmbio dos meus sonhos.

Entrei no avião por volta das 7 horas e alguns minutos antes de todos os passageiros subirem a bordo recebi uma mensagem da minha mãe me dizendo para nunca mais voltar para casa. Como é que é? Exigi dela mais informações, o que diabos tava acontecendo lá. Ela me mandou uma foto que me deixou aterrorizado cuja legenda era: "Querem nos matar!" A imagem era do meu pai caído no chão, mas não reconheci de tão... grotesca, parecia um cadáver com manchas pretas se espalhando pelo corpo e se deteriorando gradualmente. Dos pés ao pescoço tudo enegreceu como carvão.

A prefeitura disponibilizava um aplicativo para estar por dentro das notícias relacionadas e, claro, notificações sobre projetos para as comunidades mais afetadas pelos problemas emergentes.

E adivinha o que me mandaram... Pois é, uma notificação avisando que o carro da fumaça só iria passar no dia seguinte. Então que merda de fumaça espalharam no meu bairro? 

FIM... por enquanto! 

*As imagens acima são propriedades de seus respectivos autores e foram usadas para ilustrar esta postagem sem fins lucrativos. 

*Imagens retiradas de: https://megacuriosidades.net/10-equivocos-sobre-o-suicidio/
                                     http://www.assombrado.com.br/2013/01/vultos-na-janela-como-uma-mensagem-de.html
                                     http://www.supertopmotor.com.br/vai-viajar-as-dicas-de-seguranca-para-a-sua-viagem-de-carro-e-moto/
                                     http://www.fundoswiki.com/fundos/floresta-sombria-jpg/1366x768
                                     https://www.blogodorium.com.br/sonhar-com-fumaca/

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