Frank - O Caçador #32: "Sobrecarga"


Um dos poucos caçadores a não decretar a aposentadoria precoce ou não ser internado numa clínica psiquiátrica, Oleg estava no seu quarto com o celular tocando incessantemente sobre a cômoda. O smartphone vibrava se movendo quase que prestes a cair do móvel. Além do toque ininterrupto, várias mensagens de pessoas solicitando ajuda para casos sobrenaturais excediam a caixa de entrada. Mas naquele quarto, Oleg estava caído desacordado no chão de barriga para baixo.

Movidos pela emergência, dois caçadores que o conheciam muito bem arrombaram a porta da frente. David, um homem de porte atlético e com aspecto meio nórdico na face e uma barba relativamente cheia, invadia o quarto de Oleg e logo que o achara naquele estado não demorou para se agachar e verificar o pulso.

- Droga, Oleg. - disse ele, atordoado por comprovar o óbito - Ray! - chamou o amigo, porém notou o celular que parara de tocar, mas a tela ainda emitia luz. Conferiu as inúmeras mensagens não respondidas, além das chamadas ignoradas - Praticamente todas ao mesmo tempo. É tão absurdo. Mas não tem nada demais se atender pelo menos uma.

Ray, o companheiro baixinho e careca de David, se dirigia ao porão e descobriu um cativeiro com uma porta de ferro no qual Oleg havia mantido algo aprisionado. O caçador aproximava-se com a arma em riste, sentindo-se preparado para qualquer surpresa. Ele pulou para trás ao ver a pata, aparentemente de um leão, de um animal batendo contra as três pequenas grades da abertura. Mas certamente não abrigava um animal selvagem comum, percebendo-se através dos rosnados.

Pondo o cano do rifle entre as grades, Ray puxou o gatilho, executando um tiro à queima roupa. Tinha absoluta certeza que acertou a criatura por não ouvir mais sons grotescos. Alarmado pelo estampido, David correu para vê-lo, mas parou no alto da escada que descia ao porão. O companheiro abriu a jaula, vendo a criatura morta com sangue derramando da cabeça.

- Como suspeitei logo de cara... Uma quimera. - disse ele, convicto, olhando o monstro com características múltiplas de várias espécies animais. Ouviu a voz estridente de David lhe chamando - Ei, calma aí, não precisa gritar! Tô vivo, seu idiota!

David retornou ao quarto de Oleg com Ray vindo atrás e entrando depois.

- Quem diria hein. O Oleg mantinha uma quimera sob cárcere, a coitada devia estar mirrada de fome e... Caramba. - disse Ray, surpreendendo-se com o cadáver - Você não disse uma palavra até me trazer aqui só pra fazer suspense e me mostrar...

- Escuta Ray, não é momento de ficar paralisado, em choque, lamentando a morte do nosso amigo, então vou ser direto com você. - disse David mostrando o celular - O celular do Oleg tá repleto de mensagens e ligações pendentes. Atendi uma chamada, alguém que mora à cinco quadras, mas caiu e não quero pensar no pior. Mas quero dar um funeral digno pro Oleg.

- Me deixa ver isso aí. - pediu Ray. David jogou o celular para o amigo - Essa pessoa também mandou mensagem?

- A maioria dos que ligaram também enviaram mensagens, um monte de gente desesperada e em pânico precisando de nós. - disse David, irrequieto, passando a mão no rosto e andando de um lado para o outro.

- Eu vou até lá. Você cuida do Oleg. E o celular fica comigo enquanto isso.

- Enquanto isso uma ova, seu malandro. - repreendeu David, querendo tomar o aparelho - Tá pensando o quê? Que vou dividir toda essa abundância de caçadas com um zé mané feito você? Achei a merda do celular primeiro, nesse caso ele pertence a mim agora. - tirou-o da mão de Ray - Vou resolver o que o Oleg não conseguiu, virei o dono do jogo.

- Pra você é tudo uma competição, né? Cara, se manca: Pelo que eu vi, vai ter que se multiplicar em umas cinquenta cópias de David espalhadas por essa cidade enorme e dominar tudo. - disse Ray - Eu preciso ir, tenho que salvar o máximo que eu puder! E nem você e nem ninguém vai me obrigar a parar. - o caçador saiu do quarto indignado.

Ray saíra da casa indo até seu carro com o qual vieram. David seguiu-o, estressado.

- Não é que queira você de braços cruzados, Ray! Vê se me entende, a concorrência tá pesada e isso tá me incomodando.

- E daí? Somos caçadores, salvar pessoas é o que fazemos. Não estamos num jogo. Não tô nem aí pro que você pensa.

Num ato desvairado, David sacara uma pistola e disparara contra a cabeça de Ray que caiu para frente. O caçador barbudo pegara o carro, ou melhor roubara-o, para seguir diretamente ao local onde o sinal da ligação caiu. Um rapaz escondido nos arbustos observou a cena com um sorriso no rosto.

- Isso aí. Briguem desgraçados, briguem. - disse o jovem de cabelo loiro liso com umas mechas caídas na testa.

