Frank - O Caçador #12: "Bicho-Papão"


A floresta parecia infinita. Até mesmo as árvores pareciam se repetir como se desse a sensação de estar voltando ao mesmo ponto inúmeras vezes. O homem parou a corrida para tomar fôlego com as mãos nos joelhos. Tinha cabelo curto preto, olhos castanhos destacados e vestia terno sem gravata. Olhou para o céu branco angustiado. E finalmente ouvira de novo o grito agoniante do perseguidor.

Por instinto, retomou a corrida, mais frenético desta vez. O lugar inteiro tinha aparência quase preto e branco, como um filme mudo de terror. Ele tentava gritar, mas quando o fazia nenhum som vinha.

Um único tropeço seria fatal. E ele ocorreu, justo numa raiz grossa e solta duma árvore. A coisa se aproximava com seu urro gutural. Ele olhou diretamente à ela movido ao pavor. Encarou a face negra e vazia daquele ser flutuante trajando uma mortalha rasgada com mãos longas de unhas pontudas.

Seu grito soou no pensamento enquanto abria a boca. Havia torcido o tornozelo, não demorando a ser pego como uma presa de águia e por fim levado a uma caverna escura.

Teria sido mais reconfortante perceber que tudo não tinha passado de um pesadelo comum. Isso seria possível caso ele acordasse. Na sua cama, o homem estava com a boca aberta e rasgos no pijama azul e abaixo deles cortes profundos que manchavam as cobertas de sangue fresco.

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CAPÍTULO 12: BICHO-PAPÃO 

Departamento Policial de Danverous City 

Frank, na entrada, observava o topo do prédio que considerava algo próximo de um segundo lar. Assentiu para si mesmo, tranquilo e esbanjando uma auto-estima renovada.

- É isso aí. De volta ao trampo. - disse ele, logo adentrando e preparado para novos trabalhos contra ameaças paranormais que só a sua amada cidade pode oferecer diariamente.

Chegara rápido no corredor no qual estava a sua sala e sacou a chave, mas constatou que alguém tinha entrado antes e simplesmente abriu. Uma pasta fora deixada na sua mesa.

- Ora essa... Ela preferiu escrever um resuminho qualquer do que me mostrar pessoalmente? - se perguntou ele, pegando o documento.

- Bom dia, detetive número um! - disse Carrie, entrando, num tom alto que assustou Frank - Nossa, calma aí... - ela quase ria.

- Que belo susto hein... - disse Frank, envergonhado por ter tremido - Excelente bom dia. Idem.

- Desculpa, foi mal. E desculpa também por ter largado o caso na espera de que você lesse, carregasse as armas e se lançasse na caçada. Opa.. acho que especificamente esse não precisa de armas.

- Já peguei uns detalhes lendo os jornais de ontem. - disse Frank olhando os papéis - Cerca de 5 pessoas foram achadas mortas em seus quartos pela manhã bem cedo, com exceção de um morador na periferia cujo corpo foi encontrado num estado avançado de decomposição. O cara morava sozinho e pelos relatos todos o achavam esquisitão, por isso ninguém dava bola.

- Pra quem sonha em morrer dormindo, essa situação é um bom exemplo pra repensar. - disse Carrie.

- Tipo você? Não que eu me lembre de... Ahn, esquece. Nunca conversamos sobre isso.

- Não imagino outra forma melhor de morrer, mas isso é uma grande questão de opinião. Viu aí o enorme ponto em comum? Todas as vítimas mortas por falta de sangue em decorrência da profundidade dos cortes que parecem ser bem selvagens.

- Sim, tô vendo uma foto. Mas não é sério que você tá imaginando ser um monstrengo do tipo lobisomem ou outra coisa parecida né? Elas nem sequer acordaram, não mostraram resistência...

- Não tô teorizando nada. Você ficou bem enferrujado mesmo. Quero o antigo Frank de volta. O atual se assusta com pessoas vivas que o flagram sozinho.

- É... você tá certa. - disse Frank, suspirando - Três meses e uns dias foi pra acabar com meu rendimento. Vou precisar retreinar hábitos pra não acabar virando um medrosão covarde. Porque você sabe... eu quis fugir disso tudo, de toda essa droga sobrenatural. Mas é o meu destino. Meu pai não estaria nem um pouco orgulhoso... - ele fez uma pausa, fechando os olhos - Voltando ao caso...

- Olha na última página. Vai te atrair rapidinho. - recomendou Carrie.