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CAPÍTULO 32: SOBRECARGA

A mesa da cozinha de Frank estava lotada de livros, cadernos e diários, todos retirados do arquivo de seu pai para um estudo intensivo em meio à revisões. Frank copiava, repetidas vezes, anotações do pai sobre várias criaturas para fixar conhecimento. O caçador escrevia rapidamente, usando um óculos de grau com armação preta. Ao terminar, recostou-se na cadeira para soltar o ar pela boca num indício de cansaço mental. Ainda nem sabia para qual conteúdo de sua auto-aula seguiria olhando com cara de indisposição para o material volumoso que trouxe. Tirou os óculos e passou a mão no rosto.

- Será que uma dormidinha cairia bem agora? - perguntou ele. Segundos depois o telefone tocara e Frank virou o rosto imediatamente - Ou depois de esticar as pernas. - disse, levantando-se depressa para atender - Alô? Frank Montgrow ao...

- Eu sei quem você é! Um dos melhores detetives de coisas assustadoras! Vem voando pra cá, por favor! Aaaahh!

- Ei, calma, senhora... Pode dizer seu nome, por gentileza?

- Dana! Não perca tempo, detetive, não sei por quanto mais posso aguentar me esconder dele! Não adianta, não tem escapatória, fiquei encurralada! Ele tá prestes a arrombar a porta! Tô escondida no armário!

- Tá legal, digo... Entendido, só me fala o endereço. Ah, e que monstro é esse que tá te atacando, Dana? Descreve aí.

- Eu lá vou saber! Pense... sei lá, num cara esguio, horrível, sujo, fedido, pele meio verde e rosnando feito um cão raivoso!

- Deu pra ter uma ideia, uma clara ideia do que é essa coisa. Já tô a caminho, tomara que eu chegue na hora certa.

- Espera aí, o endereço! Minha casa fica na rua Manson, casa 1038! A mão dele atravessou a porta!

- Não demoro, eu juro. Se distancia bem da porta, apesar do refúgio apertado. Tô indo agora!

Frank pôs o fone de volta ao gancho, logo pegando a chave do seu sedã prata e saindo de casa. Assim que entrou no carro, deu a partida para pisar fundo no acelerador e sair rasgando o asfalto. "Ainda bem que não tá chovendo", pensou ele.

Levou cerca de de 18 minutos para chegar à casa de Dana. Frank freara o carro barulhentamente e pulou para fora esquecendo de fechar a porta. Foi ao porta-malas abrir a tampa e pegar um rifle municiado. Destravou a arma e correu para a residência, podendo ouvir os gritos aflitos de Dana. O caçador entrou em disparada passando pela sala de estar. O armário se localizava na cozinha. Frank deparou-se com a porta despedaçada, escutando os grunhidos do ser bizarro e foi aproximando-se cuidadosamente. Num movimento brusco, ficara de frente ao armário mirando a arma.

- Ainda não estudei sobre você. - disse, olhando para a criatura humanoide, magérrima, a pele verde-pântano e com trejeitos de um morto-vivo - Se prepara... - firmou o dedo no gatilho.

O monstro lhe atacara correndo, mostrando suas presas salientes e afiadas. Algo passou despercebido à Frank: as manchas de sangue nos dentes pontiagudos. Seria um tipo de zumbi com características de vampiro? Não havia tempo para pensar.

Frank disparou na cabeça, acertando em cheio. Em seguida mais três vezes no tórax e duas na barriga para derruba-lo completamente. Emitindo seus últimos rosnados, o zumbi pereceu com os buracos de bala sangrando no seu corpo e no meio da cabeça. O caçador adentrou no armário, chutando o cadáver da criatura aberrante para poder passar.

- Dana? - chamou, olhando o fundo escuro - Pra um armário, até que é bem espaçoso. Tá mais pra um depósito pra guardar ferramentas de jardinagem. - disse, pegando a lanterna do bolso do seu sobretudo e ligando-a. Apontou o facho de luz e subitamente veio Dana avançando violenta contra o detetive, além de rosnar semelhante ao zumbi vampiresco. Ela caiu sobre Frank num pulo selvagem. Estava bem claro que a mulher tinha sido infectada pelo zumbi através de uma mordida. Mesmo naquela situação aperreadora, Frank pôde notar os buraquinhos de mordida no antebraço esquerdo de Dana, cuja pele mostrava-se esverdeada, imaginando que ela tivesse contrariado sua recomendação de manter-se afastada da porta, o que foi conveniente ao zumbi agarrar seu braço e morder. Frank a empurrou forte, conseguindo libertar-se para ao menos reaver a sua arma. Rolou no chão pegando o rifle de volta e atirou diretamente no rosto de Dana que caiu morta de imediato.

- A gente nem se conheceu direito, que pena. - disse Frank, triste por ter que assassinar uma vítima.

Mais pares de zumbi-vampírico surgiam invadindo pelas janelas da cozinha e da sala de estar. Frank atirava nos quais podia alvejar conforme ia embora da casa. Correra em retorno ao seu carro poupando o restante que prosseguia a invasão.

- Esses desgraçados parece que brotam da terra. - disse ele, entrando no carro. O veículo partiu cantando pneus. Após dobrar para outra rua, Frank sentiu um clima que aguçava sua desconfiança. Olhou para os lados, vendo os prédios e casas aparentemente vazios assim como o lado exterior. No entanto, isso acabou sendo uma distração, fazendo-o atropelar um dos zumbis vampíricos. O detetive freou na hora, mas hesitou sair para verificar.

- Agora esse dilema. Não tenho certeza se atropelei um inocente ou um daqueles miseráveis. Mas mesmo que tenha sido rápido... me pareceu que é mesmo um deles. - manteve as mãos no volante, suando pela testa, a tensão crescente. Bruscamente, o zumbi reergueu-se batendo contra o pára-brisa, sua boca gosmenta colando ao vidro.

Com o susto, Frank acelerou o empurrando direto a um poste onde imprensou-o e posteriormente deu a ré para bater a dianteira do carro contra ele. Mãos imundas e verdes tocaram nas janelas do carro. O número de zumbis elevava, uma horda que tentava parar o veículo. A aglomeração cada vez mais intensa forçou Frank a bater em retirada, atropelando mais deles, vários ao mesmo tempo. Uma das janelas foi quebrada, o que revoltou-o. Farto do sufoco, o detetive fez o ponteiro do velocímetro girar mais rápido pisando fortemente no pedal e passando por cima do exército de monstros infectantes sem piedade. Muitas cabeças bateram contra o pára-brisa manchando-o de sangue, corpos rolavam por sobre o capô e o teto e as rodas certamente não atravessavam lombadas. Quando ultrapassou o aglomerado inteiro, seguiu livre pela rua.

A chegada em casa foi tranquila na maior parte do caminho. Frank entrara, fechando a porta e encostando-se nela com os olhos fechados. O toque do telefone intensificou sua dor de cabeça. Mas não pensou em recusar uma ligação urgente.

                                                                                ***

À noite, o detetive investigava uma mansão assombrada pelo fantasma de uma noiva vingativa abandonada no altar. A enfrentava num dos corredores, protegido com um círculo de sal, recitando um encantamento para aprisionar fantasmas no mundo espiritual a longo prazo. Travava uma batalha dura entre o seu plano e o poder fantasmagórico dela em direcionar o vento para desfazer a proteção com sal. Porém, Frank finalizou o encanto bem a tempo do círculo não ser desmanchado. A noiva gritava histericamente sendo atraída por uma porta que abriu-se mostrando um vazio de escuridão para o qual a fantasma amargurada foi tragada. Seus olhos fundos e furiosos encaravam Frank com atenção.

- E eu a declaro... neutralizada. - disse Frank, aliviado com o sucesso do plano.

Na volta para a casa, o detetive mal deu dois passos direito pela sala e o telefone tocou. A missão: derrotar um grupo de vampiros que tomaram de assalto uma fábrica com trabalhadores tornados reféns. Ao final, Frank enchera um barril de metal com várias cabeças decepadas de vampiros, praticamente excedendo a capacidade. Derramou gasolina sobre as cabeças e acendeu um fósforo, a chama iluminando seu rosto sério com respingos de sangue.

- Pro inferno, sanguessugas. - disse ele, jogando o fósforo. As cabeças incendiaram, o fogo subindo crepitante.

Voltando para a casa, Frank já não parecia andar como quem conserva energia extra para o resto do dia. Ele já sabia exatamente o que aconteceria logo que cruzasse um cômodo. Fingindo que o cansaço não o atormentava naquele instante, Frank veio ao telefone atender um novo pedido de socorro. Entretanto, sua mão parou poucos centímetros do fone.

- Não tomo banho faz horas, talvez uns dois dias... Nem sequer enganei a fome... Não, preciso seguir em frente, sou um legado.

Pegou o fone, levando-o ao ouvido. Tentou reproduzir o tom que não sugerisse exaustão.

- Alô? Você ligou pra Frank Montgrow, o melhor detetive paranormal da América. Em que posso ajudar?

                                                                                 ***

Quatro dias depois

Frank deixou-se cair para trás na cama, seu corpo prejudicado por um esgotamento físico que ameaçava atingir um nível crítico. Com os braços sobre o colchão, o detetive fitava meio apático o teto ofegando levemente. Não havia parado um minuto para repor as energias de forma saudável. "O que eu tô fazendo da minha vida? Sinto como se meu coração fosse parar. Trabalhei tanto, mas não tô nem um pouco satisfeito. A única coisa que sei... é que se o telefone tocar... não, ele vai tocar daqui à pouco... eu não vou resistir, não posso levar uma culpa por negligência, nunca iria me perdoar por isso."

Ao invés do telefone ecoar seu toque, batidas na porta se fizeram presentes. O detetive levantou-se com dificuldade, sofrendo com o cansaço físico latejando seus ossos e músculos. Andando pela sala, olhou de relance para o telefone, cogitando desliga-lo da tomada, mas descartou. A visita era David que exibiu um sorriso fechado e amigável para Frank que o encarava confuso, embora no fundo algo lhe dizia que aquele rosto de olhos azuis e feições meio nórdicas parecesse familiar nos recônditos da sua memória. David logo se apresentou, disposto a sanar qualquer dúvida que Frank tivesse.

- Ora se não é o ilustre Frank Montgrow quem finalmente reencontro.

- Reencontra? - indagou Frank, franzindo o cenho - Eu te conheço?

- Nossa, também não precisa falar assim. - disse David, levando na brincadeira - Cara, você tá visivelmente cansado, arrisco dizer que desidratado também. Qual foi sua última boa noite de sono?