- Geralmente as últimas páginas são bem chatas. Vamos ver... - disse Frank, folheando e lendo em seguida - Isso é uma luz no fim do túnel pra um caso aparentemente sem solução. Alguém que sobreviveu pra contar, uma garota de 11 anos chamada Lauren Blake... ela mora com os pais, tem uma vida normal, mas andou tendo pesadelos recorrentes e procurou as autoridades ao se informar das mortes. Ela só tem leves escoriações. Então é isso, o nosso monstro invade sonhos. Freddy Krueger que se cuide, concorrente na área. Vou até lá conversar com ela.

- OK, lembra de me ligar e você sabe... eu também te ligo se achar alguma história correspondente...

- Eu sei, Carrie. - disse Frank, parando na porta ao olha-la - A gente segue nesse processo, nossa rotina de sempre. Talvez eu realmente não dispare nenhuma bala hoje.

- Ahn, Frank, espera. - pediu a assistente meio insegura - Você está bem?

O detetive ficou uns segundos silencioso um tanto confuso.

- Não é o tipo comum de pergunta que se faz.. em pleno início de um dia de trabalho... - disse ele, incerto - Olha, tô me sentindo ótimo. Sem querer forçar nada, mas falo a verdade. Me sinto bem.

- Tem mesmo certeza? - insistiu Carrie, séria.

- Eu vou correr atrás do tempo perdido e até que eu consiga isso... o seu querido velho Frank estará de volta. Eu prometo. - disse o detetive - Te vejo mais tarde. - fechara a porta.

O celular da assistente tocara assustando-a da mesma forma que Frank minutos antes.

- Diretor, o que foi? Meio raro me ligar do seu santuário. Tô na sala do Frank e com um caso pra resolver, então melhor ser breve.

- Acha que tenho coragem de tomar o tempo alheio quando nem mesmo eu me atrevo a procrastinar no meu? - questionou Ernest na sua sala - Ouça, Wood... Tem notícias da Megan?

- A má notícia é que você ficou sem uma secretária. A boa é que ela finalmente deu no pé.

- O que é isso? Não brinca comigo, por favor. Ela era competente de tal modo que nunca abandonaria sem dar satisfações. Mas desapareceu. Eu tinha dado férias.

- E pelo visto ela prolongou. Já entrou em contato?

- Nada funciona. Nenhum telefone, nem e-mails... Me recuso a aceitar que ela desertou. Sei que não vai com a cara dela, mas... podia fazer por mim uma última tentativa?

- Por que? Eu tenho que reconhecer, ela era certinha no trabalho, soa estranho ela desaparecer...

- Pra descobrir outras formas de contato terá que verificar os pertences dela no armário. Venha aqui e lhe dou a chave. Eu estou atolado, diria que até mais do que você e o Frank.

A assistente viu ali uma oportunidade inescapável. "A vadia deixou itens no armário... Interessante."

- É pra já, chefinho.

                                                                                   ***

A casa da família Blake parecia ser a mais atrativa da vizinhança. Frank bateu educadamente na porta, logo sendo atendido pela mãe de Lauren, Donna - uma mulher de trinta e poucos anos com cabelos castanhos que caíam aos ombros e em fios bem cuidados. Ela deu um sorriso amigável ao detetive como prova de sua gentileza.

- Ah sim, o senhor deve ser mais um investigador profissional que veio apurar sobre o caso das pessoas que não puderam viver um novo amanhã.

- Sim, eu mesmo. Muito prazer, sou o Frank. Frank Motngrow. - disse ele, mostrando o distintivo - A sua filha tá por aí? Gostaria de bater um papinho já que ela tem ligação e é uma sobrevivente. Na verdade, o fato dela resistir ao que quer que seja o causador disso... eu chamaria de milagre.

- Acredite ou não, consideramos a ajuda de um padre, mas...

- Mas eu a convenci de que não perderia tempo esperando milagres acontecerem. - disse o pai de Lauren, George Blake, homem caucasiano com cabelo preto e curto partido ao lado em diagonal e vestindo uma camisa azul - Queremos a nossa filha bem não importa o que seja.

- Eu posso entrar? - indagou Frank - Espero não incomodar, eu só...

- Tudo bem, a Lauren tá lá em cima estudando. - disse Donna, hospitaleira - Fique à vontade. Não ligue se o George intimida-lo, ele tem agido desconfiado com pessoas da lei ultimamente.

- Pois já vou logo avisando que sua filha vai tá em boa companhia. - disse Frank, bem-humorado, estendendo a mão para George que recusou em desprezo - Ajudarei com o que posso. Garanto. - falara, logo subindo a escada. Donna lançou um olhar reprovador ao esposo.

O detetive bateu na porta no mesmo tom de antes. Lauren, uma garota de pele parda clara - como a da mãe - e cabelos negros longos - desviou os olhos do caderno.

- Pode entrar! - disse ela - Mãe? Pai? Não ligo quem for, já tô terminando.

- Olá... - disse Frank, entrando - E aí, Lauren? - acenou à ela sorrindo - Eu sou o Frank, detetive encarregado de ajudar pessoas que acreditam que não podem ser salvas.

- O meu pai não gosta muito de detetives. - disse ela - Mas você parece legal. Eu sinto muito...

- Pelas vítimas né? Entendo. Ahn... - disse ele olhando em volta - Posso pegar esse banquinho?

Lauren fez que sim com a cabeça, bastante séria.

- Obrigado. Err... - pigarreou - Soube que você vem tendo pesadelos que se repetem... e amanheceu com machucados no corpo, feridas leves comparadas ao das outras cinco pessoas azaradas. É isso?

- Verdade. - disse Lauren, mostrando seu braço esquerdo com a marca de arranhão - Foi tudo culpa do Bicho-Papão, tudo isso tá acontecendo por causa dele, eu juro. Acredita em mim, por favor.

- Olha, Lauren... Terei que ser honesto com você, pelo menos somente com você por enquanto, os seus pais ainda não sabem. Não sou investigador comum, digamos que eu... seja um aventureiro. Do tipo que pega qualquer coisa fora do normal. Simplificando, sou um caçador.

- Um caçador... de assombrações? Mentira... - Lauren formava um sorriso.

- É sério, já encarei muita coisa que faria até inveja aos melhores cineastas de terror. Mas Bicho-Papão pra mim até agora era pura lenda. Eu acredito em você. Pode me contar.

- Eu... não só vejo o Bicho-Papão me perseguindo nos sonhos, sempre o mesmo sonho... como também vejo gente morta. O meu irmão que morreu quando tinha minha idade. Mamãe já me levou na terapia várias vezes e todo esse pesadelo continua repetindo, repetindo... sem parar. Mas o Bicho-Papão só apareceu uma vez e eu sabia o que ele queria... Acho que ele quer engolir minha alma.

- Vê fantasmas... Escapou de uma entidade paranormal devoradora de almas... É, acho que não há tanto mistério quanto eu pensava. A conclusão é que você é especial, Lauren. Te prometo que vou achar uma forma de afastar essa coisa do mal que perturba seu sono. Eu vou voltar. Tá legal?

- Obrigada mesmo, senhor Frank.

- Me chama só de Frank. - disse ele, dando uma piscadela para a garota.

Enquanto se distanciava da casa, andando por uma calçada, Frank ligava para Carrie.

- E aí, tigrão? Está carregado de informações? - perguntou ela.

- Quem me dera. Tô saindo agora da residência dos Blake.

- Estou online no Twitter agora, podia ter comentado isso.

- A única rede social que costumo acessar é uma sala de bate-papo sem nenhuma popularidade. Normalmente converso com uns caçadores, até mesmo a Natasha aparece umas vezes...

- Não menciona o nome da minha deusa do rock agora, estamos no meio de um caso difícil, é arriscado me desconcentrar...

- Tá, tudo bem, já entendi. Escuta só: A Lauren entra em contato com fantasmas, na verdade apenas um que é um ente querido morto, mais precisamente um irmão que morreu com a mesma idade dela.

- Mas o que explica os arranhões e ferimentos? - indagou ela, logo ignorando a pergunta - Ah sim, lembrei, ele tinha pesadelos, você falou em Fredy Krueger, então... pode haver uma entidade semelhante. Estou pesquisando agora...

- Ela chamou a coisa de Bicho-Papão. Me fez até um desenho pra representar... Só um minuto, vou te ligar de novo, vou tirar uma foto. - disse Frank, sacando o desenho e fotografando-o. Imediatamente retomou a ligação com Carrie após enviar a imagem - Checa aí no celular.

- Ela dá uma ótima artista. Bem medonho. Parece uma criatura das sombras que vaga por cemitérios.

- Desenhou tão bem que acredito ser mais sinistro pessoalmente. Encontrou algo sobre Bicho-Papão?

- Tem uma infinidade de representações e perspectivas do que seria essa tão temida criatura. Pode ser o velho do saco, a coisa que se esconde no armário ou embaixo da cama ou até a própria fada dos dentes. Pode ser inúmeras coisas: Um monstro devorador, duende, fantasma, bruxa, humano... Não existe uma concepção fixa. Resumo da ópera: Qualquer ser sobrenatural sem um nome específico e com intenções de tirar algo de sua vítima é considerado um Bicho-Papão.