- Olha, desculpa, sinceramente não tô te reconhecendo. Como se chama?

- David. - respondeu ele - David Rogerson.

- Rogerson... - disse Frank, vasculhando na mente - Espera aí... Tô lembrado agora, eu conheci seu pai... Marlon Rogerson, me embrenhei numas matas com ele caçando lobisomens. Ele só me apresentou a família uma única vez, tinha esquecido do filho dele... Você. Como cresceu hein. Seguiu os passos do velho?

- Pois é, até quatro dias atrás sentia orgulho de me espelhar nele, agora se arrependimento matasse...

- O que você quer de mim? Na certa não veio só de visita. A propósito, como foi que me encontrou?

- Papai sabia do seu endereço, prometia sempre vir aqui jogar conversa fora tomando uma cerveja... mas ele desperdiçou todas as oportunidades antes de partir. - disse David - Tudo bem, aprendi a lidar.

- Caramba... Um dos melhores parceiros de caçada que tive bateu as botas. Mas... E aí, pra quê me procurou? É estranho o telefone não ter tocado até agora, minha rotina virou uma zona, me tornei o caçador mais atarefado dessa cidade.

- É sobre isso mesmo que quero discutir. Preciso da sua ajuda, Frank. Mas é importante que você se ajude. Tem algo muito errado e sinistro acontecendo aqui. Com todos nós. - disse David, expressando sua tensão.

                                                                                ***

Os dois caçadores sentaram-se nos sofás, Frank no menor e David no maior. O detetive não parava as olhadelas nervosas para o telefone, mas tentou se focar no que seu colega de profissão tinha a dizer.

- Pensei numa teoria sobre o que provavelmente tá afetando os caçadores da cidade. É tipo uma bruxaria muito avançada, seja lá o que for tem o poder colossal de um deus. - disse David - Os seus olhos estão pesados, querendo fechar, mas você se sente obrigado a continuar acordado para não perder o próximo toque do telefone e evitar o risco de deixar alguém na mão. O que tá havendo com você e com os outros deve ser algum de transe que mexe com nossos impulsos de caçador.

- Pra um filho de Marlon Rogerson, você é um cara inteligente. - comentou Frank, o tom denotando o cansaço - Sem querer ofender a memória do seu pai, mas... um dos piores defeitos dele nas nossas missões quase impossíveis era a mais completa falta de tino pra investigação. Só pensava em encontrar o bicho e enfiar chumbo grosso nele.

- Frank, o assunto aqui é essa coisa estranha, medonha e misteriosa, não o meu pai, se concentra. A exaustão tá impedindo você de manter o foco. Isso quer dizer que seu corpo pode não aguentar mais uns dois ou três dias ininterruptos de caçada em caçada. O seu coração tá sujeito a uma parada súbita. Como aconteceu com o Oleg, eu e um amigo o achamos morto no quarto dele. Eu quero te deixar bem ciente das consequências de obedecer a essa realidade supostamente falsa.

- Estamos sendo feito de marionetes? Não sinto nada estranho no ar.

- É claro que não. Deixa eu te explicar: Você foi submetido a uma espécie poder hipnótico que condicionou a sua mente a matar monstros sem nenhum descanso. Vai saber quantos ainda restam vivos, jogando esse joguinho de cartas marcadas. - explanou David, preocupando com o estado de Frank - E sabe o quê mais? Essa falha na realidade mexeu também com minha memória. Foi conferindo a lista de chamadas atendidas que pude... despertar. Especialmente por uma chamada.

- Que ligação foi essa que fez você se libertar? - perguntou Frank, desconfiado.

- É um número desconhecido de um caçador chamado Roman. O curioso é que todos os caçadores com quem já cruzei nos últimos dias frequentavam a Sol da Meia-Noite, uma taverna onde os caçadores faziam happy hour toda noite de sexta, mas nenhum caçador com esse nome passou por lá. Você também era um frequentador?

- Justamente nessa taverna que conheci o seu pai, naquela época ele foi o líder do clube, a gente brincava de ser uma sociedade secreta. - disse Frank, tirando as costas do sofá e mostrando-se mais atento - Você veio pra me libertar dessa matrix. Quer me dar a pílula vermelha, né? Eu não tô conseguindo acreditar, meu cérebro tá travado, minha mão tá coçando pra matar monstro - levantou-se depressa - Me meti numa encruzilhada agora: Escolho sair dessa vivo ou morro fazendo o que eu mais amo nessa vida!

- Calma aí, Frank, fica relaxado, não deixa a ansiedade te dominar. - aconselhou David, também se levantando - Estive na mesma situação, fiquei com raiva, achando que ia pirar com essa confusão. Mas fui forte pra me desprender porque questionei, não joguei conforme as regras. Você também consegue. Eu tenho um plano, é pra hoje. Presta atenção: Acho que um único jeito de quebrar o controle nos outros caçadores é reunindo todos eles, nem todos podem ser capazes sozinhos.

- Eu nem sei se tenho os números de telefone. Conheço os caçadores da época que seu pai liderava o clube. Se não forem os mesmos, então não tem jeito de chama-los, vamos ter que... caça-los.