- OK, captei a mensagem. O monstro sem nome persegue as pessoas nos sonhos ou distorce transformando em pesadelos. O que tá me encucando é a Lauren conversando com o irmão fantasma.

- Frank, vamos ligar os pontos. Ela foi a única de um total de seis vítimas até o momento que escapou por um triz. Se existe um grupo de pessoas capaz de estabelecer contato com fantasmas... e ainda por cima fugir da morte por causa sobrenatural... Primeiro tenho que te perguntar: Acredita em mediunidade? - fez uma pausa - Diz que sim, diz que sim.... - falou baixinho.

- Estúpido você me perguntar isso hein. Não existe nada teoricamente bizarro ou anormal que eu não consiga acreditar. Eu sei dos médiuns, mantém ligação com os mortos entrando num tipo de plano astral. - fez uma pausa meio longa - Será que a Lauren tem esse poder?

- Normal você achar que não tinha nenhuma conexão por saber pouco deles. Vou te enviar o endereço de um que mora a três quadras da minha casa. - disse Carrie, mandando por celular - O nome dele é John Cober. Inclusive, tenho uma tia que faz sessão espírita com ele regularmente.

- Ótimo. Vou considera-lo minha última esperança. O casal Blake não pode perder mais um filho. - disse Frank, logo desligando e conferindo a caixa de mensagens - Sr. Cober, aqui vou eu.

                                                                                  ***

O sempre solícito John Cober estava em plena sessão com algumas mulheres. Uma delas, chamada Veronica, que ostentava roupas pretas de grife, olhava com expectativa para o médium que concentrava-se para imergir no plano astral e contactar um espírito - no caso, o falecido marido dela.

Cober era um homem de 42 anos, rosto meio redondo e cabeça meio calva. Seus olhos fechados apertaram numa expressão mais séria, preocupando Veronica.

- Por favor, Sr. Cober, dê algum sinal, uma resposta. Consegue vê-lo? Ele está aí?

- Vá embora... - disse Cober - Vá embora...

- O que foi? Tem algo perturbando o senhor?

- Eu já disse... Vá embora! Vá embora! - disse Cober, aturdido, logo abrindo os olhos - Eu lamento, Sra. Madson, mas não encontrei seu esposo, tive que dobrar meus esforços para... repelir alguns empecilhos. Se queria um sinal, receio que... o cenário não seja dos melhores. Ele estava perto. Pude sentir. Mas as forças malignas podem ocultar a luz que alguém como eu busca para ajudar.

A campainha tocara, quebrando o clima.

- Me deem licença. - disse Cober, levantando-se. Abrira a porta, deparando-se com Frank - Eu posso ajudar?

- Sabe, é uma boa pergunta. - disse o detetive - Você é John Cober? Só pra me certificar...

- Mas é claro. O que deseja? Aliás, o que um homem claramente a serviço da lei faz aqui?

- Vim atrás de respostas que somente você pode me dar. A gente pode conversar?

Um tanto relutante, Cober ficara pensativo por um instante. Resolveu ceder à visita.

- Estava no meio duma sessão. Pela sua ocupação e a forma como fala, deve ser muito importante. Vou dispensa-las. Entre. - disse, gesticulando com a cabeça permitindo a passagem.

Após suspender a sessão, Cober chamara Frank para falar a respeito do caso na cozinha.

- Isso... é uma descoberta realmente impressionante. - disse John sobre Lauren - Eu costumava enxergar inúmeros fantasmas acorrentados ao plano terreno, bons e maus, mais maus do que bons. O plano astral é um lugar inconstante, imprevisível e não é para qualquer iniciante, mesmo tendo sobrevivido a um ataque sobrenatural.

- Olha, a Lauren, até onde sei, não visitou essa dimensão astral que você diz... É um lugar onde os espíritos geralmente se cruzam e tratam como um lar?

- Não é exatamente um Céu ou Inferno, está mais para um ponto de fixação. Apenas os que estão presos sem passagem a algum outro plano como um destino concreto após a morte... é que habitam esse lugar que eu não recomendaria à essa garota visitar.

- E sabe alguma coisa sobre o Bicho-Papão? Já ouviu falar? Um invasor de sonhos que há poucos dias matou cinco pessoas. Lauren por pouco não foi a sexta. - disse Frank, sentando à mesa.

- Ele é uma entidade obscura... que nós médiuns facilmente podemos driblar. Temos resistência espontânea a ações de seres como ele. Falo por experiência própria, Sr. Montgrow.

- Nada de formalidade. Me chama de Frank. Somos parceiros nessa.

- Não teria tanta certeza. Enfrentar aquele monstro novamente... para salvar uma vida pode acabar dando muito errado. Acontece que os médiuns embora praticamente imunes, até os mais experientes como eu... são suscetíveis a um corrompimento uma vez que suas almas são capturadas.

- Que tipo de corrompimento? - perguntou Frank, estreitando os olhos.

- Do tipo que nos transforma em algo tão vil quanto ou até mesmo pior que ele. Existe um jeito de mostra-lo. Podemos ser parceiros numa viagem aos sonhos. O que acha?

- Espera... Não gosto de como isso soa. - disse Frank, temeroso.

- Vem comigo. Precisamos nos preparar. - disse Cober, andando até à escada que levava ao quarto.

Já presente no recinto, ambos se acomodaram para a experiência que levaria Frank a conhecer o monstro que aterrorizava pessoas ao manipularem seus sonhos. Cober pegara um pêndulo dourado.

- Deite-se. Para que o processo funcione, vai precisar de um sono bem profundo.

- Vai me hipnotizar? - indagou Frank, deitando-se na cama - Deixa ver se eu entendi: Médiuns podem espionar os sonhos alheios com algum tipo de conexão?

- Essa cruz... - olhou para o objeto de madeira marrom escuro com uma espécie de insígnia prateada manchada com sangue seco - ... será nosso amuleto da sorte. Não é nenhum efeito baseado em religião. O segredo está nessa insígnia... com meu sangue. Por isso nos manterá seguros.

- Entendido. A cruz basicamente será nossa âncora. - disse Frank.

- Nossas mentes vão estar conectadas. A hipnose vai acelerar o estado REM do sono. - disse Cober, balançando o pêndulo de um lado para o o outro - Agora relaxe... relaxe profundamente... desprenda-se dos problemas... esqueça que viveu dias ruins... só encontre a sua paz interior...

Os olhos de Frank acompanhavam os movimentos do pêndulo até que suas pálpebras pesaram.

- Está funcionando... Relaxe... Relaxe... - dizia Cober, suavemente. Frank dormira em poucos minutos. Sentando-se na cama, o médium pegara a cruz na mão direita e com a outra segurou a mão esquerda do detetive logo fechando os olhos. A imersão não demoraria.

Em poucos instantes, o pesadelo de Frank se desenhava para Cober que se viu num celeiro à noite. Logo avistou Frank diante de uma criatura caída.

- Frank! - disse Cober, correndo à ele.

- Essa não... foi tão rápido. - disse Frank, atordoado - Olha, retiro o que eu disse. Isso foi uma péssima ideia. E-eu... quero acordar. Por favor, tira a gente daqui...

- Escute, Frank. Pela velocidade que chegamos à esse sonho, certamente você o tem muitas vezes. Não é? Um pesadelo recorrente. Parece real, mas é só uma repetição...

- E quanto mais se repete mais eu sofro! - disse Frank, aborrecido - Mas está diferente...

- Em qual detalhe esse sonho se diferencia dos outros?

- O meu pai... é esse monstro que tinha acabado de matar. - disse Frank, olhando para o revólver na sua mão - Por ignorância, claro. Ele volta ao normal, nos falamos um pouco e de repente...

Uma corrente de vento frio os acometeu. Ao virarem-se, deram de cara com o Bicho-Papão, o ser flutuante sem rosto coberto por uma mortalha esfarrapada.

- Vamos dar no pé, rápido! - disse Frank, pegando Cober. Chutou uma parede de madeira do celeiro várias vezes e correra para fora ao lado do médium.

- Frank, fugir dele é inútil! - disse Cober, olhando para trás. A criatura os perseguia com seu som amedrontador de mil sussurros, balançando os dedos com unhas grandes.

De repente, o Bicho-Papão emergia da terra como se atravessasse-a e para Frank parecia que estava crescendo de tamanho.

- Isso é brincadeira né? - Frank pegara uma galho para espanta-lo. - Não posso matar esse desgraçado com balas, preciso ao menos intimida-lo!

- Pensa em assusta-lo com um galho?! - disse Cober - Confie em mim. Pra trás. Agora!

- O quê? O que você vai fazer?

- Eu mandei se afastar, Frank! Você é o mais vulnerável aqui! Afaste-se!

O Bicho-Papão avançara com um urro gutural preparando suas garras, mas Cober concentrou sua vontade fazendo emanar dentro de si uma luz refulgente que fez Frank proteger os olhos.