- Talvez hajam alguns na sua lista de contatos, senão todos, não custa checar. - declarou David, esbanjando confiança pelo seu plano - Vem cá, quero te mostrar uma evidência muito conclusiva, mas, insatisfeito que sou, acabei mantendo a teoria.

David saiu para ligar o GPS do seu carro e mostrar um detalhe que reforçaria a libertação de Frank.

- Dá só uma olhada, entra aí. - disse David - O último destino que o GPS registrou. - o detetive, um tanto relutante, adentrou no veículo para conferir e viu a data na tela do aparelho, 07 de julho de 2019, além da localização - Viu? Não é prova suficiente? Eu usei o GPS durante cada dia, pra qualquer lugar onde teria uma missão me esperando. Hoje seria 12 de julho.

- Esse troço tá desconfigurado, não? - perguntou Frank, sua teimosia irritando David.

- Cai na real de uma vez, Frank! Essa situação nos deixou embriagados pela vontade de caçar, caçar, caçar e caçar sem freio e sem se importar com mais nada. Você por acaso lembra de olhar no calendário do seu celular? Qual data consta? Tá cada vez mais óbvio pra mim, estamos presos numa outra dimensão. E não vai achando que não tô apavorado, afinal não sei se meu plano vai funcionar. Mas se sou o primeiro a romper com esse controle, vou até o fim pra que o resto deles faça igual.

Frank retirou o celular do bolso do sobretudo para verificar se a data era a mesma do GPS de David.

- Ah não... - disse Frank, expressando temor - 07 de julho.

- Que também é a data da ligação do tal Roman.

- E o lugar onde seu carro, segundo o GPS, fez a última parada?

- Sim, acho que é uma reserva florestal ou uma área livre, repleta de pinheiros. Embora eu saiba que a floresta existe e prefira acreditar que foi lá onde estacionei o carro pela última vez, não tenho lembrança, nada pra recordar do que houve lá pra nos fazer parar nessa dimensão que nos força a caçar adoidado. Minha nova teoria: Armadilha. Suspeito nº1: Roman.

O toque do telefone fixo de Frank pôde ser ouvido naquela distância do lado de fora. Imediatamente atraído, Frank se dirigiu à sua casa, andando como se fosse uma reação automática. David tentou impedi-lo pondo-se na frente dele para segura-lo.

- Não, Frank, não vai! Resiste, luta contra essa vontade! É como se estivéssemos num sonho perfeito, mas é pura ilusão, não passa de um pesadelo. Você tem que se rebelar! Mostra que você pode pensar por si mesmo!

Frank fechou os olhos, apertando-os intensamente, mostrando-se esforçado para desobedecer.

- Frank, não vou te soltar enquanto não me der um sinal positivo, essa é sua grande chance. - disse David, agarrando-o com as duas mãos. O detetive aos poucos amenizava o semblante. David, porém, arriscou solta-lo para ir à casa. O caçador desligou o telefone da tomada e o jogou na parede quebrando-o. Voltou para observar se a resposta de Frank ao seu apelo foi efetiva - Frank... Você tá legal? - deu uns tapinhas no rosto - Anda, se recupera. Preciso consertar isso. Mas não sozinho.

Abrindo os olhos rapidamente, Frank visualizou ao seu redor, parecendo desperto e menos cansado.

- Vou preparar meu carro. Bora cair na estrada atrás de juntar a galera. Vamos emboscar esse monstro que se passou por caçador e armou a ratoeira. - tais palavras alegravam David - Não somos nós que estamos presos com ele. É ele que tá preso conosco.

                                                                              ***

Cinco nomes foram contactados por Frank e solicitados para a reunião na floresta marcada para a meia-noite, orientando-os a desligarem seus telefones. Alguns haviam se libertado antes de serem chamados, o que minimizou o trabalho de David em explicar o contexto detalhadamente. Os sete estavam na floresta na noite enluarada se aprontando para uma caçada conjunta a fim de capturar o responsável que se pressupunha ser uma criatura paranormal com poderes numa escala inatingível.

- Bem, pessoal, agradeço a presença de todos vocês e pelo esforço de lutarem pela suas liberdades. - disse Frank no meio deles - É realmente admirável que tenham se convencido de que esse jogador misterioso tá brincando com nossos instintos de caçador, a boa vontade que nos move a derramar nosso sangue por vidas inocentes ameaçadas por coisas que não entendem. Eu sei que meu sobrenome é forte e influente entre a comunidade e sei que não vieram pra oportunismo.

- Temos um respeito incondicional pela sua linhagem, Frank. - disse Spencer, um caçador de boné azul usando camisa de flanela sob jaqueta jeans - Nunca que iríamos duvidar do que você tem capacidade pra nos oferecer.

- Com certeza. É muito orgulho envolvido. - disse outro, chamado Emil - Você é uma lenda viva, cara. - tocou Frank no ombro.

- Ótimo. - disse David - Ainda que desfalcados, acredito que somos o bastante pra criar a emboscada.

- O que tiver controlando essa falsa dimensão... pode ter a força de um deus. - disse um caçador chamado Danton.

- Ele que subestime a esperteza dos seus predadores à vontade. - disse David - Eu não vou nem pensar em recuar um centímetro. Quando seguirmos a partir daqui, já era. Dar meia-volta é jogar no lixo a dignidade.