Subitamente a criatura sentiu-se empurrada, distanciando-se com rapidez. A luz não parava de crescer. No plano físico, Cober sentia efeitos colaterais externos como sangramento nasal. A cruz começava a emitir labaredas que aumentavam. Frank despertou sobressaltado.

O médium largara a cruz que pegava fogo, levantando-se.

- Cober, você tá bem? - perguntou Frank - Dá pra ver que saiu no prejuízo...

- Não, está tudo bem. Me excedi um pouco. - disse ele, limpando o sangue - Agora você sabe...

- Gostaria de ficar sem saber. Tenho que ser grato, mas ficou uma dúvida... Se o sonho pertence a mim, então por que pareceu que você controlou toda a situação com aquela super-luz cegante?

- Esqueceu que sou um médium experiente? Tomei a liberdade de proteger você pelo fato da minha condição permitir. Em outras palavras, com nossas mentes ligadas, foi possível ser parte do sonho como se o poder de comanda-lo também fosse meu. O amuleto se destruiu com meu esforço.

Frank sentia um desconforto no antebraço esquerdo e verificou. Achou uma marca semelhante a uma mordida que queimou sua pele.

- Era só o que faltava. Fui ferido por ele e olha que não encostei um dedo.

- Não é qualquer ferimento. - disse Cober, atônito - É um aviso.

Enquanto isso, no DPDC, Carrie vasculhava o armário particular de Megan. Encontrara diários envelhecidos com páginas amareladas. O conteúdo possuía palavras em linguagem arcaica com símbolos inconfundivelmente relacionados ao sobrenatural.

- Ah, como o diretor vai adorar isso. Saber que sua ex-funcionária favorita gosta de brincar com um kit de mágica. - disse Carrie, contendo sua surpresa.

                                                                                 ***

- Como é? Então significa que... - disse Frank, meio embasbacado - ... tô na mira do Bicho-Papão por ter me aproximado demais. A explicação pra isso foi você ter me salvado, certo?

- Não exatamente. - disse Cober, sério - Por dois fatores: A regressão e a ligação mediúnica. Eu te pus em perigo. Agora o próximo sono é decisivo para a coisa devorar sua alma.

- Quando ele devora almas o que acontece exatamente? O meu pai foi caçador, mas nada tinha no arquivo sobre esse miserável. O desenho que a Lauren me fez realmente é bem fiel.

- Promete não surtar depois que eu disser?

- John, eu levei essa vida inteira de caçador tentando não surtar. A prática leva à perfeição.

- Está bem, vou contar. - disse Cober, respirando fundo, preocupado - Demônios.

- O que tem a ver ele com os demônios?

- Fabricação em massa. Bichos-Papões vem ao plano terreno... unicamente para perverter almas humanas coletadas e criar novos demônios. Devia ter falado isso antes...

- Olha, tá se estressando à toa, não foi culpa sua. - disse Frank, aproximando-se - Me responde uma coisa: Se o Bicho-Papão tem todo esse poder... então porque nunca tiveram registros evidenciais das ações deles pelo mundo?

- A influência atual dele tem um significado ainda mais terrível. Você, como caçador, devia se preocupar. O local de origem dos demônios está escasso e por isso o Bicho-Papão necessita criar mais. O plano terreno por sua vez... pode estar completamente infestado dessa praga.

Frank emudeceu por um tempo, refletindo.

- Vou acabar com isso essa noite. - decidiu ele - E você vai me ajudar. A Lauren é igualzinha à você e merece ser salva, então digamos que me tornarei a isca.

- Médiuns inexperientes tem poucas chances de sobrevivência na segunda vez. Você acha mesmo que ela é capaz de servir como âncora? Disse que ela tem 11 anos, muita pouca idade para um trabalho pesado. Mas se quer um conselho, o melhor é bani-lo pelo lado de fora.

- E como eu faço isso? Arranca-lo do meu sonho?

- Fortalecendo sua mente ao máximo para controlar o sonho junto ao poder que a garota precisa exercer pra afasta-lo. Eu sei que é possível e você consegue.

                                                                                      ***

Como anteriormente planejado, Frank voltara à casa dos Blake em plena noite. À medida que apressava o passo, sua ansiedade elevava. Por sorte, a luz da entrada estava acesa. Bateu na porta com rapidez. "Contanto que a filhinha de vocês não esteja dormindo..."

- Detetive Montgrow! O que faz aqui tão tarde? - perguntou Donna, arqueando as sobrancelhas.

- Sra. Blake, será que dá pra me deixar falar novamente com a Lauren, é que...

- Donna, o que está havendo? - perguntou George.

- Ih, chegou George, o curioso... - disse Frank, baixinho.

- Ahn... o detetive, ele só... Desculpe, mas pra quê mesmo voltou?

- A sua filha corre sério perigo, não há tempo pra explicação. Como um federal de respeito, somente entro com permissão concedida. É uma emergência.

- Que história é essa? - indagou George, irritado - Nossa filha não tem mais nada relacionado às pessoas que morreram em pleno sono. O que tem a provar para ter nossa permissão?

- Falei que não tem tempo pra explicar. - disse Frank, o tom duro - Ou me deixam entrar...

- Ou o quê? - desafiou George, mostrando-se bravo.

- Chega George! - disse Donna, contendo-o - O detetive precisa que confiemos nele.

- Não tá vendo o que ele tem na mão? - perguntou ele, logo voltando-se à Frank - Qual é a da cruz?

- Sr. Blake, por favor, tenta confiar em mim, é complicado... Eu tô tentando ajudar. Facilita.

- Deixem ele entrar. - disse Lauren, interferindo. A garota estava de pijama - Eu confio nele.

- Ufa, que bom você ainda estar acordada. - disse Frank, sorrindo fraco.

- Tudo bem, detetive. - disse Donna - Presumo que descobriu o problema da Lauren. Com os pesadelos e a correlação com as mortes. Não sou tão cética quanto meu marido.

George grunhiu bufando ao ver Frank entrar e direcionar-se ao quarto pegando na mão da Lauren.

- Não tô gostando nada disso. Se acontecer alguma merda, juro que expulso ele, nem que no final eu vá ser denunciado ou preso. Antes a cadeia do que um funeral.

- Sinceramente, não sei mais lidar com essa sua paranoia. - disse Donna, sentindo-se farta daquilo.

No quarto, Frank sentou-se com Lauren na lateral da cama.

- É confortável. Vai ajudar bastante.

- Ajudar em quê? Mamãe falou que descobriu o meu problema. O que eu não sei? Vai, fala.

- Olha, princesa... Te disse mais cedo que era especial né? O que eu soube me convenceu ainda mais.

- Então por que precisa de mim pra vencer o Bicho-Papão?

- Quero salva-la. O único jeito de tirarmos ele do mundo dos sonhos depende de nós dois. Assim vamos estar até mantendo muitas outras vidas salvas por um longo tempo. Pode acreditar.

- Sabe... Eu contei pros meus pais que você caçava monstros. - disse Lauren, um pouco desanimada.

- Pela sua cara dá pra saber como reagiram. - disse Frank, amigável - Você tem que entender... que vai ser muito útil no que faremos daqui à pouco. Só temos esperar um amigo meu chegar.

A campainha foi tocada e Donna levantou-se mais rápido que George que pretendia atender.

- Quem é você?

- Alguém chamado Frank está aí?

- Sim... O detetive Montgrow, veio cuidar do caso da minha filha... O que te diz respeito?

- Ele esqueceu de mencionar minha ajuda essencial pra salva-la. Por gentileza, me deixe entrar. - pediu Cober, determinado.

O médium entrara no quarto já com o pêndulo preparado.

- Já não era sem tempo. - disse Frank - Bora lá? - deitou-se na cama - Lauren, segura minha mão.

- O que eu tenho que fazer? - perguntou ela, aflita.

- Reúna dentro de si toda a força de vontade que o seu poder médium alcançar. - disse Cober - Conversa com fantasmas, então é uma médium. Eu também sou. Feche os olhos.

Lauren o fizera, tranquilizando-se e segurando um pouco mais forte a mão do detetive.

- Para acessar a dimensão astral requer um excelente foco. Concentre-se apenas nisso. - disse Cober, balançando o pêndulo para adormecer Frank - Vamos, Frank... Relaxe bem os músculos...

- Mas... o Bicho-Papão, ele quer devorar minha alma... - disse Lauren.

- Ultrapasse esse medo. - orientou Cober - O poder de um médium é mais forte que a escuridão dessa criatura. Conectou-se com Frank de maneira externa. Pode fazê-lo internamente também.

- Eu acredito. - disse a garota, canalizando seu foco.

Frank acordou no mesmo local do seu sonho: a fazenda cujo celeiro serviu de palco da sua batalha contra a besta de Vanderville. Levantou-se, confuso.

- Estou fora do celeiro... Caramba, que frio. - disse ele, logo virando-se e encontrando Lauren - Opa...

- Frank... Onde a gente tá? - perguntou, esfregando os braços - Tá frio...

- É, também senti. Ele tá perto, sem dúvida. Não fica com medo, tá? Vamos proteger um ao outro.

Lauren assentiu com a cabeça.

- Aqui é o seu sonho? Por que... é tão triste?