- E qual é o primeiro passo, capitão? - perguntou Steven, caçador cheio de tatuagens nos braços musculosos.

- Antes de nos separarmos na entrada do território da coisa, vamos procurar as marcas de pneu do meu carro até o ponto onde teríamos nos encontrado, fui o único a estacionar na floresta. - respondeu David, ligando sua lanterna.

O septeto percorreu por entre os troncos dos altos pinheiros portando lanternas e munidos de suas metralhadoras prendidas a cintos de couro. Frank contava com uma pistola .50 na mão esquerda e uma lanterna pequena na mão direta. O silêncio noturno compensava-se com o cricrilar baixinho dos grilos. David seguiu para um ponto meio distante, os demais logo o acompanharam. A luz da lanterna de David elucidou as buscadas marcas de pneu no solo.

- Aqui, pessoal. - disse David, chamando-os em tom baixo - Venham.

Frank e os outros seguiram junto à David para até o ponto onde as marcas terminavam. Spencer apontou a arma para uma direção, pensando ter escutado ruídos.

- O que tá pegando, Spencer? - perguntou Emil - Vambora. Ou bateu o cagaço e quer dar meia-volta?

- Jurava que ouvi alguma coisa se mexendo bem ali. - indicou um amontoado de plantas - Vai ver é um animal assustado.

- Parece que o único animal assustado aqui é você. - zombou Emil - Só espero que não saia correndo feito uma gazela.

- Não sei não... Pra mim o desgraçado tá perseguindo a gente. Ela tá de tocaia.

- Se quiser ficar aí pra descobrir, problema seu. - disse Emil, virando-se para tornar à caminhada.

David achara o final das marcas e parou. Frank esquadrinhou o ambiente, a expressão sisuda.

- Chegou a hora. - disse David - Vocês decidem: Separar por duplas, um terá que ir sozinho. Ou cada um por si.

- Eu prefiro vocês assim juntinhos. - disse uma voz no breu. Os caçadores miraram suas armas e lanternas para um rapaz com cabelo loiro comprido de blusa verde escuro - Ei, cuidado, meus olhos vão queimar com essas luzes. - falou, queixando-se dos fachos intensos das lanternas - Não esperava que tantos de vocês sobrevivessem...

- Quem é você? - perguntou Spencer, ríspido.

- Não tem mistério. - disse Frank, ficando na linha de frente do grupo - Tá bem na cara que ele não é caçador.

- Sou o cara que os chamou pra uma festinha. Não estavam se divertindo? Mas obviamente alguém tinha que estragar. - desviou o olhar para David que percebera num instante - Foi um tremendo desperdício de poder e tempo montar esse paraíso.

- Você é o Roman! - disse David, apontando sua arma para o jovem. Frank se interpôs, insinuando querer baixar o cabo da metralhadora de David - Frank, nem vem com seu código de conduta, eu vou estourar os miolos desse maldito.

- Primeiro vamos ouvi-lo! - determinou Frank, aborrecido com a postura precipitada de David - Sobre matar ou não, o que vai decidir depende do que ele vai nos contar.

- Eu poderia ficar calado e observar mais um conflito de interesses, mas reconheço que meu plano foi arruinado, vocês venceram e não cumpri a meta. - disse Roman - Isso que dá nascer com poderes tão limitados...

- Que meta? Do que você tá falando? - perguntou Frank - Não, peraí... Poderes?! Você é um esper?

- Que diabo é esper? - questionou David, franzindo o cenho.

- Nenhuma surpresa minha você mostrar que conhece os humanos especiais. - disse Roman, sorrindo cinicamente - Uma fonte que não posso revelar me antecipou sobre Frank Montgrow. Além de me ajudar a impedir que mais pessoas como eu fossem mortas por caçadores. Fiz isso pra proteger eu, meu irmão e todos aqueles que nasceram com individualidades que vocês consideram anormais, estranhas e potencialmente ameaçadoras. A parte difícil de controlar várias mentes foi negociar a vida do meu irmão, o Atticus. É uma sorte grande pra vocês nossos lugares não estarem trocados. Ele está lá, quietinho naquela prisão de manicômio, na ala dos pacientes mais perigosos, sem fazer mal a uma mosquinha. É contra pessoas como vocês que eu me senti engajado a lutar. Coincidência três crianças especiais desaparecerem?

- Escuta Roman, não sei quem pôs minhocas na sua cabeça, mas da minha parte os espers não estão ameaçados de nenhuma perseguição. - disse Frank - Eu salvei crianças paranormais das garras de um monstro muito pior!

- E quanto à eles? Concordam com você? Duvido. - disse Roman - Eu continuo sob a mira deles. Não mereço proteção?

- Foi por isso que criou essa realidade fajuta? Fazer com que os poucos caçadores da cidade se destruíssem? - perguntou David - Seu covarde. Você é uma abominação da natureza. Frank, me desculpa, mas não vou te pedir permissão pra atirar.

- Não, ele foi manipulado, fizeram ele pensar que tinha um plano mirabolante de extermínio de espers!

- Fale por si mesmo, Frank! Eu não ligo pro fato de alguém ter movido as cordinhas por baixo dos panos, ele é paranormal, montou uma farsa que custou o suor e a boa-fé de amigos nossos até a morte! Me fez matar meu melhor amigo!