O detetive baixou um pouco a cabeça, sem ideia de como descrever. "Controlar o sonho..."

Cerrou os punhos e fechou os olhos apertadamente. Os rosnados distantes da besta pararam.

- Que barulho era esse? Parou de repente... - disse Lauren.

Frank andou até o celeiro e espionou pelas brechas da parede de madeira. Não havia sinal algum da besta encontrado ali para o seu grande alívio.

- Ela se foi. Consegui. Eu manipulo esse sonho... Ainda não é suficiente. - tentara novamente. Uma corrente de vento fez voar as folhas secas do solo. O Bicho-Papão retornava com seu sussurro medonho. Lauren se amedrontou de início, mas lembrou do conselho de Cober.

- Frank! Ele chegou!

O detetive mantinha-se focado no seu desejo de vencer a atmosfera do pesadelo. No horizonte despontava a luz do sol e o céu clareava em tons de laranja e vermelho.

O Bicho-Papão aproximou-se de Lauren tentando toca-la com suas garras afiadas. Olhou para o fundo abismo da "face" do monstro envolto pela mortalha.

- Já não tenho mais medo de você.

Lauren gritara emanando com toda a força a sua luz interior, barrando a criatura que respondeu mal.

O nascer do sol correspondeu à vitória sobre a escuridão que ameaçava os dois. O urro cavernoso que saía por aquela face escura e sem nada diminuía. O Bicho-Papão fora sugado, das pontas baixas de sua mortalha rasgada, por um tipo de portal invisível como um vórtice.

A dupla acordou simultaneamente. O Bicho-Papão por sua vez estava flutuando no quarto.

- Fica atrás de mim Lauren! - disse Frank, levantando-se depressa e pegando a cruz, logo apontando-a para a criatura. Deu mais alguns passos intimidando-a. - Vai embora, bicho horroroso!

A cruz utilizava-se como arma mortal para bani-lo do plano terreno. Cober havia feito uma nova.

- Anda, vai! Volta pro inferno de onde você veio! - disse Frank, aproximando-se. O monstro afastava-se lentamente. O detetive ficou impaciente. - Tá legal, você que pediu! - jogara a cruz nele. A mortalha pegara fogo num simples toque do objeto, o enlouquecendo.

O Bicho-Papão atravessou a parede passando pelos corredores completamente atormentado, o fog alastrando-se por ele. Parou de volta ao quarto de Lauren, mergulhando no chão como uma fumaça negra. Após ele ir embora, ficou no piso a marca chamuscada em brasas.

- Isso... foi mesmo assustador. - disse Lauren, aturdida, logo abraçando a Frank que olhava a marca no chão. A marca no seu braço, por sinal, havia sumido. Porém, um detalhe foi relembrado: Aonde estava Cober?

O casal Blake veio correndo ao quarto.

- Lauren! - disse Donna, recebendo um apertado abraço da filha.

- Missão cumprida. - disse Frank - Essa princesinha tem garra.

- Obrigado. - disse George - Seja lá o que tenha acontecido aqui... Fico feliz por vê-la feliz.

- Err... Onde tá o meu amigo? Não ficou esperando?

- Nos explicou a situação e depois foi embora dizendo ter um compromisso. - disse Donna.

O detetive ficou a pensar nisso por uns bons minutos, um tanto desconfiado.

                                                                                     ***

No dia seguinte, alguém resolvera visitar o relativamente famoso médium do bairro, John Cober.

- Olá, eu posso ajudar? - perguntou ele, fitando o rapaz de terno e gravata de cabelo meio raspado.

- Responda primeiro: Você é o médium do qual muito se tem falado por essas bandas?

- Sim... O que deseja?

O homem fora entrando na casa sem autorização.

- Perdão, mas não é educado invadir assim. Me diga logo: Quem é você?

- Sr. Cober, venho avisa-lo de que há pessoas da alta escala paranormal que requisitam muito suas habilidades. - disse ele, rapidamente agarrando o braço direito de Cober. Seus olhos tornaram-se pretos - Diga adeus à sua antiga vida. Garanto que sairá bem recompensado. - sorriu canalha.

Num flash, ambos desapareceram como se tivessem sido teletransportados, deixando a casa sozinha.

O celular em cima da mesinha dele tocara... indicando na tela ser uma chamada de Frank.

                                                                                 -x- 

*A imagem acima é propriedade de seu respectivo autor e foi usada para ilustrar esta postagem sem fins lucrativos. 

*Imagem retirada de: https://www.fatosdesconhecidos.com.br/como-surgiu-historia-bicho-papao/

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