- O quê? Quem você matou? - indagou Frank, atordoado.

- O Ray. Eu comecei uma briga, criando uma competição pelos monstros que o Oleg não pôde matar e daí... atirei nele, o considerei um estorvo. Eu mataria milhares de monstros pra morrer de desgaste físico e expiar minha culpa.

- Comovente a história. - debochou Roman - Você foi brutal com seu amigo. Aliás, eu assisti tudo ao vivo e à cores, cada entrada triunfal, cada morte por cansaço. O jeito perfeito de eliminar caçadores: induzi-los a lutarem incansavelmente e morrerem insaciados e deprimidos por não serem bons o suficiente pra resguardar vidas desprotegidas.

- Esquece essa merda e me fala do seu irmão. - disse Frank, interessado em Atticus.

- O Atticus e eu fomos criados num orfanato católico em que a madre superiora reservou um quarto exclusivo para as crianças estranhas. Mas aquele lugar pegou fogo algum tempo depois de nós dois sermos adotados justo no momento que perdemos a esperança de irmos pra um lar de verdade. O incêndio não teve muita atenção da mídia, mas a história tem seu lado macabro. Foi sanguinário. Mas sei pouco dos fatos. Atticus faz o mesmo que eu com um alcance ilimitado. Foram minhas limitações que facilitaram meu plano ser descoberto. Parabéns pro seu amigo, quebrou sua própria bolha.

- Como soube nossos números de telefone? - interrogou Frank.

- Aí você me tá forçando a entregar o negociante oculto.

- Falo logo quem é! - exigiu Frank, estourando a paciência.

- Ele é um cara sinistro, literalmente o próprio diabo. Pegou sua lista de contatos e repassou pra mim compensando eu me recusar a ceder o Atticus pra sei lá o que ele planeja e confiando que meus poderes bastariam pra acabar com todos vocês.

- Malvus... - disse Frank, atônito, a imagem do governante da Terra Negativa surgindo na sua mente.

- Pra mim já chega. Cansei. - disse Spencer que rapidamente puxou o gatilho contra Roman. O tiro acertou a cabeça do jovem que caiu duro. A noite se transformou em dia, indicando que dimensão foi quebrada. Assustado com os olhares dos companheiros, Spencer resolveu fugir temendo represália.

- Por que esse imbecil saiu correndo? Eu ia agradece-lo. - disse David, estranhando a atitude.

Frank virou o rosto para o cadáver de Roman com o buraco de bala no meio da testa expelindo sangue e um sentimento de dó o maltratou. O silêncio lhe pareceu a única resposta consciente para a ação impulsiva e errática de Spencer. A partir do momento que Roman levantou a questão do extermínio, temia que David decretasse uma verdadeira depuração contra espers convocando caçadores ativos que não conhecia ou até mesmo influenciando outros que se aposentaram.

                                                                                 ***

Para amenizar a tensão provocada pela morte de Roman, David havia idealizado dar uma passada na taverna Sol da Meia-Noite. Ainda que Frank interpretasse aquilo como uma comemoração maldosa por parte de David, em vista de simplesmente Roman abrigar uma essência sobrenatural, o que automaticamente já o classificava como "monstro" na sua perspectiva, o detetive optou por acompanhar os caçadores ao bar pois não negava que precisava de um pouco de álcool no seu sangue.

- Se tivermos que celebrar mais uma vitória em equipe, com toda a certeza não é sóbrio. - disse David, entrando na taverna junto aos demais - Mas antes de começarmos a festa... - virou-se para Frank - Parece que alguém nos deve uma explicação.

- Estão me encarando desse jeito por quê? Eu também tô afim de brindar, não pela morte do Roman...

- Ah, pode acreditar que o motivo da nossa confraternização é aquele pobre coitado. - disse Emil.

- Não pode ser, vocês... ficaram felizes com a morte de uma pessoa? Saindo em defesa do crápula do Spencer?! O Roman não tinha culpa dos poderes que usou pra nos matar! Ele foi inocente, foi usado! Se eu pudesse explicar...

- Você pode ou não quer explicar, Frank? - questionou David, esboçando irritação - O próprio diabo em pessoa tá caminhando sobre a Terra e pegou nossos números através do seu celular sem que você soubesse, ou seja, ele tem um alcance pequeno demais pra fazer uma estrago na sua vida e até agora você tá vivo. Trocamos os super-humanos pelo diabo.

- Tá querendo dizer que... Pretende caçar o Malvus? Já vou avisando, não embarquem nessa, por favor...

- Malvus? Na bíblia é outro nome. - disse Dustin, o mais novo do grupo.

- Ele é um anjo caído com um mega-plano de destruição que tá fora da alçada de caçadores como vocês. - disse Frank - O buraco é muito mais embaixo, é um conselho de amigo que tô dando.

- Amigo? Se fosse nosso amigo teria confiado nos nossos potenciais, teria nos dito a verdade bem antes. - disse David, desapontado - Somos a última linha de defesa da cidade contra o mal. Você se acha muito especial, né?

- Não é essa a questão, David, eu sozinho me meti numa encrenca das brabas, só não quero envolver mais ninguém, inclusive amigos despreparados pra lidar com esse tipo de mal. Por favor, não entendam que desmereço vocês, nada disso.

David comprimiu os lábios, baixando um pouco a cabeça num estado um tanto pensativo, porém não reduzindo a decepção.

- OK, Frank... Você que escolheu fazer do modo difícil. - disse David que de repente usou a coronha da sua metralhadora para golpear Frank que teve seu nariz acertado. Iniciou-se um confronto físico em que Frank revidou com um soco e ambos se engalfinharam, no chão derrubando umas mesas. David dera uma joelhada na barriga de Frank para afasta-lo. O caçador levantou-se e sacou uma pistola para disparar contra Frank que imediatamente também armou-se destravando sua .50. O quinteto preparou-se para chover balas sobre Frank, estimulados por David. Frank atirava passando pelas mesas driblando cada tiro, conseguindo chegar andando de quatro para ficar atrás do balcão. As balas da pistola acabaram, mas para o seu alento havia uma espingarda dando sopa apoiada. Puxou a trava e disparou contra os caçadores usando o balcão como trincheira, baleando Emil que não teve tempo de esquivar-se abaixando e Danton, este levando um tiro no braço e disparando uma bala a esmo que atingiu uma garrafa numa mesa. David se protegeu numa coluna, segurando sua metralhadora.

Solomon e Steven tomaram proximidade, mais cautelosos, para dar cobertura à David. Frank abaixou-se agilmente, aguardando uma brecha para contra-ataque. Tornou a ficar visível, mirando em Steven. O caçador se jogou para o lado, escapando do tiro. Solomon veio audacioso dando três tiros contra o balcão para intimidar, mas Frank ficara de pé efetuando um tiro no peito do jovem caçador. Steven reergue-se depois, disparando contra Frank que novamente se abaixou, mas sentiu um tiro pegar-lhe de raspão no braço direito. Detrás da coluna, David suava em profusão, se vendo pressionado a matar Frank. Steven pôs três novas balas na arma e esperou Frank reaparecer, mas o detetive propositalmente demorava.

- Steven, sai da frente! - pediu David, a metralhadora em riste. Mandou uma saraivada de balas que estilhaçava copos e garrafas na prateleira entre Frank e o balcão. Frank andava de joelhos, os caquinhos de vidros lhe cortando os dedos à medida que a chuva de projéteis continuava. Steven, deitado no chão, não admitia discordar do método de David.

- Merda! - reclamou David, apertando o gatilho sem que mais balas fossem cuspidas. Frank aproveitou para mostrar-se, largando sua espingarda. Steven levantou-se, mas hesitou no disparo.

- O que tá esperando? Se tá dividido entre piedade ou lutar do meu lado, dê pelo menos um tiro na perna! - disse David.

Frank fitava Steven num misto de desânimo e confiança.

- Não precisa ser capacho desse cara. Suas decisões não são as dele. Suas vontades não podem ser controladas.

Steven engolia um choro, baixando a arma lentamente. Exasperado, David bufava, tomado pelo ódio.

- Seu imprestável. Sabia que num momento você deixaria de me escutar. - disse ele, logo sacando um revólver e atirando em Steven que morrera na hora - Por isso meu pai morreu cedo: Frank Montgrow e seu poder de amolecer corações. Brilhante.

- Eu não queria terminar isso assim... - disse Frank, aproximando-se. David foi logo apontando a arma para Frank, mas apertou o gatilho e não saiu nada. Abandonando a arma, o caçador recorreu a um taco de sinuca, partindo-o na coxa esquerda - Se esse for o único jeito de parar você... se meu aviso não funciona... Então que seja. Travar essa batalha sozinho não me faz menos humano que vocês. Mas se nada do que eu disser vai te conscientizar de esquecer e seguir em frente...

- Cala a boca! - disse David, vindo com o pedaço do taco, a parte afiada da madeira ameaçando perfurar Frank. Porém, o detetive agiu prontamente, pegando uma garrafa verde de cerveja e quebrando-a para utilizar o gargalo. Fincou o vidro na barriga de David, segurando o braço esquerdo dele que portava o taco partido. Golfando sangue pela boca, David lançou um último olhar rancoroso - A gente se vê no inferno. Meu pai e eu vamos torcer por você de lá.

De certa forma, todos se sentiam fadigados dos dias que vivenciaram na dimensão de Roman. Mas o desgaste de Frank naquele instante se manifestava psicologicamente. O detetive, alquebrado emocionalmente, andou para trás, sentando-se encostado no balcão desolado com o que acabou de fazer. Olhava os corpos dos amigos com tristeza profunda.

Seu celular vibrou e o retirou do bolso. Uma nova mensagem recebida. Ao ver o remetente, sua expressão não foi das melhores. Algo como rejeição e desprezo. "Frank, tá desocupado pra vir aqui na praça perto da igreja presbiteriana? É assunto de emergência. Vamos conversar, de caçador pra caçador, tem uma coisa pra esclarecer.", dizia Fred no bilhete. Frank apagara a mensagem, não estando com cabeça ou energia para vislumbrar o rosto de Fred depois da verdade terrificante desnudada há poucos dias.

                                                                                    -x-

*A imagem acima é propriedade de seu respectivo autor e foi usada para ilustrar esta postagem sem fins lucrativos. 

*Imagem retirada de: https://monjesdelalunazul.blogspot.com/?m=0

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